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1. APORTE TEÓRICO-METODOLÓGICO: Teoria da Variação e Mudança

1.2 TEORIA DOS PRINCÍPIOS E PARÂMETROS

Tomamos como amparo a este trabalho, também, para o estudo das construções dativas em PB, a “Teoria Gerativa: uma perspectiva biolinguística, universalista e internalista para o estudo da linguagem” (LUNGUINHO; RESENES; NEGRÃO, 2012, p. 120). A Teoria Gerativa aborda a capacidade linguística como propriedade intrínseca aos seres humanos. Isso é possível em virtude de nossa mente/cérebro ter como componente a Faculdade da Linguagem (CHOMSKY, 1994 [1986]).

É a FL que torna qualquer um da espécie humana, salvo patologias, capaz de adquirir e desenvolver linguagem. O indivíduo que entra em contato com o input de sua língua, por mais pobre que esse seja, desenvolverá a competência linguística (o seu conhecimento e compreensão) internalizada da gramática da sua língua (cf. CHOMSKY, 1995). Isto é, não é o fato de ter ido à escola ou não que torna o falante nativo de PB capaz de compreender e formular sentenças com elementos não prescritos pela GT, a exemplo das construções com as variantes linguísticas inovadoras que compõem a variável linguística aqui estudada (dentre elas – lhe), concorrendo com a segunda pessoa singular gramatical em sua forma dativa te e ti, com as variantes a/para/de/em você-tu ou com o objeto nulo, por exemplo.

A Gramática Universal (GU)5 é composta, grosso modo, por regras finitas que geram possibilidades infinitas. Essas regras são observadas por meio de princípios universais (propriedades comuns a toda e qualquer língua no mundo) e parâmetros que distinguem uma língua da outra (CHOMSKY, 1994 [1986]). Esses princípios já nos acompanham desde nosso nascimento, tornando-nos aptos a desenvolvermos naturalmente a linguagem. Sem maiores esforços, aprendemos a falar, mesmo imersos numa grande pobreza de estímulos linguísticos. Já a marcação dos parâmetros caracteriza as diferentes línguas naturais – ou estágios mais ou menos estáveis da capacidade linguística adquirida e maturada, a exemplo do PB, do russo, do alemão etc. Mesmo com poucos (e pobres) estímulos externos, a FL vai se desenvolvendo (maturando) e a Língua-I vai se constituindo, vai amadurecendo a capacidade e o conhecimento que subjaz e dá suporte à gramática vernacular de um indivíduo, num estágio final mais ou menos estável. Pensemos numa pessoa qualquer, a Maria, que:

parte do desenvolvimento da FL da Maria foi determinado exteriormente, pelo meio ambiente (linguístico) onde ela viveu. Assim, a FLf da Maria,

incorporando uma língua-I, pode ser informalmente caracterizada como correspondendo ao português de Lisboa, acrescido de várias idiossincrasias que têm a ver com a sua experiência individual, o seu estatuto social, profissional, etário, o modo como os seus amigos falam, etc. (CHOMSKY, 1995, p. 17)

Vemos a língua-I como um componente psicológico, abstraído do órgão mental FL, um código linguístico internalizado, interiorizado, individual e inconsciente a cada indivíduo, que nos torna aptos, desde muito cedo, a compreender e processar a linguagem humana. Trata-se de um “sistema de conhecimento que sustenta o uso e a compreensão da língua” (cf. CHOMSKY, 1994 [1986], p. 43). É por essa língua – entendida aqui como gramática, ou como conhecimento linguístico num estágio final – que o empreendimento gerativo se interessa. Como vimos em Chomsky (1994), esse componente da FL matura com o auxílio da língua em uso, do comportamento linguístico, a língua-E. Entendamos a língua-E como um epifenômeno, um produto do comportamento linguístico exteriorizado: a forma de acesso à Língua-I (Cf. CHOMSKY, 1994). Uma espécie de código linguístico compartilhado por indivíduos que compartilham aspectos culturais semelhantes, formando uma comunidade linguística em seus vieses histórico e político (Cf. KENNEDY, 2013).

