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7 TERRITÓRIO, GOVERNANÇA E DESENVOLVIMENTO

7.2 Governança Multinível: de Brasília até os Municípios

7.2.4 Estruturas Locais: os Municípios

As estruturas locais do Brasil são formadas por 5.570 municípios, distribuídos em26estadosfederados246.ÉimportantefrisarqueoDistritoFederal cumpre a dupla funçãodeestadoemunicípio,adotandoumanaturezajurídicasingular247.Emgeral, os municípios são constituídos por apenas dois poderes: o Executivo, cujo chefe é o Prefeito; e o Legislativo, representado por um colegiado de Vereadores (Bremaeker,

245 Ver IBGE (2016, p. 36-40) e Veiga (2001, p. 57-65).

246 Ver <http://www.ibge.gov.br/estadosat/> e <http://cidades.ibge.gov.br>. 247 Ver Título III, Capítulo V, Seção I da Constituição Federal (Brasil, 1988, p. 19).

2013, p. 3). Assim, no nível local, não existe um Poder Judiciário Municipal – sendo que as Comarcas, as Varas e os Foros são de responsabilidade da Justiça Estadual ou da Justiça Federal. Cada município é regido por uma Lei Orgânica, votada e aprovada pela Câmara Municipal dos Vereadores, estabelecendo normas legais de nível local, e em complemento aos princípios da Constituição Federal e Estadual.

É no nível local que estão as autoridades mais próximas da sociedade civil, ou seja,aquelasautoridadespolíticasquecuidamdarealidadeconcretadodia-a-diados cidadãos. Enquanto o Prefeito administra o município e as suas políticas públicas, os Vereadores elaboram leis municipais e fiscalizam as ações do Poder Executivo (e do Prefeito)(Brasil,1988,p.16-19).AcomposiçãodaCâmaraMunicipaldosVereadores observa a dimensão populacional do município: no mínimo, nove Vereadores para municípios com até 15 mil habitantes; e, no máximo, 55 Vereadores para municípios com mais de oito milhões de habitantes (Brasil, 2009, p. 1-3). Horizontalmente, cada município é autônomo e responsável pela sua própria organização (em Secretarias Municipais), administração e arrecadação dos impostos municipais248.

Constitucionalmente,competeaosmunicípios249:(1)legislarsobreassuntos de interesse local; (2) suplementar a legislação federal e a estadual no que couber; (3) instituir e arrecadar os tributos de sua competência; (4) criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual; (5) organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão, os serviços públicos de interesse local, incluindo o transporte coletivo; (6) manter os programas de educação infantil e de ensino fundamental250; (7) prestar serviços de atendimento à saúde da população; (8) promover adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle

248 “O aumento do papel dos municípios iniciou-se com o processo de descentralização brasileiro, que

teve por objetivo o fortalecimento financeiro e político dos estados e, principalmente, dos municípios em relação ao governo federal. Assim como em outros países da América Latina, esse processo esteve estreitamente ligado ao objetivo mais amplo de reforma do Estado e de redemocratização da região, baseados no argumento de que a descentralização da gestão pública seria o caminho mais adequado para aumentar a eficiência no uso dos recursos, a eficácia das políticas públicas, a transparência das decisões […]” (Veloso et al, 2011, p. 13).

249 Com a Constituição Federal de 1988, os municípios passaram a ser considerados entes federativos

e a desempenhar um papel mais relevante na administração pública brasileira. As comunas passaram a integrar expressamente a Federação, juntamente com os estados federados e o Distrito Federal. Em decorrência, os municípios receberam detalhado “tratamento constitucional” – com competências privativas ou em colaboração com o estado e a União (Brasil, 1988, p. 19; Magalhães, 2007, p. 13).

250 Em cooperação técnica e financeira com o governo federal e o estado. Ver a Emenda Constitucional

do uso do solo urbano; e(9)promoveraproteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a lei e a ação fiscalizadora federal e estadual (Brasil, 1988, p. 19).

Além disso, compete aos municípios251: (1) zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições e conservar o patrimônio público; (2) cuidar da saúde e assistência pública; (3) proteger os documentos, as obras e os outros bens de valor histórico, artístico e cultural; (4) promover os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação252; (5) proteger o meio ambiente e combater a poluição; (6) preservar as florestas, a fauna e a flora; (7) estabelecer programas de moradia e saneamento básico; (8) fomentar a produção agropecuária e supervisionar o abastecimento alimentar; (9) combater as causas da pobreza e os fatores de marginalização; (10) fiscalizar o uso dos recursos hídricos e minerais; e (11) estabelecer políticas de segurança do trânsito.

