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9. FIOS QUES SE TRANÇAM: ANÁLISE DISCURSIVA DOS TEXTOS

9.1 Categorias de Análise

9.1.3 Estratégias de manutenção de visibilidade do sujeito idoso

9.1.3.1 – O corpo e autoafirmação no cuidado de si;

Diferente da categorização anterior em que é visto como refugo, aqui o corpo é visto como autoafirmação da celebridade no cuidado de si, como uma estratégia para manutenção

da visibilidade. Nesse sentido, destacam-se os procedimentos disciplinares que agem sobre os corpos, modelando-os de forma vigilante no sentido de atender a essa necessidade de autoafirmação.

Entendendo o corpo como um lugar sobre o qual se exerce o poder, Milanez (2006, p.13) menciona:

[...] ele é o produto de uma subjetivação marcada por uma imagem que nos remete a uma forma temporal determinada, por isso, levo em conta os meios e as técnicas pelas quais elas se transmitem em nossa época em particular. O corpo subjetivado é a história de certa experiência do sujeito no mundo.

Como centro das atenções nas inúmeras relações que envolvem sujeito e práticas discursivas, o corpo representa um campo de atuação do poder quer seja como controle relativo a fatos passados quando se tenta interferir em influências genéticas, quer como elemento de beleza, desejo ou status. Quando as materialidades linguísticas ancoram em corpos de celebridades, as relações de poder se tornam mais fortes em função da exposição a que esses mesmos corpos são levados.

Vejamos algumas dessas discursividades:

A atriz Bruna Lombardi é vista em muitos sites como padrão de beleza. Em meio às pesquisas realizadas com vistas a elencar discursos a ela relativos, não encontrei produções discursivas que se configurassem em críticas ao seu corpo ou à sua beleza ao longo de seus 67 anos. Os poucos elementos encontrados foram em face de seu trabalho enquanto escritora, diferente de outras celebridades de igual idade. Isso acaba gerando, portanto, muitas inquietações quanto às formas de subjetivações que permeiam essa atriz.

Os exemplos trazidos nas discursividades oriundas dos sites selecionados mostram a preocupação da mídia em adentrar nos segredos de beleza da atriz numa possível influência A boa forma da atriz despertou também interesse para os segredos de sua beleza. "Gosto de pensar que tenho muitas coisas para cuidar, corpo, cabeça, emoção, sentimentos, valores, e acho que tudo se conecta". (Bruna Lombardi, p. 164)

A idade, ela garante, não é problema. "Para mim, idade nem mesmo é um número, porque eu normalmente não penso em números em qualquer circunstância. Sou regida por outros valores, que me interessam mais. O universo é imenso e somos todos mínimos diante da sua abrangência." (Bruna Lombardi, p. 164)

Fonte https://f5.folha.uol.com.br

―A pele boa vem de uma vida vivida com inteireza‖, diz, sorridente. ―Tive grandes momentos de derrota e de vitória. Aprendi a nem me deslumbrar com um elogio, nem me amargurar com uma crítica.‖ (Bruna Lombardi, p.165)

que esses modos de subjetivação exercem aos leitores. Em geral, a mídia sob seus diferentes meios, utiliza-se da imagem como marketing para venda de produtos. Todavia isso produz uma busca ao padrão de beleza ideal provocando nos indivíduos que não se encaixam no perfil, a sensação de fracasso e de culpa por não conseguir o corpo almejado.

Percebe-se, ainda que a atriz não relata o que seriam os seus segredos de beleza, relativiza apenas associando a algo muito subjetivo como inteireza e abrangência do universo, por exemplo.

Segundo Milanez (2006, p.16), o sujeito a que Foucault se refere é uma fabricação histórica. Ele é constituído por meio de tecnologias e dispositivos elaborados pela sociedade. Para ele,

o mecanismo principal dessa fabricação é a disciplinaridade. O corpo é o objeto das disciplinas, não apenas enquanto alvo das ações disciplinares, mas também enquanto sede capaz de pensar de uma maneira ordenada e representacional e, por aí, capaz de dar um sentido particular àquilo que pensa. A disciplinaridade passa a funcionar como uma matriz de fundo que, por si só, impõe ao corpo determinados códigos de permissão e de interdição e maneiras muito peculiares de pensar o mundo. (MILANEZ, 2006, p.16)

