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A GRANDE SÍNTESE APRECIAÇÃO DE FERM

(Videntes, filósofos, cientistas)

Da revista

Gerarchia - Milão, abril

de 1938.

A trajetória percorrida pelos seres criados, — segundo Ubaldi — é de essência biológica: de um indício, de um germe, de um princípio de vida, sobe-se até à plena elaboração,

à celebração da vida. Esta é movimento que parte de dentro e caminha para fora, para o alto, para depois regredir um pouco. Não segue em sua caminhada a linha vertical, mas a espiral, como em A Grande Síntese. A natureza dessa espiral implica breve retorno do ser sobre si mesmo, como parada, pausa, a fim de retomar o impulso para uma corrida mais rápida (. ...).

Eis novas implicações da vida. Se nos organismos inferiores o impulso vital, centrípeto ou centrífugo, é favorecido ou movido pelo prazer (ao passo que a dor é a sanção dos atos anti- vitais), acrescenta-se, no homem, o motivo ético, ou sentimento do dever, ligado com a noção do bem, do mal e da liberdade.

Surge aqui, necessariamente, uma complicação, causa de graves conflitos. O prazer (maquinismo biológico importantíssimo) para os indivíduos espiritualmente não evoluídos, ao invés de meio, se torna um fim em si mesmo, e em si mesmo procurado: por exemplo, a nutrição (centrípeta), a sexualidade (centrífuga). Uma perversão, como se vê, que frustra os fins superiores, nos quais esta colocado o bem de cada um e de todos.

Neste caso, os que colocam o prazer como bem e dele constituem um ídolo, sofrem suas conseqüências, mais ou menos voluntariamente. "Pois do próprio seio do prazer, surge o remédio, que por outro lado é muito amargo" (Lucrécio).

Ubaldi, que bem a experimentou, eleva à dor — remédio providencial — hinos triunfais. Ele sente, em medida consentida a poucos, o Beati qui lugent (jamais será adulador dos que gozam).

Os hedonistas, que odeiam o Cristianismo como qualquer outra filosofia austera, opõem que a dor (portanto, logicamente, o dever, o esforço, o sacrifício) é anti-orgânico, anti-vital, mortífero. Isto é verdade no sentido de que o elemento inferior se deteriora, para permitir o desenvolvimento do superior: do eu mais alto. Da mesma forma, e pela mesma razão biológica, a matéria, depois que atingiu a maior potência nuclear e eletrônica, se desagrega, irradiando-se.

"O progresso evolutivo implica uma degradação progressiva de potencial. Na natureza do transformismo evolutivo está a razão profunda destes fenômenos. O próprio enfraquecimento cinético progressivo, na fase "energia para vida", como na de "vida para espírito", é apenas a constante e substancial característica do fenômeno evolutivo.

Isto porque a evolução, reduzida à sua substância fundamental, é movimento, ou seja, um processo de descentralização cinética, uma expansão do princípio que se dilata para a periferia, uma subida que se opera através do esgotamento de um impulso, filho de outro precedente e contrário impulso evolutivo de concentração cinética e condensação dinâmica, de centralização de potencial da substância, a que agora se contrapõe o processo inverso de subida. Com efeito, a “degradação biológica é parte integrante do fenômeno evolutivo e existe como condição do processo genético do psiquismo”.

A lei aplica-se maravilhosamente à vida ética — constituindo mesmo a sua substância — no indivíduo e na sociedade.

Observe-se a atividade fisiológica (nutritiva e sexual), econômica e social. Os excessos e os vícios que a moral e a religião condenam são, para quem os considere bem, fatos involutivos e anti-sociais. A dor que produzem terá, de qualquer modo, a força de emendá-los.

Segue-se daí que a dor e toda forma de castigo se transformam em redenção e se tornam preciosos instrumentos de progresso social; mas aparecem aos olhos do vulgo como pouco menos do que escórias e refugos.

Portanto, é necessário aceitar a dor (se incurável) e considerar o trabalho como dever e missão. Eis uma atitude razoável; seria irracional e absurda a rebelião contra a natureza das

coisas. Esta favorece os voluntariosos e esmaga os renitentes.

Então, se a evolução significa conquista de consciência, de liberdade, de felicidade, e a involução significa o contrário, na baixeza de nossa natureza está a causa de todos os males, e na ascensão espiritual está todo o remédio. É justa a aspiração à alegria; e a felicidade pode existir, mas é indispensável submeter-se ao trabalho de conquistá-las. O Evangelho é uma estrada espinhosa, mas só por ela se pode seriamente alcançar o paraíso sobre a Terra.

"Toda concepção hodierna da vida está aqui deslocada e sois obrigados, por vossa ciência, cuja linguagem sempre falei, a compreender e efetuar por coerência esta deslocação”.

Na verdade, o homem só pode existir imerso na grande lei divina. Isto faz tornar-se absurda qualquer culpa, qualquer baixeza: torna utilitária a estrada da virtude.

Portanto, ao conceito limitadíssimo de uma força nossa individual, que guia os acontecimentos, precisamos substituir o conceito vastíssimo de uma justiça que impõe seu equilíbrio e suas compensações no destino.

