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Integração transamazônica, grandes projetos econômicos e declínio industrial A partir de 1968, a economia brasileira passou a apresentar elevadas taxas de

G. do C Geopolítica do Brasil Rio de Janeiro: José Olympio Editora,

3.3. Integração transamazônica, grandes projetos econômicos e declínio industrial A partir de 1968, a economia brasileira passou a apresentar elevadas taxas de

crescimento do PIB, futuramente compondo o período classificado de “milagre” econômico brasileiro. O prosseguimento da ditadura, agora sob o comando do general presidente Emílio Garrastazu Médici (1969-1974), ocorreria mediante um clima de endurecimento da repressão

484 Idem, p. 141. 485 CANO, 2007.

486 CORRÊA, op.cit., 1989. 487 IBGE, 2006.

aos opositores do regime, simbolizado pela instauração do AI-5 e pelo enfraquecimento dos poderes legislativos Federal e Estadual. O centro decisório da política econômica consolidou- se cada vez mais no Ministério da Fazenda, sob o comando de Delfim Netto, em detrimento do Ministério da Fazenda que se tornaria um centro de reflexões técnicas sem qualquer possibilidade de coordenação efetiva488. Sob a tutela de Delfim Netto, tornar-se-iam cada vez mais articuladas os subsídios e incentivos oriundos de fundos de origem fiscal e parafiscal, objetivando principalmente a concentração do capital e os investimentos em setores e regiões eleitos arbitrariamente para os incentivos.

O perfil da economia do “milagre” seria moldado de forma dependente dos fundos públicos, de favores burocráticos e de crédito, ampliando a tradição patrimonial e clientelista do capitalismo brasileiro489. Assim, na coxia do crescimento de 14% do PIB registrado em 1973, estava cada vez mais evidente a insustentabilidade da política econômica do período, expressa no aumento na importação de bens de capital, no foco de tensões inflacionárias em função da recuperação no salários de parte da classe trabalhadora e no reaparecimento de déficits comerciais.

Ao estimular um crescimento apoiado principalmente na expansão do setor de bens duráveis e não no setor de bens de capital, mesmo que os ritmos de crescimento do investimento e da produção corrente de bens de consumo possam acelerar-se periodicamente, estes não são capazes de se sustentarem por muito tempo pela impossibilidade de esse setor criar endogenamente sua própria demanda, dependendo ou do avanço da urbanização ou da intervenção do Estado na criação de infraestrutura490. De tal forma que, ao assumir o posto presidente da República, Ernesto Geisel (1974-1979) receberia o país com o pesado saldo da arquitetura perversa do milagre econômico, em que se reforçou a posição do capital mercantil, agrário e bancário, como bloco dominante da economia nacional, em detrimento do capital industrial e do enfrentamento das graves questões sociais presentes no subdesenvolvimento.

O início de uma nova fase no ciclo do planejamento regional periférico para os estados da Amazônia, não poderia seguir um rumo diferente da lógica em que estava imersa o planejamento da economia brasileira. O avanço na concentração do capital nacional na

488 “Com a indicação de João Paulo dos Reis Veloso para o lugar de Beltrão, o Ministério do Planejamento

perdeu totalmente a influência que tinha no tempo de Campos. Tornou-se um centro de reflexão técnica e um agente encadernador de propostas dos outros órgão da administração pública, direta e indireta, sem qualquer possibilidade de articulação e coordenação efetiva” (TAVARES, 1986 p. 29).

489 Idem, p. 30.

490 TAVARES, M. C. Ciclo e crise: o movimento recente da industrialização brasileira. Campinas: Universidade

periferia do sistema, assegurado a partir dos programa de incentivos fiscais da SUDAM e BASA, iria se mostrar nos efeitos de estímulo à industrialização que levam à consolidação regional de filiais de grupos industriais, articulados com a região polo ou mesmo com indústrias da região Nordeste. A esse contexto, somar-se-ia o crescimento exponencial de frentes pioneiras a partir de projetos agropecuários e extrativos incentivados pelo Estado, devastando o bioma e afetando as populações tradicionais que se localizavam no entornos das rodovias federais e estaduais em construção ou ampliação. Um processo cada vez mais dependente da acumulação primitiva do capital e da superexploração da força de trabalho rural para viabilizar a reprodução ampliada do capital na fronteira de acumulação amazônica.

