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De estágios para tipologia

No documento DOUTORADO EM PSICOLOGIA SOCIAL SÃO PAULO 2010 (páginas 135-153)

PARTE II – REFLEXÃO SOBRE IDENTIDADE RACIAL E AÇÕES AFIRMATIVAS

CAPÍTULO 2 De estágios para tipologia

William E. Cross Jr, um dos principais pesquisadores e teóricos sobre o desenvolvimento da identidade negra nos Estados Unidos da América, é psicólogo e professor associado na Africana Studies and Research Center da Cornell University. É, também, professor e chefe do Doctoral Program in Social-Personality Psychology, do Centro de Graduação da Universidade da Cidade de Nova York (CUNY). Conforme sítio da CUNY, seu livro “Shades of Black – Diversity in African American Identity”, de 1991, considerado inovador (groundbreaking book), é uma obra de grande referência para os estudos da identidade negra. Seu modelo conceitual de estágios de desenvolvimento da identidade negra tem gerado um grande número de ensaios, comentários e estudos empíricos. De acordo com o sítio do Centro para Equidade Multicultural e Acesso (CMEA), da Universidade Georgetown, entre os interesses de investigação de Cross Jr encontramos a estrutura e as funções cotidianas da identidade negra; conteúdo da identidade (nacionalista, bicultural e multicultural), como preditor primário das conseqüências da identidade na vida cotidiana; personalidade geral e orientação grupo-referencial como preditores independentes de nível de autoconceito diferencial; etc. Como veremos adiante, as reflexões de Cross Jr. podem se aproximar do método de pesquisa que vem sendo adotado no NEGRI – a Hermenêutica de Profundidade – ao situar as formas simbólicas sob análise em seu contexto de produção, transmissão e recepção.

As referências teóricas para a teoria de Cross Jr. são apontadas como sendo a teoria do desenvolvimento da identidade, de Erik Erikson; a abordagem ecológica do desenvolvimento humano, de Urie Bronfenbrenner e a teoria da identidade social, de Henry Tajfel (STRAUSS e CROSS JR, 2005, p. 7). Na perspectiva de Erik Erikson, a identidade “tem como modelo o indivíduo em situação de competência e eficácia sociais [...]” (STREY et alii,1998, p. 160), cuja personalidade continua se desenvolvendo para além da infância, nos oitos estágios de desenvolvimento psicossocial, cada um com um conflito ou desafio a resolver (ALMADA, 2006).

Na abordagem ecológica do desenvolvimento humano, o sujeito desenvolve-se em contexto, em quatro níveis dinâmicos – pessoal, processual, contextual, temporal. “Bronfenbrenner privilegia os aspectos saudáveis do desenvolvimento e explicita a

necessidade dos pesquisadores estarem atentos à diversidade que caracteriza o homem [...]” (ALMADA, 2006, grifo da autora).

A partir de pesquisas com percepção visual, Tajfel concluiu que a identidade social “está associada ao conhecimento da pertença aos grupos sociais e ao significado emocional e avaliativo dessa pertença” (Tajfel, 1972 a, p. 292 apud VALA e MONTEIRO, 1997, p. 291). Tajfel, juntamente com J. C. Turner, compõem a chamada “Escola de Bristol”, cujo modelo de identidade social foi “o primeiro a colocar a identidade no centro da análise das relações intergrupos, atribuindo-lhe uma posição explicativa da diferenciação e da discriminação sociais, [...]” (VALA e MONTEIRO, 1997, p. 291). Diferentemente do Interacionismo Simbólico, a Escola de Bristol tem seu foco na relação entre grupos, freqüentemente na forma de conflito (PAIVA, 2007, p. 79).

