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1.6 MOTIVAÇÃO PESSOAL PARA A PESQUISA

1.6.5 Formação na FACED

Na condição de “aluna regular” do programa, participamos, no período de março a julho de 2006, das disciplinas obrigatórias EDC603 – Educação, sociedade e práxis pedagógica e EDC 557 – Abordagens e técnicas de pesquisa em educação, e da atividade obrigatória EDC793 – Projeto de tese I. No período de setembro a dezembro de 2006, cursamos EDCA19 TEE – Formação de professores, política, currículo e experiências e EDCA20 TEE – Epistemologia das ciências – questões educacionais, e a atividade obrigatória EDC793 – Projeto de tese II. E, no período de março a julho de 2007, cursamos a disciplina EDC595 – Filosofia e educação.

No primeiro encontro da disciplina EDC 603 – Educação, sociedade e práxis pedagógica participamos de duas dinâmicas: a primeira solicitava que falássemos sobre a

origem do nosso nome e o que ele representava para nós. A outra foi uma dinâmica em que deveríamos explicitar a nossa compreensão sobre algumas noções importantes para entendermos os propósitos da educação, foram elas: sociedade, educação, praxis e ato pedagógico.

Começamos assim, a pensar de forma crítica-reflexiva sobre a presente sociedade e a relacionar a sua dinâmica às profundas mudanças políticas, sociais, culturais, ambientais e individuais que vêm ocorrendo em função da globalização, da revolução das TICs e, especialmente, do potencial de flexibilidade e integração da mente humana para produzir conhecimentos novos e, então, dar continuidade ao desenvolvimento técnico-científico. Pensamos, ainda, sobre a nossa função no processo de formação humana, bem como sobre algumas possibilidades que vêm sendo levantadas para lidar com esses desafios.

Durante a disciplina, exercitamos, também, a reflexão crítica sobre a nossa própria vida quando associamos o que vivenciamos a partir de nossa formação no curso de CC (promovido pela UFBA no período de 1993 a 1997) e no mercado de trabalho às mudanças no cenário mundial, que foram intensificadas a partir do surgimento da internet. Neste período, o mundo ainda nos parecia algo muito distante, desconhecido e, portanto, impensável.

A formação em CC foi fortemente baseada em conhecimentos técnico-científicos. Passávamos muito tempo envolvida com os estudos de disciplinas que tratavam da lógica e do cálculo, não nos sobrava tempo para reflexões mais profundas sobre os aspectos políticos, sociais, culturais, econômicos, ambientais e individuais. Nossa consciência compreendia questões como a desigualdade social, mas ainda não ouvíamos falar em exclusão sócio- digital, analfabetismo digital e software livre. Também não nos recordamos de ouvir falar em fiscalização quanto à pirataria de software e ética em computação.

Então, o segundo impacto no curso foi sentido quando, durante a disciplina, percebemos que seria um desafio para nós, com formação em outra área de conhecimento, participar/contribuir com as discussões dos colegas, pois, em alguns momentos, quando a turma fazia referência a questões específicas de alguns campos do saber como Psicologia, Pedagogia, Sociologia, Antropologia, História, Educação etc., sequer compreendíamos. Ainda assim, sentiamo-nos envolvida e animada ao longo dos encontros.

Durante as discussões pudemos observar que muitos elementos das falas dos colegas faziam referências à Filosofia. Então, recorremos a um livro que havíamos conhecido há um tempo, mas que não tivemos a oportunidade de ler. O Mundo de Sofia: um romance

sobre a história da Filosofia foi o livro que nos iniciou no estudo sobre os filósofos e nos levou a compreender um pouco da nossa própria história. Quando começamos a leitura sobre Sócrates, Platão e Aristóteles, sentimo-nos motivada a ler mais a respeito de suas vidas e contribuições, então, decidimos nos aprofundar, a partir de outras leituras que trouxessem algo mais sobre eles. Começamos por Apologia de Sócrates e Banquete, de Platão, em seguida, Fedro e Fédon, do mesmo autor etc.

