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4. POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O CINEMA

4.1. Políticas públicas para o cinema na Europa

4.1.1. França

O cinema francês é o mais vital da Europa, é visto nas suas salas e também se exporta. Na década de 90 e nos primeiros anos do sec. XXI, o cinema francês apresenta uma cota de mercado em termos de filmes estreados que ronda em média os 35%, e, a partir de 2006, alcança valores que suplantam em 56 O Conselho da Europa é uma organização internacional fundada a 5 de Maio de 1949. É a mais antiga

instituição europeia em funcionamento. A sua missão passa pela defesa dos direitos humanos, desenvolvimento democrático e pela manutenção da estabilidade político-social na Europa. Tem personalidade jurídica reconhecida pelo direito internacional e serve cerca de 800 milhões de pessoas em 47 Estados, incluindo os 28 que formam a União Europeia.

57 (Pardo; 2007: 17-30) e (Lange e Tim Westcott; 2007:35-41)

décimas as cotas de Hollywood: 44,7% de filmes franceses contra 44,2% de filmes americanos. À escala mundial, poucos países têm resultados superiores - Índia, Coreia do Sul e, nos últimos anos, a Turquia. Este nível de produção deve-se a um sistema de angariação de capitais que mais do que duplicou a verba entre 1996 e 2006, passando de 501,07 milhões em 1996 para 1.148,47 milhões em 2006.

O sistema de apoio público ao cinema francês passa pelo CNC, 58 órgão público, dotado de

personalidade jurídica e autonomia financeira, criado em 1946 e desde 1959 sob tutela do Ministério da Cultura. Este órgão tem por missão o apoio financeiro à indústria, a promoção do cinema francês no estrangeiro, a protecção do património cinematográfico, o apoio a acções de formação e a regulação do sector: garantindo o normal funcionamento da concorrência. O apoio financeiro é operado através de uma série de subsídios (cerca de 30), divididos em dois eixos: cinema e audiovisual. No cinema subsidia-se a produção, distribuição e exibição e os subsídios apresentam-se sob uma modalidade selectiva e automática. A primeira em principio suporta valores culturais a segunda premeia valores de indústria (melhores bilheteiras, autores consagrados). O CNC é financiado por um sistema fiscal dedicado, assente nas contribuições do mercado do cinema e do audiovisual. 1) Uma taxa de 10,72% sobre o preço dos bilhetes de cinema, a Taxe Spéciale Aditionelle TSA – Taxa Especial Adicional; 2) uma taxa de 5,5% aplicada aos produtores e distribuidores de serviços de televisão, que se decompõe nas seguintes valências: a Taxe Sur les Services de Télévision -TST aplicada à receita dos canais de televisão, às receitas de publicidade e de patrocínios e ainda às receitas de chamadas e SMS de valor acrescentado e a TST-D aplicada às receitas dos distribuidores de serviços de televisão por subscrição; 3) uma taxa de 2% aplicada às receitas dos distribuidores de vídeo e de video on demand.59

O orçamento conta ainda com um valor marginal resultante de alguns reembolsos de subsídios ou de adiantamentos concedidos pelo CNC e duma taxa aplicada à difusão de filmes pornográficos. O fundo do CNC começou por ser apenas financiado pelo Adicional de bilheteira, e só mais tarde pelos restantes mercados. Em 1972, a televisão é chamada a participar timidamente e de maneira mais sólida a partir de 1986. As distribuidoras e as cadeias temáticas que difundem filmes e séries de produção francesa são chamadas a participar no financiamento do cinema através do CNC só a partir de 1993.

Pode dizer-se que o CNC e por seu intermédio a indústria do cinema são financiados pelos dois grandes concorrentes do cinema francês: Hollywood, via adicional de bilheteira e pela televisão, via TST.