Nesse momento de expansão do ciclo, as políticas de incentivos fiscais dividiriam lugar com grandes planos nacionais de desenvolvimento econômicos nos quais a região Amazônica, e particularmente o Pará, serviriam de coadjuvantes. A formulação do Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), praticamente em concomitância com o Plano de Desenvolvimento da Amazônia (PDA), deixaria claro a subordinação do planejamento regional como subproduto dos planos nacionais. Ademais, o sufocamento das frações da classe dominante local pelo endurecimento do regime e o aprofundamento da centralização das decisões econômicas fizeram com que a mais elevada elite burocrática da região se convertesse em simples agente de execução desses planos491

De fato, até a institucionalização desses planos tomava-se, na prática, a Amazônia e o Nordeste praticamente como sinônimos492. A partir do PND a Amazônia seria definitivamente institucionalizada como uma fronteira de recursos naturais, redirecionando suas prioridades de desenvolvimento para investimento na integração rodoviária, a ocupação humana das suas áreas de vazios demográficos e o desenvolvimento econômico centrado no setor privado via incentivos fiscais da SUDAM e SUFRAMA. Como subproduto que se propunha em ser, o I PDA demonstrava o pessimismo quanto ao modelo cepalino de incentivos fiscais voltados à industrialização regional substitutiva de importações, dada a limitação do empresariado local e do próprio mercado de consumo, recomendando o direcionamento dos incentivos para o beneficiamento dos produtos regionais de interesse do mercado internacional. Os recursos previstos para o I PDA concentravam-se principalmente na áreas de transportes e energia, cerca de 65% do total, sob o discurso de dotar a região de

491 LOUREIRO, 2014, p. 97. 492 Idem, p.165.

infraestrutura básica para o estabelecimento dos empreendimentos produtivos493.

Em grande medida, o PDA iria servir para promover um dos projetos mais ousados do governo Médici, o Plano de Integração Nacional (PIN), destinado para – mais um vez – postergar o enfrentamento da questão fundiária do Nordeste, que atravessava um longo período de seca. Isso porque seria por meio do PIN que ocorreria a execução das principais obras de infraestrutura destinadas a facilitar o desenvolvimento de atividades econômicas nas áreas de atuação da SUDAM e da SUDENE494, especialmente no que compreende à

construção das rodovias Transamazônicas (BR-230 e BR-163), conectando a cidade de Cabedelo na Paraíba ao município de Lábrea no Amazonas, e posteriormente conhecidas como Cuiabá-Santarém e Rodovia Transamazônica propriamente dita.

Complementarmente ao PIN, o Governo Médici elaboraria ainda o Programa de Redistribuição de Terras e de Estímulo à Agroindústria do Norte e Nordeste (PROTERRA), que orientaria, no eixo das rodovias em execução, uma política de colonização e reforma agrária, coordenada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). Apesar das suas origens remontarem ao ano de 1934495, o INCRA também seria instituído no 1970, como uma necessidade de simplificação administrativa e reformulação das políticas de colonização no Brasil, impulsionado pelos problemas gerados pela forte seca nordestina naquele mesmo ano.

Em conjunto, PIN, PROTERRA e INCRA eram inicialmente programas e instituições complementares, cujo objetivo central era o de aproveitamento da força de trabalho nordestina na frente pioneira de colonização planejada para o entorno da rodovia. Contudo, efetivamente corresponderiam à solução institucional da vez para debelar a histórica questão social do sertão nordestino em momentos de seca, sem avançar no sentido da reforma agrária às avessas, como previsto por Celso Furtado no planejamento inicial da SUDENE496. Os recursos destinados para a construção das rodovias e para o programa de colonização viriam da alteração da legislação sobre a utilização dos recursos provenientes dos fundos regionais alimentados pela renúncia fiscal do Imposto de Renda (FINAM, FINOR e FISET), capturando da órbita do seu ordenamento financeiro parte substancial da principal fonte de

493 Idem, p.166.

494 PETIT, op.cit., p. 82.

495 As origens do INCRA remontam ao primeiro órgão de colonização criado pela União durante o governo

provisório de Vargas denominado de Serviço de Irrigação, Reflorestamento e Colonização. Cf. CARDOSO; MÜLLER, op.cit.,1977.

recursos da superintendência.

