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Figura 28 – Imagens obtidas pela busca “people walking city brazil” e “people walking city usa” no 

banco de imagens Shutterstock. Acesso em: 11 de maio de 2016.    O que explica isso, além do número ínfimo de colaboradores do Brasil, é que esses  bancos são estrangeiros. Até temos alguns bancos de imagens nacionais, com destaque  aos  bancos  de  imagens  vinculados  às  agências  de  notícias,  como  a  Folhapress  e  a  Agência Estado, com boa quantidade e variedade de conteúdos por oferecerem materiais  exclusivos.  Porém,  não  há  bancos  que  ofereçam  tanto  quanto  os  bancos  de  imagens  internacionais,  e  poucos  no  formato  chamado  de  “Stock”,  que  oferecem  assinaturas  de 

downloads  de  imagens,  resultando  em  um  preço  baixo  por  fotografia  comprada.  Isso 

influencia  diretamente  no  tipo  de  conteúdo  de  imagem  veiculado  nos  livros  didáticos,  limitando‐se,  dessa  maneira,  as  chances  de  se  encontrar  imagens  que  apresentem  melhor  representatividade  étnica  e  cultural  do  Brasil,  mostrando  que  os  fatores  logísticos  e  de  disponibilidade  são  também  grandes  influenciadores  da  forma  do  conteúdo, devido às virtualidades que eles impõe ao aparelho editorial.  

Araújo (2008) descreve que 

Em sua prática, o iconógrafo defronta‐se com o duplo problema da seleção de  ilustrações em relação ao texto e à expectativa do leitor. [...] Ele indaga também  sobre  a  conveniência  da  escolha  de  certas  ilustrações,  no  que  respeita  quer  à  sua  qualidade  técnica  de  confecção,  quer  à  sua  qualidade  de  reprodução  impressa. E além dessas dificuldades, ainda existe o não pequeno problema das  fontes, i.e., onde encontrar determinadas ilustrações adequadas, ou até vitais, a  determinada obra. (ARAÚJO, 2008, p. 444). 

Além  de  todos  esses  fatores  já  vistos,  ainda  podemos  apontar  um  último  que  chamaremos de fator governamental. Este fator é, obviamente, extremamente ligado ao  fator  legal,  e  definiremos  como  ações  governamentais  que  influenciam  diretamente  o  setor de livros didáticos e paradidáticos, como o Programa Nacional do Livro Didático  (PNLD) e o Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE).  

Silva  (2012)  mostra  a  atual  dependência  de  boa  parte  do  aparelho  editorial  em  relação a esses programas: 

Apesar de o volume de vendas de livros não didáticos ter crescido nos últimos  anos  e  de  as  redes  privadas  de  ensino  representarem  um  bom  mercado,  a  vitalidade do setor editorial no Brasil se deve à compra de grandes quantidades  de  exemplares  pela  Fundação  de  Assistência  ao  Educando  (FAE),  órgão  do  Ministério da Educação (MEC), através do PNLD. (SILVA, 2012, p. 810) 

Segundo dados da pesquisa “Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro” da  CBL, SNEL e FIPE, somente em 2014 foram vendidas mais de 155 milhões de livros para  o  governo  federal,  sendo  um  número  impressionante  mesmo  sabendo  que  em  2013  foram  mais  de  190  milhões  de  livros  comprados.  Segundo  o  próprio  governo  federal,  somente a editora Moderna foi responsável pela venda de 19,68% dos livros do PNLD  em  2014,  recebendo  um  valor  de  mais  de  211  milhões  de  reais  neste  ano.  Com  isso,  podemos constatar a importância do PNLD para as editoras. 

É  evidente  que  esses  programas  governamentais,  que  representam  mais  da  metade  do  mercado  de  livros  didáticos  em  faturamento  –  o  que  tornam  o  governo  federal  o    maior  comprador  de  livros  do  Brasil  e  um  dos  maiores  do  mundo  –,  influenciam  diretamente  na  escolha  do  tipo  de  conteúdo  dos  livros  que  serão  feitos  especialmente  para  eles.  Qualquer  orientação  que  estiver  presente  no  edital  será  determinante para a inserção ou exclusão de qualquer conteúdo que for pensado para  esse material, muitas vezes, independente da sua importância pedagógica e editorial no 

livro em questão. Além disso, outros aspectos que não estão presentes no edital também  podem influenciar no sucesso do projeto, como afirma também Carmagnani (1999):  