Ao contrário do que imaginávamos, achamos esses livros interessantes, e com um conhecimento atual, embora com a interpretação própria de sua época. Abordam temas relacionados à vida, ao amor, à conduta, ao bem, à virtude, à sabedoria etc. Que também nos fizeram refletir um pouco mais sobre nós mesmas, a partir das nossas relações: mãe, amiga, filha, irmã, esposa, estudante e profissional. Percebemos que além da Matemática, da Lógica, da Física, das Linguagens de Computação, há uma série de conhecimentos sobre a vida que, ao nos furtarmos de conhecê-los, privamo-nos de uma reflexão crítica sobre a condição humana. Um saber importante para todo o âmbito da vida, como bem nos diz Santos (2005), um “conhecimento prudente para uma vida decente”.

O processo de religação entre saberes é tratado por Santos (2005), em seu livro “um discurso entre as ciências”, que aborda a relação histórica entre a crise do paradigma dominante das ciências naturais e a emergência do paradigma social, e trilha um percurso analítico balizado por algumas hipóteses. Para ele, deixa de fazer sentido a distinção entre ciências naturais e ciências sociais, e a síntese que há que operar entre elas tem como pólo catalisador as ciências sociais. Afirma ainda que, para isso, haverá de existir uma revalorização do que se convencionou chamar humanidades ou estudos humanísticos.

Na disciplina EDC Educação, Sociedade e Práxis Pedagógica pudemos, ainda, refletir sobre o processo educacional, quais as suas características, como ele ocorre, fatores que o influenciam e a vivenciar possibilidades pedagógicas que viriam a nos servir de apoio na formação dos estudantes de ECOMP.

Desde a primeira disciplina cursada sob a orientação da professora Teresinha, “EDC 704 – Tópicos Especiais de Educação”, cujo eixo central foi Educação a Distância e Difusão do Conhecimento, pudemos vivenciar uma forma de ensinar-aprender em que também assumimos a responsabilidade na produção do conhecimento, a partir do trabalho coletivo, do contato com a história de vida dos outros colegas e do desafio que é a autogestão.

O processo de autogestão tem como lastro o modo como se vem organizando, historicamente, o trabalho na REDPECT, inspirado em Castoriadis (2000, 2002, por ex.). Significa a intenção de que as pessoas envolvidas dirijam-se a si mesmas, tomem decisões coletivamente em relação ao que e ao como fazer, nessa coletividade, sem delegar controle a alguém ou algo a ela externo. Esta autogestão “implica ao mesmo tempo e pressupõe a autonomia e a liberdade dos indivíduos” (2002, p. 228), numa práxis cujo objetivo maior é a “autonomia do outro ou dos outros (o que não é o caso das relações simplesmente pessoais [...] porque essas relações não têm finalidade exterior à própria relação)” (2000, p. 94). A autonomia envolve a relação deliberada e reflexiva entre indivíduos, no processo de constituição de si próprio e do outro, ao mesmo tempo, de modo intersubjetivo, com o propósito de “definir por si próprio as normas, os valores, as significações” com base nos quais organiza “sua própria vida e lhe [dá] um sentido” (2002, p. 228) (FRÓES BURNHAM et al., 2006).

Tal metodologia de trabalho contribuiu com a nossa reflexão sobre o processo de aprendizagem em que o aprendiz é sujeito responsável por seu aprendizado, em confronto constante com suas crenças, com o seu conhecimento, seja ele o produzido na escola e/ou lares, seja ele produzido por eles mesmos, a partir de suas andanças e relações intersubjetivas. Durante os encontros, termos como autonomia, trabalho coletivo, dialodicidade e reflexividade deixaram de ser apenas significantes para ganharam essência e sentido em nossa caminhada.

Nas disciplinas EDC595 – Filosofia e educação e EDCA20 TEE – Epistemologia das Ciências – questões educacionais tivemos mais contato com a Filosofia e reforçamos a importância do hábito de questionar, de indagar etc. A partir de um processo prático-reflexivo exercitamos o pensamento crítico. Estas disciplina, dentre outras possibilidades, fizeram-nos repensar a nossa maneira de atuar enquanto docente. Ao invés de darmos aulas expositivas passamos a motivar os estudantes a formularem questões e a pensarem de modo crítico sobre suas indagações.