A captura dos recursos pelo PIN e PROTERRA, somava-se à concorrência com novos fundos e programas criados pelo o Governo Federal, como o Fundo de Investimentos Setoriais (FISET) e o Fundo de Recuperação Econômica do Estado do Espírito Santo, dentre outros497. Em alguns anos, a autonomia da SUDAM sobre os recursos oriundos de renúncia fiscal ficaria restrita a pouco mais de 9% do total concedidos no país498, reforçando a

vulnerabilidade financeira do órgão às vésperas da primeira grande crise internacional com elevação da taxa de juros internacional.

Como elemento de suporte a esse momento, a medida de maior impacto dessa fase do ciclo do planejamento regional periférico sobre a região foi a que ficou conhecida como a “federalização das terras”499, que transferiu, sem indenização prévia, a totalidade das terras devolutas na faixa de 100 quilômetros de cada lado do eixo das rodovias federais em execução500. Em estados como o Pará, onde estavam planejadas as duas maiores rodovias federais, a federalização transferiria para o patrimônio da União uma quantidade estimada de 83 milhões de hectares, o que equivalia a 66,5% do território paraense501.

A federalização das terras devolutas acabaria elevando no médio prazo a procura por investimentos agropecuários na região pelo grande capital nacional e internacional. Contudo, na contramão dessa demanda estava o audacioso programa de colonização sob comando do INCRA, em articulação com os recursos direcionados pelo PIN e PROTERRA, que pretendiam assentar cem mil famílias ao longo de três anos de forma concomitante às obras da Transamazônica. A previsão do projeto indicava módulos agrícolas não superiores a 100 hectares, com famílias de agricultores organizados em cooperativas, evitando a prática da agricultura de subsistência, além de prever a regularização de títulos fundiários em favor de posseiros existentes na área e que se enquadrassem na lei502. Ademais, a abertura das rodovias viria acompanhada de frentes pioneiras de ocupação espontânea, elevando a presença de posseiros em terras devolutas federalizadas nos estados da região, que poderiam temporariamente se empregar em fazendas, como peões, e posteriormente ocupar um trecho

497 Trata-se principalmente do Mobral, EMBRAER e FUNRES. 498 LIRA, op.cit., 2005 p. 182.

499 SANTOS, 1978, p. 89.

500 Inicialmente 10 quilômetros, de acordo com a Lei-Decreto inicial de 1970, que em seguida é alterada para a

faixa de 100 quilômetros alegando a necessidade de defesa do território.

501 SANTOS, 1978, p. 90. 502 Idem, p. 105.

inexplorado de terra para desenvolver alguma cultura de subsistência.

Em pouco tempo, diversos problemas técnicos e de gestão interna do INCRA, aliados à falta de conhecimento dos funcionários do órgão sobre a geografia da região, depreciariam a imagem dos projetos de colonização previstos no plano original de colonização da Transamazônica503. Somado a isso, a ocupação predatória dos grupos de posseiros provenientes do Nordeste, que trariam consigo o hábito da queima da mata para promover a limpeza do terreno ocupado, contribuiria para construir a visão negativa da imigração em pequena propriedade sob o comando do Estado.

Para complementar o quadro de descrédito no projeto de colonização previsto, ao menos no papel, pela articulação entre PIN, PROTERRA e INCRA, ao final do ano de 1974, apenas uma pequeníssima fração da população-alvo, pouco mais de 5.000 famílias, havia se instalado nos assentamentos planejados ao longo da Transamazônica. Ainda naquele época, os valores dos investimentos se mostravam desproporcionais ao número de famílias beneficiadas e o reduzido impacto sobre a região. Além disso, tratava-se de assentamentos compostos na sua maioria por famílias da região Sul do Brasil – gaúchos e catarinenses, principalmente – evidenciando o caráter fictício das motivações da política de colonização, que previa o deslocamento dirigido de nordestinos afetados pela seca. Às quase 1,3 milhões de famílias subempregadas nordestinas504 afligidas pela seca no auge do “milagre econômico brasileiro” , cuja válvula de escape mais imediata seria a migração no sentido da transamazônica, sobraria a exclusão das políticas oficiais de colonização e a superexploração nas fazendas agropecuárias.

