• Nenhum resultado encontrado

5 CONTEXTO DA PRODUÇÃO DE TEXTO

5.1 FASE INICIAL DA ORGANIZAÇÃO EM CICLOS ([198-] 2005)

A primeira escola criada no âmbito da Secretaria Municipal de Educação da cidade do Salvador data de 1976. Assim, apesar da não localização de documentos orientadores desse período, consideramos as orientações nacionais para identificar a organização da educação utilizada no período que, na época, era regida pela LDB nº 5.692/71, que organizava o ensino em 1º e 2º graus. O 1º grau compreendia o Ensino Primário, com duração de oito anos (1ª à 8ª série); e o 2º grau compreendia o

Ensino Médio. Dessa forma, o currículo ofertado no cenário municipal público nesse período era totalmente seriado.

A escola em ciclos em Salvador, objeto desta pesquisa, nasceu em 1987, quando a Rede Municipal de Salvador implantou a escola em ciclos, intitulada Ciclos de Estudos Básicos (CEB), mesclando com a escola seriada. Isto seria regulamentado posteriormente pela Resolução do Conselho Municipal de Educação nº 004, publicada no Diário Oficial do Município em 16/10/1999. Em 1986 foi implantado um projeto piloto que deu origem e base à implantação em uma escola. Após as primeiras experiências, a SMED apresentou a resolução de institucionalização, o que ocorreu em 1999: “Artigo 2º - O Ciclo de Estudos Básicos – CEB, integrado ao Ensino Fundamental, se constitui em uma organização pedagógica, não seriada, que visa garantir a continuidade da aprendizagem dos alunos sem interrupção dos seus estudos no Ciclo” (SALVADOR, 1999).

Os ciclos eram plurianuais, organizados em CEB 1 (fase inicial) e CEB 2 (fase final), proposta que organiza as 1ª e 2ª séries como um bloco contínuo, sem interrupções, cujo objetivo era normalizar o fluxo escolar através da eliminação da repetência entre elas. A proposta de trabalhar com ciclos tinha como objetivo propiciar maiores oportunidades de escolarização voltada para a alfabetização das crianças, respeitando seus ritmos e formas de aprender. Esta organização tinha o objetivo de contribuir efetivamente para a superação dos problemas do desenvolvimento escolar – evasão e repetência – ao flexibilizar a seriação, abrindo possibilidade de o currículo ser trabalhado ao longo de um período de tempo maior, permitindo o respeito aos diferentes ritmos de aprendizagem que os alunos apresentavam (SALVADOR, 2000).

O funcionamento do CEB pode ser compreendido de melhor forma através da Figura 1. Do CEB I para o CEB II, como já assinalado, não existia retenção dos alunos. Os alunos tinham dois anos para desenvolver as competências e habilidades estabelecidos nos Marcos de Aprendizagem. Caso o aluno não atingisse o percentual mínimo de 80% das habilidades previstas para todo o ciclo, o mesmo era retido, repetindo apenas o último ano do ciclo.

Figura 1 – Funcionamento do CEB na Rede Municipal de Ensino público da cidade do Salvador

Fonte: SALVADOR (2001, p. 8).

De acordo com um dos documentos orientadores, os objetivos do CEB eram:

Garantir a continuidade do processo educativo do aluno, visando a apropriação do sistema de representação da língua escrita, da leitura e do pensamento lógico-matemático e a ampliação do conhecimento de mundo; Elevar os índices de permanência e promoção escolar a partir da melhoria e renovação da prática docente; Promover o exercício da cidadania crítica e consciente e o resgate sócio-cultural do aluno a partir da aprendizagem dos conteúdos curriculares definidos nos PCN e no documento Escola, Arte e Alegria; Garantir a permanência do professor, por, no mínimo, dois anos na mesma classe do CEB, assegurando o acompanhamento sistemático da construção do conhecimento dos alunos (SALVADOR, 2000, p. 4).

Tais objetivos tomaram como referências as ideias de Jean Piaget, Lev Vygotsky, Henri Wallon (Construtivismo e Sócio-interacionismo), Emilia Ferreiro e Ana Teberosky (desenvolvimento no nível de escrita das crianças). Vale destacar que se ancoravam, também, em orientação nacional, como o PCN (BRASIL, 1997), e orientação local da própria secretaria, através do documento Escola, Arte e Alegria, publicado em 1999, contendo as diretrizes que orientavam a prática pedagógica nas escolas da Rede Municipal pública de Ensino.

