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Gestão da cultura: grande projeto tecnocrático e everyday reframing

PARTE I – Processos de mudança através de códigos de ética

Capítulo 2. Mudança cultural

2.2. Perspetivas de cultura

2.2.2. Gestão da cultura: grande projeto tecnocrático e everyday reframing

Apesar de já se ter apresentado diferentes perspetivas sobre a natureza da cultura, pretende-se agora explorar os resultados de intervenções que induzam alterações de cultura e analisar diferentes formas de implementar projetos de mudança cultural. Voltar-se-á a fazer referência a alguns dos autores já analisados dado que não é possível separar perspetivas de cultura com as formas de a gerir, mas pretende-se agora encontrar também paralelismos com as visões de mudança planeada e emergente.

A mudança cultural das organizações pode ser uma mudança natural, não induzida ativamente, e portanto, nesta perspetiva, o seu estudo centra-se na evolução da cultura da organização. Não é esse o objetivo desta dissertação.

O estudo da gestão da cultura organizacional centra-se sobre os efeitos da ação da gestão, ou seja, sobre a capacidade da gestão em ter uma forte, sistemática e intencional influência sobre os valores, crenças, ideias e significados dos seus colaboradores, incluindo a capacidade de fazer uma mudança de cultura.

O interesse em investigar a gestão da cultura organizacional tem origem em dois pressupostos: a) o desempenho das organizações depende do alinhamento de valores organizacionais com os valores adotados (e explicitados) pela organização; b) a cultura organizacional está sujeita a manipulação consciente pela gestão.

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP É consensual que o estudo da gestão da cultura se centra sobre os efeitos da ação da gestão na cultura organizacional, mas já não é consensual que a cultura organizacional possa ser gerida. Aliás exercer o “controlo” cultural a fim de cumprir as metas da organização é uma justificação comum para tentar fazer gestão cultural. No entanto, a forma de exercer o “controlo” cultural tem sido posta em causa, muitas vezes retratando os mecanismos utilizados para o atingir como "exploradores" e “castradores” (Ogbonna & Harris, 1998, p. 275) e questiona-se mesmo a possibilidade de se fazer gestão da cultura organizacional. A questão que se coloca é saber se é possível gerir (ou mudar) a cultura organizacional.

Podem encontrar-se na literatura três grandes abordagens relativamente à gestão da cultura organizacional: a) é possível gerir a cultura; b) não é possível, conscientemente, mudar a cultura; c) é possível “manipular” a cultura, em determinadas circunstâncias (Ogbonna & Harris, 1998; 2002; Alvesson & Sveningsson, 2008).

A primeira abordagem - é possível gerir a cultura - é defendida pelos manegarialistas que encaram a cultura como uma variável organizacional que, como outras variáveis organizacionais, está sujeito ao controle da gestão. Baseia-se no pressuposto de que o desempenho de uma organização depende da força da sua cultura, visão que é defendida quer por profissionais quer por académicos, que desenvolveram mesmo vários modelos teóricos para apoiar os gestores a alcançar a mudança cultural planeada.

Contrapondo esta abordagem e numa perspetiva muito crítica, os “puristas” da cultura alegam que o pressuposto das organizações poderem planear a implementação de uma mudança cultural é academicamente inconsistente e na prática impossível, ou seja, alegam que não é possível, conscientemente, mudar a cultura. Estes autores questionam mesmo a capacidade (quer de conhecimento quer de informação) dos gestores para compreenderem e controlarem as crenças e os valores dos trabalhadores que, por definição, estão profundamente enraizados no subconsciente. Além disso, argumentam que a natureza da cultura - rica, complexa e diferenciada - faz com que seja um recurso indeterminado para que possa ser utilizado pela gestão e pelos gestores. Consideram, em suma, que a direção, o impacto e a sustentabilidade da mudança não podem ser objeto de uma ação de gestão consciente, embora possa ocorrer uma mudança natural.

