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Evolução das Interfaces – Das Instruções ao Intuitivismo

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CAPÍTULO II – INTERAÇÃO HUMANO-COMPUTADOR

2.2. Evolução das Interfaces – Das Instruções ao Intuitivismo

Vários fatores foram determinantes para a evolução da interface. Em um primeiro momento, os computadores foram máquinas concebidas para atividades matemáticas. De fato,

o nascimento da computação moderna chega com Alan Mathison Turing, que desenvolveu a noção de algoritmo, formulando um novo princípio técnico, em que o programa gravado simulava comportamentos de quadros de estados onde o problema deveria ser tratado (MATTELART, 2002). Fonseca Filho observa que:

Em 1936, Turing consagrou-se como um dos maiores matemáticos do seu tempo, quando fez antever aos seus colegas que é possível executar operações computacionais sobre a teoria dos números por meio de uma máquina que tenha embutida as regras de um sistema formal. Turing definiu uma máquina teórica que se tornou um conceito chave dentro da Teoria da Computação. Ele enfatizou desde o início que tais mecanismos podiam ser construídos e sua descoberta acabou abrindo uma nova perspectiva para o esforço de formalizar a matemática, e, ao mesmo tempo, marcou fortemente a História da Computação (FONSECA FILHO, 2007, p. 75).

Só que as ideias de Turing eram limitadas pelas capacidades dos computadores. Desta forma, após retornar da guerra, Turing dedicou-se a construção de computadores mais complexos e eficientes que pudessem assumir a linguagem semelhante a do cérebro humano. Foi a partir da configuração deste cenário, que Turing começou a criar linguagens de computação. Deu-se início a codificação de programas de computador (FONSECA FILHO, 2007). Turing entendeu que a capacidade do computador não estaria limitada somente as questões físicas dos componentes eletrônicos. Os softwares poderiam ser mais robustos e funcionais além da automação de operações matemáticas: a ideia de utilizar sub-rotinas, ou pequenos blocos estáticos de comandos simples para controlar o hardware72 deram um novo papel ao software: controlar todas as operações do computador, baseado nas instruções dadas por seus usuários, incluindo o controle de outros softwares.

Se a evolução do hardware estava sendo impulsionada constantemente pelas demandas cada vez mais exigentes de performance e eficiência dos computadores, a introdução do transistor73 permitiu uma rápida e crescente evolução dos componentes eletrônicos que por sua vez permitiam mais possibilidades de processamento, armazenamento e comunicação entre diversas redes (SIQUEIRA, 1987, p.. 14).

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O hardware pode ser definido como um termo geral para equipamentos como chaves, fechaduras, dobradiças, trincos, puxadores, fios, correntes, material de canalização, ferramentas, utensílios, talheres e peças de máquinas. No âmbito eletrônico, o termo hardware é bastante utilizado, principalmente na área de computação, não se referindo apenas aos computadores pessoais, mas também aos equipamentos embarcados em produtos que necessitam de processamento computacional, como os dispositivos encontrados em equipamentos hospitalares, automóveis, aparelhos celulares entre outros.

73 O transistor é um componente eletrônico que começou a popularizar-se na década de 1950, tendo sido o

principal responsável pela revolução da eletrônica na década de 1960. São utilizados principalmente como amplificadores e interruptores de sinais elétricos. O termo vem de transfer resistor (resistor/resistência de transferência), como era conhecido pelos seus inventores.

A introdução da Interface do Usuário de Computador pela apresentação de Engelbart em 1968, somado a esses dois fatores (sofisticação e evolução de hardware mais os avanços na lógica de programação do software) criaram o ambiente ideal para que um verdadeiro ciclo de evolução fosse estabelecido (CASTELLS, 2007, p. 52). Para Steven Johnson, foi exatamente esta combinação que permitiu a popularização do microcomputador. Apesar da importância do feito de Engelbart, o software ainda era uma ferramenta complexa de se trabalhar.

Todas as ações que o usuário executava em um determinado software era um trabalho colossal, pois a máquina era gerenciada a partir de códigos e instruções: gerenciamento de memória, espaço em disco físico, entre outras tarefas precisavam ser calculadas pelos programadores. Em um esforço de resolver esta situação, os pesquisadores do Centro de Pesquisas de Palo Alto (PARC) desenvolvem a linguagem de programação SmallTalk.

