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O emprego das formas dativas de segunda pessoa na escrita do nordeste brasileiro do século XX: uma mudança em curso

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM MESTRADO EM LINGUÍSTICA ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: LINGUÍSTICA TEÓRICA E DESCRITIVA LINHA DE PESQUISA: VARIAÇÃO E MUDANÇA. FRANKLIN COSTA DA SILVA. O EMPREGO DAS FORMAS DATIVAS DE SEGUNDA PESSOA NA ESCRITA DO NORDESTE BRASILEIRO DO SÉCULO XX: uma mudança em curso. 2017.

(2) FRANKLIN COSTA DA SILVA. O EMPREGO DAS FORMAS DATIVAS DE SEGUNDA PESSOA NA ESCRITA DO NORDESTE BRASILEIRO DO SÉCULO XX: uma mudança em curso. Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Estudos da Linguagem (PPgEL), da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como um dos requisitos para a obtenção do título de mestre em Estudos da Linguagem. Orientador: Prof. Dr. Marco Antonio Martins. NATAL 2017.

(3) Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA Silva, Franklin Costa da. O emprego das formas dativas de segunda pessoa na escrita do nordeste brasileiro do século XX: uma mudança em curso / Franklin Costa da Silva. - 2017. 105f.: il. Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem, 2017. Orientador: Prof. Dr. Marco Antonio Martins. 1. Sintaxe. 2. Diacronia. 3. Variação. 4. Mudança. 5. Dativos. I. Martins, Marco Antonio. II. Título. RN/UF/BS-CCHLA. CDU 81'367.

(4) O EMPREGO DAS FORMAS DATIVAS DE SEGUNDA PESSOA NA ESCRITA DO NORDESTE BRASILEIRO DO SÉCULO XX: uma mudança em curso. Defesa de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem (PPgEL) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, por Franklin Costa da Silva, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Linguística.. BANCA EXAMINADORA. Prof. Dr. Marco Antonio Martins UFRN/UFSC (Presidente). Profa. Dra. Izete Lehmkuhl Coelho UFSC (Membro Externo). Profa. Silvia Regina de Oliveira Cavalcante UFRJ (Membro Externo). Profa. Dra. Maria Alice Tavares UFRN (suplente interno). Natal/RN, julho de 2017.

(5) Dedico esta pesquisa a todos os estudantes que assim como eu não se renderam/rendem às dificuldades em ter de estudar, pesquisar, trabalhar, ser pai, ser marido, ser filho, ser tudo concomitantemente em busca de um lugar à sombra....

(6) Agradecimentos Agradeço aos meus pais, Francisco Pereira da Silva e Francisca Costa da Silva, por terem superado todas as dificuldades cotidianas e financeiras e conseguido me dar uma boa educação intelectual e moral. Agradeço a minha esposa, Kadidja Hanny, por quase sempre ter tido paciência comigo, em ter de sacrificar finais de semanas, passeios, atividades familiares... para que eu pudesse atender aos prazos impostos pela agenda acadêmica. Agradeço ao meu filhão, Kláiverte Costa, pelas vezes que me presenteou com um sorriso ou com uma brincadeira, servindo-me de poderosa vávula de escape nas horas mais difícies. Agradeço a todos os professores que contribuíram com minha formação, desde o ensino fundamental até esta etapa que se conclui. Agradeço a meu amigo de todas as horas, o agora Mestre em Linguística, Sammy Vieira Carvalho Júnior. Tomamos muitos cafés enquanto quebrávamos as nossas cabeças discutindo nossas pesquisas e pensávamos em desisitir, até entendermos que desistir não é opção. Agradeço às professoras Dra. Shirley de Souza Pereira, Dra. Izete Lehmkuhl Coelho e Dra Rosane de Andrade Berlinck, por terem me auxiliado, quando da qualificação desta pesquisa, a encontrarem o rumo certo para avançar. Agradeço às professoras Dra. Silvia Regina de Oliveira Cavalcante, à Dra. Maria Alice Tavares e, mais uma vez, à Dra. Izete Lehmkuhl Coelho, que agora compõem a banca de defesa desta pesquisa. Agradeço, em especial, ao professor Dr. Marco Antonio Martins, um dos responsáveis, desde o terceiro semestre da graduação, a despertar em mim o amor pelos estudos acadêmicos, pela pesquisa, pela sintaxe... Nossos primeiros contatos foram por meio de embates sobre Gramática Gerativa. Dali brotou admiração, por minha parte, e acolhimento, por parte dele. A partir daí, foram anos de trabalhos acadêmicos: monitoria em disciplina, organização de eventos, projetos de pesquisas, especialização, mestrado. Tornou-se um amigo, orientador – um pai acadêmico. Meu muito obrigado a todos!.

(7) “Sorte é o que acontece quando capacidade encontra-se com oportunidade.” ― Sêneca.

(8) RESUMO. O EMPREGO DAS FORMAS DATIVAS DE SEGUNDA PESSOA NA ESCRITA DO NORDESTE BRASILEIRO DO SÉCULO XX: uma mudança em curso Na presente pesquisa, analisamos o emprego das formas dativas em contexto de segunda pessoa (singular e plural) em cartas privadas do Português Brasileiro (doravante PB), de três diferentes Estados do Nordeste, a saber, Rio Grande do Norte (RN), Pernambuco (PE) e Bahia (BA), correspondências redigidas no século XX. Constituem o nosso corpus exemplares compartilhados no site do corpus mínimo comum impresso do Projeto para a História do Português Brasileiro (PHPB). Subsidiaram nosso trabalho duas perspectivas teóricometodológicas: a Teoria da Variação e Mudança (TVM) (cf. WEINREICH; LABOV; HERZOG, 2012 [1968], doravante WLH; LABOV, 2008 [1972]) e a Teoria dos Princípios e Parâmetros (P&P), da Teoria Gerativa, (cf. CHOMSKY, 1995). Dessa forma, conduzimos uma análise qualitativa e quantitativa, buscando mapear e explicar a seguinte variável linguística: as formas dativas de segunda pessoa do singular e do plural (P2 e P5) em português brasileiro. Assim como, suas variantes linguísticas concorrentes: diferentes possibilidades de realização que concorrem para P2 e para P5, a exemplo dos pronominais te/ti, vos/vós, lhe, da elipse (ᴓ), além dos pronomes você, vocês e tu precedidos das preposições a/para/prá/de/em. Dentre os demais objetivos que guiam nossa pesquisa, destacamos o seguinte: pesquisar se a relação gramatical de OI (complemento indireto (CI) – “verdadeiro objeto indireto”) ou de complemento oblíquo (CO) restringe ou favorece, respectivamente, a implementação das variantes linguísticas concorrentes dos pronomes dativos. Tomamos como hipótese que as formas variantes concorrentes não sofreriam influência da relação gramatical de OI ou de OBL. No entanto, essas relações gramaticais mostraram-se como um dos mais importantes condicionadores da variação entre as formas competidoras. Após identificarmos e caracterizarmos os 610 dados presentes nas cartas, submetemo-os a rodadas no progama GoldVarb, elecando 10 (dez) variáveis independentes, sociais e linguísticas, o que nos remeteu a algumas regras variáveis. A análise dos dados, de forma geral, aponta para uma mudança em curso em favor das formas concorrentes do paradigma de você-tu preposicionados, passando antes pelas concorrentes lhe e a elipse (ᴓ), ficando as variantes da norma padrão te/ti e vos/vós restritas a contextos específicos, como comunicações envolvendo mais afetividade, mais informalidade. PALAVRAS-CHAVE: Sintaxe; Diacronia; Variação; Mudança; Dativos..