Para cumprir com as suas competências, os municípios dispõem de diversas fontes de receitas253, porém, na maioria dos casos, as transferências constitucionais respondempelamaiorfatiado orçamento, especialmente, nos pequenos municípios, que representam cerca de 70% dos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes (Magalhães, 2007, p. 13-17)254. Desta maneira, as receitas municipais são: impostos (IPTU, ITR, ITBI e ISS)255; taxas (sobre serviços públicos); contribuições de melhoria (decorrente das obras públicas) ou custeio (de serviços públicos); e, transferências constitucionais do estado (25% do ICMS, 50% do IPVA, e 25% do IPI que o estado receber)256edaUnião(50%doITR,23,5%doImpostodeRendae23,5%doIPI, todos por meio do Fundo de Participação dos Municípios257) (IBGE, 2007, p. 22-27).258

251 Ver Brasil (1988, p. 14).

252 Ver a Emenda Constitucional nº 85/2015 (Brasil, 2015, p. 1-3)

253 A Constituição de 1988atribuiu aos municípios competências tributárias próprias e participações

no produto da arrecadação de impostos da União e dos estados” (Magalhães, 2007, p. 13).

254 Ver também <http://www1.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/1704munic.shtm>.

255 Siglas: IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano; ITR – Imposto sobre a Propriedade Territorial

Rural; ITBI – Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter-Vivos; e ISS – Imposto sobre Serviços. No caso do ITR, existe a hipótese do artigo nº 153 da Constituição Federal e da Emenda Constitucional nº 42/2003, em que os municípios poderão, por convênio com a União, arrecadar 100% do ITR. Ver Brasil (1988, p. 66-67, 70; 2003, p. 1-6) e Tristão (2003, p. 73-120).

256 Siglas: ICMS – Imposto sobre Circulação de Mercadorias e de Prestação Serviços; IPVA – Imposto

sobre a Propriedade de Veículos Automotores; e IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados.

257 Repassados em cotas calculadas pelo Tribunal de Contas da União com base em indicadores como

população. Ver <http://portal.tcu.gov.br/normativos/início/início.htm>.

258 Além do mais, os municípios podem obter receitas de: compensações financeiras (royalties); pela

Apesar da homogeneidade das competências municipais, os municípios são heterogêneos na sua essência, já que possuem características territoriais diferentes, variadas dimensões populacionais, desigualdades na arrecadação de impostos, etc. Por exemplo, o município de Barcelos (no Amazonas) tem 122 mil km² (maior que Portugal), enquanto que o município de Águas de São Pedro (em São Paulo) tem 3,6 km² (equivale a dois principados de Mônaco) (em 2015). A distribuição populacional também é fortemente assimétrica: de São Paulo (em São Paulo) com 11 milhões de habitantes até Serra da Saudade (em Minas Gerais) com 815 habitantes (em 2016). Já a arrecadação de impostos municipais pode ir dos R$ 24 bilhões em São Paulo (em São Paulo) até os R$ 296 mil em Graça Aranha (no Maranhão) (em 2015)259.

Compreender as especificidades dos municípios, e o fato de que eles não são iguais no contexto da governança multinível, evita pensar nesses municípios como umúnico“corpo”eaelesassociarpolíticasfederaise/ouestaduaissemelhantes; mas, também evita, por razões óbvias, pensar políticas federais e/ou estaduais exclusivas para cada município brasileiro. Como destaca Pochmann (2007, p. 7), “[...] o desafio é, portanto, tratar os semelhantes de forma semelhante e os desiguais de forma desigual no que se refere à atuação do Estado [...]”, em todos os níveis de governança. Em termos práticos, os municípios sobrepõem em sua estrutura de governança as mais variadas complexidades nacionais, estaduais e intermunicipais – constituindo- se em um mosaico de poderes, de políticas públicas e de interesses sociais.

Na governança local, a sociedade civil organizada participa diretamente dos Conselhos Municipais – juntamente com as autoridades municipais. Esses Conselhos Municipaissãoinstânciasdediscussãodeassuntospúblicoslocais260,sendodecaráter paritário (50% de parceiros públicos e 50% de privados), e de natureza consultiva, deliberativa,normativae/oufiscalizadora.Nestecontexto,algumaspolíticaspúblicas federais e/ou estaduais exigem que os municípios criem Conselhos Municipais para a obtenção de recursos públicos (Abramovay, 2001, p. 121-123; Silva, 2012, p. 103).

público do município (bens móveis e imóveis); pela cobrança de tarifas sobre o transporte coletivo, mercados, feiras, matadouros, cemitérios etc.; e outras receitas provenientes de multas e/ou outras penalidadesadministrativas(Brasil,1988,p. 16-19;IBGE,2007,p. 22-27;Tristão,2003,p.73-120).

259 Ver <http://cidades.ibge.gov.br/>. Ver também Pochmann (2007, p. 7).

260 Há Conselhos Municipais para variados temas, tais como saúde, assistência social, trabalho, meio

ambiente, criança e adolescente, transportes, habitação, política urbana, entre outros. São tantos os Conselhos Municipais que, em alguns municípios, existe uma infraestrutura própria para as reuniões, chamada de "Casa dos Conselhos” (IBGE, 2002, p. 59-67; 2005, p. 61-67; Silva, 2012a, p. 187-213).

Nototal,existemmaisde25milConselhosMunicipaisnoBrasil,umamédiade4,5 por município (IPEA, 2015, p. 1). Além disso, as autoridades locais – juntamente com a sociedade civil organizada – participam na governança intermunicipal.