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2. CIÊNCIA, TECNOLOGIA E SOCIEDADE: BASES HISTÓRICAS E

2.6. Uma terceira tradição: o fator econômico

2.6.4. Gestão e política das C&T

A gestão e a formulação de políticas tradicionais se baseavam principalmente na concepção econômica neoclássica da tecnologia. A translação dessa concepção à gestão e política

10 Os sociólogos do conhecimento, na definição dos paradigmas tecnológicos, se basearam na obra de Thomas Kuhn,

A Estrutura das Revoluções Científicas (1962), que defendia a existência dos fatores epistêmicos como

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científico-tecnológica é um modelo (modelo de osmose11) onde a ciência básica é condição necessária e suficiente para a inovação tecnológica que, ao mesmo tempo, conduz ao aumento da produção, ao crescimento econômico e ao bem estar social. Dada essa explicação do problema, a política científico-tecnológica deveria consistir no apoio à ciência básica, já que a economia de mercado livre não dá conta desse requisito. A pesquisa científica não é rentável para os empresários, mas é socialmente necessária porque desencadeia o surgimento de inovações. Por isso, os estado deve assumir os encargos econômicos da ciência. Os passos seguintes que conduzem ao crescimento econômico se consideram automáticos devido ao próprio funcionamento do mercado (modelo linear de inovação12), tal como apontam teóricos da economia neoclássica (BUSH, 1945 e LÓPEZ & FERNÁNDEZ, 1993 apud GARCÍA et al, 2000).

Nathan Rosenberg, conhecido estudioso da tecnologia, afirma que todo mundo sabe que o modelo linear de inovação está morto (ROSENBERG, 1991 apud GARCÍA et al, 2000). Na atualidade, poucos analistas de políticas de desenvolvimento de C&T acreditam na idéia de que a transferência de resultados da investigação básica para a investigação aplicada e por sua vez, à inovação industrial é um modelo concebível.

Uma rápida busca na história poderá auxiliar na identificação da relação entre as concepções sobre a conexão entre a pesquisa científica e a inovação tecnológica por um lado, e as estratégias da política científico-tecnológica por outro. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial três condições distintas das C&T, que culminaram em diferentes modelos de gestão, que segundo Beatriz Ruivo, podem ser entendidos com três paradigmas (RUIVO, 1994 apud GARCÍA el al, 2000):

i. O paradigma da ciência como motor do progresso: a mudança tecnológica é concebida de forma linear e como conseqüência do empurrão da ciência. Nessa fase, o objetivo era a investigação básica, na versão Big Science. No que se refere à

11 Segundo García et al (2000), o modelo de osmose requer a permeabilidade das membranas CTS somente do centro

até a periferia. Este modelo coincide com o caráter unidirecional da familiar ideologia do progresso: mais ciência = mais tecnologia = mais riqueza = mais bem estar social.

12 Modelo linear de inovação: um aumento do conhecimento científico é condição suficiente para a inovação

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gestão, não se percebe a necessidades de instruções específicas, compatibilizando assim, o financiamento público com a manutenção da autonomia da comunidade científica.

ii. O paradigma da ciência como solução de problemas: se caracteriza pela ênfase no caráter aplicado da pesquisa. Assim como o paradigma anterior compartilha a noção do modelo linear do desenvolvimento tecnológico, contudo, apresentando um princípio causal distinto: o empurrão da demanda. A política de C&T tem o objetivo de estabelecer prioridades relacionadas com o crescimento econômico e a competitividade. A atuação dos poderes públicos centra-se no estabelecimento de vínculos entre o sistema de P&D e os agentes produtivos.

iii. O paradigma da ciência como recurso estratégico: conceitua a mudança tecnológica como resultado da um conjunto de processos, produto da interação entre diferentes atores sociais e institucionais. A política de C&T leva em conta as necessidades de longo prazo e as demandas sociais em sentido amplo. Os instrumentos para tal finalidade são instituições mediadoras que possibilitam um fluxo comunicativo entre os diferentes âmbitos sociais envolvidos nos processos de desenvolvimento tecnológico.

Conforme sugere García et al (2000), esse modelo histórico sistemático proposto por Ruivo destaca os principais pontos da política de C&T, porém não podemos pensá-lo de forma uniforme em diferentes partes do mundo. Cada país, respeitando suas condições internas, de uma maneira ou outra trilharam caminhos parecidos. Uma forma de interpretar a evolução da política de C&T e sua relação com os estudos sociais das C&T deve levar em conta, em primeiro lugar, que durante o século XX houve uma produção significativa, pública e acadêmica, de C&T. A concepção dessas atividades como sendo neutras e livres de intervenção externa mudou e passou a levar em conta a dependência do contexto e da capacidade para induzir mudanças sociais, políticas e culturais. Em um segundo momento, é preciso considerar que as políticas de C&T passaram por um processo de socialização, tendo o segundo dos paradigmas como o primeiro passo no sentido de orientar as C&T rumo ao desenvolvimento econômico e o terceiro paradigma como orientador da C&T rumo a metas sociais econômicas. Isso leva a entender, que como o

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passar do tempo que os empreendimentos científico-tecnológicos foram sendo orientados socialmente, na busca por um projeto público (GARCÍA et al, 2000).

Todavia, o processo de socialização das políticas de C&T não foi completo nem tampouco uniforme. Em suma, quando questionamos as idéias da economia neoclássica, o modelo de osmose e o modelo linear de inovação, a política e a gestão das C&T devem levar em conta a grande variedade de fatores que se relacionam com a inovação tecnológica e produtiva. Desde suas origens, os programas STPP têm ocupado da formação de gestores de C&T. As mudanças também significam mudanças nos STPP e a convergência entre esses programas e os CTS é possível e necessária: a gestão das C&T se beneficiaria do conhecimento proporcionado pelas novas orientações sociais no estudo das C&T e estas, poderiam ter um dimensão prática da forma como realmente deveria ser.

Abordados as diferentes variações dos estudos CTS, apresentaremos no capítulo seguinte as particularidades dos diferentes pontos atribuídos à tecnologia.

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