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Fé e Arrependimento A regeneração é inseparável de seus efeitos, e um destes

efeitos é a fé. Sem a fegeneração é moral e espiritualmente impos­ sível que o homem creia em Cristo, porém, quando ele é regene­ rado, é moral e espiritualmente impossível que ele não creia. Jesus disse: “Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim” (Jo 6.37), e certamente neste caso ele estava se referindo à doação e à atração eficaz do Pai mencionadas no mesmo contexto (Jo 6.44,65). A regeneração é a renovação do coração e da mente, e o coração e a mente renovados devem agir de acordo com a sua natureza.

A Fé

A regeneração é um ato de Deus, e unicamente de Deus. A fé, porém, não é um ato de Deus; não é Deus quem crê em Cristo para a salvação, e, sim, o pecador. É peia graça de Deus que o homem é capacitado para crer, porém a fé é uma atividade por parte do homem, e unicamente dele. Pela fé nós recebemos e descansa­ mos unicamente em Cristo para a salvação.

Pode-se dizer: esta é uma estranha mistura. Somente Deus é quem regenera. Somente nós é que cremos. E cremos unicamente em Cristo para a salvação. Porém, este é precisamente o caminho

do evangelho. Convém que apreciemos tudo o que está implícito na combinação, porque este é o caminho de Deus para a salvação, e ela expressa a sua suprema sabedoria e graça. Na salvação Deus não lida conosco como se fôssemos máquinas; ele nos trata como pessoas, e, portanto, a salvação traz consigo a extensão total de nossa atividade dentro de seu alcance. Pela graça somos salvos, mediante a fé (cf. Ef 2.8).

Para termos uma melhor compreensão do sentido de fé, é preciso examiná-la quanto à sua garantia e quanto à sua natureza.

A garantia. Fé, como veremos mais tarde, envolve a totalida­

de da alma num movimento de auto-rendição a Cristo para a salvação tanto do pecado como de suas conseqüências. Não é inútil fazer, as seguintes perguntas: que garantia tem o pecador perdido em entregar-se a Cristo? Como pode ele saber se será aceito ou não? Como pode ele saber se Cristo é capaz para salvá-lo? Como pode ele saber se a sua confiança não é infundada? Como pode ele saber se Cristo tem disposição para salvá-lo? Estas são perguntas urgentes, talvez não urgentes para a pessoa que não tem uma verdadeira concepção das conseqüências ou da gravidade de sua condição perdida, porém são excessivamente urgentes e pertinen­ tes para a pessoa convencida de pecado e em cujo coração arde a realidade e consciência da ira de Deus contra o pecado. Enumera­ mos os seguintes fatos que constituem a garantia da fé.

1. A oferta universal do evangelho. Esta oferta pode ser

considerada de vários ângulos. Pode ser considerada como um convite, uma exigência, uma promessa e uma oferta. Porém, seja qual for o ângulo pelo qual o evangelho é visto, ele é pleno, gracioso e irrestrito. Os apelos do evangelho cobrem o campo todo da prerrogativa divina e do interesse humano. Deus roga, convida, ordena, chama, apresenta a oferta de misericórdia e graça e ele faz tudo isto sem qualquer distinção ou discriminação.

Podemos ficar surpresos de que esta oferta universal receba tanta proeminência no Velho Testamento. Sob o Velho Testamen­ to, a revelação da graça salvadora de Deus foi dada ao povo eleito, e a eles foram confiados os oráculos de Deus. O salmista pôde cantar: “Conhecido é Deus em Judá; grande o seu nome em Israel. Em Salém está o seu tabernáculo, e em Sião a sua morada” (SI 76.1,2). E Jesus podia dizer desse período veterotestamentário: “A salvação vem dos judeus” (Jo 4.22). Houve um muro divisório entre judeu e gentio. Porém, é no Velho Testamento que encontra­ mos um apelo como este: “... pois não há outro Deus senão eu, Deus justo e Salvador não há além de mim. Olhai para mim, e sede salvos, vós, todos os termos da terra; porque eu sou Deus, e não há outro” (Is 45.21,22). Lemos em outro lugar: “Dizei-lhes: Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do perverso, mas em que o perverso se converta do seu caminho, e viva. Convertei-vós, convertei-vos dos vossos maus caminhos; pois, por que haveis de morrer, ó casa de Israel?” (Ez 33.11; cf. 18.23,32). Eis aqui uma negação muito enfática — “Não tenho prazer na morte do perverso”; uma afirmação — “mas em que o perverso se converta do seu caminho, e viva”; uma asseveração — “Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus”; uma exortação — “Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos”; um protesto — “Pois, por que haveis de morrer?”

