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3. O SISTEMA DE COTAS: UTOPIA OU POSSIBLILIDADE?

3.2. O direito do trabalho como medida de discriminação positiva

3.2.8. Flexibilização das cotas legais e a necessidade de legislação específica

produtiva fundada em formas de flexibilização das relações de trabalho.

PREVIDÊNCIA SOCIAL. Boletim Estatístico da Previdência Social, vol. 16, n. 2. Disponível em: http://www.mpas.gov.br/arquivos/office/3_110324-154450-196.pdf. Acesso em: 09 de abr. 2012.

Houve expressivo aumento das formas mais precárias de trabalho que foi verificada pelo aumento do trabalho autônomo, assalariamento sem carteira, trabalho doméstico, sem contar diversas estratégias aplicadas pelas empresas para minimizar o custo com o trabalho, como por exemplo, processo de desverticalização e externalização do processo produtivo, terceirização ou subcontratação, contratação de mão de obra por tempo determinado, trabalhos exercidos fora do sistema de seguridade social e medidas de flexibilização da jornada de trabalho.

Essa reestruturação do processo produtivo refletiu na desigual distribuição de renda, exclusão social e, logo, dificultou o acesso das minorias no mercado de trabalho.

Diante das dificuldades relativas à implementação do sistema de cotas, bem como da concretização da inclusão social das pessoas com deficiência, na esfera judiciária foram propostas demandas que tinham como objeto a flexibilização do cumprimento das cotas legais, no sentido de que as “deficiências leves” também deveriam ser consideradas.150

No entanto, os Decretos nº 3.298/99 e 5.296/2004 não excluem as “deficiências leves”, apenas caracterizam aquelas condições nas quais, a partir de uma significativa limitação funcional há desvantagens competitivas e dificuldades adicionais para o pleno acesso ao mercado de trabalho.151

Essa preferência das empresas por pessoas com deficiência consideradas leves tem dificultado o acesso de cadeirantes ou pessoas cegas ao mercado de trabalho, prevalecendo a existência de uma dupla discriminação, a primeira histórica e ampla e outra que reside no interior do próprio grupo discriminado.

150 Dentre as demandas recentes na esfera judiciária, importante frisar a Ação Civil Pública proposta

pelo Ministério Público do Trabalho em face do Grupo Jeronimo Martins Distribuição Brasil Ltda., cujo objeto consiste na possibilidade de flexibilização das cotas para pessoas com deficiência para que também sejam consideradas as “deficiências leves” para apuração do cálculo legal. Agravo de Instrumento 840.684-STF ORIGEM: RR - 31560200290002009 – TST- Proc: São Paulo. Relator: Min. Ricardo Lexandowski. Agte(s): Jeronimo Martins Distribuição Brasil Ltda. Agdo: Ministério Público do Trabalho.

151

“No mesmo sentido, é prematuro e perigoso falar em inclusão de “deficiências leves” nas cotas quando ainda está em curso um estudo demandado pela Secretaria Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência (SNDP), vinculado à Secretaria Nacional de Direitos Humanos, junto ao IETS (Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade), com o objetivo de aperfeiçoar a classificação das deficiências”. GARCIA. Vinicius Gaspar. Manifesto- Lei de Cotas. Fev. 2012. Disponível em: http://vggarcia30.blogspot.com.br/2012/02/manifesto-lei-decotas.html. Acesso em: 18 de mar. 2012.

Também, no que se refere a esse argumento de que a classificação das modalidades de deficiência apresentada pelo Decreto nº 3.298/99 restringe o número de pessoas para contratação não corresponde às estatísticas.

Considerando apenas a população em idade ativa, de 15 a 64 anos, o número de pessoas com deficiência cai de 14,5% para 10% da população baseado em percentual do censo de 2000. Aplicando-se esse percentual ao total da população estimada pela PNAD de 2008, são 18,9 milhões de pessoas com deficiência nessa faixa etária. Se adotado o conceito mais restrito de deficiência, que atinge 2,5% da população, tem-se que pelo menos 4,7 milhões de pessoas poderiam ser contratadas dentro da política de cotas .152

Os argumentos afetos à flexibilização da lei de cotas não se resumem à questão do cômputo das “deficiências leves” para o preenchimento das cotas legais. Há outros, diversos, como por exemplo, a possibilidade da norma coletiva estipular como base de cálculo somente o número de funcionários ocupantes de cargos administrativos 153, que é afastada pela jurisprudência, e o oferecimento de vagas de

152 BARS, Renata. Analise sobre a reserva de cargos em empresas privadas para as pessoas

com deficiência. Consultoria Legislativa da Área XXI para Câmara dos Deputados. Brasília: 2009. Disponível em http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/41/docs/vagas_deficiencia_baars.pdf. Acesso em 18 de mar. 2012.

