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1. Introdução

1.6 Estratégia Saúde da Família e Atenção Primária à Saúde

A ESF propõe um novo modelo de cuidado em saúde, fundamentando a assistência na promoção da qualidade de vida.4,30 Representa uma estratégia para transformação do modelo de atenção à saúde no Brasil, com a proposta de reorganização da Atenção Primária à Saúde (APS).4

Nesse novo modelo, a APS é considerada eixo de orientação do modelo assistencial, porta de entrada do sistema de saúde, transformadora do modelo médico-sanitário, que tem ênfase na cura por meio de medicamentos e atendimento individual, para um modelo de saúde coletiva, centrado na promoção da saúde e tratamento dos agravos.4

Este novo modelo orienta-se pelos princípios doutrinários do SUS, na universalidade, equidade e integralidade. Assim, a APS, procura garantir ao usuário acesso ao sistema, com atendimento humanizado e continuado, dirigido às suas necessidades e com resolubilidade em tempo oportuno.31,53-53

A APS tem como estratégia prioritária de consolidação e expansão a ESF, nomeando os estabelecimentos de saúde que prestem assistência nessa esfera de atenção, como Unidade Básica de Saúde.53

A ESF propõe a incorporação de equipes multi e interprofissionais para o desenvolvimento de ações, visando ao cuidado na família e na comunidade, delimitadas por território e população adscrita.4,53

Dentre as intervenções realizadas na ESF, destaca-se seu papel importante no controle de Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT), tais como a Hipertensão Arterial (HA) e o Diabetes Mellitus (DM), evitando o agravamento e o surgimento de complicações.54

A HA é uma condição clínica, caracterizada por elevação sustentada dos níveis pressóricos ≥ 140 e/ou 90 mmHg, tem como fatores de risco a idade, sexo e etnia, excesso de peso e obesidade, consumo excessivo de sal, consumo crônico de álcool, sedentarismo e genética. O quadro abaixo apresenta a classificação da pressão arterial para pessoas acima de 18 anos de idade, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia.55

Quadro 1 - Classificação da Pressão Arterial a partir de 18 anos de idade, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia. Campinas-SP, 2018.

Classificação Pressão Arterial Sistólica (mmHg) Pressão Arterial Diastólica (mmHg)

Normal ≤ 120 ≤ 80

Pré-hipertensão 121-139 81-89

Hipertensão Estágio 1 140-159 90-99

Hipertensão Estágio 2 160-179 100-109

Hipertensão Estágio 3 ≥ 180 ≥ 110

Quando a Pressão Arterial Sistólica e a Pressão Arterial Diastólica situam-se em categorias diferentes, a maior deve ser utilizada para classificação da Pressão Arterial.

Fonte: Malachias MVB et al. 7ª Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial. Arq. Bras. Cardiologia. 2016;107(3):suple3.

As principais complicações da HA se relacionam à Insuficiência Cardíaca, Infarto Agudo do Miocárdio (IAM), Doenças cerebrovasculares (aterosclerose e Acidente Vascular Encefálico), Doença renal (proteinúria e microalbuminúria) e danos a retina (visão turva e hemorragias).55

A HA é considerada um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares.56 Um estudo norte-americano realizado em 2015 revelou que 69% dos pacientes que tiveram IAM e 77% dos pacientes que tiveram Acidente Vascular Encefálico (AVE), tinham o diagnóstico de HA.57

No Brasil, a HA contribui em 50% das mortes por doença cardiovascular, atingindo 32,5% (36 milhões) da população adulta e 60% da população acima de 65 anos. Em conjunto com o DM, teve elevado impacto na perda de produtividade do trabalho entre os anos de 2006 e 2015, estimado em 4,18 bilhões de reais.58

Figura ainda neste contexto das DCNTs, o DM, que é um distúrbio metabólico, caracterizado por hiperglicemia persistente, decorrente de deficiência na produção de insulina, na sua ação, ou na resistência celular a ela. É classificada em:59

Diabetes Mellitus tipo 1: Doença autoimune, com destruição das células β pancreáticas, com deficiência completa na produção de insulina. Corresponde de 5 a 10% dos casos de DM. 59

Diabetes Mellitus tipo 2: Possui etiologia multifatorial, com forte influência de fatores ambientais tais como, hábitos dietéticos, sedentarismo, obesidade. É caracterizada por resistência à insulina, aumento da produção de glicose pelo fígado e graus variados de deficiência a produção de insulina. 59

Diabetes Mellitus gestacional: Caracterizada pela ação de hormônios que atuam causando resistência à insulina, com eventual evolução para disfunção das células β pancreáticas. 59

Outras formas de diabetes Mellitus: Todas as outras formas menos comuns, são caracterizadas por alterações de base que causam o distúrbio metabólico.59

Os fatores de risco envolvidos no DM são genéticos, sobrepeso ou obesidade, idade e etnia, sedentarismo e HA. Suas complicações se classificam em agudas (Hipoglicemia, cetoacidose diabética, Síndrome Hiperglicêmica Hiperosmolar) e crônicas (Macrovasculares, Microvasculares e Neuropáticas).59

Estima-se que no mundo, o DM atinja 415 milhões de pessoas. O Brasil ocupa a quarta posição em prevalência, com 14,3 milhões de pessoas (12,9 a 15,8% da população), com projeção de 23,3 milhões (21 a 25,9%) para 2040.59

O DM é o terceiro fator, da causa de morte precoce, superada pela HA e pelo uso do tabaco. Estima-se que no mundo, no ano de 2015, morreram aproximadamente 5 milhões de pessoas entre 20 e 79 anos. 59

Em conjunto com a HA, o DM representa um importante gasto financeiro para os indivíduos e suas famílias, assim como para os sistemas de saúde. Juntos, são responsáveis por altos índices de internações e custos elevados. Em se tratando de DM, corresponde a 5 a 20% dos gastos com saúde.59-60

O tratamento da HA e do DM poderá ser não medicamentoso e medicamentoso, mas acima de tudo envolve, a prevenção. A prevenção primária (busca proteger o indivíduo de desenvolver HA e DM no que se refere a fatores de risco modificáveis), a prevenção secundária (prevenção das complicações agudas e crônicas por meio do controle eficaz da doença) e a prevenção terciária (reabilitação das incapacidades produzidas pelas complicações).59

Nesse sentido, a ESF tem um importante papel no controle da HA e do DM, pois, neste nível de atenção, o indivíduo é atendido de forma integral, desde a promoção da saúde ao tratamento e reabilitação.