Diferente das demais linguagens de programação, o SmallTalk foi concebido de forma que usuários comuns fossem capazes de compreendê-lo. Dentre as evoluções que o SmallTalk trouxe foi o gerenciamento de memória automático, encapsulamento de instruções de

software mais a manipulação de dados permitiram que o software respondesse mais

prontamente as interações do usuário. O destaque do SmallTalk foi a introdução de uma Interface mais próxima da metáfora do desktop, como ilustra a Figura 8:

Figura 8 - Tela do sistema Smalltalk.

O conceito de “ícones” também é introduzido pela interface do SmallTalk, como o relógio no canto superior direito, e a caixa de correio fazendo referência a correio eletrônico. O Smalltalk foi lançado a partir de 1974 e continuou a ser atualizado a partir de então. Dois anos após o lançamento do SmallTalk, Steve Jobs e Steve Wozniak criam a Apple Computer. A Apple fez uma fortuna a partir do popular computador Apple, que apresentava em sua interface gráfica tanto de texto quanto de gráficos e ainda possuía a linha de comando. Muitos pesquisadores do Centro de Pesquisas de Palo Alto encontraram seus novos trabalhos na Apple, onde puderam continuar suas pesquisas realizadas anteriormente com o SmallTalk.

Mesmo a Apple, em sua versão mais recente nesta época, ainda trabalhava com o conceito de linha de comando para computadores com fins comerciais. Foi com a visita ao PARC, que Steve Jobs reconheceu a importância da interface do usuário e dedicaram seus esforços para que a próxima versão do Lisa se tornasse um computador totalmente gráfico e sem a necessidade de linha de comando.

Diferentes versões de rascunhos foram feitas, principalmente porque qualquer tarefa conduzida em um computador era muito demorada de ser realizada. Eventualmente, em uma

destes rascunhos, a equipe responsável pelo desenvolvimento do Lisa utilizava ícones que indicavam um documento ou uma aplicação, assim como o primeiro uso de barra de menus, que organizava em si todas as funções do computador. Outras inovação concebida por este time foi o conceito de marcação de elementos visuais selecionados (check), e o conceito de atalhos muito frequentemente utilizados para comandos no menu.

Outras inovações foram releituras do SmallTalk, como a barra de título de uma janela que não era redimensionável, passou a ser ajustável a tela e o conceito de lixeira, que era um lugar espacial dentro da área de trabalho (desktop) que auxiliava o usuário a deletar arquivos desnecessários. O mouse proposto por Engelbart que possuía três botões passou para apenas um botão, e as ações após a seleção de um elemento eram apenas duas: clicar e executar, ou duplo clique para abrir um documento. Os conceitos por trás destes avanços continuam em uso ainda hoje.

Enquanto o SmallTalk introduziu o conceito de imagens diferenciadas para cada tipo de arquivo, a interface do Lisa (Figura 9) foi a primeira a utilizar ícones que representassem todos os arquivos dentro de um sistema. A partir destas representações visuais o usuário poderia navegar através de uma estrutura hierárquica de informações em que cada diretório ou pasta era aberta em uma nova janela. O conceito de “clicar e abrir” também foi concebido nesta época, bem como o conceito de “clicar e arrastar” que envolvia a manipulação direta de arquivos

Outras empresas também dedicavam seus esforços no desenvolvimento de software como a Microsoft de Bill Gates e a VisiCorp. A VisiCorp criou o VisiOn, com a primeira planilha eletrônica que utilizava mais do que linha de comando, apresentava gráficos e era desenvolvido para computadores IBM-PC. Apesar de sua forma rústica e não apresentar facilidade de uso, o VisiOn inspirou Bill Gates a criar um produto competidor chamado de Gerenciador de interface, mais tarde renomeado para o popular Windows.

Todos os conceitos de interação eram semelhantes: apontar e clicar, arrastar, janelas e ícones. A maior diferença entre o Windows e o Lisa, era que o Windows abria um “menu” para cada janela aberta, em vez de apenas um único menu do Lisa. Ainda entre os anos de 1970 e 1980 existiram outros computadores que foram lançados, mas que devido à dificuldade de uso não obtiveram muito sucesso, mas contribuíram para a construção de um padrão de uso de interfaces computacionais.

