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FORA DE TEMPO E DE LUGAR

No documento Magazine de Ficcao Cientifica 03 (páginas 115-140)

George Collyn

escolas diferentes. Houve os que nada censuravam, que mergu- lharam em suas novas vidas com a impassibilidade de um bêbedo num vagaroso mergulho. Houve outros que se dispuseram a explo- rar esse novo e estranho mundo com o mesmo interesse que os ex- ploradores demonstram pelo desconhecido. A maioria — e eu fazia parte dela — não conseguiu alcançar o ajustamento psicológico ao mundo que era ainda mais estranho por ter sido familiar um dia. O nosso grupo era de vinte e oito homens. Quatro cometeram suicí- dio no ano de nossa volta. Quanto aos demais, muitos voltaram-se para dentro de si mesmos e se isolaram do mundo.

Quando se tem vinte e três anos — ao se considerar os pro- blemas inerentes ao regresso, quando se terá trinta e três — pensar que o mundo terá progredido cinqüenta anos, com as conseqüentes mudanças tecnológicas e sociais, parece sem importância. Para os jovens, o progresso permanece abstrato porque não possuem uma retrospectiva de visão o bastante ampla para perceber como o acú- mulo de pequenas mudanças pode, através dos anos, revolucionar a maneira de viver. É claro que eu fora advertido por uma velha geração, que criticava o mundo que seus filhos estavam criando. Mas meus antepassados haviam moldado o mundo, sofreram “mu- danças”, sim, no entanto estavam vivendo dentro delas, enquanto elas se processavam, e não tinham sido obrigados a assimilá-las de uma só vez. Estavam prevenidos, vendo as “mudanças” se veri- ficarem.

Nada, muito menos meus vinte e três anos, podia imaginar o impacto emocional de nossa volta do Espaço para um mundo que se modificara para além de qualquer possibilidade de reconhe- cimento. Era como se a gente tivesse nascido de novo, mas com idéias e preconceitos já formados e uma variante com a norma social.

Certas coisas podem levar uma pessoa a lutar — nem que seja apenas para ver suas idéias alteradas pelo inesperado. Já me convencera de que meu pai estaria morto quando eu voltasse; que minha madrasta — sua segunda mulher — e uma filha da minha idade, deveriam estar velhas; que minha irmã, nenê quando eu partira, teria cinqüenta anos e provavelmente estaria com netos do tamanho que tinha quando eu a vira pela última vez. Estava preparado para isto, sim, mas não para receber o avanço dos medi- camentos e tratamentos geriátricos. Encontrei meu centenário pai

no espaço-pôrto. Não somente estava vivo, como também parecia tão jovem como quando eu saíra de viagem, no início da década de meus vinte e três anos. O encontro provocou-me confrações no estômago, como quando eu via alguma perversão obscena.

O que mais me revoltou — além da sensação causada por esses verdadeiros transtornos pessoais — foi o monótono tom cin- zento de vida. Não só o cinzento em côr, propriamente — apesar das maciças construções cinza, em concreto, que passavam por arquitetura, e o monótono tom castanho das roupas, que eram iguais para homens e mulheres — mas a falta de calor do ambiente de vida, em geral, era o que mais deprimia. A monotonia da vida em si chocou-me de modo obsecante. Aquela gente eliminara a velhi- ce, mas no processo, destruíra a alegria da juventude. As pessoas andavam em ruas horríveis, com roupas horríveis e seus rostos es- pelhavam toda aquela feiúra. Tudo cinzento, vazio, fosco. Pareciam ver, mas não sentir.

Acrescente-se a isso o desenvolvimento tecnológico de meio século e imagine-se minha perplexidade. Havia um veículo, sem motorista, a que chamavam “robô-car”, algumas diversões medío- cres a que chamavam “altrigo” e outras, misteriosas, cujos nomes nunca consegui entender. Na verdade, eu não conhecia o funcio- namento, nem as finalidades das novas invenções, se bem que to- dos se demonstrassem bastante pacientes e dados, querendo me explicar tudo. Mas eu cerrava os ouvidos e, assim que tinha uma oportunidade, fugia para o apartamento que a Agência Espacial me dera para morar.

