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1. APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO: Teoria da Variação e Mudança

4.1 ANÁLISE GERAL: FREQUÊNCIA DE USO

4.1.3 Fator: subsistema pronominal no tratamento do interlocutor

Por conseguinte, levando em conta que há um padrão de distribuição do emprego pronominal brasileiro, com base em “três subsistemas de tratamento pronominal vigentes no Brasil na posição de sujeito: 1) tu; 2) você; e 3) você~tu)” (LOPES, 2011, p. 362), como afirmam Lopes e Cavalcante (2011),

em princípio, podemos dizer que atualmente coexistem pelo menos três subsistemas de tratamento na posição de sujeito – (i) você, (ii) tu e (iii)

você/tu. Em certas localidades o uso de você é prioritário ou exclusivo, em

outras prevalece o tu majoritário com ou sem concordância. Na maior parte do Brasil, entretanto, identifica-se a variação você/tu. (LOPES; CAVALCANTE, 2011, p. 37).

em que escreventes fazem uso exclusivo ou majoritário do você (subsistema 1); uso exclusivo ou majoritário do tu (subsistema 2); ou o emprego misto, em que o escrevente utiliza ambas as formas tu/você (subsistema 3). Com base nesses subsistemas, a distribuição das variantes concorrentes passa por uma nova regra variável. Vejamos a tabela 4 a seguir:

Tabela 4: distribuição das variantes linguísticas de acordo com o subsistema.

TE/TI/VOS/VÓS A/PARA/DE/EM + VOCÊ//TU LHE ELIPSE Subsistema 1 (Você) 37/483 – 7,7% 102/483 – 21,1% 255/483 – 52,8% 89/483 – 18,4% Subsistema 2 (Tu) 46/50 – 92% 0/50 – 0% 2/50 – 4% 2/50 – 4%

Subsistema 3 (Você~Tu)

17/77 – 22,1% 4/77 – 5,2% 1/77 – 1,3% 55/77 – 71,4%

Total 100/610 – 16,4% 106/610 – 17,4% 258/610 – 42,3% 146/610 – 23,9% Fonte: autoria própria.

O padrão de distribuição apresentado na tabela 4 mostra que o emprego dos pronomes de P2 estão categoricamente correlacionados ao uso majoritário de todo o paradigma original de segunda pessoa (subsistema 2) com 92% da frequência de uso. Isto é, escreventes do subsistema 2 empregam os pronomes acusativos/dativos em 92% das ocorrências de OI. Além disso, esse grupo não faz uso da variante mais inovadora, preposição + você. Enquanto isso, na escrita dos escreventes inseridos no subsistema 1, há uma maior concorrência entre as formas variantes, levando vantagem a alternativa lhe. Para aqueles que fazem uso misto, subsistema 3, a elipse apresenta-se como alternativa mais produtiva. É como se na dúvida do escrevente que transita pelos dois paradigmas, a elipse surgisse como variante linguística neutra, empregável para os dois pronomes em segunda pessoa.

Correlacionando os dados com os subsistemas de tratamento do sujeito, vemos que a escrita no Nordeste do Brasil, com base nos 3 Estados contemplados nesta pesquisa, encontra- se em um processo de mudança mais avançado na direção da variante preposição + você, quando comparamos com a frequência de uso encontrada nas cartas cariocas, do final do século XIX e início do século XX, como vemos em Lopes e Cavalcante (2011, p 57),

analisando a questão da correlação entre a expressão do dativo e o tratamento empregado ao interlocutor, alguns aspectos merecem destaque. Em primeiro lugar, o clítico dativo te é majoritário nas cartas em que o tratamento tu é exclusivo na posição de sujeito (quase 80%). Nas cartas em que se emprega apenas você para se dirigir ao destinatário, percebe-se um equilíbrio entre as estratégias para expressar o dativo. Nesse caso, o dativo nulo é o mais frequente com 30%, as outras estratégias apresentam valores bastante semelhantes: te com 27% e lhe com 29% de uso aproximadamente. É também nessas cartas que foi localizada a maior parte dos dados de a você (seis dos sete casos identificados). Cabe ainda ressaltar que nas cartas denominadas mistas (você/tu), o clítico te predomina ao lado do dativo zero: 68% e 16% respectivamente.

Não temos uma hipótese formulada sobre o motivo de a mudança em curso a favor da variante preposição + você desfrutar de um maior avanço nos Estados nordestinos pesquisados neste trabalho, o que pode vir a ser observado em pesquisa futura. Constata-se,

todavia, que enquanto ainda há equilíbrio no padrão de distribuição das variantes linguísticas concorrentes para o dativo entre a elipse com 30%, o te com 27% e o lhe com 29%, nas cartas do Rio de Janeiro, no subsistema 1 (V) – uso exclusivo ou majoritário do você; no RN, também no primeiro subsistema, as variantes preposicionadas já contavam com 21,1% do total de ocorrências, ao passo que o lhe contabilizava 52,8%, ficando a elipse com 18,4% e os pronominais de tu com apenas 7,7%. No subsistema 3 carioca, uso misto, ainda há o predomínio do pronome te com 68%, enquanto que no RN a maior produtividade neste subsistema fica com a elipse 71,4%, ficando o te com apenas 22%.

Comparando ainda com os resultados de Oliveira (2014), ainda no comparativo com os dados do RJ, o autor constatou a predominância do pronome te, como complemento dativo, nos três subsistemas. Mesmo entre os escreventes do subsistema 1 (usuários exclusivos ou majoritários do pronome você), o te mostrou-se como alternativa mais produtiva com 30,9%, superando a elipse com 29,1% e o pronome lhe com 27,3%. Apesar do predomínio da variante padrão, é no subsistema 1 carioca que há a maior produtividade da forma você preposicionado, confirmando o percurso da mudança em curso, em que primeiro o pronome você entra na função de sujeito, para só depois passar a ocorrer em outras funções, como a de OI.

Nos resultados encontrados nas cartas catarinenses, o subsistema 1, na segunda amostra de tempo (1932-1990), mostrou-se como restringidor aos pronomes originais de P2, ao passo que é neste subsistema que ocorrem as únicas 6 (seis) ocorrências da variante preposição + você. Na terceira amostra (1984-1992), o subsistema 1 também restringe a ocorrência do pronome te, enquanto favorece a elipse e o pronome lhe. Mais uma vez, confirma-se a tendência de que quem utiliza o pronome você em posição de sujeito também tende a fazer uso nas demais funções, apesar da ainda pouco expressiva frequência de uso da variante mais inovadora nas cartas catarineneses.

A tabela 4, apresentada um pouco mais acima, também nos fornece a informação de o quanto o paradigma de você como segunda pessoa já estava consolidado na escrita do Nordeste brasileiro no início do século XX. Isto é, de um total de 610 ocorrências, 483 foram realizadas por escreventes do subsistema 1, aqueles que fazem uso exclusivo ou majoritário do paradgma de você. Esse quantitativo consiste em cerca de 80% do total de dados contra pouco mais de 8% de escreventes do subsistema 2.