Se há universalidade de exortação e de apelo quando a aliança da graça de Deus foi concentrada em Israel, quão mais evidente deve ser esta quando não há mais judeu e nem gentio, e o muro divisório é derrubado, quando o evangelho é proclamado nos termos da comissão de Jesus: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações” (Mt 28.19). As palavras de Jesus estão impreg­ nadas deste convite indiscriminado: “Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28); “e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora” (Jo 6.37). E as palavras do apóstolo são inconfundivelmente claras: “Ora, não levou Deus em conta os tempos da ignorância; agora, porém,

notifica aos homens que todos em toda parte se arrependam; porquanto estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça por meio de um varão que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitando-o dentre os mortos” (At 17.30,31). Não sim­ plesmente que Deus roga aos homens em toda parte que se arrependam, ele ordem que assim façam. É uma ordem investida com a autoridade e majestade de sua soberania como o Senhor de todos. O imperativo soberano de Deus é realçado no convite da graça. E isso encerra toda e qualquer contenda. De sua ordem ninguém é excluído.

2. A suficiência plena e a adequação do Salvador apresenta­ do. Cristo apresentou-se a si mesmo na glória de sua pessoa e na

suficiência de seu ofício como Salvador, quando disse: “Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28), e ainda: “e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora” (Jo 6.37). Esta é a verdade que é enunciada em Hb 7.25: “Por isso também pode salvar totalmente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles.” A suficiência de seu ofício como Salvador repousa sobre a obra que ele efetuou uma vez por todas, quando morreu na cruz e ressuscitou com poder triunfante. Mas ela reside na eficácia e perfeição de sua atividade contínua à destra de Deus. É em virtude de sua continuidade ininterrupta e o seu sacerdócio imutável que ele pode salvar os que vão a ele e dar-lhes a vida eterna. Quando Cristo é apresentado aos homens perdidos pela proclamação do evangelho, é no papel de Salvador que ele é apresentado, como aquele que continua sendo, ininterruptamente, a incorporação da salvação que ele realizou uma vez por todas. Não é a possibilidade de salvação que é oferecida aos homens perdidos, é o próprio Salvador, e, portanto, a salvação, plena e perfeita. Não há nenhuma imperfeição na salvação oferecida, e não há nenhuma restrição em seu convite — é pleno, gracioso e irrestrito. E esta é a garantia da fé.

A fé de que estamos falando aqui não é a crença de que fomos salvos, e, sim, é a confiança em Cristo a fim de sermos salvos. E é de suma importância que saibamos que Cristo é apresentado a todos, sem distinção, para que possam entregar-se a ele para a salvação. A oferta do evangelho não se restringe aos eleitos ou àqueles por quem Cristo morreu. E a garantia de fé não é a convicção de que somos eleitos ou que estamos entre aqueles por quem, estritamente falando, Cristo morreu, mas o fato de que Cristo, na glória de sua pessoa, na perfeição de sua obra consumada e na eficácia de sua atividade exaltada como Rei e Salvador, nos é oferecido na oferta do evangelho pleno, gracioso e irrestrito. Não é como pessoas convencidas de sua eleição, nem como pessoas convencidas de que são os objetos especiais do amor de Deus que nos confiamos a ele, mas é como pecadores perdidos. Confiamo­ -nos a ele não porque cremos que somos salvos, e, sim, como pecadores perdidos a fim de podermos ser salvos. É para nós, em nossa condição perdida, que a garantia de fé é dada, e esta garantia não se restringiu nem de forma alguma se circunscreveu. Na garantia de fé, a rica misericórdia de Deus é oferecida aos perdidos e a promessa da graça é certificada pela veracidade e fidelidade de Deus. Esta é a base a sobre qual o pecador perdido se entrega a Cristo na plena certeza de que ele será salvo. E nenhum pecador a quem o evangelho alcança é excluído da garantia divina por tal confiança.

