• Nenhum resultado encontrado

Fundação (1848 a 1880): as pequenas estruturas de comércio e o seringal caboclo

80 COSTA, 2012 81 BELTRÃO, 2004.

1.3. O que a borracha desvela?

1.3.1. Fundação (1848 a 1880): as pequenas estruturas de comércio e o seringal caboclo

O ciclo de exploração da borracha na Amazônia é apenas uma pequena parte das grandes transformações promovidas pelo sistema capitalista durante a segunda metade do século XIX. Nesse período, em países líderes da revolução industrial, particularmente Inglaterra e EUA, a busca por inovações nas técnicas de produção tornava o progresso técnico um elemento comum e não algo intermitente do mundo econômico, adquirindo a reprodução ampliada do capital um ímpeto cumulativo próprio que se inclinava predominantemente para

130 COSTA, op. cit., 2012.

131 É do relato de Vianna Moog sobre a Amazônia que se cunha, pelo próprio autor, a ideia de “ciclo do ouro

negro”, fruto de suas impressões, conversas e estudos sobre a historiografia econômica da região, escritas durante o período que residiu em Manaus nos anos de 1930. Cf. MOOG, V. O ciclo do ouro negro: impressões da Amazônia. Belém: Conselho Estadual de Cultura, 1975. p. 30-36.

a economia de gastos com capital variável durante a etapa de produção132. As indústrias da primeira fase da revolução industrial, pequenas e pouco concentradas, ganham economia de escala na esteira dessas inovações tecnológicas e impulsionam processos de concentração e centralização do capital, geradores de grandes conglomerados empresariais e financeiros que imprimem novos padrões de concorrência e de expansão do mercado internacional133.

Não obstante, até meados do século XIX, os complexos econômicos que integravam a economia brasileira viviam um quadro de estagnação, no qual não parecia haver possibilidades para que as exportações tradicionais do Brasil recuperassem algum dinamismo capaz de lograr uma nova etapa de desenvolvimento. O açúcar e o algodão haviam perdido competitividade externa e os outros produtos de exportação (fumo, couro, arroz e cacau) atendiam a mercados que não admitiam grandes possibilidades de expansão. A saída desse quadro só seria possível por meio produtos primários de exportação, cuja produção tivesse como fator básico a terra, único fator abundante no país, já que capitais praticamente não existiam, e a força de trabalho escrava se encontrava em grande parte imobilizada na pouco produtiva indústria açucareira ou prestando serviços domésticos134. É nesse sentido que a extração da borracha na Amazônia e o cultivo do café nas províncias do Sudeste, entre a metade do século XIX e início do XX, assumiriam grande importância dentro da economia brasileira.

A etapa de fundação corresponde às primeiras três décadas do ciclo extrativista gomífero, em que ainda se observam características típicas da fase na qual predominou a exportação do cacau: unidades caboclas de produção na beira dos rios, uma miríade de comerciantes volantes e alguns pequenos e médios aviadores urbanos135. Os dois primeiros grupos de agentes encontravam-se pulverizados pelo território, enquanto as casas de aviação e exportação estavam instaladas nas principais cidades da rede urbana.

Do outro lado, havia os proprietários de terra e grandes fazendeiros escravistas, particularmente paraenses, já que a atividade agrícola pouco havia se desenvolvido na

132 DOBB, M. A evolução do capitalismo. Rio de Janeiro: Zahar, 1977,p. 328-340.

133 HOBSON, J. A. A evolução do capitalismo moderno: um estudo da produção mecanizada. São Paulo: Abril

Cultural, 1983.

134 FURTADO, op. cit., p. 166-168.

135 “Pode-se imaginar que a transformação da borracha, de substância utilizada por ameríndios para fins

cerimoniais, ou ocasionais, em matéria-prima essencial à indústria em grande escala no exterior, tivesse fomentado uma transformação concomitante no sistema de produção. Contudo, não foi o que aconteceu; se 150 anos depois, La Condamine pudesse ter visitado de novo a Amazônia, provavelmente se espantaria por ver quão pouco se alteraram, durante esse período, os métodos de extração e de coagulação. Por certo, a produção se intensificara, mas permanecia nas mãos dos seringueiros escassamente capitalizados, que só contavam com a ajuda de algumas ferramentas muito simples e da boa vontade da natureza” (WEINSTEIN, 1993, p. 24).

província do Amazonas136. Dedicavam-se às culturas agrícolas do fumo, do açúcar e aguardente, do café, além do gado vaccumm na região do Marajó, e justamente por isso se colocavam politicamente contrários à economia extrativista da borracha, sob o discurso que essa prática simbolizava o atraso da região137.