Dados os limites da colonização oficial promovida pelo INCRA e a predominância da migração espontânea, predatória e sem planejamento nos eixos rodoviários, o imigrante amazônico seria retratado como alguém que não respeitava as leis ambientais, sendo incapaz de conduzir um desenvolvimento regional adequado do território505. Esse contexto, conduziria a uma campanha sistemática em favor de uma ocupação mais racional e menos destrutiva da região, com o apoio do setor privado e privilegiando a pecuária em grande propriedades, empreendida pela Associação de Empresários da Amazônia (AEA), cuja

503 VENTURA FILHO, 2004.

504 Nos estudos de Cardoso e Müller levantam estimativas que apontam para cerca de 1.300.000 de famílias

subempregadas no estados do Nordeste durante os anos de 1970. Considerando um quadro otimista de reforma agrária, que efetivamente não ocorreriam, o assentamento seria possível para não mais que 560.000 famílias, o que deixaria um “saldo” migratório na ordem de quase 309.000 famílias passíveis de serem absorvidas na fronteira amazônica. Cf. CARDOSO; MÜLLER, 1977, p. 141.

sede ficava na cidade de São Paulo. Baseado em estudos controversos, alguns deles avalizados por consultores do projeto RADAM, a AEA defenderia abertamente que a conversão da floresta tropical em pasto seria algo benéfico para o meio ambiente, já que uma vez removida a cobertura florestal, os pastos, na realidade melhorariam a qualidade do solo506.

O peso da opinião pública contra a colonização apenas reforçava interesses presentes inclusive no alto escalão do governo Médici, que pressionava pela mudança na política de colonização do INCRA, em favorecimento do setor privado. As pressões levariam o INCRA a estabelecer os primeiros negócios com o setor privado ainda no ano de 1972, negociando a venda de 500 mil ha de terras federais em Rondônia e 250 mil no município de Marabá, no Pará. Cabe destacar que àquela altura o INCRA controlava cerca de 2,3 milhões de hectares na Amazônia Legal, algo em torno de 30% da área global do Brasil, um montante tão elevado de propriedade que tornava quase desprezíveis essas negociações. Porém, a resistência do INCRA à venda de terras federais na Amazônia não atravessaria o ano de 1973, quando a própria SUDAM enfatizaria plenamente que a Amazônia é um espaço ideal para a pecuária507, definindo a não aceitação de projetos agropecuários com menos de 25.000 hectares.

Com um amplo controle sobre as terras devolutas dos estados, o Governo Federal consolidaria a entrada maciça do grande capital nacional e internacional no mundo rural amazônico, em consonância com a utilização dos fundos públicos por meio da SUDAM e do BASA. Com isso, até o fim do PND, em 1974, já era substancialmente relevante a presença de grandes grupos industriais e financeiros internacionais na Amazônia, como grandes proprietários de terra nas regiões nordeste do Mato Grosso, no atual estado do Tocantins e no Sul e Sudeste do Pará. Os projetos agropecuários abarcariam mais da metade dos recursos provenientes de incentivos fiscais sob o comando da SUDAM, relegando definitivamente a indústria para segundo plano no projeto de desenvolvimento proposto para a região.

A diminuição da euforia que cercava o milagre econômico brasileiro se aprofunda com o primeiro choque do petróleo, em setembro de 1973, ampliando tensões internas herdadas da fase anterior do ciclo. Também herança do milagre, o clima de otimismo nacionalista ainda conseguiria impulsionar o ufanismo presente no slogan “Brasil, ame-o ou deixe-o”, permitindo acreditar no megalômano e ousado II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND) que viria para realizar o tão aclamado sonho do Brasil potência. O

506 Idem

II PND nasce com o propósito de corrigir os desequilíbrios da estrutura industrial brasileira e no setor externo, apresentando metas de produção e planos de investimento consideradas megalômanas por grande parte da literatura, mas que a princípio permitiriam conduzir o Brasil a uma posição de potência intermediária no cenário internacional508.

O Plano ia de encontro a barreiras estruturais que o próprio modelo econômico do regime militar havia consolidado, particularmente, aquelas associadas ao empresariado nacional que, sancionado pelo Estado, manteria a prática dos ganhos mercantis em detrimento de elevação nas taxas de produtividade da indústria. Assim, ficava claro que o II PND exigiria necessariamente do empresariado nacional uma postura que estava para além das suas práticas correntes de reprodução do capital, e isso sem contar, é claro, com seus próprios desejos509. Assim, o Plano implicava acima de tudo a constituição prévia de um “capitalismo monopolista de Estado”, movimento que de certa forma foi obstaculizado pelo próprio pacto burguês que sustentou e manteve a ditadura militar no poder durante 21 anos510.