A natureza. Há três verdades que precisam ser mencionadas

acerca da natureza da fé. Fé é conhecimento, convicção e

confiança.

1. Conhecimento. Pode parecer algo confuso dizer que fé é

conhecimento. Pois conhecer não é uma coisa e crer outra coisa? Isto é parcialmente verdadeiro. As vezes devemos distinguir entre fé e conhecimento, e colocá-los em contraste um com o outro. Porém, existe um conhecimento que é indispensável à fé. Em nossas relações humanas ordinárias costumamos confiar numa

pessoa sobre quem nada sabemos. Especialmente quando aquele em quem confiamos é de suma importância para nós, devemos conhecer uma boa parte a respeito de seu caráter e identidade. Quanto mais deve ser no tocante à fé que é dirigida a Cristo; porquanto é a fé contra todas as conseqüências de vida e de morte, de tempo e de eternidade. Devemos conhecer a Cristo, quem ele é, o que ele tem feito e o que ele é capaz de fazer. Do contrário, a fé seria uma conjectura cega, no melhor, e uma zombaria insensata, no pior. Deve existir apreensão da verdade referente a Cristo.

As vezes a medida da verdade apreendida pela pessoa que crê é realmente muito pequena, e temos de apreciar o fato de que a fé de alguns em suas fases iniciais é bastante elementar. Mas a fé não pode começar num vácuo de conhecimento. Paulo nos lembra isto de forma muito simples quando escreveu: “E assim, a fé vem pela pregação e a pregação pela palavra de Cristo” (Rm 10.17).

2. Convicção. Fé é assentimento. Devemos não somente

conhecer a verdade acerca de Cristo, mas também devemos crer que ele é a verdade. Certamente que é possível compreendermos a importância de certas proposições da verdade, e todavia não crermos nelas. Toda incredulidade tem este caráter, e à medida que a importância das verdades envolvidas são compreendidas, as mais fortes podem ser as rejeitadas. Uma pessoa que rejeita o nascimen­ to virginal pode entender perfeitamente o que a doutrina é, e por esta mesma razão rejeitá-la. Mas, no momento, não estamos lidan­ do com a incredulidade ou descrença, e, sim, com a fé, e esta obviamente implica que as verdades conhecidas são também rece­ bidas como verdadeiras.

A convicção que entra na fé não é apenas um assentimento à verdade acerca de Cristo, mas também o reconhecimento da exata correspondência que existe entre a verdade de Cristo e os nossos feitos como pecadores perdidos. O que Cristo é como Salvador se encaixa perfeitamente às nossas profundas e mais extremas neces­ sidades. É o mesmo que dizer que a suficiência de Cristo, como

Salvador, satisfaz o desespero e desesperança de nossa miséria e pecado. É a convicção, portanto, que ocupa o nosso interesse maior e que registra o veredito: Cristo se adequa perfeitamente a tudo o que eu sou em meu pecado e miséria e a tudo o que aspiraria ser pela graça de Deus. Cristo se ajusta perfeitamente à totalidade de nossa situação como pecadores, culpados, miseráveis e infelizes.

3. Confiança. A fé é o conhecimento passando para a convic­

ção, e é a convicção passando para a confiança. A fé não pode impedir uma breve auto-rendição a Cristo, uma transferência de dependência de nós mesmos e de todos os recursos humanos para uma dependência unicamente de Cristo para a salvação. É uma recepção e descanso nele. É aqui que o ato mais característico da fé aparece; é um acordo entre duas pessoas, um acordo entre o pecador perdido e a pessoa do Salvador pronto e desejoso para salvar. A fé, finalmente, não é a crença em proposições da verdade acerca do Salvador, embora a inclusão delas em nossa crença seja um ingrediente essencial à fé. Fé é confiança numa pessoa, a pessoa de Cristo, o Filho de Deus e Salvador dos perdidos. É a confiança de nós mesmos a ele. Não é simplesmente crê-lo; é crer sobre ele.