Por trás da negação da elite agrícola tradicional à economia extrativista, havia uma real incapacidade de participar dos ganhos permitidos pela exportação das pélas de borracha. De fato, ao que parece qualquer possibilidade de articulação nesse sentido, voltada para colocar a atividade extrativa do látex sob o comando desse grupo, precisaria dar conta de solucionar três questões centrais para a produção extrativista: a desarticulação com a força de trabalho do caboclo, a falta de poupança interna e o desconhecimento das áreas de maior ocorrência da hevea.

A primeira dependeria da subsunção formal da força de trabalho cabocla, conhecedora das técnicas de coleta do látex e do trabalho de beneficiamento do látex. Nesse caso, a despeito de qualquer herança negativa do tempo dos diretórios ou da Cabanagem, a dificuldade de acesso à força de trabalho cabocla dava-se, fundamentalmente, pela não monetarização das relações de troca. Apesar de isolado e atado pela necessidade de consumir mercadorias manufaturadas, o campesinato-caboclo amazônico era autônomo nas suas atividades e não se encontrava cerceado de acesso aos meios de produção, particularmente a terra e o próprio bioma amazônico. Nessa fase do ciclo, a possibilidade de ocupar incomensuráveis áreas de terras devolutas138 ou não reclamadas no meio rural amazônico, com vastas áreas inexploradas de seringueiras, inviabilizava qualquer tipo de cerceamento que visasse a constituição de um mercado de trabalho baseado em relações capitalistas de produção.

Como é previsível, o emprego da força de trabalho escrava no extrativismo de coleta era altamente arriscado para o proprietário, em especial no da borracha, em que a distância entre seringueiras dentro de uma mesma estrada139 geralmente era na ordem dos

136 cf. LOUREIRO, op. cit. 137 WEINSTEIN, 1993, p. 55-56.

138 A definição de terras devolutas se tornou mais preciso no Brasil a partir da Lei de Terras de 1850,

significando todas aquelas terras que “não fizessem parte do domínio particular por qualquer título legítimo, nem forem havidas por sesmarias ou outras concessões do Governo, não incursas em comisso por falta do cumprimento das condições de medição, confirmação e cultura; aquelas que, ainda que não tenham sido dadas por meio de sesmarias, ou qualquer outro tipo de concessão, apesar de terem caídas em comisso, tenham sido revalidadas pela lei; e por fim, aquelas que não se acharem apossadas, ainda que não seja por título legal, forem legitimadas pela lei” (OLIVEIRA, N. A. S. ; FISCHER, L. R. C. , 2016 p. 8) .

139 Estrada de seringueiras era o modo como se organizava a área de colheita da seringa. Tinha normalmente a

quilômetros. Não só se mostrava quase impossível o controle de cada escravo durante a coleta diária, de modo a evitar fugas do cativeiro, mas também o acesso à força de trabalho escrava naquele momento específico – pós-lei Eusébio de Queirós – só podia contar com o limitado mercado interno de escravos, fortemente orientado para suprir o complexo econômico cafeeiro fluminense e posteriormente o paulista140.

A segunda questão central era a baixa oferta de capital disponível para investimento, já que grande parte da poupança desse grupo estava imobilizada em propriedades rurais e urbanas, além de escravos. É importante lembrar que, mesmo tendo conseguido se viabilizar como Estado colonial, consolidando estruturas de produção distintas, mas relevantes, a formação socioespacial da Amazônia possuía, até 1855, uma renda interna anual situada entre 4.000 e 8.000 contos de réis. Uma dimensão exígua para dinamizar, de forma imediata, qualquer tipo de atividade econômica que garantisse o suporte necessário para o aumento súbito da demanda por látex no mercado mundial141, que no auge do ciclo possuiria bancos locais com capital próximo de 5.000 contos. Por fim, os investimentos necessários para dinamizar a economia extrativista por parte desse grupo deveriam contar, portanto, não só com a capacitação de um novo contingente de força de trabalho, como também com a mobilização de capital para o transporte fluvial da borracha do seringal para as cidades de Belém ou Manaus, além do desafio de localizar as áreas de maior ocorrência da seringueira na mata.

