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Fenômeno 3: A expressão variável do futuro do presente x a forma perifrástica com ir + verbo infinitivo.

GOSTOSO DEMAIS

3. Copie as frases no caderno, mudando a pessoa a que se refere cada forma verbal de você para tu a) Chame-o mais uma vez b) Aguente firme c) Bata na minha mão.

4.2.3 Fenômeno 3: A expressão variável do futuro do presente x a forma perifrástica com ir + verbo infinitivo.

Na agenda de investigações sociolinguísticas do PB, verificamos importantes resultados de pesquisa que mostram a variação e a mudança no uso do tempo verbal futuro (SILVA, 1997; TESCH, 2007; BRAGANÇA, 2008; ALMEIDA, 2009, MATOS; SANTOS, 2010). Esses pesquisadores constataram que, ao menos na língua falada, a forma verbal composta, formada por IR + Infinitivo, tem suplantado o uso da forma indicadora de futuro simples, passando a expressar, assim, a futuridade. A forma sintética do futuro tem aparecido quase que exclusivamente em textos escritos mais monitorados e, ainda assim, em coocorrência com a forma inovadora ir + infinitivo.

Para Silva (1997), no PB, há dois tempos verbais relacionados ao futuro no modo indicativo, o futuro do presente e o futuro do pretérito, e um no modo subjuntivo (futuro do presente), além das formas futurizadas (presente-futuro e aquelas constituídas por formas perifrásticas: ir + infinitivo, estar para + infinitivo, ter de/que + infinitivo, haver de + infinitivo e querer/poder/dever + infinitivo).

Em pesquisa sobre esse fenômeno, Almeida (2009) postulou que a forma perifrástica ir + infinitivo encontra-se em processo de gramaticalização e a tendência a substituir a forma sintética até mesmo em contextos de língua escrita é forte. Essa pesquisadora explica que o verbo “ir”, ao passar pelo processo de gramaticalização, sofreu uma “deslexicalização”, ou seja, deixou de sugerir apenas o conteúdo léxico do verbo de deslocamento e passou a adquirir, gradativamente, um caráter aspectual e, em consequência, temporal.

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A pesquisadora chegou à conclusão de que essa forma perifrástica encontra-se, ainda, em processo de gramaticalização e, por isso, “a função de codificar o tempo ainda não lhe cabe totalmente, mas encontrando-se no contexto do modo indicativo, a perífrase pode estar adquirindo a função de tempo, marcando, assim, a futuridade” (p. 8).

As gramáticas normativas pouco falam sobre esse fenômeno, à exceção de Cunha e Cintra (1985), que reconhecem na forma ir + infinitivo a designação de locomoção, desejo de realizar algo ou um fato que se realizará em tempo próximo.

Como vimos, as pesquisas sociolinguísticas indicam que o PB vem apresentado significativas mudanças no que se refere ao uso do tempo futuro. Na língua oral, esse fenômeno é ainda mais visível, pois já é uso consagrado a forma verbal perifrástica substituir o futuro simples. Este, por sua vez, tem aparecido mais frequentemente em textos escritos, dependendo do gênero e do nível de formalidade.

Para Almeida (2009), o futuro é, dentre as três formas verbais existentes (pretérito, presente e futuro), aquele que apresenta uma referência menos precisa, pois se aplica a acontecimentos vindouros, incertos, inexistentes na época em que se fala ou do que se fala, mas que se espera que se efetuem. Para Gonçalves (1987, apud Almeida, 2009, p. 1894), “o futuro, na sua verdadeira realidade, é muito mais um modo. Designa os desejos incertos que o falante projeta no desconhecido”.

Em função desse quadro teórico, pusemo-nos a observar a recorrência desse fenômeno nos LDP em análise e percebemos que apenas a Coleção LNO não fez menção à variação entre o futuro simples e a perífrase verbal e apenas duas delas (PPL e IDE) tratam da questão de forma mais aprofundada. As outras três coleções (PPL, IDE, PPT) mencionam a forma perifrástica ir + infinitivo como uma forma típica da fala e da linguagem coloquial, usada em situações informais (LIN), mas não apresentam nenhuma atividade para sistematizar esse conteúdo.