Dessa forma, quando a mídia investe em discursos que disciplinam os corpos a partir da imagem de celebridades, tenta transformar a diversidade de corpos já existentes em um padrão único, cujo resultado se efetivará em poucos devido aos inúmeros dispositivos que agem sobre esse mesmo corpo. Utiliza-se de um jogo enunciativo com vistas à produção de um senso comum, mesmo sabendo que esse padrão único de beleza não existe. Assim, a depender da forma como esses indivíduos fazem uso do cuidado de si, pode-se inferir acerca da constituição de suas subjetividades, o que no caso específico de Bruna Lombardi, constitui- se a partir de tecnologias do eu que conectem corpo, cabeça, emoção, sentimentos e valores. O cuidado de si é associado ao cuidado com a espiritualidade e à pureza da alma. É a conexão com o universo que a faz direcionar o olhar para si mesmo. Essa conexão, contudo não a impede de frequentar as mais renomadas clinicas e profissionais especializados em técnicas de rejuvenescimento. Ou seja, a imagem da artista é repassada como uma beleza natural, sem intervenções, produto do devido controle da atriz em suas mais diferentes concepções, todavia, sua presença é vista e divulgada em sites de clínicas conceituadas de estética.

Essa concepção de que todos detêm o controle sobre seus corpos e só deles dependem os resultados, é assim referenciada por Foucault (2004b, p. 107)

Não havendo mais diferença de status, pode-se dizer que todos os indivíduos, em geral, são ―capazes‖: capazes de ter a prática de si próprios, capazes de exercer essa prática. Não há desqualificação a priori de determinado indivíduo por motivo de nascimento ou de status. Por outro lado porém, se todos, em princípio,

são capazes de aceder a prática de si, também é fato que, no geral, poucos são efetivamente capazes de ocupar-se consigo. Falta de coragem, falta de força, falta de resistência – incapazes de aperceber-se da importância desta tarefa, incapazes de executá-la: este, com efeito, é o destino da maioria.

Com isso, pode-se inferir que as discursividades da atriz tentam atribuir seu padrão de beleza a um cuidado de si muito mais reflexivo e espiritual do que pela adoção de medidas estéticas. Seu autogoverno diante das intempéries da vida figuram como o principal elemento a influenciar sua estrutura corporal de forma positiva. É importante destacar que, ao contrário de matérias anteriores, as direcionadas à Bruna Lombardi não perpassam pelo lado negativo da velhice. Os efeitos de sentido aqui expostos canalizam para alguém que, com cuidados simples, ostenta uma beleza semelhante à de pessoas bem mais jovens. Com isso, sua beleza se configura numa autoafirmação do cuidado de si e se traduz como garantia de permanência dos espaços de visibilidade.

Para a cantora Elba Ramalho, o cuidado espiritual se faz presente, mas os cuidados com o corpo se apresentam de forma mais enfática, os quais são corroborados pela atriz Vera Fischer. Vejamos:

As produções discursivas trazidas pela cantora Elba Ramalho e pela atriz Vera Fischer produzem diferentes efeitos de sentido a partir, inicialmente, da citação de práticas corporais. Para a cantora, a prática selecionada (Yoga / meditação) visa à manutenção da alegria, de um maior equilíbrio e de sua beleza interior. O tipo de subjetividade aponta estar mais atrelada ao lado espiritual do que propriamente aos cuidados com o corpo, apesar de mencionar ser vaidosa e referir usar bons demaquilantes para os cuidados com a pele. Já a atriz Vera Fischer diz optar pelo Karatê enquanto atividade aeróbica por ser indicada para sua idade. Assim Faço yoga e meditação, e acho que isso mantém minha alegria, meu equilíbrio e a beleza de dentro. Ah, sempre retiro a maquiagem com um bom demaquilante e uso hidratante, acrescido de um protetor solar. Sou vaidosa como todo artista, mas sou serena e confiante - esse é o segredo da juventude. Há trinta anos, achava que cairia em depressão ao me ver envelhecendo. Mas o tempo chega para mim, para todos. Não posso fazer nada em relação a isso. Com essa idade, a insegurança passou, e estou mais exigente. Envelhecer não é tão ruim assim. (Elba Ramalho, p. 166)

Fonte: https://revistamarieclaire.globo.com

"Eu faço karatê, é um aeróbico que para minha idade é excelente. Faço tratamento para cabelos finos. A pele está sempre limpa, por causa do excesso de maquiagem que uso nos trabalhos e passo muitos cremes. Jovem, não serei mais, tenho que dormir bem, me alimentar bem e tentar não fazer extravagâncias". (Vera Fischer, p. 186)

como a primeira, demonstra cuidados com a pele devido ao excesso de maquiagem no trabalho.