[...] A adoção de um livro didático depende, sobretudo, da influência da editora  junto  a  órgão  governamentais,  de  suas  estratégias  de  marketing,  dos  acordos  feitos  junto  às  direções  de  escolas  e  de  outros  aspectos  que  independem  das  qualidades pedagógicas do material. (CARMAGNANI, 1999, p. 128) 

Sem observarmos estas outras questões externas ao edital, ainda sim vemos que  esses  fatores  governamentais  influenciam  em  vários  aspectos  esses  livros  feitos  especialmente visando os programas do governo. O conteúdo, por exemplo, poderá ser  revisto  ou  até  abandonado  por  algum  tipo  de  mudança  no  tipo  de  avaliação  que  será  feita pelo governo para a escolha dos livros que poderão fazer parte dos programas. Isso  já ocorreu em 1995, quando, segundo Silva (2012), 

[…]  MEC  iniciou  um  processo  de  avaliação  mais  criterioso  e  sistemático  que  vem  analisando  até  hoje  os  livros  didáticos  adquiridos  para  distribuição  às  escolas  de  Ensino  Fundamental  da  rede  pública  brasileira.  A  equipe  de  pareceristas passou a adotar critérios de avaliação que são públicos e aparecem  descritos  no  Guia  dos  Livros  Didáticos  para  o  conhecimento  de  professores  e  interessados.  Além  disto,  o  modelo  foi  sendo  aprimorado  nos  PNLD’s  subsequentes. (SILVA, 2012, p. 812) 

Dessa maneira, Souza (1999b), analisa que 

Como  resultado  da  política  de  controle  do  MEC  [...],  cria‐se  um  clima  de  efervescência no mercado de livros didáticos e entre professores. Editoras que  tiveram  seus  livros  inseridos  na  categoria  de  excluídos  buscam  dar  uma  nova  “roupagem” aos livros, a fim de readaptá‐los às novas exigências dos Catálogos  do MEC. (SOUZA, 1999b, p. 63) 

Com  este  breve  levantamento,  fica  evidente  a  influência  que  o  governo  tem  em  relação  às  editoras  que  projetam  materiais  didáticos  para  esses  programas,  muito  devido ao fator financeiro intrínseco. Até o formato, o papel, e o número de páginas são  determinados  por  esses  programas,  criando‐se  barreiras  para  inovações  de  design  do  livro e de estilos de diagramação, pois prioriza‐se sempre o aproveitamento máximo da  página  por  textos  em  detrimento  das  imagens  por  questões  de  limite  no  número  de  páginas já estipulado do material, como podemos ver na figura 29. 

 

Figura 29 – Reprodução da tabela presente no edital do PNLD 2015 (Ensino Médio) com o número  de páginas limite de cada disciplina. 

 

Vemos que as virtualidades criadas pelos fatores governamentais influenciam em  todos  os  processos  presentes  num  aparelho  editorial,  desde  o  projeto  inicial  do  livro  pelo conselho editorial, até a sua impressão e distribuição para as escolas, passando por  todas as partes “invisíveis” do processo editorial. É um fator complexo que, pelos valores  astronômicos  que  movimenta  e  por  sua  importância  na  Educação  pelo  número  de  exemplares  distribuídos  para  o  todo  o  país,  é  um  dos  mais  estudados  por  pesquisas  sobre  o  livro  didático,  diferentemente  de  outros  fatores  mais  invisíveis  no  processo  editorial. 

Dentro desses fatores governamentais, além de ações mais mercadológicas como  o PNLD e o PNAD, também poderíamos inserir ações de controle governamental como já  ocorreram em nosso país, como a censura dos meios de comunicação e das publicações  editoriais  na  ditadura  militar,  o  que  foi  certamente  nesta  época  um  dos  principais  fatores  a  serem  analisados  para  uma  produção  de  um  livro  didático,  limitando  acirradamente as possibilidades do aparelho editorial. 

 

Com isso, temos um bom panorama de como é complexo esse aparelho editorial,  com  vários  fatores  que  influenciam  diretamente  na  forma  do  produto  final,  o  livro  didático.  Também  vimos  como  suas  virtualidades  podem  variar  de  acordo  com  a  influência e a hierarquização dos fatores intra‐editoriais e extra‐editoriais na produção 

do  livro  didático,  considerando  sempre  que  esses  fatores,  apesar  de  divididos  aqui  didaticamente,  não  podem  ser  considerados  independentes,  e  devem  sempre  ser  considerados em qualquer estudo sobre livros didáticos e suas aplicações. 