O apartamento tinha cinco cômodos empoleirados, em glorio- so isolamento, no cimo de uma daquelas montanhas de concreto feitas pelo homem. Contava apenas com uma invenção moderna: a máquina automática de refeições. Aliás, fiquei bem satisfeito com isso, porque me evitava maiores contatos com o mundo lá de fora.

Quanto ao resto, tinha livros e discos para passar o tempo. A princípio, insisti em ligar a TV, na esperança de que me ajudasse a conhecer e aceitar aquele mundo. Mas, por alguma razão que eu desconhecia, a TV perdera a popularidade e tudo que consegui sin- tonizar foram duas estações em cadeia, corri um programa musical e de humor. Como a maior parte do que diziam era incompreen- sível para mim, passei definitivamente a preferir a palavra escrita e a música de Bartok e Schoenberg. E passei a maior parte de

meu tempo meio adormecido, numa espécie de deprimente meio- sonho.

Mas, apesar de tentar esquecer o mundo, o mundo se recu- sava a me esquecer. Entravam avalanches de cartas pela minha porta e o videofone não parava de soar, a ponto de eu chegar a queimar as primeiras e desligar o segundo. Como resultado de tal atitude, quase tive que enfrentar uma corte marcial por faltar a uma recepção presidencial — convite que queimei ou não recebi. Afinal, acabei contratando um homem para atender ao videofone e abrir as cartas, separando as que merecessem ser passadas para mim. O mesmo homem agia como meu intermediário em transa- ções externas.

Não sei dizer qual o mérito que Bárbara Fellin tinha aos olhos dos homens. Ela proclamava ser minha cunhada, uma vez que se casara com um irmão que nascera depois de minha partida e fale- cera num acidente, antes do meu regresso. Nosso parentesco pare- ce que não lhe dava o direito automático de falar comigo: minhas amizades não existiam. Então, para meu eterno desgosto, meu censor-secretário fê-la chegar até mim.

Ela queria me convidar para uma festa. Imaginei que seria um daqueles “venha-e-babe-se” diante dos maiores nomes do mundo dos negócios... e que eu seria uma das celebridades a serem admi- radas na ocasião. Ir a essa festa era algo que estava inteiramente fora de cogitação para mim. Mas, enquanto ela subia para meu apartamento, senti que a estava esperando com certa satisfação; de qualquer modo, seria impossível escapar-lhe àquela altura.

Os acontecimentos que se seguiram foram suficientes para me convencer da inevitabilidade do destino. Aconteceu o que não deveria ter acontecido. Bárbara Fellin fêz-me aceitar o convite para a tal festa. Dificilmente poderia dizer que acabei convencido por seus argumentos. A causa principal deve ter sido que sofri uma re- volução de sentimentos tão completa quanto a que sofrera quando me decidira pela reclusão.

Essa festa devolveu-me o mundo que eu pensara que tivesse deixado de existir. Se o mundo lá fora era sombrio e uniformemente cinzento, essa festa era uma avalanche de cores. Relutei muito em aceitar, mas se não tivesse ido, não ficaria sabendo que existiam pessoas alegres e vivazes. Quando a alegria e as cores caíram em cima de mim, senti a tensão escoar-se e, pela primeira vez em um

ano, comecei a achar que valia a pena continuar a viver.

Minha anfitriã agitava-se por todos os lados, com as atitudes próprias da falsa juventude, que aparentava. Não sei quantos anos tinha, na verdade; sentia-me desgostoso demais ao pensar na pre- servação artificial para ter coragem de indagar. Mas não aparenta- va mais de dezenove anos: vestia-se e agia de acordo, puxando-me pelo braço, mergulhando seu olhar no meu com o fervor de uma adolescente diante de um herói.

Bárbara notou que eu coxeava e imediatamente referiu-se ao fato — para meu embaraço. Tentei não falar sobre o acidente que causara o defeito, mas ela exclamava em voz muito alta que eu não precisava explicar, pois ela sabia perfeitamente o quanto os astro- nautas eram românticos e corajosos. O grupo todo deve tê-la escu- tado e todos os olhos se voltaram para mim, que continuei obedien- temente atrás dela, sentindo-me como um personagem byroniano numa tragédia de salão do século XIX.