Na disciplina EDCA19 TEE – Formação de professores, política, currículo e experiências, passamos a compreender o currículo e a interpretá-lo como uma instância do projeto político de educação e, por isso, que está integrado à realidade sócio-cultural e às suas demandas. Isso foi fundamental para compreendermos que o conhecimento internalizado ao longo da vivência dos professores e estudantes é proveniente da disciplinarização do conhecimento e do privilégio do conhecimento técnico-científico. Por isso, a fragmentação do saber e o privilégio pelo conhecimento técnico-científico emergem durante a formação dos engenheiros, durante o ato pedagógico.

Paralelamente aos encontros nas disciplinas continuamos a freqüentar as reuniões da REDPECT, onde pudemos acompanhar a criação da Rede Interativa de Pesquisa e Pós- Graduação em Conhecimento e Sociedade (RICS), também coordenada pela professora Dra. Teresinha Fróes Burnham, e a implantação do doutorado interinstitucional, com área de concentração em difusão de conhecimento científico e tecnológico, atualmente sediada na UFBA e contando com a participação de várias instituições, inclusive a UEFS (FRÓES BURNHAM, 2004). Foi assim que conhecemos algumas tendências quanto à organização curricular do conhecimento, a partir dos conceitos de interdisciplinaridade, transdisciplinaridade e, de modo especial, multirreferencialidade, que nos auxiliaram ao longo da pesquisa e reforçaram a necessidade de uma educação contemporânea em que os conhecimentos sejam articulados de modo integrado e flexível, considerando-se tanto as especificidades de cada campo do saber, quanto as relações totalizantes entre eles, sem reduzi- los um ao outro.

Ao longo da disciplina EDC 557 – Abordagens e Técnicas de Pesquisa em Educação, inquietamo-nos quando lemos um trecho do livro de Macedo (2000, p. 30)no qual comenta que no processo de construção do saber científico, quando consideramos uma abordagem qualitativa, os sujeitos do estudo não são “um produto descartável de valor meramente utilitarista”. A voz do ator social, segundo o autor, deve ser trazida, irremediavelmente e interpretativamente, para o corpus empírico analisado, e para a própria composição conclusiva do trabalho.

Interessamo-nos pela pesquisa científica desde o início do curso de graduação quando, ainda no segundo semestre do curso de CC, da UFBA, fomos convidada para participar do programa de iniciação científica num projeto na área de Matemática Computacional, elaborado por um professor do Instituto de Matemática. Apesar de ficarmos dois anos como bolsista vinculada ao programa, desenvolvendo pesquisas junto a um grupo de estudantes, de cursar duas especializações e defender uma dissertação de mestrado, ficamos surpresa quando soubemos que poderíamos trabalhar a subjetivação durante o processo de investigação.

Hoje compreendemos que essa surpresa está relacionada ao fato de termos tido uma formação em que a objetivação sempre foi sugerida e, conseqüentemente, praticada. Sempre exercitamos a impessoalidade, o distanciamento do objeto, numa tentativa de observá-lo com o maior grau de fidelidade, precisão e exatidão possível.

Nossa compreensão de metodologia limitava-se ao conjunto de instrumentos e ao passo a passo necessário para se chegar aos objetivos que haviam sido planejados no início da pesquisa. Mais uma vez, resumia-se à atividade puramente técnica, em que há procedimentos para se chegar a um fim, a um resultado, a um produto. Para nós, o que mais importava era o produto final. Percebemos que não havia espaço para o inesperado. E, embora na primeira versão do nosso projeto de tese aparecessem termos como “abordagem qualitativa” e “teoria fundamentada em dados”, percebemos que pouca compreensão tínhamos a respeito do assunto, que a principal atenção era dispensada ao fim, e não ao percurso, ao processo.

E, a partir das atividades e reflexões realizadas pudemos, pouco a pouco, compreender a importância de se apreender a base da pesquisa científica e a vivenciar uma nova relação com o conhecimento, baseada em um processo contínuo de interação com o objeto investigado. Isso repercutiu na forma como ocorreu a pesquisa.