A HA e o DM enquadram-se como Condição Sensível à Atenção Primária (CSAP), ou seja, o adequado atendimento desses usuários na APS pode colaborar para redução da morbimortalidade e hospitalizações.56,60

Com base no contexto acima, em 2001, o Ministério da Saúde (MS), em conjunto com as sociedades científicas de Cardiologia, Diabetes, Hipertensão e Nefrologia, apresentou o “Plano de Reorganização da Atenção a Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus”.61

O Plano visava vincular os portadores de HA e DM às unidades de saúde, com garantia de acesso, acompanhamento e tratamento, mediante capacitação das equipes de ESF que

atuavam na APS. A partir de então, o MS propôs a qualificação das equipes da ESF por meio de publicação de Cadernos de Atenção Básica – ESF para HA e DM.61

Em 2013, foram publicadas as versões mais atuais de estratégias para o cuidado da pessoa com doença crônica, DM e HA, cadernos de atenção básica números 36 e 37, respectivamente. Ambas publicações descrevem o papel importante da APS e o envolvimento das equipes multiprofissionais no controle e prevenção da HA e DM.62-63

Dentre os profissionais atuantes na APS, destaca-se a importância do enfermeiro, que atua com criatividade e autonomia, seja na educação em saúde, na promoção da saúde, na prevenção de agravos ou na reabilitação.64-65

O enfermeiro na ESF presta cuidado individual e coletivo, desenvolvendo ações de enfermagem como: visita domiciliar, avaliação com classificação de risco, acolhimento, monitoramento e avaliação do calendário vacinal, grupos educativos e ações de vigilância epidemiológica, supervisão e planejamento das ações desenvolvidas pela equipe de enfermagem, entre outras.53,64-65

De acordo com a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), cabe ainda, ao enfermeiro da ESF, a realização da consulta de enfermagem para usuários com HA e DM e nos diferentes ciclos de vida.53 Na resolução do COFEN-358/2009, a consulta de enfermagem em serviços ambulatoriais corresponde ao PE.7

Nesse sentido, nota-se uma divergência entre os significados da consulta de enfermagem, pois na PNAB a consulta de enfermagem é considerada uma atividade, e pelo órgão regulador de nossa profissão é considerado como um instrumento metodológico a ser utilizado em todas as atividades.

Este estudo optou por não utilizar o PE como sinônimo de consulta de enfermagem, entendendo que o PE é um instrumento metodológico organizado em cinco etapas e que a consulta de enfermagem é uma prática clínica voltada ao cuidado individual e coletivo. Entende-se ainda que o PE deve ser realizado durante a consulta de enfermagem e em todas as atividades desenvolvidas pelos enfermeiros da ESF, tais como acolhimento, visita domiciliar, entre outros.

As ações desempenhadas por enfermeiros na ESF, durante a consulta de enfermagem, ocorrem principalmente pelo levantamento de situações e a intervenção sistematizada por meio de um plano de cuidados capaz de transcender a fragmentação do cuidado.64

A realização da consulta de enfermagem na ESF está ligada ao processo educativo, com prevenção primária à HA e ao DM e ao acompanhamento do usuário hipertenso e diabético.61-62

As consultas de enfermagem para acompanhamento compreendem a prevenção secundária e terciária, com identificação de fatores que influenciam no controle dessas condições, das vulnerabilidades e das complicações. As ações devem ainda, priorizar o indivíduo, orientando o autocuidado e ao melhor convívio com a doença crônica.61-62

Considerando o contexto acima, a realização do PE proporciona ao enfermeiro da ESF um direcionamento na organização do cuidado, conferindo integralidade e continuidade à assistência de enfermagem.

Entretanto, na prática, os enfermeiros da ESF referem que não realizam o PE, uma vez que em sua compreensão, este ainda está relacionado ao contexto hospitalar. A falta de tempo e o acúmulo de atribuições são apontados pelos enfermeiros como obstáculos à realização do PE, assim, o mesmo não é priorizado, principalmente no que tange ao atendimento da demanda espontânea da ESF.8

A não realização do PE na ESF resulta na ausência de diagnóstico do indivíduo e da população, e tem como consequência, a falta de planejamento sistematizado.5 Por sua vez, o

registro da assistência ao usuário da ESF também é prejudicado, o que pode resultar em ausência da visibilidade profissional e dificuldade de avaliação da prática de enfermagem.5

Uma forma de estimular o PE na APS, aumentar e melhorar o número de registros de enfermagem, é a adoção de uma classificação de enfermagem.19,66 Assim, neste estudo, acredita-se que a utilização do Subconjunto Terminológico CIPE® Enfermagem Comunitária poderá promover a SAE e o PE na ESF, uma vez que os Subconjuntos Terminológicos da CIPE® permitem mais facilmente a integração da CIPE® com o cotidiano da prática, constituindo-se uma referência de fácil acesso aos enfermeiros de determinada área.28