153 Inteiro teor do acórdão no anexo I. Parte da ementa: [...] II) DEMAIS RECURSOS ORDINÁRIOS -

AÇÃO ANULATÓRIA – PROPORCIONALIDADE DE COTAS PARA DEFICIENTES - EMPRESAS DE

TRANSPORTE DE CARGAS DE SÃO PAULO – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA

RAZOABILIDADE.1. O art. 93 da Lei 8.213/91 dispõe que as empresas com 100 ou mais empregados devem preencher certos percentuais de seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, em proporções que variam de 2% a 5%. Já o Decreto 3.298/99, dentre outras providências, determina, em seu art. 36, a obrigatoriedade desse preenchimento às empresas, delegando, no seu § 5º, a competência ao Ministério do Trabalho e Emprego para estabelecer sistemática de fiscalização, avaliação e controle das empresas, bem como instituir procedimentos e formulários que propiciem estatísticas sobre o número de empregados portadores de deficiência e o de vagas preenchidas.2. O Regional, acolhendo a ação anulatória proposta pelo Ministério Público do Trabalho, declarou a nulidade da cláusula que dispõe sobre a proporcionalidade na contratação de pessoas portadoras de deficiência nas empresas de transporte rodoviário e de transporte de cargas, entendendo que o objetivo da norma coletiva é o estabelecimento de normas coletivas e, na hipótese, as entidades convenentes estabeleceram regra sobre matéria legislativa, reservada ao Poder Público.3. A meu ver, a cláusula convencionada não está criando norma jurídica a despeito das normas de ordem pública, pois não veda a contratação de pessoas portadoras de deficiência ou impede o seu acesso ao labor, nem sequer desrespeita os direitos fundamentais do cidadão. De fato, estabelece uma ressalva ao estabelecer que o percentual de 4% seja calculado apenas sobre o número de empregados que exercem atividades administrativas. Isso porque se tratam de empresas de transportes rodoviários ou de transportes de cargas, cujas principais atividades têm características próprias (motoristas e carregadores de cargas), que exigem plena capacidade física dos empregados que a exercem. 4. Contudo, matematicamente, a condição proposta pelos Recorrentes não se torna mais benéfica que a previsão legal, diferentemente do alegado pelos mesmos, acarretando prejuízos à coletividade dos portadores de deficiência. Isso porque, tomando-se como base um quadro funcional de 101 empregados, conforme exemplificado

emprego cujo critério de seleção envolva sexo, idade e deficiência, o que reproduz ainda a tendência pelo comportamento não inclusivo das empresas154, igualmente afastada pelos tribunais.

Também, já se comentou a respeito dos diversos mecanismos legais existentes destinados à inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho, especialmente outros previstos na legislação estrangeira, e foi observado que o sistema de cotas realmente é bastante comum, porém, apenas uma das modalidades existentes de ação afirmativa.155

O sistema de cotas foi adotado no Brasil até mesmo pela tradição de supervalorizar a força da lei. Conforme demonstrado, há muitos aspectos que ainda

nas razões do recurso, em que atuam no setor administrativo 10 empregados, o percentual de 4% seria praticamente inexistente, ao passo que o percentual legal de 2% equivaleria a, no mínimo, 2 empregados deficientes. Além do mais, nas empresas desse segmento o número de pessoas que exercem funções administrativas geralmente é bem pequeno, e a aplicação do percentual de 4%, conforme proposto, resultaria em precedentes para que se criassem inúmeras exceções à regra e, segundo afirma o Ministério Público nas contra-razões, ficaria “ao livre arbítrio da fiscalização do trabalho escolher as atividades e a empresa que deve cumprir a lei em sua originalidade ou cumpri-la pela metade, ou não cumpri-la”.5. Assim, diante do exposto, mantenho a decisão regional que

declarou nula a cláusula 1ª e seu § 1º, da Convenção Coletiva de Trabalho dos Transportadores de Cargas de São Paulo. Recursos ordinários desprovidos. TST-ROAA-20.297/2005-000-02-00.1, Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 13 de dez. 2007, 7ª Data de Publicação: 16 de dez. 2011.

