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Evasão e Fraude Fiscal

No documento A reforma da tributação do património (páginas 96-102)

De acordo com o disposto na Constituição da República Portuguesa e na LGT, o objectivo dos impostos é o de obter receita para o Estado e contribuir para a redistribuição da riqueza e a igualdade entre os cidadãos64. Os impostos devem, por isso, servir apenas para permitir ao Estado cumprir os inúmeros deveres sociais ou de fomento económico que lhe competem.

Ora, não é moralmente indiferente que os cidadãos aufiram os benefícios do Estado sem pagar, ou que actuem fraudulentamente para não pagar a correspondente contraprestação.

Por outro lado, com a internacionalização da economia, que tem como consequência lógica a possibilidade da instalação, nos diversos espaços geográficos, de unidades industriais, comerciais e financeiras, as empresas desconhecem fronteiras e não têm nacionalidade. Instalam-se nos diversos países consoante os mesmos mostrem ter condições e potencialidades adequadas ao seu funcionamento e à obtenção dos correspondentes resultados e rendimentos.

Deste modo, a internacionalização e a integração das economias levaram ao redimensionamento de um problema que sempre se colocou ao nível fiscal: o da evasão e fraude fiscal.

Quando os impostos são evitados através de medidas perfeitamente legais, mas contrárias ao objecto e ao espírito da lei, estamos a falar de evasão fiscal.

Quando, pelo contrário, é um acto pelo qual um contribuinte procura, de forma fraudulenta, “fugir” às suas obrigações legais, estamos perante uma fraude fiscal65.

64 Artigos ns.º 13º, 66º, n.º 2 h), 81º b), 103 n.º 1 e 104º da Constituição da República Portuguesa e artigos

ns.º 4º n.º1 e 5º da LGT.

65 Por exemplo pelo recurso à emissão e utilização de facturas falsas, negócios simulados, apropriação de

Este problema gera, assim, a nível interno, uma perda de receitas por parte do fisco contribuindo para o agravamento da carga fiscal do país, e a nível internacional, implicações ainda mais graves que se repercutem seriamente na Balança de Transacções com o exterior e falseiam a concorrência internacional e os movimentos de capitais.

Segundo Antunes “Quem pratica a evasão e fraude fiscal está, portanto, a infringir (…) os princípios fundamentais da igualdade, da legalidade, da justa repartição do rendimento e da riqueza, da concorrência leal, da solidariedade social e da solidariedade fiscal” (Antunes, 2005).

Em Portugal, as elevadas taxas da SISA e a ausência de correspondência entre os valores constantes nas matrizes de um elevado número de prédios e os valores praticados no mercado imobiliário, a que se alia a convergência de interesses entre alienantes e adquirentes, promoveu um endémico e elevado grau de fuga fiscal nos impostos.

Foi, por isso, fundamental, a criação de medidas anti-abuso e de métodos de determinação da matéria tributável, em que se privilegiam indicadores objectivos de riqueza e em que a avaliação indirecta prevalece sobre a avaliação directa da matéria tributável, de modo a conferir alguma equidade e justiça no sistema fiscal.

A maioria dos sistemas fiscais adopta este tipo de soluções, em maior ou menor grau, na medida em que estas coexistem com o princípio da tributação segundo o rendimento real, que está organizado com a necessária flexibilidade para admitir medidas anti-abuso e de combate à fuga e fraude fiscais.

A benevolência da lei e da organização em relação à fraude e a à evasão fiscal são uma realidade inquestionável e é esta a realidade que urge modificar.

Foi, então, com a reforma do património que foram modificados alguns preceitos do CIRC e do CIRS, de modo a que o valor tributável para efeitos do IMT seja considerado para efeitos de determinação do lucro tributável das empresas cuja actividade seja a alienação de bens imóveis, quer por si construídos, quer na esfera da actividade de compra para revenda, nos casos em que o preço declarado constante no contrato de transmissão seja inferior àquele valor.

De facto, uma das medidas mais importantes no combate à fraude fiscal foi o incremento efectivo do cruzamento de dados por parte dos serviços de inspecção fiscal, bem como a flexibilização do sigilo bancário e o agravamento das penalidades por infracção.

Conceito diferente de evasão e de fraude fiscal é o de planeamento fiscal. Com o planeamento fiscal, os particulares e as empresas procuram pagar menos impostos, utilizando para tal as normas mais apropriadas e adequadas à sua real situação fiscal, mas sempre dentro do quadro jurídico existente.

