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Muitos factores foram estudados na tentativa de compreender a sua ligação ao cenário familiar e o seu papel como determinante da qualidade desse mesmo cenário,

contribuindo para definir o curriculum educativo familiar (Rodrigo & Acuna, 1998). O

estudo de Menaghan e Parcel (1991) demonstrou que os ambientes familiares de

crianças em idade pré-escolar eram essencialmente função dos antecedentes maternos e

da criança, das condições de trabalho da mãe e de características da estrutura familiar.

Cada um deste grupo de variáveis tinha, na qualidade do ambiente, um efeito aditivo,

embora as características maternas - idade, habilitações escolares, grupo étnico, nível de

auto-estima e locus de controle - se revelassem como os preditores cujo efeito era mais

crítico. A qualidade do ambiente familiar apresentava além do mais uma relação inversa

com o número de crianças do agregado, e uma relação positiva com a complexidade do

trabalho desempenhado pela mãe.

Capítulo 3 - Qualidade do ambiente familiar e desenvolvimento infantil

A relação existente entre as crenças parentais e o ambiente familiar tem também sido objecto de investigação, como referem Stevens, Hough e Nurss (1993). Adoptando uma abordagem ecológica do desenvolvimento infantil, referem-se aos pais como um "organismo em desenvolvimento" que estabelece ligações com sistemas formais e informais do contexto social envolvente, ligações essas que determinarão até certo ponto as interacções com os seus filhos. A revisão levada a cabo sobre este tema leva os autores a concluir que um dos factores que permite aos pais proporcionar aos filhos um ambiente em casa que vai de encontro às suas necessidades de estimulação é o facto de possuírem conhecimentos de tipo normativo sobre o desenvolvimento infantil, traduzindo-se em cuidados mais adequados, padrões de interacção mais positivos e menos punitivos, mais estimulação da linguagem e do desenvolvimento cognitivo. Por outro lado, verificam que, o facto de os pais possuírem algumas convicções quanto aos factores que influenciam o desenvolvimento infantil e quanto à forma como nele podem interferir, é um factor com maior impacto do que o anterior na qualidade do ambiente proporcionado pelos pais aos filhos (Stevens et ai., 1993).

A qualidade do ambiente familiar também tem sido relacionada com a psicopatologia parental. O estudo de Noll, Zucker, Fitzgerald, e Curtis (1992) incidiu num grupo de crianças com pais alcoólicos e num grupo controle oriundo da mesma comunidade, verificando-se que neste último a qualidade do ambiente familiar era bastante melhor. Os dois grupos foram também comparados nos domínios da motricidade fina, comportamento adaptativo, linguagem e competências pessoais/sociais. Embora o grupo de filhos de pais alcoólicos apresentasse notas menos elevadas em todos os domínios, o recurso a métodos de regressão e análise de covariância permitiu verificar que as diferenças nos resultados obtidos pelas crianças se deviam a diferenças na estimulação e na qualidade dos ambientes familiares, e que apenas no domínio pessoal/social as diferenças podiam ser atribuídas à psicopatologia parental. Esta constatação aponta para o papel mediador e de interface da qualidade do ambiente familiar entre as características parentais e o desenvolvimento infantil e o caracter distai da variável psicopatologia parental por consumo de álcool.

Além dos aspectos já citados, Bradley e Corwyn (1999) consideram que a qualidade do ambiente em casa está também relacionada com factores como a personalidade dos pais, a estrutura familiar, o apoio social, o clima psicosocial em casa, e a ocorrência de acontecimentos traumáticos, citando vários estudos em que estas relações são comprovadas.

A idade da mãe é um outro factor estudado verifícando-se que regra geral, as mães mais novas são menos capazes de proporcionar ambientes de qualidade. Reis e Hertz (1987) compararam grupos de mães adolescentes verificando que as mães mais novas (de 13 a 16 anos) obtinham notas mais baixas em avaliações de qualidade do ambiente e recorriam mais a estratégias punitivas, demonstrando na generalidade menos competências de parental idade, comparativamente com o grupo de mães mais velhas (entre 16 e 19 anos). Coll, Hoffman e Oh (1987) compararam mães adolescentes com um grupo de mães mais velhas, verificando que, mesmo controlando o tipo de apoio social recebido e o stresse familiar, as mães mais velhas obtinham avaliações mais positivas em termos do ambiente familiar, particularmente quando as dimensões avaliadas envolviam interacções e envolvimento da mãe com a criança. Também Menaghan & Parcel (1991) concluíram, num grupo de mães empregadas, que as mães mais velhas conseguiam criar ambientes familiares de mais qualidade, provavelmente em função da sua maturidade e experiência. Diferentes foram as conclusões de Whiteside-Mansell, Bradley e Rakow (1996, cit. por Bradley e Corwin, 1999) que concluíram não serem as práticas de parentalidade de mães mais jovens consistentemente menos adequadas que as de mães mais velhas, estando outros factores, como a competência materna e o contexto familiar, implicados nos resultados.