154 Transcrição parte da ementa. Inteiro teor do acórdão no anexo II. [...] DANO MORAL COLETIVO.

PREENCHIMENTO DA COTA SOCIAL. DISCRIMINAÇÃO RELATIVA A SEXO, IDADE E TIPO DE DEFICIÊNCIA. A reparação por dano moral coletivo visa a inibição de conduta ilícita da empresa e atua como caráter pedagógico, para que o ofensor não mais venha a incorrer em transgressão ao ordenamento jurídico vigente. Na hipótese, o Tribunal Regional, com base no conteúdo fático probatório, registrou que a ré retardou o cumprimento da cota social (art. 93 da Lei nº 8.213/91), bem como -formulou ofertas de emprego com inserção de requisitos discriminatórios referentes a sexo, idade e tipo de deficiência, criando óbice a determinados indivíduos que, por critérios vis, ficaram excluídos da obtenção de emprego perante a empresa-. Concluiu, assim, ser -inegável a existência de dano decorrente da violação a direitos e princípios constitucionais, atentando a ré contra postulados fundamentais exortados na Lei Maior, a garantia à dignidade da pessoa humana, ao valor social do trabalho, à igualdade, à não-discriminação e à busca do pleno emprego (arts. 1º, III, 3º, IV, 5º, caput e I, 7º, XXX e 170, VII e VIII)-. Dessa conclusão, inequivocamente deriva a ocorrência de dano moral coletivo e, por consequência, o surgimento da obrigação de repará-lo. Não se trata, pois, de condenação desprovida de prova ou de condenação a reparar dano presumido, porquanto este se evidencia pelo próprio fato violador, sendo razoável, pois, o a valor arbitrado à indenização (R$25.000,00 - vinte e cinco mil reais). Vale ressaltar, que a reclamada pugna para que seja reduzido o valor da indenização para R$5.000,00 (cinco mil reais), mas não traz fundamentos específicos para embasar o seu pedido. Não se vislumbra, pois, afronta aos arts. 5º, V, da Constituição Federal e 186, 927 e 944 do Código Civil. Recurso de revista da ré de que não se conhece. RR - 9890600- 28.2005.5.09.0001 , Relator Ministro: Pedro Paulo Manus, Data de Julgamento: 07 de dez. 2011, 7ª Turma, Data de Publicação: 16 de dez. 2011.

155 A respeito do sistema de cotas Sandro

Nahmias Melo destaca: “É importante chamar atenção para o fato de que o sistema de cotas é apenas uma das modalidades existentes de ação afirmativa. O governo federal norte-americano, por exemplo, reconhece outros mecanismos que se enquadram nesse conceito, mas não adotam o sistema de cotas. ‘É o caso, por exemplo, da oferta de treinamentos específicos para membros de certos grupos, quando tendentes a corrigir os desequilíbrios existentes, e da reformulação de políticas de contratação e promoção de empregados, levando-se em conta fatores que estão associados aos grupos que se pretende beneficiar”. MELO,

devem ser ajustados para alcançar a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, porém pior seriam as consequências sociais se a política de ação afirmativa fosse extinta.

A inexistência de regulamentação específica que discipline a questão da reserva de vagas às pessoas com deficiência no mercado de trabalho, conforme previsto no art. 2º, III, b, da Lei nº 7.853/89, pois as cotas estão definidas na lei da previdência, art. 93 da Lei nº 8.213/91, cria impasses para atender às necessidades específicas do grupo e às peculiaridades do próprio empresariado.

Para a legislação, não importa qual é o trabalhador reabilitado ou pessoa com deficiência que ocupa a vaga da cota obrigatória, e isso pode, inclusive, proporcionar um sentimento de incômodo à própria pessoa com deficiência ocupante da vaga, seja porque percebe que poderia superar as funções que lhe foram atribuídas, ou seja, em suposição oposta, porque se constrange em admitir que não consegue realizar uma determinada função que também lhe foi atribuída.

Trata-se do que já foi mencionado quando se referiu à necessidade de o Estado adotar políticas de estímulo, porém, no momento, enfatiza-se que a sensibilização do legislador e do operador do direito sobre a questão do preenchimento das cotas legais é fundamental já que o ambiente de trabalho pode tanto contribuir como sobrestar o desempenho das pessoas com deficiência.