Partindo de uma revisão dura sobre os estudos clássicos norte-americanos sobre identidade negra no período entre 1939 a 1980, Cross Jr. resgata a noção de diversidade para a compreensão da identidade negra. O objetivo de seu trabalho é “expurgar da Black Psychology tanto o seu aspecto bastante pejorativo quanto sua propensão romântica, substituindo-os por um discurso centrado na diversidade e complexidade do funcionamento psicológico negro” (CROSS JR., 1991, xiii, tradução nossa). Segundo o autor, o modelo resultante da revisão que fez “tornou-se conhecido como o modelo do enegrecimento [nigrescence]78. Nigrescence é uma palavra francesa que significa ‘o processo de tornar-se negro’; [...]” (CROSS JR., 1991, p. x, tradução nossa). Sua proposta teórica é descrever a Psicologia do tornar-se negro, de assumir a negritude. No Brasil, em 1983, uma pesquisadora já afirmava que “Ser negro é [...] criar uma nova consciência que assegure o respeito às diferenças e que reafirme uma dignidade alheia a qualquer nível de exploração. Assim, ser negro não é uma condição dada, a priori. É um vir a ser. Ser negro é tornar-se negro” (SOUZA, 1983, p. 77).

Reconhecer-se enquanto negro é uma construção passível de acontecer ao longo da vida, é uma jornada na busca de resgatar seu próprio valor, um processo de tornar-se negro, ir além do estigma, da baixa estima, da inferiorização; lutar contra o racismo, o preconceito e a discriminação e, sobretudo, lutar por cidadania. Tanto em Souza (1983) quanto em Cross Jr (1991), notamos a influência do Movimento da Negritude, apesar de

78 “Our resulting developmental models became known as models of nigrescence. Nigrescence is a French word that means ‘the process of becoming Black’; thus our models attempted to depict the psychology of the process of

que, na sua obra seminal, Cross Jr. (1991) não faz nenhuma referência a uma influência direta desse movimento. Melhor dizendo, há duas referências rápidas, uma a DuBois, considerado o “Pai da Negritude”79 , que aparece na bibliografia do livro e outra a Fanon, um dos críticos da Negritude, que aparece como exemplo do uso da perspectiva processual, no estudo da identidade negra (CROSS JR., 1991, p. 156).

Uma referência a DuBois aparece novamente em um texto de 1994, quando o autor faz um histórico dos estudos que têm sido feitos na tentativa de elaboração de um corpo teórico e empírico que dê conta do processo de transformação da identidade negra (CROSS JR., 1994, p. 120). Uma referência mais explícita ao Movimento da Negritude aparece em um texto de 2005, quando é apresentada a relação direta entre a teoria desenvolvida por Cross Jr. (1991) e a apropriação que os negros americanos fizeram do termo francês, no início dos anos 1970, inspirados pelo Movimento da Negritude, na busca pela identidade negra80. Foi essa a população que Cross Jr. estudou para elaborar sua teoria, durante a fase “Black Power”81 do Movimento Social Negro norte- americano, em sua cidade natal, Evanston, no Estado de Illinois e na cidade vizinha de Chicago. Seu “Modelo de conversão Negro-to-Black [...] foi desenvolvido através de auto-análise e estudos de observação participante” (CROSS JR., 1991, xi, tradução nossa).

É necessário fazer uma rápida digressão a respeito do Movimento da Negritude, para depois prosseguir apresentando a teoria de desenvolvimento da identidade negra, segundo Cross Jr.. Negritude é um termo polissêmico, segundo Bernd (1988, p. 15), cuja “multiplicidade de interpretações está relacionada à evolução e à dinâmica da realidade colonial e do mundo negro no tempo e no espaço” (MUNANGA, 1988, p. 5). A despeito da riqueza conceitual que Munanga (1988) apresenta em seu livro, Bernd traz dois sentidos que vêm ao encontro das necessidades deste trabalho.