2.2.1. Tarefas básicas da família

Em termos conceptuais, a família pode, como vimos, ser considerada um sistema com regras de organização que vão mudando ao longo do tempo, e que lhe permitem

Capítulo 3 - Qualidade do ambiente familiar e desenvolvimento infantil

desempenhar tarefas com vista ao crescimento e o bem estar dos seus membros (Fiese & Sameroff, 1999), particularmente dos filhos, tendo em conta que são organismos em desenvolvimento com necessidades que se vão alterando ao longo do tempo. Utilizando factores do ambiente próximo e distai, os pais (e outros prestadores de cuidados4),

regulam o desenvolvimento dos filhos desempenhando cinco tarefas básicas ou funções, caracterizadas por Bradley (1995) e Bradley e Caldwell (1995) e que analisaremos de seguida em detalhe.

A primeira função consiste na manutenção da vida, e designa acções cuja finalidade é assegurar a viabilidade do organismo. O ambiente deve fornecer os nutrientes adequados, abrigo e condições para a manutenção da saúde física, bem como proteger de agentes patogénicos, o que a torna uma função fundamental para a sobrevivência do indivíduo. A estimulação é proporcionada pelo ambiente, com vista a captar a atenção do indivíduo, transmitindo-lhe informação relevante. Um nível de estimulação adequado, em termos quantitativos e qualitativos, é fundamental não apenas para garantir a integridade neurológica do indivíduo como também para desenvolver a sua capacidade reguladora da atenção, com óbvias implicações a nível do desenvolvimento cognitivo.

A tarefa de apoio emocional implica a capacidade do ambiente para fornecer respostas adequadas às necessidades sociais e emocionais da criança. O clima de afecto implica o estabelecimento de relações de vinculação, e um sentimentos de relação previlegiada e de compromisso emocional Desta forma, os pais ajudam as crianças a modularem as suas expressões emocionais e ao mesmo tempo, fornecem-lhes respostas adequadas que vão de encontro às suas necessidades. As relações calorosas e de apoio são essenciais a um desenvolvimento psicológico saudável.

A tarefa estrutura é de tipo qualitativo. Assim, não basta que o ambiente proporcione às crianças estimulação e apoio, sendo importante também a sua

configuração. Abarca todas as acções que têm como finalidade a organização e controle dos estímulos (objectos, acontecimentos e trocas sociais) no tempo e no espaço. Quanto mais estruturado o ambiente, mais fácil será para a criança utilizar a informação recebida. Quanto mais previsível e ordenado for o ambiente, mais fácil será para a criança aprender acerca do mundo e função das coisas. Esta tarefa assume uma dimensão física e temporal - cada coisa no seu lugar e no seu tempo. Regras, estabilidade e regularidade são dimensões que promovem um desenvolvimento óptimo.

Finalmente, a tarefa de supervisão ou vigilância assegura um controle adequado do sistema regulador. Ao exercerem vigilância, através da monitorização e controle, os pais proporcionam segurança e recolhem informação que permitirá efectuar reajustes em outras funções reguladoras, se necessário.

As diferentes tarefas são desempenhadas pelos prestadores de cuidados dirigidas à satisfação de necessidades da criança, de forma mais ou menos adequada. Enquanto que as três primeiras promovem, respectivamente, a actividade biológica, cognitiva e social/emocional, as duas últimas têm uma função reguladora sobre as anteriores. Neste contexto, fala-se em ajustamento entre a criança e o meio. Existe ajustamento quando há preenchimento de uma necessidade, sendo a necessidade função do que a criança traz (os seus estados motivacionais internos e as suas competências) e do que o meio oferece. A noção de ajustamento entre criança e meio implica portanto que o ambiente é responsivo relativamente à criança.

2.2.2. Dimensões do ambiente familiar

Os elementos que constituem o ambiente familiar, têm sido analisados de diferentes formas por diferentes autores. Tradicionalmente são consideradas duas dimensões principais, uma física (ou fisico-espacial) e outra social (ou socio-

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relacional). Contudo, os esforços desenvolvidos no sentido de encontrar e descrever