O CNC não esgota os canais de financiamento do cinema em França; o Estado concebeu outros mecanismos, a saber: subsídios regionais, créditos de impostos à produção para filmagens feitas em

58 Actual Centre National du Cinéma e de L'Image Animé .Até 2010 designado Centre National de la Cinématographie.

59 Informação retirada da página do CNC: http://www.cnc.fr em julho de 2017.

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França, uma forma de abrigo fiscal e um instrumento de garantia bancária – Institut de Financiament du cinéma et des industries Culturelles, criado em 1983.

Em França, os subsídios geridos pelo CNC ou pelas regiões representam cerca de 10% do financiamento global e pouco mais de 3% são subsídios provenientes das Sofica, o grosso das participações vêm das produtoras (entre 30% a 40%), das televisões (cerca de 30%) e adiantamentos dos distribuidores (cerca de 6%) e dos distribuidores de vídeo (aprox.2%)

As televisões, para além dos fundos que canalizam para o CNC, têm ainda uma obrigação de produção. França tem sete canais: 3 públicos: France 2, 3 e 5; dois privados: TF1 e M6, e dois por subscrição: o Arte, canal Franco-Alemão, e o canal + (Channel Plus). Por lei, os canais abertos devem investir 3,2% da sua facturação em co-produções ou pré-aquisições de direitos. O canal +, por programar os filmes em estreia na TV tem obrigações acrescidas: deve investir 12% da facturação em produção europeia, 9% em produção francesa e o restante em produção de países terceiros europeus. Para a gestão desta participação directa na produção, os canais, por lei, têm de criar filiais especializadas em produção. A consequência perniciosa desta forte participação das televisões na montagem financeira dos filmes é que na maioria dos casos se tornou indispensável a participação prévia de uma televisão para conseguir atrair o restante financiamento. Considerando que a bilheteira é falível e que a maioria dos filmes não se paga na sala, a televisão garante uma segunda vida ao filme no circuito audiovisual. Entre 97 e 2001, dos 800 filmes produzidos apenas 23 (menos de 3%) compensaram os custos de produção com bilheteira. Por duas décadas, o cinema francês contou com um financiamento estável e significativo das televisões, mas este tem vindo a decrescer desde a segunda metade dos anos 90: 1996: 43,2% (do financiamento médio de um filme garantido pelas televisões); 2004: 38%; 2005: 29%. Em 1997, apenas 8% dos filmes realizados não tiveram participação financeira das televisões, em 2005 quase um terço dos filmes teve de ser feito sem dinheiro da TV. Em 2016 esse padrão mantém-se, 32,1% dos filmes produzidos sem participação dos canais de televisão. Trata-se em todo o caso de uma indústria pujante. Em 2016, o financiamento público ao cinema (fundos de apoio automático e selectivo de CNC mais os fundos regionais) totaliza 83,18 M€ (milhões de euros). E este financiamento representa apenas cerca de 6% do valor total investido em cinema em 2016 (1388,50M€).

Uma das queixas recorrentes na indústria cinematográfica actual é a bipolarização extremada entre filmes de vocação artística, de baixo custo, e filmes de entretenimento de grande orçamento. Os filmes do meio (orçamento médio) têm vindo a desaparecer e a extrema compartimentação do meio tem tornado quase impossível a um cineasta passar de uma categoria a outra.

França tem um parque de salas excepcional, com mais de 5.300 ecrãs, mas as salas de arte e ensaio ressentem-se dessa oferta, porque os filmes de autor com maior potencial de sucesso em sala passam também nos multiplexes, retirando-lhes uma parcela de receita importante. O mercado

cinematográfico francês enfrenta ainda problemas de concorrência desigual na distribuição e exibição. São lançados cerca de 15 novos filmes por semana e o número de cópias mais do que duplicou nas últimas duas décadas, crescimento que não foi acompanhado em proporção pelo número de salas. Este desfasamento entre filmes a distribuir e locais de exibição gera uma competição feroz e ciclos de exibição cada vez mais curtos para os filmes que não conquistam o público na primeira semana, naturalmente os de baixo orçamento60.