Os reformadores puseram ênfase especial sobre este elemento da fé. Eles se opunham ao ponto de vista romanista de que a fé é assentimento. É bem consistente com a religião romanista afirmar que a fé é assentimento. É o gênio da concepção romanista de salvação introduzir sorrateiramente mediadores entre a alma e o Salvador —■ a Igreja, a virgem, os sacramentos. Ao contrário, é a glória do evangelho da graça de Deus a existência de um só mediador entre Deus e o homem, o homem Cristo Jesus. E esta foi a glória de nossa Reforma Protestante, descobrir novamente a pureza do evangelho. Os reformadores reconheceram que a essên­ cia da fé salvífica é conduzir o pecador, perdido e morto em delitos e pecados, a um contato direto e pessoal com o próprio Salvador, contato este que nada menos é do que uma auto-entrega a ele em

toda a glória de sua pessoa e perfeição de sua obra, como ele é graciosa e plenamente oferecido no evangelho.

Deve-se lembrar que a eficácia da fé não reside em si mesma. Fé não é algo que merece o favor de Deus. Toda a eficácia da salvação reside no Salvador. Como alguém apropriada e correta­ mente declarou: Não é a fé que salva, e, sim, a fé em Jesus Cristo; estritamente falando, não é nem mesmo a fé em Jesus Cristo que salva, e, sim, é Cristo mesmo quem salva através da fé. A fé nos une a Cristo pelos laços de ligação e confiança permanentes, e esta é a união que garante que a virtude, a graça e o poder salvíficos do Salvador se tomem operantes naqueles que crêem. O caráter específico da fé é aquele que olha para fora de si mesmo e encontra todo o seu interesse e objetivo em Cristo. Ele é a preocupação absorvente da fé.

E no ponto da fé em Cristo que a nossa responsabilidade se compromete na mais plena extensão, assim como é no exercício da fé que os nossos corações e mentes e vontade são ativos no mais alto grau. Não é responsabilidade nossa regenerar-nos a nós mes­ mos. A regeneração é a ação de Deus, e tão-somente de Deus. É responsabilidade nossa viver o que a regeneração efetua. É respon­ sabilidade nossa ser santos. Mas o ato de regeneração não entra na esfera de nossas ações responsáveis. A fé entra. E jamais nos libertamos da obrigação de crer em Cristo para a salvação de nossas almas. O fato de que a regeneração é o pré-requisito da fé de forma alguma nos livra da responsabilidade de crer nem elimina de nós o privilégio inestimável que é nosso, como Cristo e suas reivindi­ cações são impostos sobre nós através da plena e gratuita oferta de sua graça. A nossa incapacidade não é desculpa para a nossa incredulidade nem nos propicia razão qualquer para não crermos. Quando Cristo nos é apresentado no evangelho, não há motivo algum para rejeição de incredulidade, antes toda razão exige o consentimento da fé.

O Arrependimento

A questão foi discutida: o que vem primeiro, a fé ou o arrependimento? É uma questão desnecessária, e a insistência de que um antecede o outro é fútil. Não há prioridade. A fé que é para a salvação é uma fé penitente, e o arrependimento que é para a vida é um arrependimento crente. O arrependimento é admiravelmente definido no Breve Catecismo. “Arrependimento para a vida é uma graça salvadora, pela qual o pecador, tendo uma verdadeira cons­ ciência de seu pecado e percepção da misericórdia de Deus em Cristo, se enche de tristeza e de aversão pelos seus pecados, os abandona e volta para Deus, inteiramente resolvido a prestar-lhe nova obediência” (Resp.87). A interdependência da fé e do arre­ pendimento é facilmente percebida quando nos lembramos de que a fé é fé em Cristo para a salvação do pecado. Porém, se a fé é dirigida para a salvação do pecado, deve haver ódio pelo pecado e o desejo de ser salvo dele. Tal ódio pelo pecado envolve o arrependimento que consiste essencialmente em voltar-se do pe­ cado para Deus. Repetindo, se nos lembramos que o arrependi­ mento é voltar-se do pecado para Deus, este voltar-se para Deus subentende fé na misericórdia de Deus como revelada em Cristo. É impossível desvencilhar a fé do arrependimento. A fé salvadora é permeada com o arrependimento, e o arrependimento é permeado com a fé. A regeneração se verbaliza em nossas mentes através do exercício da fé e do arrependimento.