1) em um sentido lato, negritude – com n minúsculo (substantivo comum) – é utilizada para referir a tomada de consciência de uma situação de dominação e de discriminação, e a conseqüente reação pela busca de uma identidade negra. [...] 2) em um sentido restrito, Negritude – com N maiúsculo (substantivo próprio) – refere-se a um momento pontual na trajetória da

79 Segundo Munanga, (1988, p. 36) e também Bernd (1988, p. 22).

80 “In the early 1970s the French term effectively captured the African American search for identity and today Nigrescence Theory is synonymous with theory and research on African American identity development” (STRAUSS e CROSS, 2005, p. 6).

81Today we take the concept Black identity for granted, in fact, however, Black identity is a contemporary term given credence by events primarily associated with the Black Power phase of the Black Social Movement”. (CROSS JR, 1991, p. 151) “[…] today ‘Negro’ implies a deracinated identity” (CROSS JR, 1991, p. 152).

construção de uma identidade negra, dando-se a conhecer ao mundo como um movimento que pretendia reverter o sentido da palavra negro, dando-lhe um sentido positivo (BERND, 1988, p. 20, grifo da autora).

O período colonial do séc. XX foi o contexto de nascimento do Movimento da Negritude. A situação colonial implicava em submissão econômica e cultural das sociedades colonizadas, sendo elas inferiorizadas e desqualificadas em seus valores e seu povo considerado primitivo e não-lógico. O negro foi reduzido e submetido a condições de desumanização e humilhação, tanto no continente africano quanto nas Américas. Essa redução visava a sua alienação, para que assim fosse dominado e explorado, com mais eficácia, pelo colonizador europeu (MUNANGA, 1988, p. 33).

A negritude, entendida como tomada de consciência e de luta contra uma situação de dominação e/ou discriminação, remonta às primeiras manifestações de resistência dos escravos africanos nas Américas. Assim, pode-se considerar como eventos precursores da Negritude: a revolta dos escravos no Haiti, que desencadeou a independência desse país, em 1804; a disseminação de quilombos durante todo o período escravista brasileiro; a militância de DuBois, que influenciou o “renascimento negro”, no Harlem, nos anos de 1920, nos EUA e outros acontecimentos, conforme Munanga (1988) e Bernd (1988). No entanto, o termo Negritude só surgiu em 1939, quando foi definido pelo poeta antilhano Aimé Césaire “uma revolução na linguagem e na literatura que permitiria reverter o sentido pejorativo da palavra negro para dele extrair um sentido positivo” (BERND, 1988, p. 17). É um grande movimento de recusa à assimilação. Por assimilação entenda-se que o negro deveria assumir para si, os valores culturais do branco. Processo que “foi apenas um mito, pois o caminho de desumanização do negro escolhido pelo colonizador não poderia integrá-lo. Pelo contrário, criou sua desestabilidade cultural, moral e psíquica [...] (MUNANGA, 1988, p. 31).

O objetivo da Negritude, liderada por Césaire, Senghor e Damas era afirmar ao mundo os valores da cultura negra (CONSTANT e MABANA, 2009, p. 6). Nesse processo, competia aos negros expurgar e substituir atitudes negativas em relação ao ser negro e africano, por atitudes proativas e positivas.

Em sua expansão, a Negritude recebeu influências do marxismo, do surrealismo e do existencialismo, o que lhe proporcionou muita força. Nos EUA, nas Antilhas e na África o movimento foi, inicialmente, muito influenciado pelo comunismo internacional. Nesse período, Bernd (1988) pôde identificar duas tendências, uma mais

voltada para a “consciência de classe”, independente da cor e outra focada na “consciência de raça”. Após a Segunda Guerra Mundial, o movimento, em sua fase militante, se engajou na luta pela independência das colônias africanas e se internacionalizou, chegando a “outros países do Terceiro Mundo, como o Brasil” (BERND, 1988, p. 31).