A última questão tem uma determinação eminentemente espacial. Tem a ver com o fato das propriedades da elite colonial não possuírem reservas extensas de seringueiras nas suas áreas de floresta, o que obrigava à empreitada em busca dessas áreas. Em grande medida as principais reservas da hevea predominavam nas áreas mais altas da floresta, com mais frequência nas proximidades dos rios Madeira, Purus e Solimões, na província do Amazonas, e distante das propriedades da tradicional elite agrícola paraense. No Pará, a maior ocorrência se dava ao longo dos sistemas fluviais do Xingu e do Tapajós, áreas que em grande parte eram inexploradas; ou então em áreas que estavam circunscritas a alguma sesmaria, mas não eram conhecidas, como é o caso da região das ilhas do arquipélago do Marajó, região rica em seringueiras, mas cujos pecuaristas não tinham conhecimento, já que dominavam a parte

árvores. Cf. WEINSTEIN, 1993, p. 31.

140 CANO, W. Raízes da Concentração Industrial em São Paulo. Campinas: ed. Unicamp, 1985. 141 SANTOS, op. cit., p. 122-152.

oriental e central da ilha, onde predominavam os campos naturais142.

Ao que tudo indica, tanto o mapeamento dessas áreas quanto a cerceamento das estruturas produtivas ribeirinhas dos meios de subsistência dependeria de uma ampla e irrestrita implementação da Lei de Terras de 1850 nas províncias amazônicas, mas o desenrolar dessa determinação legal foi relativamente lento e com pouca eficácia nesse sentido. Em termos efetivos, apesar de importante e potencialmente transformadora em seu texto original, a Lei de Terras de 1850 é parte de uma longa luta política dentro do Império, entre suas forças mais progressistas e os membros das oligarquias rurais e proprietárias de escravos de cada província. Isso leva a alterações substanciais da proposta original da lei, que previa a institucionalização de um mercado de terras no país, associado a políticas de colonização em pequenas propriedades rurais nessas áreas. A demarcação dessas terras foi a exigência de maior custo no embate político entre os setores progressistas do Império e as elites coloniais das suas províncias, resultando na descentralização das atividades de demarcação e registro das terras devolutas143.

Nas províncias da Amazônia, a implementação da Lei de Terras inicia pela província do Amazonas no ano de 1854, quando se determina a suspensão na concessões de lotes urbanos, bem como o levantamento das plantas das povoações e dos terrenos para servidões, além de obrigar o registro e posterior demarcação das posses. Em pouco mais de dois anos, 2.721 posses foram registradas, mas poucos possuidores prosseguiram com as etapas de medição nos próximos anos, alegando que os baixíssimos preços dos imóveis chegarem a ser inferiores aos custos das despesas para a demarcação.

No Pará, área mais povoada, de ocupações mais antigas e berço das oligarquias coloniais, houve grande adesão às exigências das lei de terras, sendo a Província do Império com o maior número de registros paroquiais até o fim do prazo da lei – cerca de 22.611 registros, sem que fosse obrigatória a apresentação de documentos comprobatórios das posses e dos tamanhos das respectivas terras144. A demarcação efetiva da propriedade era de responsabilidade do seu respectivo proprietário, enquanto a demarcação das terras devolutas era de responsabilidade dos governos provinciais, uma situação que se arrasta por todo esse período de fundação do ciclo gomífero. Ao fim e ao cabo, na transição para a República, o governo paraense determinou a conversão em propriedade àqueles que comprovassem a

142 WEINSTEIN, op. cit., p. 57.

143 Cf. OSÓRIO, L. Terras devolutas e latifúndio. Campinas: EDUNICAMP, 1996.

144 Segundo dados do relatório do Ministério da Agricultura do ano de 1860, foram feitos 19.320 registros de

ocupação da terra, sem qualquer ônus sobre o valor do terreno, contanto que efetivassem o pagamento do imposto territorial.