Luciana Alves156 comenta que a mesma pessoa com deficiência pode ser altamente eficaz em uma determinada função e, ao mesmo tempo, extremamente desincentivada em relação à execução de outra função em razão das dificuldades que apresenta. Resta, assim, notória a necessidade de mapeamento das funções até como forma de estimular a política de ação afirmativa.

É importante esclarecer que a proposta de mapeamento das funções não consiste em estabelecer um rol de funções taxativas de acordo com o tipo de deficiência predominante. Parece que isso acarretaria em discriminação, pois, na verdade o que se pretende é articular de modo inclusivo a pessoa com deficiência no mercado de trabalho.

156 ALMEIDA, Luciana Alves Drumond; CARVALHO-FEITAS, Maria Nivalda de; MARQUES, Antônio

Luiz . Inserção no mercado formal de trabalho: satisfação e condições de trabalho sob o olhar das pessoas com deficiência. O trabalho e as pessoas com deficiência: pesquisas, práticas e instrumentos de diagnósticos. In: CARVALHO-FREITAS, Maria Nivalda de; MARQUES, Antônio Luiz (Orgs.). O Trabalho da Pessoa com Deficiência. Curitiba: Juruá, 2009. p. 89.

Dessa forma, o mapeamento de função que se defende consiste em práticas de Recursos Humanos que venham identificar o perfil do candidato, tal como já é realizado nas empresas, por meio de dinâmicas de grupos e treinamentos, e só assim definir a função adequada para a pessoa.

Afasta-se, assim, a alocação das pessoas com deficiência em setor isolado da empresa, de forma segregacionista, em atenção ao art. 2º da Recomendação nº 168, de 20/06/1983, da Organização Internacional do Trabalho para Reabilitação Profissional e Emprego de Pessoas com Deficiência, já que isto eliminaria as possibilidades de progresso no emprego.

Questões quanto à possibilidade de realização de horas extras, providências específicas a serem tomadas pela Segurança e Medicina do Trabalho, limitações quanto à possibilidade do exercício do trabalho insalubre e perigoso são aspectos relevantes e que deveriam ser objeto da legislação, embora seja importante ponderar que essas necessidades só poderiam ser verificadas após existir aumento do número de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

Além da ausência de regulamentação específica a respeito do trabalho da pessoa com deficiência, existem outros pontos que carecem de esclarecimentos e, que, na prática, geram dúvidas em relação à aplicação das cotas legais.

O primeiro se refere às cotas legais reservadas ao aprendiz157 e às pessoas com deficiência também contratadas sob essa condição. A dúvida que surge consiste na possibilidade de se contar simultaneamente a cota de aprendizagem e a cota para as pessoas com deficiência.

A respeito do assunto a legislação não apresenta esclarecimentos, embora o entendimento manifestado pela Secretaria de Inspeção do Trabalho158 seja de que inexiste sobreposição das cotas, já que cada uma delas teria uma finalidade e

157 Decreto 5598/05, esclarece que a pessoa com deficiência também pode ser contratada por meio

de contrato de aprendizagem, inclusive, inexistindo limite de idade para a caracterização do contrato, Art. 2. “Aprendiz é o maior de quatorze anos e menor de vinte e quatro anos que celebra contrato de aprendizagem”, nos termos do art. 428 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT.Parágrafo único. A idade máxima prevista no caput deste artigo não se aplica a aprendizes portadores de deficiência. A respeito das cotas legais para contratação de aprendizes, esclarece o Art. 9. “Os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional”.

158 SECRETARIA DE INSPEÇÃO DO TRABALHO, SIT. A Inclusão das Pessoas com Deficiência no

Mercado de Trabalho, Brasília: 2 ed, SIT, 2007. disponível em: http://www.mte.gov.br/fisca_trab/inclusao_pessoas_defi12_07.pdf. Acesso em: 18 de mar. 2012.

condições próprias. O contrato de aprendizagem firmado com a pessoa com deficiência, assim, teria como finalidade habilitá-la para sua inclusão no mercado de trabalho, nos termos do art. 93, da Lei nº 8.213/91.

