• Nenhum resultado encontrado

Parte I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

Capitulo 3 – Formação de Professores

3.1. Formação de professores: modalidades e práticas

Quando se aborda o tema da formação de professores, tendo como referencial legislativo o ECD (DL n.º 75/2010), há a considerar a formação inicial, definida no art.º 13.º como a que “confere habilitação profissional para a docência no respetivo nível de educação ou de ensino”, a formação especializada (art.º 14.º), que “visa a qualificação dos docentes para o desempenho de funções ou atividades educativas especializadas e é ministrada nas instituições de formação a que se referem os números 3 e 5 do artigo 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo” (escolas superiores de educação e estabelecimentos de ensino universitário) e a formação contínua, a qual se destina a “assegurar a atualização, o aperfeiçoamento, a reconversão e o apoio à atividade profissional do pessoal docente, visando (…) objetivos de desenvolvimento na carreira e de mobilidade” (art.º 15.º), devendo ser planeada no sentido de promover a capacitação de competências profissionais no docente.

As duas primeiras modalidades de formação realizam-se, como já referimos, nas universidades e nas escolas superiores de educação dos setores público e privado; a terceira é, na maioria das vezes, oferecida pelos centros de formação de associações de escolas, os

designados CFAE, embora possa emanar também dos serviços centrais ou regionais do MEC, das universidades ou dos sindicatos de professores, entre outros organismos. Esta última pode resultar da iniciativa de instituições vocacionadas para tal ou “ser assegurada por organismos públicos ou entidades privadas, podendo ser ainda promovida ou apoiada pelos estabelecimentos de educação ou de ensino, individualmente ou em regime de cooperação, nos termos previstos na legislação aplicável” (art.º 16.º do ECD).

No que diz respeito à formação inicial, apesar de termos vivido em Portugal, entre 1960 e 1980, um período de grande carência de professores, em virtude da expansão e da generalização da escolaridade obrigatória (Alarcão, Freitas, Ponte, Alarcão, & Tavares, s/d), atualmente apenas alguns jovens docentes, após a conclusão de uma licenciatura e de um mestrado na docência, de índole profissionalizante, resultado da aplicação do modelo de Bolonha, conseguem uma colocação. Assim, uma preocupação crescente dos decisores educativos prende-se com a qualidade da formação (Carvalho, 2009), tanto dos docentes recém-formados como dos docentes com vários anos de serviço que ou não tiveram acesso a uma formação inicial que fosse ao encontro das suas reais necessidades ou trilharam caminhos específicos na docência, por exemplo, no âmbito da formação profissional ou do ensino à distância, que lhes exigem outro tipo de competências.

A formação inicial de professores não contempla, em nenhuma das áreas específicas da docência, unidades curriculares que versem a temática dos cursos profissionais, assim como também não considera outras modalidades específicas de educação, como é o caso, por exemplo, da Educação Especial, do Ensino para Adultos ou do Ensino de Português no estrangeiro.

A formação especializada, de acordo com o preceituado no DL n.º 255/98, compreende os seguintes cursos de qualificação para o exercício de outras funções educativas: Educação Especial, Administração Escolar e Administração Educacional, Animação Sociocultural, Orientação Educativa, Organização e Desenvolvimento Curricular, Supervisão Pedagógica e Formação de Formadores, Gestão e Animação da Formação, Comunicação Educacional e Gestão da Informação. Apenas professores que possuam habilitação profissional para a docência, com cinco anos de efetivo serviço docente, podem candidatar-se à matrícula e à inscrição nestes cursos. Alguns deles, independentemente da atribuição ou não de um grau académico de 2.º ciclo (mestrado), incluem unidades curriculares relacionadas diretamente com a formação profissional, dando, não raras vezes, origem a dissertações, estágios e projetos no âmbito do EP.

Os professores que têm acesso à modalidade de formação pós-graduada supracitada, quer se trate de uma especialização quer se trate de um mestrado, como refere Jubilot (2010), estão mais bem preparados para encarar os desafios lançados pelos cursos profissionais. Segundo esta autora, reconhece-se, nas escolas secundárias, a necessidade de formação especializada para os docentes que lecionam nos cursos profissionais, principalmente para os diretores dos mesmos. Este tema é também abordado por Formosinho (2000), que considera a operacionalização do desenvolvimento profissional especializado, no âmbito dos contextos e dos agentes que a podem facultar, relacionando as lógicas escolar, académica e empresarial. Paralelamente, no que diz respeito às predileções atinentes às modalidades de formação, apuramos “a sua ancoragem na interligação entre a teoria e a prática, apoiando-se na colegialidade e numa orientação para o desempenho quotidiano.” (Jubilot, 2010, p. 141).