No Brasil, tomando o termo negritude em seu sentido lato, identificamos a luta pela consciência negra e contra a opressão desde os primeiros quilombos, como já dissemos; a “bodorrada”, de Luiz Gama, no período pré-abolicionista82; uma combativa imprensa negra, desde os anos 1915; as ações do Teatro Experimental do Negro (TEN), nos anos 1940, em São Paulo, definido por Abdias do Nascimento como “um instrumento e um elemento de negritude” (BERND, 1988, p. 47); a militância do Movimento Negro Unificado (MNU), a partir de 1978, e os demais grupos, como o Grupo de União e Consciência Negra (GRUCON), a Pastoral de Combate ao Racismo da Igreja Metodista, a Pastoral do Negro da Igreja Católica, etc., que existiram e ainda existem voltados pela causa da identidade negra e de combate ao racismo.

Apesar das críticas que o movimento sofreu (MUNANGA, 1988, p. 56-80), diversos escritores realçam a atualidade da Negritude como um movimento literário, filosófico, poético e também ideológico, como uma resposta à opressão que ainda é relevante (CONSTANT e MABANA, 2009, p. 6).

Foi necessária essa olhada superficial para o Movimento da Negritude para mostrarmos a aproximação da teoria de Cross Jr. com esse movimento, bem como para situarmos a maneira como foram apropriadas algumas palavras do texto original do autor. “Nigrescence” foi traduzida por “enegrecimento”, visando destacar seu caráter processual; “Blackness” que o autor utiliza em maiúsculo em todo seu texto, foi vertida para o português como “negritude”, atendendo ao sentido lato da palavra, conforme indicado acima. Também o termo “Black” apareceu em maiúsculo no decorrer da obra de Cross Jr., mas optamos por traduzir para “negro”, escrito em minúsculo, da mesma maneira que foi utilizado no restante do presente estudo, particularmente no Capítulo 5, da Parte I, que trata da denominação e classificação racial brasileira.

Cross Jr. (1991) procura articular a compreensão da construção da identidade do negro norte-americano com a realidade do racismo local, enfatizando a importância do

82 “Em 1861 […] Luiz Gama, assume pela primeira vez o termo BODE com que pejorativamente eram chamados os negros, devolvendo assim ao branco a ‘pedra’ que este lhe atirara: […]” (BERND, 1888, p.44, destaque da própria autora).

grupo de referência83. Modelo interessante, principalmente por considerar que a identidade tem muito mais a ver com componentes sociais e culturais do que psicológicos, isto é, é um modelo que leva em conta a influência dos grupos de referência na formação da identidade. Sobre essa influência, Cross Jr. (1991, p. 187, tradução nossa) afirma que “A diferença básica entre os negros, na medida em que o nível de negritude está em causa, é freqüentemente menos psicológica (relacionado à identidade pessoal), do que cultural, ideológica e filosófica (relacionado ao grupo de referência)” 84.

Como nos informa Cross Jr. (1991, p. 190, tradução nossa), enegrecimento é uma experiência de ressocialização85, no qual se busca a transformação de uma identidade pré-existente, não voltada para o seu grupo étnico/racial, para uma identidade afro-orientada. Lembra, no entanto, que uma pessoa pode ser socializada, desde sua infância, voltada para uma identificação mais positiva com seu grupo de origem. Nesse seu modelo revisado86, Cross Jr. salienta que, no primeiro estágio, encontramos duas “tipologias”, correspondentes a essas duas possibilidades identitárias.

Um dos argumentos contra a perspectiva pejorativa, que prevaleceu nos estudos sobre identidade negra que Cross Jr. analisou, é que sempre houve diversidade de possibilidades identitárias para negro, como resultado da diferença de grau de conscientização negra das gerações anteriores, ou seja, os estudiosos tendiam somente a ver evidência de auto-ódio, quando de fato “[...] A saúde mental foi um legado das vitórias psicológicas pessoais, que seus pais foram capazes de alcançar e passar para a próxima geração através da socialização via família, igreja e comunidade” (CROSS JR., 1991, xiv, grifo e tradução nossa). Assim, novamente afirmando a diversidade, Strauss e Cross Jr (2004, p. 7) destacam que as diferentes experiências de socialização, da infância à adolescência, é que irão determinar se a pessoa chegará a se tornar um jovem adulto com atitudes de Pré-encontro, ou de Imersão-Emersão ou de Internalização, que são algumas das fases identificadas, por Cross Jr (1991), em seu modelo de desenvolvimento da identidade negra, o qual veremos mais adiante.