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP A terceira corrente - é possível “manipular” a cultura, em determinadas circunstância - menos extremada que as duas anteriores, alega que há algum espaço para a manipulação da cultura. Argumenta-se que a mudança cultural planeada é difícil, mas que os processos de mudanças culturais nas organizações podem eventualmente ser influenciados por condições (embora raras) organizacionais e sectoriais. No entanto, embora reconhecendo que a mudança pode ser possível sob certas condições, os defensores desta corrente advertem que a manipulação da cultura, pode não só levantar dilemas éticos, mas também é potencialmente perigosa podendo levar a consequências inesperadas, quer para as organizações quer para os indivíduos envolvidos. A criação de uma organização ou a alteração de liderança ou de propriedade são exemplos de contextos em que a cultura pode ser manipulável.

Parece ser claro que a visão de que as organizações podem facilmente mudar as suas culturas é demasiado otimista. Mas também parece ser claro que o ponto de vista contrário – a cultura organizacional não pode ser mudada - pode igualmente representar uma visão incompleta da complexidade e dinamismo do conceito. Por isso parece ser mais adequado assumir a imprevisibilidade, quer na direção quer no impacto, dos resultados induzidos a partir da ação consciente da gestão.

Em síntese, se não se considerar a visão extremada dos puristas da cultura que consideram que não é possível planear qualquer mudança cultural, e corroborando as conclusões de Smircich, considera-se que há duas grandes abordagens à cultura organizacional. Os que consideram a cultura organizacional como uma variável - perspetiva manegerialista - vêem-na como algo que as organizações “têm” e, por isso, procuram perceber “o que é que as organizações fazem e como é que o podem fazer mais eficientemente”. Os que consideram a cultura organizacional como uma metáfora vêem-na como algo que as organizações “são” e, assim, procuram perceber “como é que a organização surge e o que é que significa ser organização” (Smircich, 1983, p. 353).

Tendo-se já assumido que nesta dissertação se vai dar ênfase à “metafísica do processo” também se dará naturalmente destaque à visão de que gerir a cultura deverá ser encarado como um processo dinâmico que poderá envolver tentativas de estabelecer uma nova cultura ou preservar, modificar ou rejeitar a cultura existente.

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP Mas que abordagens considerar na implementação destes processos? Alvesson & Sveningsson (2008) consideram que há na literatura três abordagens sobre a forma de conceber projetos para implementar uma mudança cultural: grande projeto tecnocrático, reformulação da vida diária e combinação do grande e do local.

a) Grande projeto tecnocrático

Uma das visões encontrada na literatura encara a mudança cultural como um grande projeto tecnocrático. Esta abordagem defende a possibilidade de uma transformação intencional, em larga escala, de uma situação cultural para outra, superior e mais proveitosa, admitindo, contudo, que tal poderá ser um processo lento e difícil.

A mudança cultural é emanada e conduzida pela gestão de topo como um projeto grandioso para toda a organização, apoiada frequentemente por consultores externos. Os gestores de topo são, assim, os “agentes da mudança, de quem emergem os contributos mais importantes sobre a mudança necessária, e, também, os arquitetos por detrás dos planos de mudança” (Alvesson & Sveningsson, 2008, p. 45). Este modelo tem presente que a gestão da mudança cultural inclui, não só, mudar comportamentos mas, também, a maneira de ser das pessoas. No entanto, assumem que a cultura organizacional é homogénea, assumem-na numa perspetiva de cultura como integração.

Nesta perspetiva, os projetos de gestão da cultura envolvem várias fases (o número de fases varia consoante o autor), configurando assim, uma visão linear do processo de mudança. Para implementar um projeto de mudança utiliza-se frequentemente uma versão deste esquema de seis passos: avaliar a situação da organização e determinar metas e direção estratégica; analisar a cultura existente e esboçar a cultura desejada; analisar o gap entre o que existe e o que é desejado; definir um plano para desenvolver a cultura; implementar o plano; avaliar as mudanças e criar novas medidas para reforçar e/ou sustentar a mudança cultural.

Estes projetos envolvem uma combinação de vários meios, tais como: liderança que comunica novos valores no que diz e no que faz; novas formas de socialização e ou programas de formação que visem sinalizar os valores desejados; sistemas de avaliação de desempenho que encorajem e recompensem a nova forma de ser e de estar,

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP acompanhados de promoção de pessoas em função de comportamentos e resultados alinhados com a “nova” cultura; novos procedimentos de recrutamento e seleção, combinados com saídas de pessoas; uso de símbolos, como linguagem, ações e objetos e materiais que concretizem o novo ideal.