Sendo certo que a teoria está intrinsecamente ligada à prática (e vice-versa), existe consenso na literatura acerca dos conteúdos de formação considerados ajustados e necessários ao exercício de funções educativas nos cursos profissionais, devendo estes contemplar áreas diversas nos domínios que, a seguir, se elencam: o domínio social da inteligência emocional, que inclui a motivação, a empatia e as habilidades sociais, e da mediação; o domínio das estratégias de liderança e orientação; o domínio do trabalho administrativo e respetiva organização; o domínio pedagógico da avaliação dos alunos; o domínio da prestação de contas, isto é, da avaliação dos cursos; o domínio das metodologias de investigação em educação; o domínio da gestão de equipas e da supervisão (Formosinho, 2000; Jubilot, 2010; Morgado, 2007).

Tendo em conta que o desenvolvimento e a aquisição de competências esperados de um profissional de educação incidem, essencialmente, nos campos técnico, científico, político e pedagógico, qualquer processo de especialização vai requerer, indubitavelmente, uma componente de formação que inclua, por um lado, a experiência no desempenho especializado continuado (o saber experiencial) e, por outro lado, a reflexão sobre a mesma (Fialho, Silva, & Saragoça., 2013). Deste modo, a formação especializada certificada, por via da sua consagração formal, traduzir-se-á num maior impacto na qualidade da educação, porquanto poderá ter repercussões na gestão dos recursos humanos atinentes a determinada área de gestão intermédia (Formosinho, 2000).

As transformações educativas dos últimos anos reclamam, da parte dos docentes em exercício de funções, um novo perfil de saberes e de competências profissionais, mais abrangente, mais direcionado, mas, ao mesmo tempo, mais ponderado e reflexivo.

No que diz respeito aos cursos profissionais, é através da auto-observação e da autossupervisão que os docentes que neles lecionam podem refletir sobre as suas práticas, com vista à progressiva melhoria do seu desempenho (Gonçalves, 2006). Neste sentido, Gonçalves (2006) considera a auto-observação um robusto instrumento de investigação do professor, principalmente quando focalizado num nível mais intimista de análise, capaz de exaltar a sua capacidade formativa e de conduzir ao seu aperfeiçoamento pessoal, profissional e social. Assim, a prática da observação participante, tendo em conta a armadura conceptual da análise da relação educativa, converte-se numa modalidade específica de análise que assenta na reflexão enquanto ferramenta de recolha de informação (Gonçalves, 2006).

Conforme menciona Gonçalves (2006), a figura do professor encerra no seu âmago as grandes linhas mestras do seu próprio desenvolvimento individual, social e profissional, assumindo, neste âmbito, o exercício da auto-observação e análise da relação educativa uma importância crucial, enquanto instrumento auxiliador e mediador dos mecanismos da autoaprendizagem docente. À luz desta conceção, a auto-observação facilita e promove a reflexão docente, contribuindo, claramente, para o alargamento da rede de professores reflexivos e críticos e, por conseguinte, para a constituição de escolas cada vez mais reflexivas.

Avocando a escola, enquanto organização, algum protagonismo no aperfeiçoamento dos seus atores, ela desencadeia junto destes, e no contexto circundante, um processo de interação dialética e integral; o crescimento daí resultante reverte numa melhoria global, a nível de desempenho e de qualificação, dos indivíduos que nela trabalham (Alarcão, 2008). A autora apresenta, assim, um conceito distinto de supervisão, em que o enfoque deixa de estar na esfera individual para se posicionar na ótica de uma perspetiva desenvolvimentista global da instituição escola: “desenvolvimento qualitativo da organização escolar e dos que nela realizam o seu trabalho de estudar, [investigar, aprender], ensinar ou apoiar a função educativa por meio de aprendizagens individuais, [significativas] e coletivas, incluindo a formação dos novos agentes” (p. 35).

Apenas uma instituição reflexiva, uma instituição competente que consiga inserir-se na comunidade envolvente, será capaz de abarcar os vários atores educativos, enquanto aprendentes, num projeto conjunto de melhoria da qualidade educativa, com vista à promoção do sucesso educativo e à consequente diminuição da inquietação advinda do insucesso (Alarcão, 2008; Gonçalves, 2006). A qualidade da prática pedagógica, a sua natureza e a organização estrutural que lhe subjaz são, pois, fortemente influenciadas pela formação que o docente vai adquirindo ao longo da sua carreira, nomeadamente no campo de ação da formação

contínua e da utilização da metodologia do trabalho de projeto (Formosinho & Machado, 2015; Jubilot, 2010; Many & Guimarães, 2006; Roldão, 2009).