O arrependimento consiste essencialmente de uma mudança de coração, mente e vontade. A mudança de coração, mente e vontade se refere, principalmente, a quatro coisas: é uma mudança de mente acerca de Deus, acerca de nós mesmos, acerca do pecado e acerca da justiça. Sem a regeneração o nosso conceito de Deus, de nós mesmos, do pecado e da justiça é radicalmente pervertido. A regeneração muda os nossos corações e mentes; ela os renova radicalmente. Daí, ocorre uma mudança radical em nosso pensa­ mento e sentimento. As coisas antigas passaram, e todas as coisas

se fizeram novas. É muito importante observar que a fé que é para a salvação é a fé que é acompanhada por essa mudança de pensa­ mento e atitude. Mui freqüentemente, nos círculos evangélicos e especificamente no evangeüsmo popular, a mudança momentânea que a fé assinaliza não é compreendida e apreciada. Existem duas falácias. Uma põe a fé fora do único contexto que lhe dá sentido, e a outra considera a fé em termos de simples decisão, e, infeliz­ mente, uma decisão desvirtuada. Estas falácias se relacionam e condicionam uma à outra. A ênfase sobre o arrependimento e a profunda mudança de pensamento e sentimento que ela envolve é precisamente o que é necessário para corrigir este empobrecido e mortífero conceito de fé. A natureza do arrependimento serve para acentuar a urgência dos resultados em jogo na exigência do evan­ gelho, a separação do pecado que a aceitação do evangelho impõe, e a perspectiva totalmente nova que a fé do evangelho comunica.

Não devemos conceituar o arrependimento como que consis­ tindo simplesmente de uma mudança geral de mente; ela é mui particular e concreta. E visto que esta é uma mudança mental com respeito ao pecado, ela é tuna mudança mental com respeito a pecados particulares, pecados que em toda a sua particularidade e individualidade pertencem aos nossos pecados. É-nos tão fácil falar de pecado, ser denunciantes do pecado, e denunciantes dos pecados particulares de outras pessoas, porém não conseguimos ser penitentes acerca de nossos próprios pecados particulares. A prova de arrependimento está no fato de nosso arrependimento ser genuíno e resoluto no tocante aos nossos próprios pecados, peca­ dos caracterizados pelas agravações que são peculiares a nós próprios. No caso dos tessalonicenses, o arrependimento manifes­ tou-se no fato de terem eles deixado os ídolos a fim de servir ao Deus vivo e verdadeiro. Foi a sua idolatria que particularmente evidenciou a sua alienação de Deus, e foi o arrependimento em relação ao pecado que provou a genuinidade de sua fé e de sua esperança (ITs 1.9,10).

O evangelho não é apenas o fato de que pela graça somos salvos por meio da fé, mas ele é também um evangelho de arrependimento. Quando Jesus, após sua ressurreição, abriu o entendimento dos discípulos para que pudessem entender a Escri­ tura, ele lhes disse: “Assim está escrito que o Cristo havia de padecer e ressuscitar dentre os mortos no terceiro dia, e que em seu nome se pregasse arrependimento para a remissão de pecados, a todas as nações” (Lc 24.46,47). Quando Pedro pregou à multidão por ocasião do Pentecoste e os ouvintes foram constrangidos a peguntar: “Que faremos, irmãos?”, Pedro respondeu: “Arrepen­ dei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados” (At 2.37,38). Mais tarde, de uma forma semelhante, Pedro interpretou a exaltação de Cristo como exaltação à posição de “Príncipe e Salvador, a fim de conceder a Israel o arrependimento e a remissão de pecados” (At 5.31). Pode-se comprovar mais claramente que este é o evangelho de arrependimento pelo fato de o ministério celestial de Jesus como Salvador ser aquele de conceder o arrependimento e a remissão de pecados? Assim Paulo, ao dar relatório de seu próprio ministério aos presbíteros de Éfeso, declarou que testificava “tanto a judeus como a gregos o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo” (At 20.21). O escritor da epístola aos Hebreus indica que o “arrependimento de obras mortas” é um dos primeiros princípios da doutrina de Cristo (Hb 6.1). Não poderia ser de outra forma. A nova vida em Jesus Cristo significa que as algemas que nos prendiam ao domínio do pecado são quebradas. O crente está morto para o pecado pelo corpo de Cristo, o velho homem foi crucificado, para que o corpo do pecado seja destruído e não sirva mais ao pecado (Rm 6.2,6). Este rompimento com o passado registra-se em sua consciência, pelo abandono do pecado a fim de