Dali a pouco fiquei sossegado. Andei por entre os convidados, bebendo, comendo e trocando palavras convencionais a respeito de asssuntos convencionais, pois, em cinqüenta anos, as pessoas não haviam mudado nada quanto à capacidade de conversar durante horas, evitando envolver-se em temas sérios.

A moça estava de pé, sozinha, num canto da sala. Vi-a diante de mim e sorri, involuntariamente. Não se podia deixar de sorrir para ela; irradiava calma, calor e amizade. Participava da festa sem ser parte dela, formava uma espécie de centro de tempestade, onde as mais frenéticas energias morriam, deixando-a intocada. Estava só, mas não distante; sorria para os demais convidados com uma espécie de gentil bênção no olhar. Eu lamentava a falta de côr do mundo, mas essa moça, em preto e branco, era mais evidente do que o mais exagerado escarlate. A pele de seu rosto e ombros era do puro e macio branco da pérola, enquanto seus exuberantes cabelos eram de um negro tão profundo que emitiam reflexos azulados. O vestido, de um preto acetinado, era austera e clàssicamente drape- ado, moldando-lhe o corpo com atraente simplicidade.

Agiu sobre mim como um imã, parecendo-me que os demais convidados se apartavam momentaneamente, formando um cor- redor entre nós, como se dois pólos de atração repelissem matéria estranha.

Fellin.

— Eu sei. Tenho muito prazer em conhecê-lo — respondeu ela, simplesmente.

Sentia-me inteiramente perdido, sem ter o que dizer. Achei que devia dizer alguma coisa, para não parecer monstruosamente idiota. Mas tudo que me ocorria parecia-me banal ou petulante demais para a impressão que eu gostaria de causar a ela. Nesse dilema, fui socorrido pela dona da casa.

— Oh, vocês se encontraram! — gritou Bárbara. — Estou contente. Esta é Marion Watkins, sabe?

E pôs-se a discorrer ao meu ouvido, em tom de voz que deve- ria ser um sussurro, mas que metade da sala deveria estar ouvin- do. Fiquei confuso, principalmente por não conhecer aquele nome que, pelo jeito, deveria ser importante, e também por não conseguir resistir ao evidente divertimento de Marion diante das exclamações apavoradas de Bárbara. Sinto ter que confessar que soltei uma boa gargalhada, mortificando a dona da casa.

Bárbara se afastou, com sua mente borboleteante pousan- do aqui e ali, esquecendo-se logo de minha gafe e tratando de se deliciar com as atenções de tanta gente. Marion e eu ficamos em agradável silêncio.

— Quando posso vê-la outra vez? — perguntei, enfim.

— Mas acabamos de nos conhecer! — disse ela, os olhos bri- lhando, o narizinho franzindo-se e os lábios curvando-se; todo seu expressivo rosto demonstrando o quanto se divertia. — Por que pede para me ver uma segunda vez, quando está me vendo pela primeira?

— Quero dizer, sem esta gente toda. Quero saber se podemos nos encontrar sozinhos, para conversarmos.

— Eu sei.

— É a segunda vez que você diz “eu sei”. Como pode saber tanto a meu respeito, quando nada sei de você?

— Acontece que você é o homem-mistério da nação, neste momento. Não sabia? David Fellin, o astronauta recluso, o eremita da Torre Bloco C; o homem que esteve entre as estrelas, mas não quer nem atravessar a rua. Como será êle? Não desconfia de que Bárbara só conseguiu reunir esta gente toda aqui porque todos vieram com a esperança de ver você?

quando Bárbara avançou, com o ar de um cão persistente que não quer perder seu osso.

— David, estou aborrecidissima com você! As pessoas que não vieram aqui para vê-lo, vieram para ver Marion. Não posso per- mitir que minhas duas atrações monopolizem uma à outra. Vamos, vá conversar com outras pessoas!

Fui arrastado, contra a vontade, para perto de outra pessoa, com o ar de quem vai para um purgatório. Perdi Marion de vista e logo a tortura se tornou tão aguda que saí, rápida e discretamente, da casa, sem tornar a vê-la.