Em suma, temos a GU como uma teoria sobre a FL em sua fase inicial, FL0 (um

órgão na mente/cérebro do indivíduo), que chegando a sua fase final FLf aloca a Língua-I

(conjunto de conhecimentos que nos torna capazes de utilizar a língua-E). Com uma Língua-I já amadurecida, podemos fazer uso da língua-E (o próprio comportamento linguístico, como um código linguístico compartilhado sociocultural, histórica e politicamente). Em outras palavras, a GU é uma teoria sobre a fase inicial da FL, a qual maturada viabiliza a Língua-I. Então, a gramática para o gerativismo é a própria Língua-I: a gramática de uma língua natural, homogênea e comum a todos os falantes, no que diz respeito a seu conjunto de regras (cf. MARTINS, COELHO E CAVALCANTE, 2015). Porém, essa gramática não coincide com o sistema linguístico, esse mais abrangente, o qual necessita obrigatoriamente da inserção da Língua-E, o que o torna heterogeneamente ordenado. Assim, de acordo com Martins, Coelho e Cavalcante (2015, p. 309),

podemos entender que a heterogeneidade ordenada está no sistema linguístico e que esse sistema não é a gramática. Já definimos gramática tendo em vista a teoria gerativa. E será esse o conceito por nós assumido neste texto. O sistema linguístico, por sua vez – ordenado e intrinsecamente heterogêneo – se configura como o somatório da Língua-I (ou Línguas-I) e da Língua-E nos diferentes contextos de uso. Então, Sistema =

específicas para Gramática e Sistema, necessárias para o estudo da mudança linguística na interface entre a teoria da variação e mudança linguística e a teoria da gramática.

Assim, para estudarmos a parte linguística de nossa pesquisa, discutiremos alguns conceitos com base na P&P, da Teoria Gerativa. A P&P surge no começo dos anos oitenta com uma visão totalmente nova para a arquitetura da gramática, que é encarada como a combinação de um conjunto modular e finito de princípios e parâmetros. Os princípios são tratados como leis gerais a que toda língua humana deve obedecer. Seu uso como entidade teórica nos possibilita captar a uniformidade entre as línguas humanas: apesar da diferenciação superficial, todas elas compartilham algo, os princípios. Os parâmetros, por sua vez, são entendidos como opções restritas que são acionadas com base na interação do indivíduo com os dados linguísticos primários presentes no seu ambiente linguístico. Nessa perspectiva, os parâmetros são o lugar de variação entre as línguas. (LUNGUINHO; RESENES; NEGRÃO, 2012, p. 124).

Com base na Teoria dos Princípios e Parâmetros, nos interessarão (interessar-nos-ão) os módulos da Teoria do Caso e da Teoria X-Barra. No que concerne à Teoria do Caso, essa versa sobre a necessidade de que o DP6 [sintagma determinado] tem em receber Caso7

abstrato, para que tenha visibilidade temática e sintática na sentença. O que estamos chamando de Caso abstrato não se deve confundir com caso morfológico nem com caso semântico. Com base na Teoria X-barra, essa nos mostra como um núcleo predicador se satura, de forma endofórica, preenchendo seus argumentos necessários à constituição de uma cena fregeana, além de explicar o movimento de argumentos para a marcação de seus Casos, quando for necessário.

Dessa forma, a todas as línguas há a necessidade de que exista a visibilidade dos DPs nas sentenças, trata-se de um princípio universal. Logo, toda língua natural dispõe de um sistema de casos e a forma como ele se realizará estará de acordo com a marcação do parâmetro para esse princípio. Assim, as línguas podem dispor de caso morfológico, a

6 O DP é todo sintagma encabeçado por um núcleo determinante, sejam os quais: artigos ou pronomes. DP é

sigla para o termo do inglês Determiner Phrase, um núcleo funcional que domina um NP (Nominal Phrase), subcategorizando-o, conferindo-lhe estatuto de argumento, de acordo com a Teoria X-Barra. (Cf. MIOTO, C.; SILVA, M. C. F; e LOPES, R. E. V, 2007).

7 Utilizamos o “C” maiúsculo na palavra “Caso”, referindo-nos ao Caso abstrato, de acordo com a Teoria

Gerativa, haja vista considerarmos ser esse o caso predominante no PB, mesmo nas formas pronominais. Mais à frente faremos uma breve discussão sobre o Caso abstrato.

exemplo do latim e do russo, ou podem dispor de Caso abstrato, caso sintático, a exemplo do PB e do espanhol.