Os críticos desta visão, nomeadamente Martin (2004), argumentam que os padrões culturais nas organizações são com frequência inconsistentes e ambíguos, porque há subculturas. Consideram que é necessária uma compreensão mais profunda da cultura, já que esta apresenta características de diferenciação e não de integração, como resultado da diversidade de grupos existentes nas organizações, tais como níveis hierárquicos, funções e departamentos. Por outro lado, a cultura organizacional tem, também, características de fragmentação, não compatíveis com mensagens e práticas homogéneas.

Não sendo a cultura homogénea é importante saber o que se pode realmente mudar através de um conjunto coerente de mensagens e práticas. Se se quer indicar um caminho, é provável que surjam objeções diversas e inesperadas, sobretudo em organizações mais complexas e com uma grande diversidade de funções. No entanto estas limitações não significam, necessariamente, que os gestores não tenham influência na direção da mudança. As organizações mudam, efetivamente. No entanto, corrobora- se neste estudo que esta influência é mais complexa e multifacetada do que sugere a visão de mudança cultural como um grande projeto tecnocrático.

b) Reformulação da vida diária – everday reframing

Outra forma de encarar a gestão cultural é entender a mudança como uma reformulação da vida diária, visão muito valorizada por chefias intermédias de grandes organizações. A esta abordagem está subjacente o conceito de everyday reframing.

A mudança é encarada como uma iniciativa local conduzida por um gestor sénior e por pequenos grupos de pessoas. A mudança é frequentemente incremental e informal, não é sinalizada como um projeto (com as suas diferentes fases e objetivos) e envolve pedagogia nas (re)negociações de significados. É uma mudança cultural local, que está ancorada em dinâmicas e comunicação ‘natural’, muito mais adaptada ao quotidiano e

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP às reais condições de trabalho das pessoas, tendo por isso implicações mais fortes na ação.

Não se tratando de um projeto grandioso, mas de uma reformulação da vida diária, há mais adequação ao quotidiano e conexão ao nível da interpretação da mudança.

c) Combinar o grande e o local

A outra visão defende que, para perceber os processos de mudança cultural, será necessário combinar as duas perspetivas anteriores, ou seja, combinar o grande e o local.

Nesta abordagem as iniciativas locais podem ser inspiradas, legitimadas e apoiadas pela gestão de topo. No entanto, a gestão não insiste em conteúdos ou formas pré-definidas de lidar com a cultura e por isso existe tolerância ao que vem do local. A gestão de topo pode mesmo usufruir de uma iniciativa local e usá-la como exemplo para algo mais alargado, difundindo a iniciativa local, para servir de inspiração. Pode ser encarado e sinalizado como um projeto global, ao nível da organização, mas contem alguma variação local, ainda que limitada. Esta visão da combinação do grande e do local acaba por ser um corolário da abordagem da reformulação da vida diária, havendo também mais adequação ao quotidiano e conexão ao nível da interpretação da mudança do que na visão do grande projeto tecnocrático.

Da análise destas três formas de conceber projetos para gerir a mudança cultural - grande projeto tecnocrático, reformulação da vida diária ou combinação do grande e do local – pode concluir-se que basicamente são apenas duas, dado que a terceira acaba por ser um corolário da segunda.

Mudar comportamentos pressupõe conhecer o que as pessoas são e a forma como as pessoas se vêm a si próprias na organização, ou seja, pressupõe conhecer e estar-se permanentemente atento às múltiplas interpretações de cada um, às interpretações locais, o que é, frequentemente, imprevisível. Por isso, não é assim tão fácil aos gestores (e outros agentes de mudança) imporem as suas ideias sobre como pensar e o que mudar nos outros.

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP Importa portanto explorar as consequências não previstas dos projetos de mudança, na prática, no mundo real, ouvindo o que as pessoas têm a dizer sobre a sua relação com a organização.