No entanto, eu iria encontrá-la ainda. Simplesmente porque, tendo pedido o número de seu vídeo-fone à Bárbara, bombardeei-a com chamadas, até que ela concordou em se encontrar comigo. Como ultrapassaria a aversão que sentia pelo mundo lá de fora — se Marion me pedisse que o fizesse — não sei; no entanto, creio que teria feito esse esforço por ela. Aliás, Marion, como eu e algumas outras pessoas, gostava do tipo de vida que desaparecera no século anterior. Levou-me a um verdadeiro sub-mundo, que existia para satisfazer os que não se adaptavam à monotonia geral. Fomos a lugares onde se comia carne que fora viva e vegetais que haviam crescido na terra, não num tanque químico: lugares onde a comida era feita por cozinheiros humanos; lugares onde a gente se divertia vendo dançarinos e ouvindo cantores.

Naturalmente, esse tipo de vida era caro. A comida, as roupas que Marion usava, tudo isso — hábitos e coisas que eram comuns em minha juventude — só estavam ao alcance de poucos e ricos. Felizmente, minha pensão estatal era suficientemente alta para co- brir algumas despesas e Marion parecia ganhar bastante bem.

— Que é que você faz? — perguntei-lhe, uma vez. — Parece ser muito bem paga. É atriz?

— Sim — respondeu ela. — Acho que posso dizer que sou atriz.

— Mas onde você representa? Não há teatros, cinema, tele- visão ...

— Represento, na vida — respondeu. — Vivo inteiramente para pessoas que vivem apenas pela metade.

Não entendi e achei que ela estava falando por metáforas. Como se percebesse que um entendimento completo poderia me causar desgosto, deixei o assunto de lado e comecei a falar de ou-

tras coisas.

Não creio que alguma vez tenha pedido a Marion, que se ca- sasse comigo. Numa ocasião, em algum ponto de nossas relações, ficou simples e tàcitamente entendido que íamos nos casar.

A cerimônia foi resultado de um acordo. Marion, como é na- tural em uma mulher, queria que fosse o mais alegre e maravilhosa possível. Anti-social, eu queria que fosse o mais rápida e secreta possível. No fim, casamo-nos em uma das antigas igrejas da cida- de, com toda pompa e circunstância que o acontecimento requeria. Mas estavam presentes apenas alguns dos mais íntimos amigos de Marion. Quanto a mim, não tinha convidados, nem mesmo os parentes.

Comprara um avião particular. Custara uma pequena fortu- na, porque tais máquinas eram antigas e raras. Logo que a ceri- mônia terminou encontrei-me no ar com Marion, sozinhos. Então, achei que o gasto exagerado valera a pena. Ao sentir o gosto da liberdade, lá em cima, larguei minhas preocupações na terra. A felicidade que sentia ao estar voando, com minha mulher ao lado, segurando os controles do aparelho, foi brevemente empanado pela visão — lá de cima— da massa cinzenta e amorfa dos edifícios, que se estendia de horizonte a horizonte. Mas a Natureza é muito velha, muito forte para ser totalmente dominada pelo Homem. Afinal a cidade terminou e o antigo verde da grama e das árvores substituiu o cinzento do concreto.

Ao anoitecer, descemos no lugarzinho escondido que a Agên- cia Espacial descobrira para nós — um bangalô de pedra oculto pela vegetação, de onde saía uma alameda, ladeada de árvores, que ia dar na praia de areia prateada, com a paisagem, o cheiro e o canto do mar. Estávamos inteiramente sós. Não havia estradas para aquele local, que nunca fora habitado. Durante uma semana, ficaríamos completamente entregues um ao outro e nada mais.

Não tenho palavras para descrever minhas sensações du- rante esse período. Talvez algumas pessoas apaixonadas possam sentir o mesmo, mas os sentimentos são algo tão pessoal que não podem ser comparados com os dos outros. Nessa semana fizemos coisas que poderiam parecer engraçadas ou vergonhosas, se escri- tas ou contadas — no entanto, devido à nossa confiança mútua, eram lindas e naturais.

Todo temor, desgosto, mal-estar que eu sentira por aquele estranho mundo desapareceram na alegria do nosso casamento e união.