Efectivamente, o desenvolvimento do comércio mundial, apoiado na desregulamentação e liberalização generalizada dos movimentos de capitais com o exterior, obrigou as empresas com ligações entre si e que operam em vários países a planear da forma mais eficiente as suas actividades de um ponto de vista fiscal, já que as respectivas actividades encontram-se sujeitas a várias jurisdições.

Este planeamento consiste, do ponto de vista das empresas, na prática de actos lícitos de acordo com uma gestão corrente e racional em ordem a estruturar os respectivos negócios da forma mais eficiente possível, elegendo, o regime fiscal mais favorável.

Ao contrário do que acontece com a evasão fiscal, os meios utilizados no planeamento fiscal baseiam-se em possibilidades concedidas e consentidas pela lei, sem colidir com o seu espírito. Constitui, por isso, “um imperativo de racionalidade económica e de boa gestão comercial, financeira e fiscal”. (Antunes, 2005, p.17)

O objectivo inerente a uma operação deste tipo passa sempre pela concentração dos lucros nas unidades localizadas nos territórios de mais baixo imposto ou nas unidades que apresentem ou apresentaram prejuízos.

Este propósito é alcançado através de uma manipulação da política de preços nas relações internas do grupo – preços de transferência – inflacionando os custos de aquisição e deflacionado os preços de alienação.

De facto, os vínculos existentes numa multinacional podem, nas relações estabelecidas com as empresas do grupo, possibilitar a prática de condições especiais distintas das que normalmente seriam aplicáveis caso fossem empresas independentes em mercados livres, provocando, deste modo, sérias dificuldades à AF de determinar correctamente as receitas e despesas de uma empresa integrada num grupo multinacional.

Este planeamento levado a cabo pelas empresas multinacionais conduz, em determinadas situações, a um conflito entre estas e as Administrações Fiscais dos países dotados de uma elevada carga fiscal. Estes Estados que vêm aquela “arquitectura fiscal” como uma verdadeira evasão fiscal procuram escudar o respectivo sistema fiscal com medidas que consideram adequadas para anular determinados comportamentos adoptados pelos contribuintes, que apesar de respeitarem a letra da lei, contrariam, no entendimento da AF, o espírito da lei.

O controlo dos preços de transferência no sistema fiscal português encontra-se previsto no artigo 58º do CIRC e na Portaria 1446 –C/2001, de 21 de Dezembro. Nos termos daquele artigo, a DGCI poderá efectuar as correcções necessárias à determinação do lucro tributável sempre que, em virtude da existência de “relações especiais” entre os sujeitos envolvidos, tenham sido estabelecidas condições diferentes das que normalmente seriam acordadas entre pessoas independentes (nomeadamente em termos de preço praticado em negócios de compra e venda), de modo a alterar-se o resultado fiscal, isto é, de modo a que se apure um lucro menor do que se apuraria na ausência daquelas relações.

O artigo 58º -A do CIRC “tem a natureza de uma cláusula especial anti-abuso, que se destina a dar resposta a situações de flagrante e manifesta sub -declaração dos valores das transacções que envolvem direitos reais sobre bens imóveis”66 e, por isso, tem como propósito induzir os contribuintes a adoptar a sua conduta em ordem a que os valores constantes dos contratos de compra e venda de direitos reais sobre bens imóveis reflictam os valores de mercado efectivamente praticados pelas partes.

Segundo este artigo do CIRC, o valor patrimonial definitivo que tenha servido de base à liquidação do IMT, ou que serviria no caso de não haver lugar à liquidação deste, deve igualmente relevar para a determinação do resultado para efeitos fiscais quer do vendedor quer do comprador do imóvel, caso se trate de sociedades ou titulares de rendimentos empresariais.

A introdução deste artigo, provocará um aumento da receita de IRC, por via da correcção de valores prevista no artigo 58º –A do CIRC.

Contudo, as correcções a que alude o n.º 3 do artigo 58º-A do CIRC e das respectivas consequências, só actuam após os contribuintes terem usado os meios de reacção que a lei prevê para esse efeito (artigo 129ºn.º4 do CIRC).

Trata-se, por isso, de uma medida excepcional que tem como objectivo corrigir, para efeitos de determinação do lucro tributável, os valores de venda/aquisição inscritos pelos SP na sua contabilidade, na sequência de procedimentos legais que possibilitam demonstrar, perante a AF, que os valores das transacções efectivamente praticados não são inferiores aos VPT definitivos eu serviram de base à liquidação do IMT ou que serviriam no caso de não haver lugar à liquidação deste imposto.

9. O impacto da Reforma da Tributação do Património na

No documento A reforma da tributação do património (páginas 96-102)