Outra controvérsia decorrente da ausência de esclarecimentos sobre o cumprimento das cotas reservadas às pessoas com deficiência na empresa se refere à possibilidade da empresa tomadora de serviços aproveitar os empregados contratados, em atendimento das cotas legais, pela empresa terceirizada. O Ministério do Trabalho defende que isso não é possível na medida em que a lei estipulou reserva de cargos que deve ser preenchida por empresa, de forma que os empregados da empresa terceirizada somente contam para esta, não para a tomadora.159

A respeito do mesmo assunto, a título de complementação, é curioso anotar que as medidas de políticas afirmativas francesas160 seguem caminho oposto, pois, para o direito daquele país, se a empresa exigir de seus fornecedores terceirizados a contratação de pessoas com deficiência, o tal trabalhador será considerado empregado da empresa tomadora de serviço para fins de preenchimento da respectiva cota. Contudo, os trabalhadores terceirizados não podem superar o percentual de 50% da cota obrigatória. Na verdade, a realidade do sistema inclusivo para pessoas com deficiência se distancia do cenário brasileiro, já que a própria lei francesa permite o pagamento de contribuição pelo não preenchimento da cota e isso possibilita diversas alternativas às empresas, de sorte que a maior parte delas paga a contribuição, poucas contratam toda a cota e boa parte delas contratam a cota e complementam com o pagamento da contribuição.

Outrossim, a legislação nacional regulamentadora da inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho também deveria apresentar critérios mais específicos ou, pelo menos, esclarecimentos quanto à fixação da base utilizada para cálculo das cotas em determinadas atividades, como no caso das empresas de

159 COIMBRA, Cristiane Elias Penido; GOULART, Iris Barbosa. Análise da inserção das pessoas com

deficiência segundo suas percepções. In: CARVALHO-FREITAS, Maria Nivalda de; MARQUES, Antônio Luiz (Orgs.). O Trabalho da Pessoa com Deficiência. Curitiba: Juruá, 2009. p. 106.

segurança e construção civil, pois por causa da natureza da atividade, a contratação de pessoas com deficiência exigiria mais cautelas. 161

A respeito desse ponto não se pretende apoiar a posição autorizadora da flexibilização da lei de cotas, ao contrário, é importante enaltecer as práticas relacionadas ao mapeamento de inclusivo.

O mapeamento inclusivo que se propõe não consiste em predeterminar as funções que cada pessoa com deficiência pode exercer. Isso ensejaria prática discriminatória e segregacionista.

Propõe-se um mapeamento com olhos para o reasonable accommodation, ou seja, projetar e exigir das empresas adaptações para oferecer emprego a todos.

O mapeamento inclusivo é diferente do mapeamento de função. O mapeamento inclusivo pressupõe o incentivo, pelo Estado às empresas, de práticas inclusivas e isso compreende, estudos, pesquisas e planejamentos para que todas as empresas se adaptem às cotas legais, por mais que a atividade da empresa seja peculiar e, em primeiro momento, não pareça se adequar ao emprego das pessoas com deficiência.

Por enquanto, as soluções trazidas pelo sistema no que condiz a inclusão do grupo são notoriamente reduzidas.

Esse quadro pode ser explicado até mesmo pela análise feita sobre a política de inclusão adotada por outros países, o que demonstrou que é imprescindível a somatória de outros fatores162, e não somente a garantia das cotas, quais sejam: a reabilitação médica e profissional, o preparo e adaptação para o trabalho, incentivos aos empregadores por sistemas de cotas-contribuição, adaptação dos locais e equipamentos.

Por isso, no próximo capítulo pretende-se analisar essas políticas públicas que incentivam e viabilizam a concretização da inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho. A política de cotas remedia a discriminação do grupo, porém é necessário enxergar além dela.

161 Não se quer dizer que a flexibilização das cotas para essas empresas seria a solução ideal, mas

sim que o nível avançado de profissionalização e os cuidados para inclusão das pessoas com deficiência em determinadas áreas são fundamentais.

162

“No Brasil, para que se alcance a igualdade real no exercício do direito do trabalho das pessoas portadoras de deficiência, é imprescindível a adoção de medidas compensatórias (ações afirmativas), tais como: contribuições, prêmios, subsídios e benefícios, que, aliadas ao sistema de cotas, trarão novo estímulo aos empregadores para contratação de integrantes deste grupo favorecido”. MELO,

4. PARA ALÉM DAS COTAS: AS OUTRAS MEDIDAS DE DISCRIMINAÇÃO