Esses cuidados também reverberam a governamentalidade presente em seus discursos reforçando a existência das técnicas de poder que monitoram o comportamento das celebridades aqui representadas. Essas ações de biopolítica não só investem na longevidade dos que vivem expostos ao público como sinalizam que essa longevidade deve ultrapassar a fronteira da qualidade de vida, tão defendida no campo médico-biológico. A ideia é que essa vigilância deva interferir para a manutenção de corpos e que siga o padrão de jovialidade esperado pelo público. Nesse processo de regulação estão incluídos os cosméticos anteriormente citados, as dietas, prescrição de exercícios físicos, aplicações a exemplo do botox e cirurgias ou intervenções plásticas. Quanto mais próximo dos padrões ideais de beleza, maior a probabilidade de manutenção no cenário midiático. O corpo, conforme Foucault (2009, p.150) passa a ser o alvo do poder.

Assim como no período helenístico em que o cuidado de si passa a ser uma maneira de viver extensiva a todos e onde elementos como dietas e exercícios físicos eram estimulados, as produções discursivas de Elba Ramalho e Vera Fischer apontam para esse mesmo propósito. Diante das alterações típicas do envelhecimento biológico, as discursividades apontam para a construção de um corpo que necessita ser cuidado para que as marcas do tempo não se tornem tão perceptíveis aos olhos do público, garantindo-lhes, assim, uma visibilidade positiva. Os cuidados relatados perpassam, também, por momentos reflexivos que contribuem para um processo de aceitação do envelhecimento sem desvinculá-los da importância estética para suas funções.

Ainda nessa perspectiva do corpo como objeto de poder, encontramos as seguintes discursividades:

“Eu sou muito tranquila. Cuido muito bem do meu corpo. Três vezes por semana tenho fisioterapia.

Cuido da minha saúde, da minha alimentação, eu sei que preciso me cuidar. Por isso que eu digo, cuidem do Brasil porque o Brasil precisa se cuidar.‖ (Elza Soares, p. 169)

“Adoro um espelho. E para adorar um espalho adoro cirurgia plástica, adoro tudo. Acho que a

mulher merece tudo, tem que ser linda, vaidosa. Mulher. Bons vestidos de seda, boas camisolas lindas, maravilhosas. Olhar no espelho e dizer, sou feliz comigo mesma. É muito bom.‖ ( Elza Sares, p.169)

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese

"Que mulher quer ser velha e feia? Nenhuma!". A declaração foi feita pela atriz Susana Vieira, 68 anos, 51 de carreira, em entrevista que foi ao ar neste domingo (14), no Fantástico. Adepta das cirurgias plásticas, liftings e tudo o mais que a ajude a manter a aparência sempre mais jovem, ela garantiu não ligar para a idade, afirmando viver atualmente como se fosse uma "menina de 70 anos". (Susana Vieira, p.183) Fonte: https://www.terra.com.br

As discursividades apresentadas por Susana Vieira, Simone, Antônio Fagundes e Cid Moreira trazem o cuidado de si voltado ao corpo de forma enfática. Enunciados que perpassam pela realização de fisioterapia (aqui provavelmente relacionada à atividade física e não a algum processo de reabilitação), dietas, cirurgias plásticas, uso de cosméticos, pilates, musculação, futebol e tênis são algumas evidências desse cuidado. O corpo, aos poucos, vai se modelando e assumindo os contornos que o mercado necessita.

―Ninguém chega para mim e pergunta a minha idade. Não tem necessidade. O maior xingamento para mim é me chamar de velha. Eu aparentemente não tenho 72 anos

Não faço parte dos velhinhos. Não tenho medo de envelhecer. Me desculpem se eu cheguei aos 72 anos sem estar caquética e estando maravilhosa, com tudo em cima.‖ ( Susana Vieira, p. 184)

Fonte: wp.clicrbs.com.br

Sim, Simone revelou que está com 70 anos e deixou artistas, telespectadores e internautas chocados, de queixo caído, com a boa forma física da artista.