Implicações da gestão da cultura organizacional

Explorar as consequências não previstas e inesperadas da gestão cultural tem já merecido a atenção de alguns investigadores. Por exemplo, Ogbonna e Harris realizaram vários estudos (Harris & Ogbonna, 1998; Harris & Ogbonna, 1999; Ogbonna & Harris, 2002) sobre as respostas dos colaboradores a processos de mudança cultural, com diferentes propósitos, em empresas de vários sectores (hotéis, supermercados, restaurantes, lojas de vestuário, etc.) e de diferentes dimensões.

Num desses estudos, efetuado numa organização de retalho alimentar, no Reino Unido (Ogbonna & Harris, 1998), observou-se diferentes interpretações entre pessoas de diferentes níveis hierárquicos: os gestores de topo enfatizaram que a mudança consistia em desenvolver “uma organização mais focada no cliente”; os gestores de loja pensaram que visava sobretudo reduzir o seu poder; os trabalhadores pensaram que as novas condições e práticas foram introduzidas para aumentar a sua exploração. Registaram e documentaram que estas pessoas de diferentes níveis hierárquicos responderam de forma ambígua a um programa de mudança cultural: aceitaram, parcialmente, as novas mensagens, mas também suspeitaram que, por detrás dos novos valores explicitados, havia outras intenções, que não tinham que ver com os valores. Concluiu-se que, para melhor compreender o que as pessoas são e a forma como as pessoas se vêm a si próprias na organização, é necessário continuar a ouvir (muitas) pessoas que foram encorajadas (ou forçadas) a adotar novos hábitos. Contudo esta tarefa não é fácil, sobretudo em empresas com centenas ou milhares de empregados.

Cientes da vasta literatura sobre modelos teóricos acerca de como proceder em processos de mudança cultural Alvesson e Sveningsson publicaram, em 2008, Changing

Organizational Culture: Cultural Change in Progress onde, partilhando a sua

experiência de campo, apresentam potenciais “armadilhas” para reflexão de quem trabalha na prática com o tema.

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP Dessas recomendações, que se apresentam de seguida, destacam-se temas como: hipercultura, anorexia simbólica, importância limitado dos valores, a cultura como “aquilo” ou “aqueles” em vez de “nós” e conhecimento limitado. Os autores apresentam ainda nesta publicação, que se segue de perto, algumas lições práticas sobre projetos de mudança cultural (Alvesson & Sveningsson, 2008).

i) Hipercultura. A fonte de inspiração para “hipercultura” foi a expressão “hiper- realidade” e, tal como nesta, há asserções que deverão ser evitadas. A primeira é que cultura é um produto acabado, tangível e que faz parte de um pacote que incluiu, também, as ferramentas para a reforçar e mudar. A “produção” e mudança da cultura são asseguradas por “especialistas em cultura” (como consultores e colaboradores das áreas de recursos humanos). A segunda é a que a cultura se reflete em discursos e rituais solenes que tendem a seguir não só temas em voga na literatura de gestão como também exemplos de representações de cultura de outras organizações. A terceira asserção é a que a cultura se traduz numa grande ideia acerca de um futuro que já é visto como uma realidade pelos que “produzem” e apresentam a cultura, ou seja, a hipercultura. Ainda que a hipercultura possa ser atraente e tentadora para gestores, especialistas e consultores, os processos de mudança cultural devem envolver discursos mais ajustados ao quotidiano e à experiência das pessoas na organização, mesmo que tal seja muitas vezes difícil de apreender e formular. A hipercultura tende a traduzir-se em retórica vazia e sem ligação ao contexto organizacional, mas não é irreal. É uma forma de falar de cultura organizacional que é facilmente identificável e que a retrata como sendo clara, forte, homogénea e convincente. A hipercultura é real, tem vida própria, traduz-se em documentos, vídeos, vocabulário específico e em determinadas atividades. É uma forma de hiper-realidade, frequentemente vista como “a” cultura organizacional.

ii) Anorexia Simbólica. A ausência de símbolos é também uma questão relevante em projetos de mudança cultural: ações, objetos, expressões, eventos e histórias devem ser abundantemente utilizados porque sintetizam e expressam significados de forma rica e condensada, ilustram conceitos e são fáceis de relembrar. No entanto, é fundamental que os símbolos utilizados sejam quer relevantes quer consistentes com as mensagens e valores (atuais e desejados) da organização. No entanto, é mais fácil e tentador usar

