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5 CONTEXTO DA PRODUÇÃO DE TEXTO

5.3 FASE FINAL DA ORGANIZAÇÃO EM CICLOS (2008 ATUAL)

No ano seguinte, 2008, a Rede ampliou os ciclos nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, alterando novamente a terminologia para Ciclos de Aprendizagem. Os anos Iniciais do Ensino Fundamental estão organizados em Ciclo de Aprendizagem I (1º, 2º e 3º ano) com alunos de 6 a 8 anos, e o Ciclo de Aprendizagem II (4º e 5º ano) com discentes de 9 e 10 anos de idade, conforme a Figura 5, na página seguinte.

Figura 4 – Organização curricular do ensino público da cidade do Salvador a partir de 2008

Fonte: Freire (s/d, p. 2).

De acordo com o que pode ser observado na figura, o avanço do aluno se processa na mudança de um ano para outro, podendo ter retenção apenas do 3º para o 4º ano e do 5º para o 6º ano, nos últimos anos de cada ciclo. Naquele momento, a Rede já tinha atribuído aos Anos Finais do Ensino Fundamental a denominação de anos no lugar de séries, embora alguns documentos ainda conservem a nomenclatura anterior, de séries, segundo consta na Resolução do CME nº 12/2007.

Nos Anos Finais do Ensino Fundamental, apesar de adotar a denominação de anos de escolarização, semelhante aos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, o currículo continua no sistema seriado. Dentro desse contexto, as Unidades de Ensino que ofertam todo o Ensino Fundamental convivem diariamente com duas lógicas: a escola ciclada e a escola seriada. Compreendemos esse currículo misto como um grande desafio para os profissionais da educação.

Após o período de transição, novos documentos são elaborados, tais como os Marcos de Aprendizagem de Língua Inglesa e Arte (Artes Visuais, Dança, Música e Teatro); orientações para a figura do Coordenador Pedagógico que está

ingressando na Rede nesse período; e documentos que sugerem como pode ser a organização da rotina escolar, bem como subsídios para avaliar os níveis de escrita dos alunos e os gêneros textuais. Outros documentos são reformulados, como os Marcos de Aprendizagem de parte dos componentes curriculares ministrados nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental (Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia e Ciências), apresentando nova formatação, com a presença de competências, conteúdos, habilidades e eixos para cada componente curricular e para cada ano de escolarização do ciclo. Os Diários de Classe também seguem essa linha de reformulação, bem como sugestões de atividades diagnósticas para serem utilizados nas primeiras semanas de aula do ano letivo.

Em 2013 foi publicado o decreto nº 23.810, que cria, no âmbito da SMED, a Operação Salvador Alfabetiza, conforme já discutido no capítulo anterior. Essa operação foi prorrogada em 2014. Em 2015, a Rede vivenciou uma parceria piloto com o Instituto Ayrton Senna para desenvolver ações em prol da regularização do fluxo escolar. Essa parceria tem duração prevista de 05 (cinco) anos, a partir de 201634.

Nessa última fase dos ciclos, constatamos uma quantidade maior de documentos que possuem o intuito de subsidiar o trabalho dos professores. Muitos dos documentos são apenas atualizações realizadas de outros já existentes.

Podemos considerar que a fragilidade teórica é amenizada no corpus, pois aparece o enunciado Progressão Continuada como uma orientação a ser seguida dentro do sistema organizado em ciclos. O discurso da avaliação permanece como o das fases anteriores.

É importante destacar que os anos de 2015 e 2016 corresponderam a uma fase de reelaboração do projeto da Rede Municipal de Ensino da cidade do Salvador através do Programa Combinado e do Projeto Nossa Rede.

A SMED, juntamente com o Instituto Chapada de Educação – ICEP, iniciou um processo de elaboração coletiva de Cadernos Pedagógicos35 para serem

utilizados como recurso didático em sala de aula, contendo sequências didáticas e

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Esta parceria não resulta, para a SMED, em repasse de recurso financeiro. A contrapartida do Órgão Central é a compra do livro didático utilizado no programa.

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Foram elaborados apenas os Cadernos Pedagógicos dos componentes curriculares Língua Portuguesa e Matemática. Há a intenção de no futuro incorporar a produção de meterial didático para os componentes curriculares História, Geografia e Ciências.

projetos de ensino, na tentativa de imprimir, na Rede, uma concepção de ensino e aprendizagem unificada, com vistas a acabar com a vivência de diversos projetos pedagógicos com orientações metodológicas distintas.

Paralelo à produção dos Cadernos Pedagógicos havia, também, um movimento de reelaboração das diretrizes pedagógicas da Rede, mas até o momento da finalização da coleta de dados da presente pesquisa, esse documento ainda estava em processo de reconstrução. Durante os encontros de produção dos cadernos e da atualização das diretrizes, notamos que a SMED, juntamente com o ICEP, afirmava que um enunciado viria a compor a questão do currículo, qual seja, a questão das expectativas de aprendizagem em substituição das competências e habilidades utilizadas até o momento. No final de 2016, o enunciado escolhido foi Aprendizagens Esperadas e Avaliadas. Isso poderá vir a ser observado nos documentos produzidos a partir de 2017.