(9) ABSTRACT. THE USE OF THE DATIVE FORMS OF SECOND PERSON IN NORTHEASTERN LETTERS OF THE 20TH CENTURY: a change in progress In the present research, we analyze the use of dative forms in a second person context (singular and plural) in private letters of Brazilian Portuguese (hereinafter PB), from three different Northeastern states, namely Rio Grande do Norte (RN), Pernambuco (PE) and Bahia (BA); correspondences written in the 20th century. Our corpus consists of copies shared in the site of the common minimum printed corpus of the Project for the History of Brazilian Portuguese (PHPB). Two theoretical and methodological perspectives supported our work: The Theory of Variation and Change (TVM) (see WEINREICH, LABOV, HERZOG, 2012 [1968], hereinafter WLH, LABOV, 2008 [1972]) and the Theory of Principles and Parameters (P&P), Chomsky, 1995). This way, we conduct a qualitative and quantitative analysis, willing to map and explain the following linguistic variable: the second person singular and plural dative forms (P2 and P5) in Brazilian Portuguese. As well as its competing linguistic variants: different possibilities of realization that compete for P2 and P5, like the pronominal te / ti, vos / vós, of the ellipse (ᴓ), in addition to the pronouns você, vocês and tu preceded by the prepositions a / para / prá / de / em. Among the other objectives that guide our research, we highlight the following: to investigate whether the grammatical relation of OI (indirect complement (CI) - "true indirect object") or oblique complement (CO) restricts or favors, respectively, the implementation of competing linguistic variants of the dative pronouns. We hypothesized that the competing variant forms would not be influenced by the grammatical relationship of OI or OBL (CO). However, these grammatical relationships proved to be one of the most important conditioners of the variation amongst the competing forms. After identifying and characterizing the 610 data present within the letters, we submitted them to rounds in the GoldVarb program, electing 10 (ten) independent variables; social and linguistic ones, which referred us to some variable rules. In general, data analysis points to a change in progress in favor of the competing forms of the prepositioned você-tu paradigm, passing first by competitors lhe and the ellipse (ᴓ), leaving the standard variants of the standard Te / Ti restricted to specific contexts, such as communications involving more affectivity, more informality. KEY WORDS: Syntax; Diachrony; Variation; Change; Datives..

(10) LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1: distribuição geral das formas linguísticas realizadas em cartas do RN. ............ 71 Figura 2: distribuição das formas dativas em cartas do RJ .....................................................72 Figura 3: distribuição geral das formas linguísticas realizadas em cartas de SC .............. 73 Figura 4: concorrência entre as formas no eixo da temporalidade ......................................... 76.

(11) LISTA DE QUADROS Quadro 1. Caso morfológico. ................................................................................................... 43 Quadro 2. Herança Latina ........................................................................................................ 44 Quadro 3. Pronomes na GT ...................................................................................................... 45.

(12) LISTA DE TABELAS Tabela 1: distribuição geral das formas linguísticas realizadas. ............................................. 71 Tabela 2: distribuição das formas em função da temporalidade ..............................................75 Tabela 3: distribuição das variantes por tipo de complemento................................................77 Tabela 4: distribuição das variantes linguísticas de acordo com o subsistema ....................... 81 Tabela 5: distribuição das formas de acordo com a relação entre os escreventes. .................. 84 Tabela 6: distribuição das formas de acordo com o sexo do escrevente. ................................ 86 Tabela 7: distribuição das formas de acordo com o assunto discorrido nas cartas. .................87 Tabela 8: distribuição das formas concorrentes de acordo com o Estado (localidade). .......... 90 Tabela 9: distribuição e peso relativo das ocorrências das formas em função do tipo de complemento. ........................................................................................................................... 93 Tabela 10: distribuição e peso relativo das ocorrências das formas em função da forma de tratamento na posição de sujeito.............................................................................................. 94 Tabela 11: distribuição e peso relativo das ocorrências das formas em função da temporalidade ........................................................................................................................... 95 Tabela 12: distribuição e peso relativo das ocorrências das formas em função do sexo do escrevente. ................................................................................................................................ 96.

(13) SUMÁRIO. INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 15 1. APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO: Teoria da Variação e Mudança Linguística e a Teoria dos Princípios e Parâmetros ............................................................ 22 1.0 PALAVRAS INICIAIS ...................................................................................................... 22 1.1 TEORIA DA VARIAÇÃO E MUDANÇA – TVM (OU SOCIOLINGUÍSTICA VARIACIONISTA). ................................................................................................................24 1.2 TEORIA DOS PRINCÍPIOS E PARÂMETROS .............................................................. 31 1.3 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 34 2 DELIMITAÇÃO DO OBJETO: a sintaxe das formas dativas de segunda pessoa em Português Brasileiro .............................................................................................................. 36 2.0 PALAVRAS INICIAIS ...................................................................................................... 36 2.1 NOÇÃO DE CASO GRAMATICAL NO PORTUGUÊS ................................................ 37 2.2 OS PRONOMES DATIVOS E SUAS DIFERENTES VARIANTES EM PB PARA A SEGUNDA PESSOA ............................................................................................................... 42 2.3 DATIVIDADE E COMPLEMENTO INDIRETO EM PORTUGUÊS: HERDEIROS DO CASO DATIVO ...................................................................................................................... 49 2.3.1 Predicação verbal e o argumento interno indireto .................................................... 50 2.4 CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO ............................................................... 56 3 O CORPUS E SUA COMPOSIÇÃO, EM BUSCA DA VARIÁVEL LINGUÍSTICA E SUAS VARIANTES .............................................................................................................. 58 3.0 PALAVRAS INICIAIS .................................................................................................... 58 3.1 O CORPUS E SUA COMPOSIÇÃO ................................................................................. 59 3.1.1 Composição do grupo A (RN).......................................................................................60 3.1.2 Composição do grupo B (PE) ....................................................................................... 60 3.1.3 Composição do grupo C (BA) ...................................................................................... 61 3.2 AS VARIANTES LINGUÍSTICAS CONCORRENTES .................................................. 62 3.3 CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO ................................................................. 66 4 DATIVIDADE NA ESCRITA NORDESTINA: analisando os dados ........................... 68 4.0 PALAVRAS INICIAIS ...................................................................................................... 68 4.1 ANÁLISE GERAL: FREQUÊNCIA DE USO ........................................................................ 71 4.1.1 Fator: tempo .................................................................................................................. 74 4.1.2 Fator: tipo de complemento ......................................................................................... 77 4.1.3 Fator: subsistema pronominal no tratamento do interlocutor ................................. 81 4.1.4 Fator: relação social entre os escreventes ................................................................... 84 4.1.5 Fator: sexo do escrevente ............................................................................................. 86 4.1.6 Fator: assunto predominante nas cartas ..................................................................... 87 4.1.7 Fator: localidade ........................................................................................................... 90 4.1.8 Fatores: tipo de preposição e item lexical ................................................................... 91.

(14) 4.2 ANÁLISE DE REGRA VARIÁVEL: RODADA BINOMIAL.........................................92 4.3 CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO................................................................. 97 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 99 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 103.