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP exemplos de outras organizações, ainda que nem sempre relevantes ou ligados às práticas das pessoas na organização. Este risco é, assim, próximo do de hipercultura.

iii) Importância limitada dos valores. Muitos gestores e investigadores encaram os valores como elementos chave da cultura organizacional. No entanto, Alvesson e Sveningsson referem que “os valores são menos importantes para a compreensão e influência da (e na) cultura organizacional do que a maioria das pessoas parece pensar” (p. 167) fundamentalmente devido a três ordens razões: a) alguns valores, ainda que importantes e relevantes, podem ter um efeito paralisante (suscitam concordância generalizada, mas podem gerar dificuldades na sua operacionalização ou mesmo conduzirem a problemas e incertezas, se forem objeto de análise aprofundada); b) podem existir relações conflituantes entre valores que suscitam aceitação generalizada, pelo que será necessário definir prioridades entre eles; c) necessidade de dar atenção aos significados que suportam os valores, ou seja, à interpretação local efetiva desses valores.

iv) A cultura como “aquilo” em vez de “nós”. Existem vários exemplos, na imprensa de negócios e em livros da especialidade, de processos de mudança cultural em que os gestores de topo, quase sempre com o apoio de consultores, definem o que os outros têm que mudar. No entanto, a mudança cultural deve ser entendida como “nós precisamos de mudar” - incluindo aqueles que iniciam e impulsionam a mudança - em vez de “aquilo” ou “aqueles” (o resto da organização) - que são definidos como alvo da mudança” (p. 170).

v) Conhecimento limitado. O excesso de confiança, o (surpreendente) pouco conhecimento sobre o quotidiano da organização e o desconhecimento sobre qual é realmente o papel dos agentes de mudança têm sido apontados por vários estudos como problemáticas comuns de muitos responsáveis por programas de mudança. Por isso, defende-se que “invocar modéstia e curiosidade”, abrir canais para comentários e

feedback e ainda aumentar a autorreflexão será importante para atenuar a possibilidade

da mudança se converter num “projeto de fantasia” (p. 171).

A submissão ou a mudança genuína é um dos temas que também tem merecido a atenção de Emmanuel Ogbonna. Os seus estudos sobre processos de mudança cultural

Mudança cultural como alinhamento e transformação: o caso do Código de Ética EDP revelam mais evidências de mudanças ao nível das manifestações materiais e dos comportamentos e menos evidências nos valores (Ogbonna & Harris, 1998; 2002). Não obstante estes resultados, questionam a sua autenticidade. Acabam por concluir que as mudanças nas manifestações materiais, suportadas por mudanças de comportamentos, sendo visíveis, são genuínas. Contudo, concluem também que uma parte da mudança nos comportamentos pode ser considerada como submissão resignada e não como uma autêntica vontade de mudar. Da mesma forma, a mudança de valores pode ser atribuída à submissão e não à crença genuína.

Os resultados destes estudos sobre a mudança de valores são ambivalentes: a) aceitação incondicional dos novos valores e substituição dos existentes; b) total rejeição; c) reinterpretação e reinvenção dos valores. A reinterpretação resulta na aceitação parcial dos novos valores que coexistem com parte dos valores existentes. Já a reinvenção resulta na reciclagem dos valores existentes, intencionalmente ou não, para que se alinhem com os novos valores pretendidos. A reinterpretação e a reinvenção podem ser vistos como mecanismos de redução da dissonância, despoletados pela necessidade das pessoas se manterem leais à organização.

De igual modo no estudo False Promise of Organizational Culture (Ogbonna & Wilkinson, 2003) direcionado para as chefias intermédias conclui-se da ambivalência dos resultados da mudança. Há comportamentos alinhados com os objetivos da mudança, com submissão relacionada com preocupações sobre carreira e poder, mas também se regista que “a nova cultura não é «comprada»: a sua mente e os seus corações estão em outro sítio” (p. 1173). Apesar de alguns processos de mudança poderem apresentar aparentes evidências de mudança cultural, poderá não estar em causa, necessariamente, uma mudança cultural genuína.

Acreditando na valia destas lições práticas para projetos de mudança cultural,