Em 1987, a Acorn lança o A205/A310 (Figura 10), que além de ser o primeiro computador utilizar gerenciamento de cores em 32 Bits, introduzia o conceito de “dock” ou “Barra de ferramentas”, além de ter tratamento especial para visualização de fontes, mesmo em 16 bits.

Em 1988, a Apple lança o NeXSTEP, com uma interface mais rica e visualmente detalhada. É o NexSTEP que introduz o conceito de gerenciamento de janelas com as opções de fechar representado por um ícone em formato de “X”.

Figura 11 - Interface gráfica do NeXTSTEP da Apple.

O NeXSTEP já trazia consigo o conceito de barra de tarefas na vertical direita como pode ser observado na Figura 11, diferente do Arthur da Acorn que apresentava um menu similar na linha horizontal inferior. Mas esta interface também enfrentou dificuldades devido a alta resolução necessária para sua exibição, que consequentemente demandavam maior performance de hardware.

No final de 1980 e inicio de 1990 outras plataformas perdem sua popularidade deixando apenas dois grandes competidores para a solução de computador pessoal: Microsoft com seu Windows e a Apple com seu Macintosh. Em 1992, a Microsoft lançou o Windows 3 com o qual alcançou um alto nível de aceitação e popularidade, mesmo não apresentando diversas funcionalidades avançadas como o Macintosh - como um sistema de gestão de arquivos por representações iconográficas - vendeu milhões de cópias.

Figura 12 - Interface gráfica do NeXTSTEP da Apple.

O lançamento do Windows 95 colocou definitivamente a Microsoft como a líder de vendas em produtos de interface gráfica do usuário e foi o programa mais popular de todos os tempos74. É possível perceber a diferença da interface gráfica e o uso de cores observando a Figura 13.

Figura 13 - Interface gráfica Windows 95.

74 Say Hello to Windows 95. Disponível em:

Apesar da aparente homogeneização da interface gráfica do usuário, ainda existia espaço para a inovação. Se o Windows 95 introduziu o conceito de “Startmenu” de onde todos os programas pudessem ser iniciados, o sistema BeOS, da BeBox, em 1995, introduziu o conceito de “agrupamento de tarefas” e também utilizava o conceito de movimentação de janelas – de forma semelhante ao SmallTalk - permitindo que o usuário do sistema pudesse movê-la de cima para baixo, da esquerda para a direita e ainda deixá-la visível na tela.

Figura 14 - Interface gráfica do sistema BeOS da IBM.

Mas as contribuições mais inovadoras vieram novamente da Apple que não ficou parada. Com uma espécie de mistura de NeXT e seu sistema operacional antigo, o MAC OS X, não somente introduziu uma interface visual gráfica rica em detalhes, como também introduziu o conceito de animação na resposta da interação do usuário com o sistema. O conceito de zoom também foi especialmente inovador: trazia para frente do usuário o elemento gráfico selecionado.

Figura 15 - Interface gráfica do Mac OS X.

Evitando uma visão simplista de como a interface gráfica do usuário evoluiu, é importante ressaltar que assim como qualquer feito do homem, esta está em constante evolução, sendo reinventada, aprimorada por diversos atores em diversos cenários que tornaria muito extensa uma pesquisa dedicada ao tema. Como podemos observar neste resgate histórico, a evolução da interface gráfica do usuário foi de vital importância para a aceitação de sistemas baseados em software.

Se por um lado foi no universo dos computadores que a interface gráfica do usuário ganha notoriedade e aceitação em razão da facilidade de entregar ambientes associativos ao homem na interação com computadores, por outro o software também passa a estar presente nos objetos mais comuns do dia a dia, reafirmando a importância da interface gráfica do usuário como plataforma dialógica entre o homem e os dispositivos digitais. A interface também pode ser observada como a camada mais sensível desta relação, pois qualquer falha ou ocorrência pode restringir ou mesmo impossibilitar a comunicação entre homem e máquina.

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