Mas não se trata apenas de aparência física, a voz de Simone permanece a mesma. Ela cantou ao vivo e mostrou que continua afinada e com a voz potente de sempre. Faltou perguntar a ela o segredo dessa jovialidade aos 70 anos. Claro que os mais céticos e críticos vão falar em plástica, botox, médicos caros etc....(Simone, p. 181)

Fonte: https://www.sonoticiaboa.com.br

―De pertinho, o veterano ator – que estreou na teledramaturgia em 1969, na novela Nenhum Homem É Deus, na pioneira TV Tupi – parece vaidoso. É cheiroso, o cabelo brilha e a pele está sempre bronzeada. Mas, durão, diz que o máximo que faz é tomar banho. O cabelo só lava com sabonete. Nunca usou cremes. Nem fez plástica. Pintar os cabelos brancos, então… Nem pensar.‖ Tenho cabelo branco desde os 30 anos. Já pintei, mas não acredito que isso faça a pessoa parecer mais jovem. Fora que dá trabalho, ter de retocar a cada 15 dias. E aí eu ia ter de pintar outras coisas, o peito, por exemplo. Dá trabalho, né?‖, justificou. E dei risada. Detalhe: ele me disse que só tem cabelo branco do lado esquerdo do peito. ‖É que o coração está velho.‖ (Suspiros!) E diz que não liga para esse papo de velhice. ‖Não me sinto velho, estou ótimo. (Antônio Fagundes, p. 188) Fonte: https://www.portaldoenvelhecimento.com.br

Com saúde de ferro e ótima memória, Cid conta que às vezes exagera nos exercícios físicos e que mantém a forma praticando musculação, pilates, futebol e tênis. Além disso, ele segue uma rotina saudável de hábitos alimentares com saladas e alimentos integrais. ―Há mais de meio século tirei a carne vermelha do meu cardápio. Minha fisioterapeuta diz que tenho a musculatura de um homem de 60 anos‖. (Cid Moreira, p. 194) Fonte: extra.globo.com/famosos

Percebe-se que esse cuidado de si tem uma repercussão direta com o ambiente externo. Quanto mais as celebridades se dedicam a ações para consigo, mais influenciam a população que as acompanha nas mídias exercendo, também, uma forma de controle para com os demais.

Considerando que o corpo é submetido a poderes, Foucault (2009, p. 117) destaca:

Houve, durante a época clássica, uma descoberta do corpo como objeto e alvo de poder. Encontraríamos facilmente sinais dessa grande atenção dedicada então ao corpo - ao corpo que se manipula, se modela, treina, que obedece, responde, torna-se hábil ou cujas forças se multiplicam. (FOUCAULT, 2009, p. 117).

Nesse caso, o corpo que treina e se modela tenta se configurar em um influenciador como forma de garantia de seu espaço profissional. Dessa forma, o cuidado de si é pautado por saberes médicos que direcionam e justificam a melhor forma de proceder. Esses saberes permaneceram contínuos desde a época clássica, mantendo-se os mesmos princípios, mas aprimorando-se ao ponto de exigir constante vigilância sobre o corpo.

O fato, portanto, de se subjetivar a partir dessas práticas, não é algo novo. Tanto no momento conhecido como Socrático-platônico como no período denominado como a idade de ouro do cuidado de si, o direcionamento ao corpo enquanto enfoque já se fazia presente. Aqui, as discursividades das celebridades revelam efeitos de sentido com forte intervenção sobre os corpos mediante o auxílio de procedimentos estéticos. As matérias veiculadas constroem subjetividades cujo foco é a manutenção de uma aparência jovem que não só assegura a empregabilidade artística como mantém o corpo como instrumento de sedução. Mesmo aqueles que não fazem referência às intervenções têm as suas subjetividades construídas como se tivesse adotado procedimento semelhante, como apontam as discursividades sobre a cantora Simone. Os cuidados de si, expressos ou não, são associados às novas tendências médicas que amenizam os sinais do tempo.

9.1.3.2- Sexualidade;

Foucault (1988, p.16) em sua genealogia da sexualidade já asseverava que é necessário levar em consideração:

o fato de se falar de sexo, quem fala, os lugares e os pontos de vista de quem fala, as instituições que incitam a fazê-lo, que armazenam e difundem o que dele se diz, em suma, o ―fato discursivo‖ global, a ‗colocação do sexo em discurso‘.