Assim, o que o modelo de enegrecimento se propõe é explicar como adultos negros assimilados, desenraizados, aculturados, transformam-se, devido a circunstâncias

83 “The distinction between personal identity (‘general personality’) and group identity (‘reference group orientation’) is crucial to my analysis” (CROSS JR, 1991, p. xiv).

84 O autor usa uma concepção neutra de ideologia, conforme conceituação de John B. Thompson (1995). 85 “Nigrescence is a resocializing experience” (CROSS JR, 1991, p. 190).

e eventos específicos, em negros mais conscientes de seu pertencimento étnico/racial. Propõe, então, um modelo de desenvolvimento da identidade do negro – de seu enegrecimento – composto por cinco estágios, articulados entre si, num processo contínuo. Os estágios indicam uma proeminência de certas características em relação a outras, um padrão descritivo. Neste sentido, a teoria sugere processos que são transitórios na construção da identidade e não uma “camisa de força”. Não se trata, por certo, de uma perspectiva naturalizante muito comum a certas teorias de desenvolvimento em Psicologia. “Com efeito, a negritude é um estado de espírito, não um traço herdado, cuja aquisição muitas vezes exige um esforço considerável” (CROSS JR., 1991, p. 149, tradução nossa).

Apresentamos, a seguir, os cinco estágios de desenvolvimento da identidade negra, propostos e nomeados por Cross Jr (1991, p. 190) e tipologias correspondentes aos mesmos, identificadas e nomeadas por este pesquisador, conforme Quadro 1 na página seguinte. Em seu modelo de enegrecimento, Cross Jr., (1991, 160, tradução nossa) indica a possibilidade para que isto seja feito: “As tipologias implícitas nos estágios e na dinâmica do processo como um todo têm comprovada relevância para discussões de identidade pós-movimento, conseqüentemente, estudos continuam a aparecer”. Tal tipologia não se refere a estágios de desenvolvimento nem às pessoas, apenas qualifica, neste trabalho, os tipos de relatos identificados no corpus analisado. Deve ser encarada apenas com fins instrumentais, pois entendemos que estamos no campo da pluralidade.

O estágio do Pré-encontro descreve a identidade a ser mudada; o estágio do Encontro envolve os pontos nos quais a pessoa se sente compelida a mudar e tenta localizar ou descrever, com precisão, “aquelas circunstâncias e eventos que provavelmente induzem à metamorfose da identidade de um indivíduo” (CROSS JR., 1991, p. 199, grifo e tradução nossa); o estágio Imersão-Emersão descreve o ápice da mudança de identidade e os estágios de Internalização e Internalização-Compromisso, descrevem a familização e internalização da nova identidade.

Quadro 2 – Estágios de desenvolvimento da identidade negra e tipologia

Pré-encontro 1 (baixa saliência para questões raciais)

Omisso Transcendente Centrado no estigma Racista anti-negro

Pré-encontro 2 (alta saliência para questões raciais)

Simpatizante

Encontro (situações que levam a tomada de consciência)

Centrado na constatação Político

Imersão-Emersão (transição de uma velha perspectiva para uma nova referência) Imersão Entusiasmado Emersão Estável Imersão-Emersão

Restrição em relação à negritude Revolta com o branco

Ativismo ou militância frustrada Ativismo ou militância ocasional

Internalização (negritude consolidada e atenção para outras problemáticas

Grupocentrado

Centrado no seu grupo, mas sem exclusividade Bi-focado

Multi-focado

Internalização-Compromisso (ação em direção a compromisso ou reciclagem)