(15) 15. INTRODUÇÃO. Nesta dissertação, analisamos o emprego das formas dativas em contexto de segunda pessoa (singular e plural) na complememtação verbal indireta, em cartas privadas de três diferentes Estados do Nordeste brasileiro do século XX: Rio Grande do Norte (RN), Pernambuco (PE) e Bahia (BA). Constituem o nosso corpus exemplares compartilhados no corpus mínimo comum impresso do Projeto Para a História do Português Brasileiro – PHPB1. Conduzimos nossa pesquisa com base em duas perspectivas teórico-metodológicas: a Teoria da Variação e Mudança (TVM) (cf. WEINREICH; LABOV; HERZOG, 2012 [1968], doravante WLH; LABOV, 2008 [1972]) e a Teoria dos Princípios e Parâmetros (P&P), da Teoria Gerativa, (cf. CHOMSKY, 1995). Assumimos que a Língua, enquanto conhecimento, por ser fruto de uma dotação genética própria ao homem, amadurece e desenvolve-se na mente/cérebro do indivíduo, como organismo vivo que é, com o auxílio das relações sociais estabelecidas por meio do ambiente (cf. WLH, 2012 [1968]). Logo, para dar conta do processo de variação e possível mudança linguísticas pelos quais passaram/passam as formas dativas no Português Brasileiro (PB), e de modo mais específico o PB escrito no Nordeste do Brasil no século XX, utilisamos dados da Língua-E2 (externa, extensional, em uso) – de língua escrita – advindos de cartas pessoais escritas no século XX para teorizar sobre o conhecimento linguístico – Língua-I3 – dos escreventes. Nesse ambiente, podemos encontrar e observar, por meio da língua em uso, a propagação da variação e a competição das variantes linguísticas, sob a ótica dos pressupostos da (TVM). Para dar conta do que concerne à LínguaI (intencional, involuntária, capacidade de uso) e suas categorias de análise e descrição linguísticas, fizemos uso da P&P, da Teoria Gerativa. Dessa forma, conduzimos uma análise qualitativa e quantitativa, buscando responder a alguns dos problemas empíricos elencados pela TVM, quais sejam: a) encaixamento; b) 1. O corpus utilizado nesta pesquisa encontra-se disponível no site do PHPB: https://sites.google.com/site/corporaphpb/home/corpora-manuscritos. No capítulo 3, apresentaremos e detalharemos o corpus aqui pesquisado. 2. A língua-E, na Teoria Gerativa, é considerada um subproduto, um epifenômeno, um objeto exteriorizado fruto do comportamento linguístico real (CHOMSKY, 1995). Esse conceito de língua leva em conta sua dimensão sociocultural, adotada como um fenômeno histórico e político: um código linguístico compartilhado, uma língua natural – “o comportamento linguístico real ou potencial e seus produtos” (CHOMSKY, 1995, p. 43). A Língua-I na Teoria Gerativa é vista como “um mecanismo que gera um conjunto infinito de expressões” (CHOMSKY, 1995, p. 18). A língua-I trata-se da parte cognitiva que subjaz à própria linguagem, “um elemento que existe na mente da pessoa que conhece a língua, adquirido por quem aprende e usado pelo falante-ouvinte.” – “o sistema de conhecimento atingido por um indivíduo”. (CHOMSKY, 1995, p. 41). 3.

(16) 16. transição e c) implementação (cf. WLH (2012 [1968], p. 121-125); Labov, (2008 [1972], p. 326); Lucchesi (2004, p. 173-180); Coelho, Gorski, Souza e May (2015, p. 76-95)). Levamos em conta o processo de mudança em tempo real (i.e. a evolução histórica da língua no decorrer temporal), delimitando o recorte diacrônico em três momentos históricos: tempo I (1900 a 1930), tempo II (1931 a 1970) e tempo III (1971 a 1999). A variável linguística pesquisada no presente trabalho é o emprego das formas dativas de segunda pessoa do singular e do plural (P2) em complementos verbais indiretos, a partir de cartas privadas de três estados nordestinos. Suas variantes linguísticas concorrentes, sobre as quais nos debruçamos e controlamos, são as formas que concorrem para P2 no PB (te/ti/vos/vós, lhe, elipse (ᴓ), pronomes você-tu preposicionados). Unimos em um mesmo grupo as formas morfológicas de P2 e de P5 porque aparecem empregadas referindo-se ao interlocutor (2ª pessoa do singular). Seguem alguns exemplos dos dados encontrados no corpus com o qual trabalhamos: (1). venho | mesmo com a pobreza de minha inte- | ligencia diser-te que/ Hoje destante de ti4. (Ruzinete a Lourival, Patu, 26 de-2-1946).. (2). Não mandei hotem as gallinhas (ᴓ) (João a Theodosio de Paiva, Monte Alegre 8-05-1917) e para remeter o dito algodão (ᴓ). (João a Theodosio de Paiva, Monte Alegre, 4-10-1918).. (3). lhe mandei por | José Carambola, que ja lhe forneci | as listas (João a Thodosio de Paiva, Monte Alegre, 6-06-1917).. (4). agradeço | tudo isto a você. (Walter a Lucinha, Diadema, 21-07-1994).. (5). Lucinha | liguei prá voce no dia de seu aniversario. (Walter a Lucinha, sem local e data).. (6). 4. Para você milhoes de beijos. (Walter a Lucinha, sem local e data).. Apresentaremos exemplos que abarcam todo o ambiente de datividade: a noção semântica de destinatário, beneficiário, meta, origem, etc., perpassando relações sintáticas que vão além da complementação verbal (complemento indireto e complemento oblíquo), a exemplo de complementos de nome e de adjuntos, como ocorre nos exemplos acima (1) e (6). No entanto, no levantamento estatístico dos dados, serão levadas em conta apenas as variantes linguísticas na relação gramatical de complementação verbal indireta. O conceito de datividade e a discussão sobre divisão de complemento verbal indireto serão trabalhados no capítulo 2..

(17) 17. Os exemplos acima representam parte das diversas formas de realização do ambiente de datividade, do qual nos interessam os complementos verbais de segunda pessoa. Para investigarmos se essa variação linguística acima é estável ou pressupõe uma possível mudança em curso, elencamos algumas variáveis independentes para, de acordo com os pressupostos teórico-metodológicos da TVM, submetermo-as ao programa do pacote estatístico GoldVarb 2001 (cf. Robinson; Lawrence; Tagliamonte, 2001). Assim, observamos a frequência de uso e o peso relativo PR. no padrão de distribuição das variantes, levando em conta fatores linguísticos e não linguísticos, como: (i) forma linguística empregada, (ii) temporalidade, (iii) tipo de complemento, (iv) forma de tratamento pronominal na posição de sujeito, (v) item lexical, (vi) tipo de preposição, (vii) relações sociais entre os escreventes, (viii) sexo do escrevente, (ix) conteúdo temático predominante nas cartas e (x) localidade. Sabendo que a variação e a mudança são inerentes a todas as línguas naturais, quando assumidos tais pressupostos da TVM e a observação empírica no contínuo temporal, acreditamos que trabalhos como este podem dar uma valorosa contribuição junto à sociedade acadêmica, fazendo com que a variável linguística continue a ser mapeada e entendida no território brasileiro. Afinal, como afirmam Coelho et al (2015, p. 8), o surgimento de uma proposta de análise sistemática desses fenômenos representa, portanto, um importante marco no desenvolvimento da ciência linguística, e já nos trouxe valiosos conhecimentos acerca de como se comporta a variabilidade nas línguas. Esses conhecimentos, por sua vez, contribuem para o entendimento de questões como a do preconceito linguístico e para a construção de uma prática pedagógica consciente e reflexiva acerca dos usos linguísticos no ensino de língua materna.. Dessa forma, corroboramos com a assertiva de que todo processo de variação e de mudança é sistemático, o que nos cabe investigar o encaixamento dessa variável com as demais no sistema linguístico; a transição que envolve esse processo de variação e possível mudança; além da implementação dessas concorrentes variantes em relação aos dativos de segunda pessoa. Mesmo com o papel mantenedor de certa unidade linguística que as gramáticas normativas exercem, o falante opta, voluntária ou involuntariamente, pelas formas mais produtivas (em seu vernáculo), o que acaba por reforçar a própria produtividade dessas concorrentes, seguindo o fluxo de evolução da sua língua, em conformidade com Coelho et al (2015, p. 7):.