Concordamos com a orientação presente no último objetivo, que expressa a necessidade do mesmo professor acompanhar os alunos no período de dois anos, CEB I e CEB II, com o intuito de garantir o acompanhamento de cada aluno dento do processo do ciclo. Essa orientação possibilitava que o professor realizasse um processo de gestão do ensino, da aprendizagem e da avaliação de forma

continuada, permitindo, com maior facilidade, que os alunos aprendessem as competências e habilidades destinadas ao período de dois anos de duração do CEB. Os Marcos de Aprendizagem do CEB estavam organizados por componentes curriculares (Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia e Ciências). Em cada um deles havia uma lista de habilidades. Para Língua Portuguesa e Matemática as habilidades estavam organizadas por eixos. Havia, também, conteúdos e as orientações didáticas descritos para cada componente curricular.

Um dos documentos orientadores explicitava que o CEB

[…] utiliza a avaliação da aprendizagem processual, formativa, contínua e cumulativa, prevalecendo os aspectos qualitativos sobre os quantitativos, tomando como base os Marcos de Aprendizagem, previstos para cada ano de escolarização, definidos em Portaria da Secretaria Municipal de Educação e Cultura do Salvador, de… (SALVADOR, 2000, p. 7).

Como documento de apoio para o professor registrar o processo avaliativo havia o Diário de Classe, onde ele podia anotar o desenvolvimento da turma através de pareceres descritivos dos desempenhos obtidos pelos alunos, bem como assinalar as habilidades alcançadas por bimestre, cujo intuito era possibilitar o acompanhamento das aprendizagens da turma.

Podemos observar que, nessa primeira fase da implantação dos ciclos na cidade do Salvador, na Rede pública de ensino, o currículo dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental possuía a característica mista, pois os dois primeiros anos de escolarização eram em ciclos e os demais anos eram seriados (3ª e 4ª séries). A figura a seguir ilustra tal característica:

Figura 2 – Organização da Educação Infantil e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental nas escolas públicas municipais da cidade do Salvador na fase inicial dos ciclos

Vale destacar que a aprovação do Programa de Aceleração de Aprendizagem, no CEB, 3ª e 4ª séries do Ensino Fundamental da Rede Municipal, a partir do ano de 1998, através da Resolução CME nº 001/98, alterada pela Resolução CME nº 005/2000, demonstrou que o fluxo dos alunos não foi satisfatoriamente regularizado apenas com a adoção do CEB em 1987. Em 2004, a Secretaria possuía um índice de 23,9 % de reprovação no Ensino Fundamental, principalmente no CEB II e 5ª séries, o que leva o Órgão Central a estipular a meta de reduzir este índice para 17% até 2008 (SALVADOR, 2005).

Com a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos (2007), a Secretaria Municipal de Educação da cidade do Salvador reformula seu currículo, ampliando a duração dos ciclos de dois para cinco anos (embora essa ação não estivesse prevista na política da instituição como estratégia para diminuir o índice de reprovação, podemos compreender que tal ampliação visava a este objetivo), conforme descrevemos na seção a seguir. Antes, é importante destacar quais são os discursos presentes no corpus da fase inicial da escola em ciclos na cidade do Salvador.

Os documentos categorizados como pertencentes à fase inicial dos ciclos demonstram uma tentativa da SMED em tornar essa organização curricular em um regime de verdade. Os enunciados acerca de currículo e avaliação convergem para uma formação discursiva desejada no período: busca por melhoria dos índices educacionais. Assim, as discussões das práticas pedagógicas eram permeadas pela necessidade do exercício de uma avaliação diagnóstica, processual e qualitativa, tendo como pano de fundo o Construtivismo. Para garantir esse tipo de avaliação, havia um discurso recorrente quanto aos documentos que deveriam ser utilizados como forma de registro e acompanhamento dos alunos: os diários de classe com pareceres descritivos e a marcação das habilidades alcançadas por bimestre, para cada aluno.

No que tange ao currículo, outros enunciados se fazem presentes no corpus da pesquisa: marcos de aprendizagem, competências e habilidades. Estes termos organizavam o currículo escolar, servindo de orientação básica para que professores planejassem o ano letivo, os semestres e as unidades didáticas, chegando até no planejamento de cada aula.

Além das orientações ditas mais pedagógicas em torno do currículo e da avaliação, havia um forte discurso de convencimento por parte da instituição SMED

em demonstrar que o currículo por ela ofertado possibilita que sejam contemplados todos os alunos em sua diversidade de ritmos de aprendizagem, pois a escola em ciclos permite uma flexibilização curricular. Tal discurso pode ser compreendido como referente à ideologia de uma escola inclusiva, o que era corroborado pela tendência nacional de outras secretarias municipais e estaduais que já estavam adotando os ciclos como organização curricular, conforme citado no corpus da pesquisa analisado.

Com o avançar dos anos, a SMED amplia suas bases teóricas para justificar a opção de adotar os ciclos de aprendizagem como organização curricular. Vejamos como isso se processou na fase intermediária da escola em ciclos.