CONCLUSÃO 

Como vimos, o livro didático é um objeto complexo, que é elaborado geralmente  por uma grande equipe multidisciplinar. Como objeto complexo, ele é determinado por  vários fatores que dirigem e limitam o aparelho editorial alterando as suas virtualidades.  Definimos, assim, alguns fatores como intra‐editoriais, fatores pedagógicos, estilísticos e  estéticos,  financeiros  e  organizacionais,  que  são  de  maior  controle  dos  programadores  desse aparelho. Outros fatores os extra‐editoriais, legais, governamentais e logísticos ou  de disponibilidade, determinados por aparelhos superiores, que “envelopam” o aparelho  editorial de certo modo.  

Analisando  cada  um  desses  fatores  vimos  que  a  utilização  de  uma  imagem  específica pode não ser tão simples quanto parece e pode não ser determinada apenas  por  decisões  editoriais,  ou  seja,  por  decisões  pedagógicas/organizacionais,  mas  por  questões externas, como de legislação ou de disponibilidade da imagem. As imagens que  são publicadas nos livros didáticos passaram, de alguma maneira, por análise relativa a  cada um dos fatores citados por diversos profissionais, sendo aprovadas para publicação  quando  essa  equipe  editorial  entende  que  este  conteúdo  visual  está  dentro  das  virtualidades previamente apresentadas. 

A  quebra  dessas  virtualidades  é  possível,  porém,  pode  trazer  consequências  positivas  (inovações)  ou  negativas  (sanções  e  prejuízos)  para  os  profissionais  envolvidos e para a instituição responsável pelo livro didático. Por isso, sempre haverá a  necessidade, pelos sujeitos envolvidos, da constante análise dos fatores apontados e as  alternativas  para  se  seguir  as  virtualidades  ou,  então,  de  se  “jogar  contra  o  aparelho”,  seja  ele  editorial,  organizacional  ou  governamental,  para  que  seja  possível  surgir  inovações  no  desenvolvimento  de  novas  soluções  nesta  área.  Utilizando‐se  uma  expressão  popular:  primeiro  é  necessário  conhecer  as  regras  –    virtualidades,  para  depois quebrá‐las. 

O reconhecimento desses fatores também é imprescindível para qualquer tipo de  análise  de  livro  didático  ou,  até  mesmo,  de  qualquer  produto  editorial.  Vimos  que  análises  dos  livros  didáticos  apenas  pelo  seu  output,  pelo  livro  final  impresso,  ou  até  digital,  sem  considerar  esse  elementos  presentes  em  sua  produção  pode  levar  a  discussões  vazias,  onde  poderão  apontar  problemas  e  soluções  que  não  estão  sob 

controle  dos  processos  editoriais  e  pedagógicos  do  livro,  mas  de  fatores  onde  os  responsáveis pela produção do livro podem não ter controle algum, como são os casos  de alguns fatores organizacionais, financeiros, legais, governamentais e logísticos. 

Como vimos, por exemplo, temos os fatores legais que interferem diretamente na  seleção do conteúdo visual do livro, limitando as suas possibilidades devido a leis como  Direito  Autoral  e  do  Direito  de  Imagem  e  Personalidade.  É  importante  notar  o  quanto  esses fatores impactam na qualidade e diversidade de conteúdos publicados nos livros  didáticos,  chegando  a  impedir  que  grande  parte  das  informações  visuais  de  nossa  história e cultura sejam publicados na maior parte dos livros.  

Até, por essa razão, houve em 2010 uma consulta pública para a modernização da  lei  de  Direito  Autoral17,  onde  haveria  um  parágrafo  específico  para  legalização  do  uso 