(18) 18. numa língua, não existe apenas uma forma para cada significado. O que existe são variantes, um conjunto de opções do qual retiramos as formas que empregamos ao falar e ao escrever. Essa escolha, contudo, não é aleatória: há motivações de toda ordem nos guiando no constante processo de formulação linguística.. Observamos, portanto, que independentemente de existirem formas julgadas como “certas” ou “erradas”, a língua pode mudar e tem a variação como fator intrínseco à sua realização (exteriorização). Surgiram-nos, então, os seguintes questionamentos que nortearam este trabalho de investigação: 1.. Na diacronia do Português escrito no Brasil do século XX (a partir de cartas de 3 estados do NE), são produtivas ainda, de fato, formas pronominais de P2 e P5 com caso morfológico, no que se refere às formas dativas de segunda pessoa? Ou, dito de outro modo, qual a produtividade das formas pronominais dativas com caso morfológico te/ti e vos/vós?. 2.. Qual o percurso diacrônico seguido pelas formas dativas de 2ª pessoa no português escrito no NE do Brasil do século XX? Como se dá tal transição?. 3.. A análise dessa variável linguística apontará para mudança em curso ou para variação estável ao longo do século XX?. 4.. As ocorrências do lhe podem estar associadas à hierarquia social, semelhante ao uso do tu/você na sincronia do PB falado no Brasil?. 5.. A relação gramatical de complemento indireto (CI), “verdadeiro objeto indireto”, ou de complementação oblíqua (CO) ocorre como fator (contexto) de resistência dos pronomes dativos de tu P2 ou como favorecedor da variante preposicionada preposição + você, no NE brasileiro?. Tomamos como hipóteses a esses questionamentos: 1.. No Português Brasileiro, mesmo no sistema pronominal de complementos, temos Caso abstrato, inclusive diante de resquícios de marcação morfológica em algumas formas pronominais..

(19) 19. 2.. Os pronomes com resquício de caso dativo de 2ª pessoa do singular e do plural (te/ti e vos/vós) estão cedendo lugar, gradativamente, a formas variantes inovadoras (lhe/elipse e você-tu preposicionados).. 3.. Aventamos que os resultados desta pesquisa apontarão para mudança em curso, em relação a P2, na direção da variante você-tu preposicionados.. 4.. A pessoa do interlocutor pode influenciar na escolha de formas como o lhe, de acordo com a hierarquia social que envolve os interlocutores na interação da escrita das cartas.. 5.. Apesar de as formas concorrentes (consideradas do paradigma de você) serem implementadas de formas diferentes, concorrendo com as formas de Tu, acreditamos que a relação gramatical de OI ou de OBL não exerçam restrição ou favorecimento das ocorrências das formas inovadoras (cf. GALVES et al, 2016, p. 126).. A partir da problematização e reflexão ocasionada pelo conhecimento da variável linguística selecionada como objeto de pesquisa, podemos traçar os objetivos aos quais queremos chegar com a conclusão desta dissertação. Logo, objetivando responder a esses questionamentos e confirmar ou refutar as hipóteses levantadas, traçamos como objetivos gerais: (i). Investigar se as formas com o antigo caso morfológico dativo ainda estão ativas na escrita no Brasil do século XX, verificadas por meio da escrita nordestina com base em três estados, ou se são resquícios de uma gramática arcaica.. (ii). Delinear o percurso diacrônico seguido por esses pronomes dativos de 2ª pessoa e seus concorrentes na escrita do Nordeste brasileiro, a partir de 3 Estados representados no corpus.. (iii). Pesquisar se essa variável linguística apontará para mudança em curso ou para variação estável.. (iv). Observar se variantes independentes de caráter social exercem pressão de alguma forma favorecendo ou restringindo a ocorrência do pronome átono lhe..

(20) 20. (v). Analisar se a relação gramatical estabelecida entre o verbo e seu complemento (OI ou OBL) restringe ou favorece a implementação das formas concorrentes dos pronomes dativos.. Traçamos como objetivos específicos: (a). quantificar as ocorrências das formas variantes concorrentes de segunda pessoa em contextos de caso dativo no PB, em cartas pessoais de três estados da região Nordeste do Brasil (RN, PE e BA) no século XX;. (b). analisar a distribuição dos dados ao longo do século XX para deixar claro o percurso seguido pelas variantes dativas de P2;. (c). apontar se os resultados da pesquisa indicam mudança em curso ou variação estável;. (d). pesquisar se a relação social entre os escreventes e os assuntos discutidos nas cartas favorecem a forma concorrente lhe;. (e). Analisar se a grade temática ou prototipicidade do item lexical favorece ou restringe as formas dativas, atentando se são argumentais ou não argumentais;. (f). apresentar como esses condicionadores linguísticos e extralinguísticos favorecem ou restringem as diferentes variantes da variável em estudo;. (g). mostrar a frequência de uso de cada variante linguística concorrente, de acordo com cada variável independente elencada.. Por conseguinte, a presente pesquisa está organizada da seguinte forma: no capítulo 1, apresentamos os pressupostos teórico-metodológicos que embasam e dão suporte ao presente estudo; no capítulo 2, delimitamos nosso objeto de estudo, esclarecendo alguns entendimentos e assunções aqui adotados, com base em breve revisão da literatura linguística; na sequência, no capítulo 3, apresentamos nosso corpus, expondo e quantificando as cartas selecionadas, disponíveis no domínio público; no capítulo 4, conduzimos nossa análise empírica quantitativa e qualitativa, observando, principalmente, os condicionadores da variação linguística em foco e o provável processo de mudança em curso; ao final da pesquisa, expomos nossas considerações finais acerca do trabalho realizado e,. por último,.

(21) 21. exibimos as referências bibliográficas, esclarecedoras e motivadoras das reflexões aqui presentes..

(22) 22. Capítulo 1. APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO: Teoria da Variação e Mudança e Teoria dos Princípios e Parâmetros. 1.0 PALAVRAS INICIAIS. Há muito tempo que a linguagem desperta o interesse de estudiosos. Na cultura ocidental, ainda na antiguidade clássica, os filósofos gregos estudaram as regras da língua. Os filólogos os sucederam com um fim menos normativo e mais descritivo, chegando a um ponto em que recuperavam línguas mais antigas e as comparavam com outras então contemporâneas. Os neogramáticos no curso do século XIX avançaram ainda mais, desenvolvendo e buscando renovar tais estudos linguísticos comparativos, dando prosseguimento à Linguística Histórica; por conseguinte, Saussure e Chomsky delimitaram mais cientificamente os estudos linguísticos em relação a seus precursores, objetivando atribuir-lhes um status de ciência autônoma (cf. FARACO, 2014), cada qual com seu respectivo ponto de vista. Sistematizando contribuições de pesquisadores como Galchat, sobre “a mudança linguística em progresso” (cf. LUCCHESI, 2004, p. 166), e refutando vários dos postulados formais, WLH (2012 [1968]) correlacionaram os estudos da mudança linguística com o viés social, como iniciara Antonie Melliet anos antes. De acordo com Calvet (2013 [2002], p. 15), “Enquanto Saussure opõe linguística interna e linguística externa, Meillet as associa; enquanto Saussure distingue abordagens sincrônica e diacrônica, Meillet busca explicar a estrutura pela história”. Fundamentam esta pesquisa duas perspectivas teórico-metodológicas: a Teoria da Variação e Mudança – TVM (WLH 2012 [1968], LABOV 2008 [1972]), e a Teoria dos Princípios e Parâmetros – P&P, da Teoria Gerativa, (CHOMSKY 1994 [1986]; 1995). Assumimos que a língua, por ser fruto de uma dotação genética própria ao homem (cf. CHOMSKY, 1995), amadurece e desenvolve-se, como organismo vivo que é, com o auxílio das relações sociais estabelecidas entre os indivíduos que a usam em seus comportamentos. linguísticos. reais. (cf.. WLH,. 2012. [1968]; CHOMSKY, 1994)..