A “fuga pra frente” do II PND significaria o não enfrentamento das questões sociais herdadas da fase anterior, assumindo, no lugar disso, os riscos de aumentar provisoriamente os déficits comerciais e a dívida externa, e o desafio de construir uma estrutura industrial avançada capaz de superar a crise inflacionária e, a reboque, o próprio subdesenvolvimento. No plano das ideias, as encomendas do Estado para o setor privado, através das estatais, bem como mudanças na política cambial e tributária, seriam o estímulo decisivo para o capital privado nacional migrar em direção aos setores de bens de capital principalmente511. No entanto, no plano concreto esse movimento é endogenamente obstado pela incapacidade de esses grupos abandonarem as órbitas de valorização que historicamente lhe foram reservadas no desenvolvimento da experiência capitalista no Brasil512. Por fim, se do ponto de vista econômico, o gigantismo do plano colocava ressalvas à sua real efetivação, do ponto de vista político, o II PND se apresentaria fortemente deslocado das bases sociais de sustentação da ditadura, desencadeando uma ampla campanha contra o regime militar pela própria classe empresarial do país, que o vinha apoiando desde 1964.

O II PND foi principalmente incentivado pelo contexto internacional adverso, em virtude da primeira crise do petróleo em 1973, quando o Governo Federal decidiria pela

508 CARNEIRO, 2002. 509 LESSA, op.cit., 1977. 510 TAVARES, op.cit., 1998. 511 CARNEIRO, op. cit. 512 LESSA, op.cit, 1977.

exploração extensiva de recursos naturais da Amazônia, particularmente aqueles capazes de gerar divisas513. Com isso, apesar de ter estado longe de equacionar plenamente os desequilíbrios na estrutura produtiva da economia brasileira, a influência das suas diretrizes de investimento no setor de bens intermediários e no setor energético definiria a política de desenvolvimento regional para a Amazônia, praticamente até o final dos anos de 1980. Essas definições ocorreriam por meio de dois novos Planos de Desenvolvimento da Amazônia: o II PDA, executado pela SUDAM como complemento aos objetivos da II PND; e o III PDA, como complemento às diretrizes do III PND.

As diretrizes de investimento do II PND e II PDA para a Amazônia paraense transformaria em definitivo a política de industrialização de substituição de importações, prevista para a região ainda nos Planos da SPVEA e aprofundada na fase inicial do ciclo do planejamento regional periférico por meio dos incentivos fiscais da SUDAM. As influências desses planos percorreriam as decisões de planejamento regional durante os anos de 1970 e 1980, estendendo suas diretrizes ao desenho dos limitados e pouco aclamados III PND e III PDA.

Acima de tudo, estabeleceu-se a visão de que a região deveria tirar proveito de suas vantagens comparativas514, particularmente das grandes reservas minerais de importância econômica, cujas dimensões tinham sido recém-aferidas pelo projeto RADAM515, e das potencialidades energéticas da bacia hidrográfica regional. Desse ponto em diante, a Amazônia acentuaria sua condição de periferia do sistema, sendo alçada abertamente pela política de desenvolvimento regional brasileiro como mais importante “fronteira de recursos naturais” do país, capaz de contribuir positivamente para a nossa balança de pagamentos.

O II PDA traria uma nova postura de intervenção territorial sobre o espaço amazônico. Em linhas gerais, incorporaria um modelo de desenvolvimento que visava à otimização de vantagens comparativas macrolocacionais de atividades e produtos regionais, hierarquizando os programas de acordo com as potencialidades desses produtos em função da

513 SERRA, M. A.; FERNANDEZ, R. G. Perspectivas de desenvolvimento da Amazônia: motivos para o

otimismo e para o pessimismo. Economia e Sociedade, Campinas, 23, n. 13.2, 2004. p. 6.

514 A oportunidade da Amazônia está em tirar partido de suas vantagens comparativas, isto é, daqueles setores ou

produtos que tornando-a mais apta que outras regiões a produzir, gerem a maior soma possível de renda e emprego para os residentes da área” (SUDAM, 1976, p.23).

515 O projeto RADAM foi operado entre 1970 e 1985 e foi dedicado à cobertura de diversas regiões do território

brasileiro, particularmente a Amazônia por imagens aéreas de radar, captadas por avião. Com nesses dados