A sexualidade, apesar de todos os estereótipos e tabus que a tentam circundar, passou a ser um objeto de interesse em vários campos do saber. No campo biológico, elementos como a alteração corporal na gestação, produção hormonal nas relações sexuais passaram a ser objeto de interesse e estudos. No campo religioso, sob influência do poder pastoral, todos os atos eram passíveis de confissão, até os que ainda estavam na esfera do pensamento e a sexualidade não fugia a essa regra. ―A sexualidade não é mais o grande segredo, mas ela é ainda um sintoma, uma manifestação do que há de mais secreto em nossa individualidade‖ (FOUCAULT, 2014a, p. 201).

Segundo seus postulados, quando se debruçou sobre os discursos envoltos na sexualidade seu objetivo foi

mostrar como as relações de poder podem passar materialmente na própria espessura dos corpos sem ter que ser substituídas pela representação dos sujeitos. Se o poder atinge o corpo, não é porque ele foi inicialmente interiorizado na consciência das pessoas. Há uma rede de biopoder, de somatopoder que é, ela mesma, uma rede a partir da qual nasce a sexualidade como fenômeno histórico e cultural no interior do qual, ao mesmo tempo, nós nos reconhecemos e nos perdemos. (FOUCAULT,2014a, p. 38)

O corpo, como elemento de prazer e que produz suas verdades a partir do sexo é também o centro das relações de poder. A sexualidade, em suas diferentes manifestações, é o produto real da interferência de um tipo de poder sobre os corpos e seus prazeres. Esse poder é capaz de despertar os segredos mais reservados da intimidade do indivíduo. Nesse sentido, Foucault (1988, p.71) afirma:

Muito mais do que um mecanismo negativo de exclusão ou de rejeição, trata-se da colocação em funcionamento de uma rede sutil de discursos, saberes, prazeres e poderes; não se trata de um movimento obstinado em afastar o sexo selvagem para alguma região obscura e inacessível, mas pelo contrário, de processos que o disseminam na superfície das coisas e dos corpos, que o excitam, manifestam-no, fazem-no falar, implantam-no no real e lhe ordenam dizer a verdade: todo um cintilar visível do sexual refletido na multiplicidade dos discursos, na obstinação dos poderes e na conjugação do saber com o prazer.

Reconhecendo que a sexualidade é um elemento que repercute na constituição de subjetividades, os discursos a ela relativos decorrentes de pessoas idosas passam também a ser objeto de interesse e de estudo da construção da verdade do sujeito.

Vejamos alguns enunciados das nossas celebridades acerca da questão da sexualidade: ―As borboletas estão batendo no estômago, não importa a idade que se tem. É isso que faz renovar a vida, a esperança e a felicidade‖, completou a loira. (Ana Maria Braga p. 158)

A expressão metafórica ―borboletas no estômago‖ é muito utilizada para referenciar um efeito de sentido de quando se está apaixonada (o). Essa possível relação entre corpo e mente, contudo, não é algo que determine o encontro do amor verdadeiro, mas um fenômeno ligado à atração sexual que não necessariamente implica na existência de romance.

Segundo o psiquiatra e neurocientista Daniel Amen (2020),

o estômago é estimulado por um nervo e se apaixonar ou se interessar por alguém desperta o sistema de prazer que causa respostas no corpo. O coração começa a bater mais forte, as mãos ficam frias e suadas e o foco no objeto, pessoa de interesse, fica ampliado. Seu sistema límbico ou emocional ativa o nervo vagus que vai do cérebro ao estômago. As borboletas no estômago significam que você está estressado e motivado a fazer algo ou ver a pessoa novamente. Como a dopamina é o primeiro neurotransmissor a se manifestar quando você vê alguém atraente, a pessoa, então, fica extremamente focada e excitada.

Essas discursividades demonstram o interesse que a sexualidade desperta no campo das ciências em suas diferentes especificidades. A necessidade do saber impulsiona a explicação para quaisquer alterações do indivíduo, assumindo uma conotação ainda maior quando o assunto é sexualidade. São ações de biopoder que tentam controlar, sob a justificativa de evidências científicas, os dizeres e atitudes de uma população, gerando suas verdades.