(23) 23. Compactuamos com a acepção gerativista a qual versa que há uma componente na mente/cérebro do indivíduo chamada de Faculdade da Linguagem - FL. A partir da FL, inata a qualquer indivíduo (salvo patologias), Chomsky (1994 [1986]) distingue as noções de Língua em Língua-I e Língua-E, respectivamente, como “um sistema de regras e de princípios que atribui representações de forma e de significado a expressões linguísticas” (p. 51) e “um conjunto (ou sistema) de ações ou comportamentos [linguísticos] de um certo tipo” (p. 39). Isto é, a língua como o conhecimento que se domina, uma língua natural – por exemplo, e o uso que dela pode ser realizado (comportamentos linguísticos), respectivamente. Dito ainda de outra forma, a FL possibilita, com base em seu nível de maturação final – que compreende do estágio inicial ao estágio relativamente estável –, a Língua-I: uma língua composta por princípios universais comuns a todas as línguas e por parâmetros marcados diferentemente para uma ou outra língua, “o sistema de conhecimento que sustenta o uso” (CHOMSKY, 1994 [1986]). Essa concepção de língua reside na capacidade linguística que subjaz a sua exteriorização; esta vista como um epifenômeno, chamado de Língua-E. Associamos essas duas Teorias, trabalhando em relação de complementaridade, com a Teoria Gerativa ocupando-se da Língua-I, a própria capacidade de produzir e compreender língua, na qual reside a formatação linguística, e com a Teoria da Variação e Mudança debruçando-se sobre o processo de mudança pelo qual os dativos de P2, a partir da escrita do Nordeste brasileiro, podem estar passando, o qual é mais facilmente observado empiricamente por meio da Língua-E, a língua socializada entre os indivíduos. Assim, não propomos um “casamento” entre essas Teorias, mas a aplicação de ambas dando conta daquilo que se propõem a estudar. Dessa forma, é pesquisando e sistematizando registros linguísticos com base na Língua-E que a TVM dá conta das mudanças nas línguas naturais; é nesse campo que a língua é social e dinâmica e tem a variação no uso como algo inerente. O epifenômeno do Gerativismo torna-se o objeto da pesquisa sociolinguística. Afinal, como bem afirmam Tarallo e Kato (1989 [2007], p. 37), já vai longe o tempo em que os estudos sobre a linguagem se debatiam entre o “ser empírico” e o “ser racionalista”. [...] nada mais natural e esperado, no crescimento e desenvolvimento da ciência, que um modelo (de análise gramatical, no caso) se reformule a partir da constatação de suas próprias limitações. Simplesmente, a gramática gerativa chegou a um momento em.

(24) 24. que aqueles dados trans-lingüísticos e diacrônicos, dantes considerados como marginais à argumentação interna à teoria, assumem papel de destaque.. Logo, a ciência linguística, como propõem Tarallo e Kato (1989 [2007]), só tem a ganhar quando teorias se reformulam, buscando dar conta de um número maior de possibilidades, a exemplo da flexibilização dos universais linguísticos e do abandono à ênfase demasiada ao “dado bruto”. Interface essa não meramente como uma teoria a serviço da outra, mas como uma relação de simbiose, em que as duas só ganham. Sobre a necessidade dessa interface, ainda, colaboram Martins, Coelho e Cavalcante (2015, p. 306), quando afirmam que é importante dizer que entendemos que a interface entre a teoria da variação e mudança e teorias linguísticas se faz sempre necessária para a explicação de um dado fenômeno linguístico, tendo em vista o fato de não ser o foco da teoria da variação e mudança a explicação linguística em si e por si, mas a teorização do processo de mudança linguística, entendido sempre como o resultado de um processo de variação. Nesse sentido, a teoria da variação e mudança não se propõe (e nunca se propôs) a explicar o fenômeno linguístico, mas o processo de mudança resultado da variação sistemática e inerente a toda e qualquer língua natural.. 1.1 TEORIA DA VARIAÇÃO E MUDANÇA – TVM (OU SOCIOLINGUÍSTICA VARIACIONISTA). Nesta seção, apresentamos e discutimos, de forma sucinta, os pressupostos teóricometodológicos que norteiam esta pesquisa, com base na Teoria da Variação e Mudança, também conhecida como Sociolinguística Variacionista ou Laboviana, de acordo com os postulados de WLH (2012 [1968]) e de Labov (2008 [1972]). Objetivamos expor, de forma não exaustiva, os mecanismos teórico-metodológicos dessa corrente teórica, que encontrou no Brasil terreno fértil para progredir, embasando a pesquisa sobre diversos fenômenos variáveis. Essa linha teórica interessa-se em estudar a variação e a mudança linguística, levando em conta o viés social. Apesar de a sociolinguística não ser a pioneira com a pesquisa da mudança linguística, foi a primeira corrente teórica a correlacionar, de forma sistemática, a mudança linguística à variação da língua em uso e suas implicações sociais. Para dar conta desse empreendimento, WLH desenvolveram a erosão das importantes dicotomias Saussurianas – língua vs fala e sincronia vc diacronia. Trabalho já iniciado por Martinet, considerado por Labov “um daqueles que ‘haviam consistentemente erodido’ a. rígida.

(25) 25. dicotomia saussuriana entre análise sincrônica e diacrônica, através de suas análises estruturais ocorridas no passado”. (cf. LABOV (1972) apud LUCCHESI (2004, p. 165)). Mas foi a partir de Gauchat (1905) que a mudança linguística em progresso foi tomada como objeto de estudo pela primeira vez, configurando-se, dessa forma, o “protótipo” da análise sociolinguística (cf. LUCCHESI, 2004, p. 166). Necessitavam, ainda, refutar o axioma da homogeneidade linguística e encarar a língua como uma realidade inerentemente variável e ordenada. Logo, “propõem, então, que o axioma da homogeneidade seja abandonado, instaurando-se em seu lugar o axioma da heterogeneidade ordenada.” (WLH, 2012 [1968], p. 13). A partir das fundantes pesquisas de Martha’s Vineyard e da Estratificação social do inglês na cidade de Nova York, Labov desenvolve um aparato teórico-metodológico quantitativo, sem deixar de ser qualitativo. Nele, identificam-se e descrevem-se detalhadamente variáveis linguísticas e suas respectivas variantes concorrentes em determinada comunidade de fala, entendida, de acordo com Labov (2008 [1972], p. 150), como: a comunidade de fala não é definida por nenhuma concordância marcada pelo uso de elementos linguísticos, mas sim pela participação num conjunto de normas compartilhadas; estas normas podem ser observadas em tipos claros de comportamento avaliativo explícito e pela uniformidade de padrões abstratos de variação que são invariantes no tocante a níveis particulares de uso [grifo nosso].. Tomando como base essa definição de comunidade de fala por Labov, julgamos necessário ampliar esse conceito de acordo com (GUY, 2000; 2001, p. 18 apud WIEDEMER, 2009, p. 1): Baseado na proposta laboviana, Guy (2000; 2001) apresenta algumas propriedades frequentes na literatura sociolinguística sobre CF [Comunidade de Fala], que podem ser assim resumidas: a) Características linguísticas compartilhadas: isto é, palavras, sons ou construções gramaticais que são usadas na comunidade, mas não fora dela. b) Densidade de comunicação interna relativamente alta: isto é, as pessoas normalmente falam mais com outras que estão dentro do grupo do que com aquelas que estão fora dele. c) Normas compartilhadas: isto é, “atitudes em comum sobre o uso da língua, normas em comum sobre a direção da variação estilística, avaliações sociais em comum sobre variáveis linguísticas” (GUY 2000, p. 18, grifo nosso). [grifo do autor].