“para fins educacionais, didáticos, informativos, de pesquisa ou para uso como recurso  criativo”, o que proporcionaria, a princípio, a publicação de qualquer tipo de informação  sem  a  necessidade  de  autorização  e  remuneração18,  significando  um  grande  aumento 

nas  possibilidades  de  publicação  de  conteúdos  visuais  nos  livros  didáticos,  resultando  em  uma  maior  disseminação  de  obras  e  documentos  históricos  que  estão  ainda  guardados  sob  a  tutela  de  órgãos  governamentais  e,  muitas  vezes,  “engavetados”  por  suas restrições de uso apesar de sua importância histórica e potencial pedagógico que  este conteúdo poderia ter. Essa reforma da lei ainda está em discussão, porém, o projeto  de reforma daquela consulta feita em 2010 já foi engavetado pela constante mudança no  Ministério da Cultura19. Pelo site da câmara dos deputados, consultando o projeto de lei  que trata dessa modernização, no mesmo ano de 2015 o projeto foi desarquivado, mas  ainda não mostra qualquer avanço desde então20 Vemos que este fator legal influenciará diretamente em como será a produção do  livro  didático  no  futuro,  possibilitando  um  aumento  considerável  de  conteúdos  que  poderão ser utilizados nos livros didáticos. É uma clara questão de políticas públicas que  17 Consulta pública para a modernização da lei do Direito Autoral. Disponível em:  <http://www2.cultura.gov.br/consultadireitoautoral/lei‐961098‐consolidada/>. Acesso em: 08 de junho de 2016.  18 Projeto propõe reforma na Lei de Direito Autoral. Disponível em:  <http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/EDUCACAO‐E‐CULTURA/409666‐PROJETO‐PROPOE‐REFORMA‐NA‐LEI‐DE‐ DIREITO‐AUTORAL.html>. Acesso em: 08 de junho de 2016.  19 Entenda a Consulta Pública do Governo sobre Direito Autoral no ambiente digital. Disponível em:  <http://www.internetlab.org.br/pt/internetlab‐reporta/entenda‐a‐consulta‐publica‐do‐governo‐sobre‐direito‐autoral‐no‐ ambiente‐digital/>. Acesso em: 14 de junho de 2016.   20 Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=534039>. Acesso em: 15 de junho  de 2016. 

não  avançam  por  questões  de  interesses  econômicos  e  pouco  entendimento  de  quem  legisla. 

Devemos nos atentar também ao impacto dos processos digitais, da Internet, do  e‐book  em  relação  a  esses  fatores.  É  importante  afirmar  que  o  uso  das  novas  mídias  digitais influenciaram e, ainda, influenciarão muito mais nas virtualidades apresentadas  para  a  produção  do  livro  didático  e  nas  relações  “envelopantes”  dos  aparelhos  da  sociedade,  mudando  diretamente  o  ambiente  onde  o  livro  didático  é  produzido  e,  consequentemente,  o  seu  resultado.  Vale  arriscar  que  a  disseminação  do  e‐book  no  mercado editorial de livro didático será um gatilho às inovações na legislação pendente,  como podemos perceber em alguns movimentos recentes de discussão das questões de  direito digital. 

Não por acaso, Flusser (2011) afirma que “liberdade é jogar contra o aparelho”.  Porém,  como  foi  dito  inicialmente,  para  jogar  contra  o  aparelho,  é  necessário  que  se  conheça  as  suas  peculiaridades  e,  seguindo  as  ideias  de  Morin  (2005),  se  produza  um  pensamento “ecologizante”, inserindo o aparelho editorial e o livro didático em seu meio  ambiente,  entendendo  a  inseparabilidade  dos  objetos  de  estudo.  O  próprio  autor  completava  que  esse  pensamento  ecologizante  não  só  o  contextualiza,  mas  também  pode “modifica‐lo ou explicá‐lo de outra maneira”, assim como vimos que ocorre quando  espiamos a caixa‐preta e descobrimos que alguns dos maiores problemas encontrados  nos livros didáticos não serão resolvidos apenas com uma “revisão mais criteriosa” dos  conteúdos do livro, mas atacando problemas centrais e ainda maiores que influenciam e  determinam diretamente seu output.  

Considerar  os  fatores  para  qualquer  estudo  ou  crítica  sobre  o  livro  didático  é,  antes  de  tudo,  reconhecer  esse  objeto  como  algo  complexo,  e  considerar  os  sistemas  complexos  em  que  ele  se  encontra  ainda  em  sua  produção.  É  também  enxergar  mais  claramente, um raio de luz dentro da caixa‐preta editorial, mostrando aspectos até então  desconhecidos  pela  maior  parte  dos  pesquisadores  e  sujeitos  da  educação,  possibilitando  melhor  visualização  dos  reais  problemas  do  livro  didático  e  dos  fatores  que estão determinando o seu conteúdo final.