Quando de meu primeiro contato com aquele mundo, eu me tornara amargo e ia ficando cada vez pior. Mas, ao viver junto de Marion, a barreira de gelo que erguera ao meu redor começava a se dissolver lentamente.

Marion não pediu que mudasse meu modo de vida. Tudo que pediu, foi que eu não o tentasse impor a ela. Saía e voltava, como sempre fizera, mas eu fui, aos poucos, acostumando-me a acompanhá-la a restaurantes e a compras. E à medida que Ma- rion quebrava minhas reservas, essas saídas iam-se tornando mais freqüentes. Tornei-me mais tolerante aos costumes estranhos do mundo; a não ser para com a curiosidade verdadeiramente histé- rica que meu aparecimento provocava em determinadas pessoas. Atribuía isso à minha fugaz fama de astronauta. Por algum tempo, fui tolerante e feliz.

Então, começou o pesadelo. Era uma linda manhã de pri- mavera e eu estava só no apartamento. Marion fora comprar uns vestidos. O vídeofone chamou.

Recomendara ao meu secretário que atendesse a todos os chamados sem importância ou inúteis. Por isso, atendi tranqüila- mente.

— Chamo-me Sheldon Walker — disse o homem de rosto simpático e sadio. — Sou vice-presidente da Companhia Altrigo.

— Minha mulher não está — respondi, achando que êle que- ria falar com Marion.

Sabia, então, que Marion trabalhava, sendo muitíssimo bem paga, para a Companhia Altrigo, como atriz, numa modalidade ori- ginal de divertimento organizado pela com-panhia. Como faziam isso, não sabia.

— Não é com Marion que quero falar, senhor Fellin — disse êle. — É com o senhor mesmo. Acha que poderá estar aqui em nosso escritório dentro de uma hora? Tenho uma proposta a fazer- lhe.

E eu concordei. Que Deus me ajudasse!

um letreiro colorido e uma porta de aço brilhante, um pouco menos sombrios do que os escritórios vizinhos do bairro comercial. O pré- dio também sobressaía dos demais por causa dos magotes de gente que paravam na rua para olhá-lo, como se fosse um santuário ou um importante monumento nacional. Quando saltei do táxi-robô que me trouxera, senti os olhares de todos se voltarem para mim e vacilei, como faz um animal noturno ao sair para a luz do sol.

Fui recebido como visita real. Portas abriam-se à minha apro- ximação e um exército de recepcionistas inclinou-se, perfilou-se guiou-me através de corredores, até a porta de Walker.

Sheldon Walker, pessoalmente, era a saudável, radiante e insinuante imagem que a tela do meu vídeofone mostrara. Como Marion, eu e nossos amigos, usava um terno cujo tecido tinha ma- tiz brilhante, que o diferenciava do cinzento ou castanho de uso geral. Seu escritório era luxuosamente decorado e, obviamente, êle pertencia à anacrônica elite daquele mundo.

Providenciou para que me acomodassem, mandou que me oferecessem bebida e salgadinhos. Parecia um tantinho relutante em começar a me expor sua proposta. Quando o fêz, dispensou rodeios.

— Queremos que trabalhe para nós. De fato, necessitamos do senhor como emitente, porque já está, de certa forma, trabalhando para nós há algum tempo. Marion sempre foi muito popular, mas desde o casamento, sua classificação subiu a ponto de estourar nossos gráficos. Agora, estamos sendo pressionados pelos homens que, por não querermos aceitá-los como clientes da nossa seção- de-sexo, acham que estão sendo expoliados, privados de algo muito importante.

— Creio que não sei de que está falando, senhor Walker. — Estou lhe pedindo para se tornar emitente da Altrigo, senhor Fellin. O centro da rede de transmissão Altrigo, única no mundo, em funcionamento 24/24 horas, sem interrupção. Como a sua mulher.

— Mas que quer dizer isso ? Que significa? — perguntei. — Não sei o que é.

— Bem... Há uma pequena operação, claro. Mas é muito sim- ples e inteiramente indolor, garanto. Se o senhor quiser, se apro- fundar, nossos técnicos...

No documento Magazine de Ficcao Cientifica 03 (páginas 115-140)

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