(26) 26. Munida dessas noções teóricas de comunidade de fala e buscando entender de forma consistente a trajetória de uma mudança em curso ou de uma variação estável, a TVM objetiva responder aos cinco problemas empíricos para uma teoria da mudança, quais sejam: a) restrição; b) avaliação; c) encaixamento; d) transição e e) implementação (cf. WLH (2012 [1968], p. 121-125), LABOV, (2008 [1972], p. 326), LUCCHESI (2004, p. 173-180), COELHO, et al, (2015, p 76-96)). a) o problema da restrição Entendamos o problema da restrição como o responsável por se debruçar sobre as condições e os princípios linguísticos necessários à viabilização de uma mudança linguística. Isto é, uma mudança na língua só será viável, possível numa dada língua, caso a própria estrutura da língua a permita. Trata-se de observar regras internas à estrutura, “as quais apontam para regularidades ou tendências gerais” (cf. COELHO et al, 2015, p. 77). Deve ser ressaltada a importância de investigar a restrição dos mecanismos linguísticos viáveis à mudança, “inseridos na matriz social e sujeitos à ação de fatores de natureza diversa”. Surge como questão cerne deste problema: qual é o conjunto de mudanças possíveis e de condições para mudanças que podem ocorrer em uma determinada estrutura? (COELHO et al, 2015, p. 77-79). b) o problema do encaixamento O problema do encaixamento diz respeito à harmonia existente entre os vários fenômenos em variação que estão em processo de mudança ou que a mudança já tenha ocorrido. Isto é, como um fenômeno de variação linguística se encaixa na estrutura da língua e em sua matriz social? A resposta a esse questionamento mostra que as variáveis linguísticas não estão soltas de forma aleatória, mas sim uma interligada a outra. Uma mudança linguística pode condicionar uma nova mudança ou mostrar tendências relacionadas a ela, mostrando suas causas e consequências dentro do mesmo sistema linguístico. Toma-se como questão principal desse problema: como as mudanças estão encaixadas na estrutura linguística e social? (COELHO et al, 2015, p. 79-83). c) o problema da transição O problema da transição versa sobre as diferentes fases pelas quais as mudanças linguísticas passam, durante sua propagação e estabilização. Dito de outra forma, como a.

(27) 27. mudança vai sendo transmitida de um falante a outro, de uma comunidade a outra, de uma geração a outra, levando em conta a coexistência das variantes linguísticas e a progressiva substituição da forma mais conservadora pela concorrente inovadora. Por meio do problema da transição, é possível constatar, no curso do tempo, como uma variante vai se difundindo paulatinamente e se afirmando como forma mais produtiva dentre as concorrentes de um mesmo fenômeno variável. A questão central desse problema empírico é como as mudanças passam de um estágio a outro? (cf. COELHO et al, 2015, p. 84-91). d) o problema da avaliação O problema da avaliação concerne na atitude tomada pelo falante em relação às variantes linguísticas em coocorrência ou concorrência para determinada variável linguística em seu sistema linguístico. Tal posicionamento pode ser positivo ou negativo e estar mais estreitamente interligado à avaliação linguística ou à avaliação social. Aquela diz respeito à “eficiência comunicativa na interação social” por parte das variantes (COELHO et al, 2015, p. 92). Isto é, as formas inovadoras ou até mesmo as conservadoras são úteis à comunicação de determinada comunidade de fala? Já a avaliação social tem um caráter mais comportamental em relação, por exemplo, ao gozo de prestígio ou não por uma variante linguística. As concorrentes linguísticas podem receber uma significação social como “feia” ou “bonita”, por exemplo, que pode influenciar diretamente no curso da possível mudança, favorecendo-a ou até mesmo a restringindo. Aqui podemos alocar as noções de indicador, marcador ou estereótipo (cf. COELHO et al, 2015, p. 91-93). Vejamos o que diz Labov (2008 [1972], p. 360) a respeito dos indicadores, marcadores e estereótipos: podemos classificar os diversos elementos envolvidos na mudança linguística segundo o tipo de avaliação social que eles recebem. Indicadores são traços linguísticos encaixados numa matriz social, exibindo diferenciação segundo a idade e o grupo social, mas que não exibem nenhum padrão de alternância estilística e parecem ter pouca força avaliativa. A fusão de hock e hawk e a extensão de anymore podem ser tomadas como casos exemplares. Marcadores como (eh) ou (r), por sua vez, exibem estratificação estilística tanto quanto estratificação social. Embora possam estar abaixo do nível de consciência, produzirão respostas regulares em testes de reação subjetiva. Estereótipos são formas socialmente marcadas, rotuladas enfaticamente pela sociedade. [grifo nosso].

(28) 28. Assim, com base na significação social que o falante pode atribuir às formas linguísticas em variação e possível mudança, surge como questionamento principal desse problema empírico: como as mudanças podem ser avaliadas em termos de seus efeitos sobre a estrutura linguística, sobre a eficiência comunicativa e sobre o amplo espectro de fatores não representacionais envolvidos no falar? (COELHO et al, 2015, p. 93). e) problema da implementação Este quinto problema empírico está estreitamente ligado aos outros quatro (principalmente ao encaixamento), haja vista que parece ser impossível tentar responder-lhe sem antes responder aos demais. Isto é, para entendermos o problema da implementação, devemos recorrer às pistas que a mudança linguística deixou ou pode ter deixado em seu percurso. Em outras palavras, aqui buscamos explicar quais são as prováveis causas que possam ter originado a mudança e que tenham favorecido a sua propagação. As possíveis motivações podem ser de caráter linguístico ou social, sendo observadas por meio dos quatro problemas já apresentados (cf. COELHO et al, 2015, p. 93-95). Apresenta-se como questionamento norteador deste problema: a que fatores se pode atribuir a implementação das mudanças?; por que uma mudança ocorre em uma língua em uma época e não em outras? (COELHO et al, 2015, p. 95). Embasadas nesses cinco problemas empíricos, as pesquisas labovianas tornaram-se clássicas para quem se disponha a estudar a variação e a mudança linguística no decorrer do tempo, seja em seu recorte numa análise em tempo aparente, observando o “comportamento diferenciado dos falantes em várias faixas etárias.” (LABOV, 2008 [1972], p. 318); seja em seu recorte no tempo real, investigando se são “captada pelo comportamento linguístico retratado ao longo de diferentes períodos (abordagem diacrônica)” (COELHO et al, 2015, p. 88). Com isso, após o rompimento do axioma da homogeneidade, muitos pesquisadores despertaram para a possibilidade de análise e sistematização do aparente “caos” linguístico que sempre esteve associado ao uso, principalmente à fala – enfim, à variação linguística –, mas que fora deixado de lado pelos estudiosos que se debruçaram no estudo da mudança linguística até então (cf. TARALLO, 2007). Nesse ínterim, se o pesquisador optar pelos estudos da variação e mudança da língua, levando em conta o falante e sua produção linguística em uso, terá de analisar a evolução da multifacetada e dinâmica língua em uso, considerando “três questões fundamentais sobre.