Em síntese, podemos concluir que a SMED vem trilhando um caminho relativamente longo, desde 1987, na busca de um consenso possível em torno da crença de que o regime ciclado é uma opção viável para o trabalho com alunos oriundos de classes populares, pela flexibilidade que há de cada aluno aprender no seu tempo, no seu ritmo. Contudo, notamos que os esforços empreendidos ainda não foram suficientes para o sucesso do currículo enquanto uma política, pois medidas paralelas estão sendo adotadas para conter o fluxo escolar, como os programas de aceleração da aprendizagem. A problemática perpassa algumas lacunas que a SMED não se atentou, de que o sucesso de uma política depende de algumas variáveis que não estão ainda no estágio adequado, como uma fundamentação teórica sólida presente nos documentos orientadores, mas ainda não repassadas e incorporadas por professores da Rede. Também por ações ainda não realizadas de forma consistente, articulada e permanente, como uma política de formação docente. Não podemos esquecer o processo de avaliação que compõe um dos pilares de qualquer prática pedagógica que deseje ser bem-sucedida. Compreendemos, assim, que a SMED necessita urgentemente garantir uma política de formação docente, em que o currículo e avaliação sejam eixos estruturantes da política dos ciclos de aprendizagem, para que ela possa ser praticada em sua plenitude, seguindo seus princípios. Assim, poderemos avaliar, com resultados mais consistentes, se essa organização curricular é realmente adequada para o público atendido.

A análise dos documentos produzidos pela SMED revela que: o processo de construção centrou-se no seu corpo técnico, sem envolvimento dos profissionais que atuam nas GR e Unidades Escolares; no geral, não há informações claras sobre os responsáveis pela elaboração, embora tenhamos constatado que os documentos foram construídos por coordenadores pedagógicos e professores lotados no Órgão Central; não existe uma preocupação de explicitação dos destinatários dos documentos; e o discurso da escola ciclada não se apresenta de forma coerente e sólida, pois há uma confusão de termos utilizados, constituindo, assim, uma descontinuidade no discurso. Nesta direção, o caminho percorrido pela SMED foi pautado predominantemente por estratégias superficiais, não conseguindo, portanto, alterar a concepção que os profissionais possuem sobre a escola não seriada.

Figura 5 – Articulação da Educação Infantil com o Ensino Fundamental de Nove Anos da Rede Municipal de Ensino público da cidade do Salvador

Fonte: Salvador (2006, p. 18).

O período de 2006 a 2007 é considerado, nesta pesquisa, como uma fase de transição (fase intermediária), pois é nesse intervalo que a Secretaria parece estar se preparando, através de estudo da legislação acerca das possibilidades de ampliação do Ensino Fundamental de Nove Anos, bem como consultando o currículo adotado por outras secretarias em âmbito brasileiro. O trecho a seguir evidencia nossa hipótese, ao demonstrar as intenções do Órgão Central de transformação do CEB em Ciclos:

O projeto para o ano de 2008 em relação ao Ciclo de Estudos Básicos (CEB) é transformá-lo em Ciclo de Aprendizagem, visto que, em 20 anos, já se criou no inconsciente coletivo dos profissionais da RME de Salvador, que

o Ciclo é uma estratégia de promoção automática, fazendo com que os alunos sejam aprovados sem o desenvolvimento de competências e habilidades necessárias, ou ainda como forma de combater a repetência e a evasão escolar (SALVADOR, 2007, p. 11).

O extrato acima permite considerar que há, por parte da Secretaria, um entendimento equivocado naquele período, acerca do que venha a ser uma escola organizada em ciclos, ao explicitar que exista Promoção Automática dos alunos dentro dessa lógica curricular. Tal compreensão influencia diretamente o entendimento que os profissionais da Rede possuem até hoje sobre a organização curricular em ciclos, o que leva a uma prática descontextualizada da proposta curricular organizada em ciclos.

Uma questão que merece reflexão é a crença por parte do Órgão Central de que, depois de 20 (vinte) anos de experiência da escola ciclada, há uma consciência coletiva dos professores de compreender os ciclos como Promoção Automática. Isso não foi verificado no Contexto da Prática, que é discutido no próximo capítulo. Foi observado que há diferentes entendimentos sobre a política educacional convivendo no âmbito municipal.

Outra evidência de entendimento desse período como transição é o fato de alguns documentos dessa fase utilizarem nomenclaturas diferentes para se referir a mesma coisa, como por exemplo: 4º e 5º anos = 3ª e 4ª séries.

Um avanço observado nessa fase é a busca pela ampliação de referencial teórico que justifique a adoção da escolaridade em ciclos, pois notamos que os documentos fazem referência a estudiosos da área, como Perrenoud (2004) e Barretto e Mitrulis (2001), dentre outros. No entanto, compreendemos que esta é uma questão preocupante, já que denuncia a tentativa iniciada pela SMED de fortalecer o CEB, agora ciclos em um regime consolidado em um contexto influenciado pela fragilidade teórica apresentada nos documentos produzidos nessa fase de transição, traduzidos pela falta de clareza teórica e política, visualizada na confusão dos termos adotados.

Em outras palavras, não há um entendimento claro do que vem a ser ciclos de aprendizagem, fragilidade que impacta diretamente nas ações de formação de professores desenvolvidas pela instituição, e no discurso que é propagado através dos documentos orientadores que circulam livremente pelos professores, que fazem interpretações que impactam na prática pedagógica.

Notamos, assim, que o consciente coletivo acerca dos ciclos foi construído pela SMED permeado de fragilidade teórica, pois os termos adotados para se referir à política sofrem oscilações e flutuações perigosas para a construção de uma prática consolidada nos princípios de uma escola organizada em ciclos.

Após esse período de transição, a Secretaria alterou novamente a nomenclatura de sua organização curricular, aumentou em mais dois anos o ciclo, transformando os Anos Inicias do Ensino Fundamental em uma escolaridade totalmente ciclada, permanecendo assim até os dias atuais.