Em resumo, ao que parece, mesmo que houvesse interesses políticos e econômico imediatos para centralizar o extrativismo do látex, a maior parte da elite agrícola paraense não possuiria condições econômicas e espaciais para fazer uma rápida transição das suas atividades naquele sentido. O domínio sobre a atividade extrativa continuaria concentrado nas formas de acesso à rede de comércio regional e posteriormente à força de trabalho cabocla, do que simplesmente na aquisição de novas terras que possuíssem seringueiras, mesmo que houvesse possibilidade para tal. Por isso talvez ocorram o discurso de descrença tão aclamado pelas atividades extrativistas e o desprezo pelos seus agentes, particularmente os regatões e os comerciantes donos das casas aviadores, vistos como novos-ricos que não carregavam prestígio145.

Ao que tudo indica, foi a elevação no preço e na demanda da borracha no mercado externo que induziu aviadores de Belém e Manaus a sistematicamente orientarem que os regatões trocassem suas mercadorias preferencialmente por borracha, impactando diretamente sobre as unidades produtivas dispersas do campesinato-caboclo, que passam a produzir, além do seu portfólio habitual, também látex146.

Efetivamente, o primeiro registro oficial de exportação da borracha147 em bruto é de 1827. Contudo, até 1848, portanto, sete anos após a invenção da vulcanização, a borracha ainda estava longe de ser o gênero principal da pauta exportadora amazônica148. O aumento da demanda externa149 pressionaria a dialética interna daquela estrutura de produção no sentido de eliminar os gargalos que se apresentavam para a reprodução do capital na sua

145 cf. WEINSTEIN, op. cit., p. 56 - 71 146 COSTA, op. cit., p. 65.

147De fato, existem registros de artefatos de borracha desde o século XVIII em algumas cidades da Europa,

inclusive em Lisboa, a princípio oriundos de outros países da Europa. Deve-se considerar entretanto que só havia se estabelecido uma demanda internacional contínua para a borracha quando em 1800 alguns negociantes norte- americanos começaram a importar a borracha na forma de garrafas, evoluindo a partir de 1820 para a exportação de pequenos utensílios de borracha, particularmente sapatos, artesanalmente produzidos por comunidades extrativistas de caboclos e indígenas. Nesse ponto há uma pequena divergência entre as fontes. Santos (1982, p. 52) fala de quase 460 mil pares de sapatos exportados entre 1836 e 1839, principalmente para a cidade norte- americana de Massachusetts (245 mil pares). Por sua vez, Weinstein (1993, p. 75) destaca que essa produção teria sido encabeçada por fábricas norte-americanas instaladas em Belém que exportavam basicamente para a região de Massachusetts, e não sendo mediada diretamente pelo trabalho indígena, sendo entretanto de curto fôlego e encerrando suas atividades ainda em 1855.

148 Em 1848, as exportações de borracha de ocuparam o 4° lugar em termos de valor exportado com 202:500

mil-réis.

149 O valor médio em libra-ouro da tonelada exportada de borracha passara de 43,6 para 89,7, apenas entre os

forma industrial, mas sem abdicar da estrutura de trocas desiguais e superexploração da força de trabalho que até então atendia à reprodução do capital na sua forma mercantil, que circula na Amazônia.

Dados da época, compilados por Costa150, mostram que foi apenas durante os primeiros cinco anos do período de fundação do ciclo gomífero que a quantidade de borracha ofertada e o preço cresciam de forma proporcional, não apresentando qualquer tipo de correlação preço x oferta desse ponto em diante. É particularmente entre 1848 e 1853, quando os preços da borracha amazônica triplicaram na praça de Belém, que regatões e aviadores priorizaram a troca de suas mercadorias por borracha, incentivando o aumento da coleta do produto no interior das estruturas familiares ribeirinhas.

Em complemento, nesse mesmo período, a Amazônia assistia ao começo de uma grande corrente migratória de nordestinos, na ordem de quase 55 mil indivíduos, expulsos pela seca e transformados em estruturas camponesas específicas nas imediações da cidade de Belém. Estes migrantes se inserem na dinâmica das trocas desiguais com os regatões e aviadores, contudo sua falta de conhecimento sobre o bioma amazônico os direciona para a produção ainda mais concentrada no látex, elevando a produtividade do sistema. Nesse período, tanto as estruturas produtivas ribeirinhas pré-existentes quanto as novas estruturas conduzidas por migrantes nordestinos autônomos podiam extrair o látex em terras devolutas da Amazônia, inclusive requerendo a sua propriedade posteriormente151.