(29) 29. mudança linguística”, a saber: a) o lugar da variação social; b) o nível de abstração e c) a função da diversidade. (LABOV, 2008 [1972], p. 313-315). Contemplando a questão em “a”, é necessário investigar até que ponto a variação estilística, emprego da língua de forma mais ou menos monitorada no contexto social, pode interferir no percurso da mudança linguística. Labov (2008 [1972], p. 315) esclarece o que deve ser entendido por variação social e estilística: a variação social e estilística pressupõe a opção de dizer “a mesma coisa” de várias maneiras diferentes, isto é, as variantes são idênticas em valor de verdade ou referencial, mas se opõem em sua significação social e/ou estilística.. Em relação à “b”, o nível de abstração, devemos observar se os fatores sociais têm força suficiente para afetar as regras gramaticais e fonológicas – relações abstratas mais resistentes às influencias externas – já estabelecidas numa comunidade de fala. No que concerne à “c”, a função da diversidade, temos de refletir sobre se a evolução linguística adapta-se à diversificação linguística, como apresenta Labov (2008 [1972]). Partindo da premissa de que a língua é um objeto inerentemente variável e estruturalmente ordenado, Labov observou que a variação é o primeiro passo para que possa ocorrer uma mudança linguística. Assim, segue crescente esta linha de estudos que elenca, como questão fundamental, a busca pela resposta ao seguinte questionamento: “Se uma língua tem de ser estruturada, a fim de funcionar eficientemente, como ela funciona enquanto a estrutura muda?” (WLH, 2012 [1968], p. 87). Visando responder a esse questionamento norteador da teoria, foi desenvolvido um sólido método de análise característico do estudo da variação e mudança linguísticas, como, por exemplo, o método de coleta de dados empíricos; as análises qualitativa e quantitativa; a análise de uma ou de várias sincronias; além dos cinco problemas empíricos, já apresentados, os quais o pesquisador deve buscar responder e estabelecer reflexões. Neste trabalho, buscamos responder a três dos cinco problemas, a saber: encaixamento, transição e implementação. Sendo assim, a Teoria da Variação e Mudança propõe um novo método de análise de investigação da linguagem. A essa corrente teórica interessa analisar e sistematizar a variação linguística, a qual pressupõe a mudança na língua. Para isso, é necessário trabalhar com base.

(30) 30. em dados de fala real em uso por determinada comunidade de fala; haja vista ser nessa que se encontra um suposto “caos linguístico”, composto pelas diferentes formas de se dizer a mesma coisa, em um mesmo contexto e com o mesmo valor de verdade. Cabe ao sociolinguista pesquisar essa heterogeneidade, aparentemente caótica, e buscar encontrar a sistematicidade da variação (cf. TARALLO, 2011 [2007]). Conduzimos, portanto, nossa análise por meio do estudo diacrônico, levando em conta cartas privadas do Nordeste brasileiro do século XX. Optamos por conduzir esta pesquisa no recorte do tempo real, o qual requer ainda mais cuidado pela dificuldade de caracterizar detalhadamente estágios passados da comunidade de fala e, consequentemente, dos aspectos sociais da língua e dos escreventes, como, por exemplo, a sua escolarização. Assim, torna-se indispensável aplicar o princípio da uniformidade, [...] precisamos inevitavelmente operar sob o princípio da uniformidade. Postulamos que as forças que operam para produzir a mudança linguística hoje são do mesmo tipo e ordem de grandeza das que operaram no passado, há cinco ou dez mil anos. Certamente existem novos fatores emergindo: a ampliação do letramento, a convergência linguística, o desenvolvimento do vocabulário científico. Todavia, elas representam intervenções menores na estrutura das línguas. Se existem efeitos relativamente constantes, cotidianos da interação social sobre a gramática e a fonologia, o princípio da uniformidade assevera que tais influências continuam a operar hoje do mesmo modo como operavam no passado. (LABOV, 2008 [1972], p. 317318).. Dessa forma, há a necessidade do detalhamento da variável e de suas variantes, levando em conta o maior número possível de elementos linguísticos e sociais, para que possamos inferir as pressões ocorridas há décadas ou séculos. Além de entender o curso da mudança ou a estabilização da variação, com base nesse princípio, ainda podemos pressupor o rumo a ser seguido pela variável linguística pesquisada. Diante de tais pressupostos teórico-metodológicos da TVM, analisamos nosso corpus em busca de respostas para os 5 (cinco) questionamentos norteadores da pesquisa, com base nos 3 (três) problemas empíricos selecionados. A análise levará em conta o tempo real, como já dito, no qual contemplaremos as cartas privadas do RN, BA e PE, redigidas ao longo do século XX..

(31) 31. 1.2 TEORIA DOS PRINCÍPIOS E PARÂMETROS. Tomamos como amparo a este trabalho, também, para o estudo das construções dativas em PB, a “Teoria Gerativa: uma perspectiva biolinguística, universalista e internalista para o estudo da linguagem” (LUNGUINHO; RESENES; NEGRÃO, 2012, p. 120). A Teoria Gerativa aborda a capacidade linguística como propriedade intrínseca aos seres humanos. Isso é possível em virtude de nossa mente/cérebro ter como componente a Faculdade da Linguagem (CHOMSKY, 1994 [1986]). É a FL que torna qualquer um da espécie humana, salvo patologias, capaz de adquirir e desenvolver linguagem. O indivíduo que entra em contato com o input de sua língua, por mais pobre que esse seja, desenvolverá a competência linguística (o seu conhecimento e compreensão) internalizada da gramática da sua língua (cf. CHOMSKY, 1995). Isto é, não é o fato de ter ido à escola ou não que torna o falante nativo de PB capaz de compreender e formular sentenças com elementos não prescritos pela GT, a exemplo das construções com as variantes linguísticas inovadoras que compõem a variável linguística aqui estudada (dentre elas – lhe), concorrendo com a segunda pessoa singular gramatical em sua forma dativa te e ti, com as variantes a/para/de/em você-tu ou com o objeto nulo, por exemplo. A Gramática Universal (GU)5 é composta, grosso modo, por regras finitas que geram possibilidades infinitas. Essas regras são observadas por meio de princípios universais (propriedades comuns a toda e qualquer língua no mundo) e parâmetros que distinguem uma língua da outra (CHOMSKY, 1994 [1986]). Esses princípios já nos acompanham desde nosso nascimento, tornando-nos aptos a desenvolvermos naturalmente a linguagem. Sem maiores esforços, aprendemos a falar, mesmo imersos numa grande pobreza de estímulos linguísticos. Já a marcação dos parâmetros caracteriza as diferentes línguas naturais – ou estágios mais ou menos estáveis da capacidade linguística adquirida e maturada, a exemplo do PB, do russo, do alemão etc. Mesmo com poucos (e pobres) estímulos externos, a FL vai se desenvolvendo (maturando) e a Língua-I vai se constituindo, vai amadurecendo a capacidade e o conhecimento que subjaz e dá suporte à gramática vernacular de um indivíduo, num estágio final mais ou menos estável. Pensemos numa pessoa qualquer, a Maria, que: parte do desenvolvimento da FL da Maria foi determinado exteriormente, pelo meio ambiente (linguístico) onde ela viveu. Assim, a FLf da Maria, 5. A GU é a teoria do estado inicial da FL, anterior a qualquer experiência linguística (CHOMSKY, 1994)..