No exemplo 13, que trata do ensino das formas verbais no futuro, verificamos que a atividade está inserida na seção “Reflexão e uso”, mas, longe de desenvolver uma reflexão mais sistematizada sobre esse conteúdo, o que se configura após a explicação metalinguística apresentada é a falta de um trabalho de complexificação que leve à

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comparação das formas de uso do futuro em variados contextos. Vejamos as propostas encontradas:

Ex. 13:

Seção: Reflexão e uso

Futuro do presente

__ Você será o último a ser devorado – disse o gigante. “Virareis espuma das ondas do mar”.

Em ambas as frases, são enunciados fatos que naquele momento ainda não aconteceram. Por isso, usam o futuro do presente. Emprega-se o futuro do presente para indicar fatos reais, que irão acontecer num tempo posterior àquele em que se fala.

Identifique os verbos que estão no futuro do presente nos quadrinhos abaixo:

Na fala e na linguagem coloquial, no dia-a-dia, usamos frequentemente as locuções verbais, constituídas do verbo auxiliar no presente do indicativo + infinitivo (vou almoçar, vamos estudar, temos de sair, etc.), para substituir o futuro do presente.

a) Reescreva as falas das personagens dos quadrinhos acima, substituindo as locuções verbais pelo futuro do presente simples. b) Faça o contrário: reescreva as frases dos primeiros quadrinhos, nos quais identificou o futuro do presente simples, substituindo os

verbos por locuções verbais equivalentes. Vou chegar/ vou partir

c) Qual das duas formas lhe parece mais adequada à linguagem dos quadrinhos? Por quê?Espera-se que o aluno mencione que as locuções verbais são mais adequadas para reproduzir falas do dia-a-dia, em situações como as que foram vistas nos quadrinhos.

(IDE, V. 6, p. 55, PNLD-2008)

Note-se que as autoras partiram de duas frases descontextualizadas, provavelmente retiradas de algum texto literário, em que o futuro é usado: “Você será o último a ser devorado” e “Virareis espuma das ondas do mar” e explicam, rapidamente,

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que essas frases enunciam fatos que naquele momento ainda não aconteceram e que “irão acontecer num tempo posterior àquele em que se fala” (destaque adicionado). Vejam que as próprias autoras utilizaram em sua explicação a forma perifrástica com o verbo ir no futuro + infinitivo. Essa explicação, no entanto, coaduna com os postulados da gramática normativa, para a qual os verbos no futuro denotam um acontecimento no porvir. Em todo caso, o primeiro enunciado, em que se usa o pronome “você” mais o verbo ser no futuro (“será”) é mais fácil de ser encontrado na fala, em determinados contextos mais monitorados e, portanto, é considerado menos marcado. No entanto, o segundo enunciado é menos frequente, menos acessível e, portanto, mais marcado do ponto de vista social, em comparação com o futuro sintético, pois além de apresentar uma forma verbal com uso bastante restrito (“virareis”), o sujeito dessa oração, que não está explícito, é o “vós”, também utilizado em raríssimas ocasiões hoje em dia.

Na sequência, são trazidas algumas situações inventadas pelos autores do livro didático (PPL) em que são retratadas, por meio de quadrinhos, falas isoladas de personagens que mostram o uso da forma sintética do futuro e da forma perifrástica ir + infinitivo em situações informais. O intuito, neste caso, é tomar as frases inseridas nos balões como pretexto para o trabalho com o ponto gramatical “locução verbal”.

As propostas de atividades que se seguem são aquelas que levam os alunos a fazerem a correção das frases, reescrevendo as locuções verbais utilizadas na forma futura para, em seguida, solicitar a eles que façam o contrário: substituam o futuro sintético pela forma perifrástica. Ora, se o objetivo é levar os alunos a dominarem a variedade padrão da língua, por que exigir deles tempo e dedicação para a consecução de uma atividade a qual ele já domina?

A última atividade desse exemplo, o enunciado da letra “c”, chama atenção para um aspecto curioso: se a função do LDP é alertar o aluno para os usos da variedade padrão da língua, por que, então, não foram mostradas situações diferenciadas em que a forma do futuro sintético é usada? Por que concentrar esforços em gêneros dialogais, mais próximos da fala menos monitorada para servirem de mote para a observação de questões gramaticais? Ainda nessa questão, a adequação da linguagem aos quadrinhos também limita a reflexão sobre o fenômeno a certos tipos de gêneros, sem que se

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esclareça que a variante “ir + infinitivo” pode ser encontrada também em outros gêneros textuais, tais como em crônicas, narrativas, poemas, telejornais, entrevistas e vários outros.

Vejamos mais um exemplo que revela a abordagem dada a esse fenômeno:

Ex. 14:

Seção: Reflexão sobre a língua

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