Segundo estimativas elaboradas por Santos, para garantir os níveis de exportação registrados entre 1830 a 1880, a quantidade de pessoas envolvidas na exploração da borracha deve ter aumentado de 1.164 para 47.299 (média), contabilizando aquelas envolvidas na atividade extrativa e administrativa. Considerando-se corretas as estimativas, esse total correspondia a quase 13% da população da Amazônia no ano de 1880, quando se contava com quase 390 mil pessoas152.

A solicitação da força de trabalho do migrante nordestino, na forma como ocorre

150 COSTA, op. cit., p. 62-65. 151 WEINSTEIN, op. cit.

152 Não só a imigração de nordestinos assegurou a produtividade extrativista naquele momento, de fato registra-

se que grupos antes dedicados a outras atividades do primário e mesmo do secundário e terciário da economia Amazônia, conforme o preço da borracha se eleva no mercado interno, deslocam-se paulatinamente para compor estruturas extrativistas voltadas à coleta do látex e por isso com maior produtividade, chegando a impactar sobre a produção per capita dos artigos locais. O censo de 1872 registra que 54,8% da população da Amazônia estava na idade adulta152, com cerca de 91 mil empregadas em atividades do primário, sendo em torno 31 mil aquelas empregadas no setor extrativista da borracha, isso garantia ao restante do setor primário um total aproximado de pouco menos de 60 mil pessoas. SANTOS, op. cit., p. 111.

no auge do ciclo, só começou a ser ativamente empreendida na medida em que a rede de comerciantes regionais se deparou com limites das estruturas produtivas ribeirinhas: em momento de crescimento do preço a oferta diminuía. Isso ocorria, pois, essas unidades produtivas eram comandadas por famílias que possuem processos decisórios peculiares, no qual se articulam de modo indissociável a esfera de produção e do consumo153. Uma vez atingida a cobertura do orçamento familiar planejado para um certo período, estas unidades tendem a responder de modo contrário aos estímulos de preço, ou seja, conforme o preço de um produto se eleva e as necessidades individuais planejadas são cobertas, o estímulo para a coleta de novos produtos se reduz. Logo, conforme o preço da borracha se elevava no mercado mundial, de forma inversa reduzia-se a oferta do produto a partir dos seringais camponeses inviabilizando que a expansão da oferta ficasse restrita somente àquela forma de mobilização da mão de obra. Esse movimento de elevação de preço e consequente queda de oferta, ou de redução dos preços e elevação da oferta de látex, perdura até o ano de 1880, quando são viabilizadas outras soluções para a limitação dessa mão de obra.

O movimento de deslocamento intra-regional de paraenses em direção à região do Madeira e rio Purus na província do Amazonas, local onde se concentrava uma grande quantidade de áreas de seringueira, elevou a importância de Manaus dentro da rede urbana Amazônica. Esse movimento deriva em parte da própria forma predatória com que se extraía o látex num primeiro momento, ainda nas proximidades de Belém, gerando um produto de menor qualidade, matando a árvore e forçando o deslocamento das estruturas produtivas ribeirinhas em busca de novas áreas de coleta154. Paulatinamente, a capital da província do Amazonas assumiria a posição de segundo maior entreposto comercial de exportação da borracha na região amazônica, polarizando a farta produção das bacias do Madeira, Purus e Solimões155.

A despeito do deslocamento para novas áreas, como ainda era a cidade de Belém que tradicionalmente concentrava a maior parte da exportação na Amazônia, o aumento da distância das áreas de coleta representava mais tempo de circulação do capital pela rede

153 COSTA, 2012.

154 “No início das exploração gomífera as técnicas de extração do látex eram mais rudes do que se tornariam ao

final do ciclo gomífero, como nos mostra Reis: “A técnica de sua extração era a mais rude. Golpeava-se a árvore de cima a baixo, amarrando-a, em seguida, com cipós. Escorria assim, por método tão brutal, todo o látex que possuía. E morria. Perdia-se, portanto, a árvore, forçando portanto a mudança dos grupos que a trabalhavam para