(32) 32. incorporando uma língua-I, pode ser informalmente caracterizada como correspondendo ao português de Lisboa, acrescido de várias idiossincrasias que têm a ver com a sua experiência individual, o seu estatuto social, profissional, etário, o modo como os seus amigos falam, etc. (CHOMSKY, 1995, p. 17). Vemos a língua-I como um componente psicológico, abstraído do órgão mental FL, um código linguístico internalizado, interiorizado, individual e inconsciente a cada indivíduo, que nos torna aptos, desde muito cedo, a compreender e processar a linguagem humana. Trata-se de um “sistema de conhecimento que sustenta o uso e a compreensão da língua” (cf. CHOMSKY, 1994 [1986], p. 43). É por essa língua – entendida aqui como gramática, ou como conhecimento linguístico num estágio final – que o empreendimento gerativo se interessa. Como vimos em Chomsky (1994), esse componente da FL matura com o auxílio da língua em uso, do comportamento linguístico, a língua-E. Entendamos a língua-E como um epifenômeno, um produto do comportamento linguístico exteriorizado: a forma de acesso à Língua-I (Cf. CHOMSKY, 1994). Uma espécie de código linguístico compartilhado por indivíduos que compartilham aspectos culturais semelhantes, formando uma comunidade linguística em seus vieses histórico e político (Cf. KENNEDY, 2013). Em suma, temos a GU como uma teoria sobre a FL em sua fase inicial, FL0 (um órgão na mente/cérebro do indivíduo), que chegando a sua fase final FLf aloca a Língua-I (conjunto de conhecimentos que nos torna capazes de utilizar a língua-E). Com uma Língua-I já amadurecida, podemos fazer uso da língua-E (o próprio comportamento linguístico, como um código linguístico compartilhado sociocultural, histórica e politicamente). Em outras palavras, a GU é uma teoria sobre a fase inicial da FL, a qual maturada viabiliza a Língua-I. Então, a gramática para o gerativismo é a própria Língua-I: a gramática de uma língua natural, homogênea e comum a todos os falantes, no que diz respeito a seu conjunto de regras (cf. MARTINS, COELHO E CAVALCANTE, 2015). Porém, essa gramática não coincide com o sistema linguístico, esse mais abrangente, o qual necessita obrigatoriamente da inserção da Língua-E, o que o torna heterogeneamente ordenado. Assim, de acordo com Martins, Coelho e Cavalcante (2015, p. 309), podemos entender que a heterogeneidade ordenada está no sistema linguístico e que esse sistema não é a gramática. Já definimos gramática tendo em vista a teoria gerativa. E será esse o conceito por nós assumido neste texto. O sistema linguístico, por sua vez – ordenado e intrinsecamente heterogêneo – se configura como o somatório da Língua-I (ou Línguas-I) e da Língua-E nos diferentes contextos de uso. Então, Sistema = heterogeneidade. Como visto, devemos assumir conceituações bastante.

(33) 33. específicas para Gramática e Sistema, necessárias para o estudo da mudança linguística na interface entre a teoria da variação e mudança linguística e a teoria da gramática.. Assim, para estudarmos a parte linguística de nossa pesquisa, discutiremos alguns conceitos com base na P&P, da Teoria Gerativa. A P&P surge no começo dos anos oitenta com uma visão totalmente nova para a arquitetura da gramática, que é encarada como a combinação de um conjunto modular e finito de princípios e parâmetros. Os princípios são tratados como leis gerais a que toda língua humana deve obedecer. Seu uso como entidade teórica nos possibilita captar a uniformidade entre as línguas humanas: apesar. da. diferenciação superficial, todas elas compartilham algo, os princípios. Os parâmetros, por sua vez, são entendidos como opções restritas que são acionadas com base na interação do indivíduo com os dados linguísticos primários presentes no seu ambiente linguístico. Nessa perspectiva, os parâmetros são o lugar de variação entre as línguas. (LUNGUINHO; RESENES; NEGRÃO, 2012, p. 124). Com base na Teoria dos Princípios e Parâmetros, nos interessarão (interessar-nos-ão) os módulos da Teoria do Caso e da Teoria X-Barra. No que concerne à Teoria do Caso, essa versa sobre a necessidade de que o DP6 [sintagma determinado] tem em receber Caso7 abstrato, para que tenha visibilidade temática e sintática na sentença. O que estamos chamando de Caso abstrato não se deve confundir com caso morfológico nem com caso semântico. Com base na Teoria X-barra, essa nos mostra como um núcleo predicador se satura, de forma endofórica, preenchendo seus argumentos necessários à constituição de uma cena fregeana, além de explicar o movimento de argumentos para a marcação de seus Casos, quando for necessário. Dessa forma, a todas as línguas há a necessidade de que exista a visibilidade dos DPs nas sentenças, trata-se de um princípio universal. Logo, toda língua natural dispõe de um sistema de casos e a forma como ele se realizará estará de acordo com a marcação do parâmetro para esse princípio. Assim, as línguas podem dispor de caso morfológico, a. 6. O DP é todo sintagma encabeçado por um núcleo determinante, sejam os quais: artigos ou pronomes. DP é sigla para o termo do inglês Determiner Phrase, um núcleo funcional que domina um NP (Nominal Phrase), subcategorizando-o, conferindo-lhe estatuto de argumento, de acordo com a Teoria X-Barra. (Cf. MIOTO, C.; SILVA, M. C. F; e LOPES, R. E. V, 2007). Utilizamos o “C” maiúsculo na palavra “Caso”, referindo-nos ao Caso abstrato, de acordo com a Teoria Gerativa, haja vista considerarmos ser esse o caso predominante no PB, mesmo nas formas pronominais. Mais à frente faremos uma breve discussão sobre o Caso abstrato. 7.

(34) 34. exemplo do latim e do russo, ou podem dispor de Caso abstrato, caso sintático, a exemplo do PB e do espanhol.. 1.3 CONSIDERAÇÕES FINAIS DO CAPÍTULO. Como vimos – a partir da cisão de Língua em dois conceitos distintos, Língua-I e Língua-E – podemos conciliar essas duas Teorias antes vistas como excludentes. Sabemos que o gerativismo ocupa-se em entender, conceituar, delimitar e explicar a língua-I (intencional, inata, involuntária, homogênea) com suas categorias de análise linguística; enquanto isso, a Teoria da Variação e Mudança ocupa-se em estudar e pesquisar o processo de mudança linguística, levando em conta a variação que a precede, focando sua lupa na língua-E (extensional, externa, em uso, social, heterogênea). Cada uma ocupa-se daquilo que se propõe a estudar e faz isso muito bem. O gerativismo não se atém a estudar a variação da língua, a qual ocorre no comportamento linguístico, em que cada indivíduo manifesta sua Língua-I de forma diferentemente, por meio da Língua-E. Enquanto que a TVM toma para si o processo de variação, o qual pressupõe uma possível mudança linguística. Como seu próprio nome já deixa claro, a TVM é uma Teoria que busca explicar a variação e mudança linguística, o que não a faz uma Teoria propriamente linguística. Dessa forma, neste trabalho, uma complementa a outra na relação simbiótica já apresentada. A Teoria Gerativa embasará as concepções sobre Caso linguístico gramatical, sobre as quais discutiremos no próximo capítulo; além de que, ela dará suporte ao que entendemos por argumento/complemento interno preposicionado (indireto), sejam eles objeto indireto (OI) ou complemento oblíquo ou relativo. A TVM nos fornecerá todo o aparato teórico/metodológico necessário para podermos mapear, entender e explicar o processo de variação e possível mudança por que passam os pronominais dativos de 2ª pessoa na escrita do Nordeste brasileiro do século XX, observadas a partir de dados de 3 estados. No próximo capítulo, delimitamos o nosso objeto de pesquisa, discutindo a variável linguística aqui pesquisada e quais são as variantes concorrentes que disputam a maior produtividade no contexto sintático de complementação verbal indireta. Em um primeiro momento, apresentamos a noção de Caso gramatical no Português com base na Teoria Gerativa. Em seguida, apresentamos os pronomes dativos e suas diferentes variantes em PB.

(35) 35. para a segunda pessoa, recorrendo à herança latina e à prescrição gramatical. Por último, discutimos sobre a ideia de ambiente de datividade e complemento indireto em português, como herdeiros do caso dativo, diferenciando-os de acordo com sua função sintática empregada no texto..

Referências

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