Desistência

Comprometimento adiado Questionamento

No estágio do “Pré-encontro”, como é chamado o primeiro momento, podemos encontrar negros que se encaixam no perfil do auto-ódio (distantes das pessoas negras; com estereótipos negativos internalizados, mas também negros que apresentam alta tendência para afiliação negra, baixo nível de internalização de estereótipos negativos para o negro e um sentido geral de aceitação e conexão aos negros (CROSS JR., 1991, p. 169). Podemos subdividir esse estágio em Pré-encontro I e Pré-encontro II, para mostrar essas duas possibilidades. Neste estágio se forma a primeira identidade de alguém. “Esta socialização envolve os anos de experiência da pessoa com sua família nuclear, sua família extensa, vizinhos, comunidade e escolas; abrange todos os anos da infância, adolescência e início da vida adulta” (CROSS JR., 1991, p. 198, tradução nossa). As principais atitudes de pessoas no estágio de Pré-encontro I são: 1) “atitudes de baixa saliência”; 2) “atitudes de estigma social”; 3) “atitudes anti-negro”.

Atitudes de baixa saliência são aquelas em que a pessoa apresenta baixa saliência para questões raciais, não negando ser negra, mas não considerando isto um fato relevante. Pode variar de uma baixa saliência a uma neutralidade racial. Ser negro e ter experiência negra é algo que contribui pouco para a sua vida. As pessoas, neste estágio, valorizam outras coisas, que não seja a negritude, tais como religião, estilo de vida, status social, profissão, etc. “Podem considerar terem alcançado um plano mais elevado (isto é, um humanismo abstrato), abaixo dos quais estão aqueles do mundo vulgar da raça e da etnicidade” (CROSS JR., 1991, p. 191, tradução nossa). Relacionadas a essas atitudes, este pesquisador sugere os tipos de relato OMISSO e TRANSCENDENTE.

Atitudes de estigma social estão relacionadas àquelas em que as pessoas consideram raça como um problema de estigma. “Raça é uma luta, um problema, uma imposição. Necessitam defender-se contra a negritude enquanto um estigma” (CROSS JR., 1991, p. 191, tradução nossa). São pessoas que têm pouco conhecimento da história e da cultura negra. Para essa atitude, este pesquisador sugere o tipo CENTRADO NO ESTIGMA.

Atitudes anti-negro estão relacionadas às pessoas que têm o negro como um grupo de referência negativo, ou seja, sua atitude é anti-negritude, cuja perspectiva é semelhante à dos racistas brancos. Detestam outros negros, não buscam suporte pessoal em negros ou em comunidades negras. Sua visão é dominada por estereótipos racistas em relação à negritude, ao mesmo tempo em que desenvolvem estereótipos positivos em relação às pessoas e à cultura branca. Para elas os próprios negros são culpados por sua condição. A tipologia que sugerimos para essa atitude é RACISTA ANTI-NEGRO.

A essas atitudes estão associadas outras características, tais como “miseducation”, que se refere àqueles negros que passaram por uma educação formal centrada numa perspectiva ocidental e branca, distanciados de qualquer informação sobre a contribuição da África para a civilização ocidental, no geral e para o desenvolvimento da cultura norte-americana, em particular87; “uma perspectiva cultural eurocêntrica”, isto é, a partir de sua socialização a pessoa considera corretos o padrão de beleza e de arte brancos; “ansiedade, imagem racial ou holofote”, a pessoa fica em alerta para qualquer sinal de negritude, preocupado quanto ao fato de ser “muito negro”,

87Situação bem parecida com a realidade brasileira, por isto mesmo a necessidade de luta, pelos grupos do movimento negro brasileiro, para inclusão de História da África no currículo escolar, que culminou com a promulgação da Lei 10.639, em janeiro de 2003.

principalmente quando está próximo de pessoas brancas; “assimilação-integração”, a preocupação aqui é se integrar e ser aceito pelo mundo branco; “estrutura de valores e

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