A Providência compreendida assim é um momento da grande lei permeada de equilíbrio, que adere ao mérito, sustentada por compensações contínuas — é a justiça em ato. Mas a Providência não justifica uma espera inerte e passiva: age sobretudo no justo que quer o bem e que, lutando, o impõe com seu esforço.

Quando passamos ao campo social, apresenta-se o problema da força, que a história parece identificar com a justiça. A primeira é necessária tensão da vida, imperial e tirana, mas degrau de ascensão. O caótico choque das forças, ainda à procura dos equilíbrios superiores do direito, expandindo seus impulsos interiores, prepara o amadurecimento da unidade coletiva. Enquanto reina a força bruta, o melhor é o mais forte (Aries = Marte, donde Aristos). É uma justiça proporcional à baixeza do nível e não pode ir além da seleção natural. A vida é uma expansão de egoísmo e só dilatando é que o coordena com os egoísmos limítrofes, para que possam fundir-se. O indivíduo, impelido a elevar-se pelo impulso biológico, descobre metas cada vez mais altas, trata de alcançá-las melhor na coletividade, e então o ciclo infeliz, que se chama ignorância, egoísmo, força, luta, dor, mal, tende a despedaçar-se. É a gênese da guerra. Dadas as condições atuais (não futuras) a guerra é necessária. No entanto, esse mal de transição já se inverte num reflorescimento de bem, porque ensinou ao homem feroz a matar também por uma idéia, a dilatar o próprio egoísmo até a coletividade, a sacrificar-se pela pátria.

Então, seguindo o mesmo impulso, passa-se da força ao direito, do egoísmo ao altruísmo, da guerra à paz.

Foi assim que nasceu o direito: primeira centelha de coordenação e de força social, do centro à periferia, do indivíduo à coletividade, em suas expressões cada vez mais vastas de direito privado, público, internacional.

Neste sentido, direito é uma idéia mais exata da justiça, o mal é o passado, o bem é o futuro. Pois culpa é todo regresso voluntário, que a lei corrige reconstruindo o equilíbrio por meio da reação da dor; vida é tudo o que acelera o progresso, e portanto é premiado.

O homem de pensamento deduz daí que "a evolução provoca a demolição progressiva do egoísmo, após havê-lo sitiado e obrigado a render-se".

O ser moralmente elementar, mesmo se inteligentíssimo, vê apenas o pequeno "eu" (o "eu" superficial!) e se fecha, como o primeiro Fausto, no átimo que foge. Ele não se sente como vivendo no tempo e na humanidade; em sua miopia psíquica, isola-se no próprio bem. mesquinho, fora do grande bem coletivo. É totalmente inepto a viver num regime de colaboração, em que a consciência mais evoluída sente necessidade de multiplicar-se.

Pois bem, essa consciência civilizada é gigantesca força, justamente a força do homem civilizado. Aqui o autor condensa a idéia que circula em toda a sua obra.

"Vimos (Desenvolvimento do Princípio Cinético da Substância) a lei guiar a energia e redobrar-se sobre a matéria para animá-la com seu impulso e elevá-la ao nível da vida; depois impor ávida, filha da energia, que elabore a matéria até o psiquismo. Essa mesma lei de coesão, que impõe um recomeço de movimentos inferiores, para que revivam em oitavas mais altas, e faz dobrar o alto para o baixo, para que este seja retomado pelo ciclo evolutivo e jamais possa ser abandonado fora do círculo e apodrecer no fundo, fora da grande caminhada progressiva, essa lei, que quer assim, é a mesma que impõe ao super-homem (santo, herói, gênio) que se sacrifique pelos irmãos menores, é o movente de seu instinto irresistível, de altruísmo e martírio".

Por esse caminho, superadas as fronteiras e deitadas no chão as barreiras de toda espécie, o super-homem pratica uma ética internacional e prepara um direito internacional.

Não se creia que Ubaldi reduza a virtude a um egoísmo refinado. Cristão até a medula, aponta o Evangelho como o código supremo da moral, e a moralidade social definitiva na lei: "ama teu próximo como a ti mesmo". Esta forma uma unidade com o amor de Deus, e só ele pode ordenar o amor aos inimigos.

As relações sociais são grandemente econômicas. Ora, a ciência oficial cometeu um erro duplo: 1) forjou um "homo economicus", isolando-o dos outros aspectos e funções de humanidade: um ente que não existe na natureza; 2) codifica o egoísmo, reconhecendo a legitimidade do princípio hedonístico, anti-colaboração por excelência, isto é, anti-social. Os dois erros justificam todo o egoísmo de indivíduos, grupos, classes, nações, interesse de todo o gênero. Será uma guerra geral, da qual só pode derivar a destruição.

Ao contrário disso, a evolução tende, como sempre, a reduzir, sitiar, eliminar os impulsos egoísticos. Ao passo que o mundo econômico, edificado sobre a santidade do egoísmo, está cheio de crises inevitáveis, sem remédio. A solução dos conflitos não está na criação de um rebanho de irresponsáveis, mantidos pelo Estado (bolchevismo); nas, ao invés, de responsáveis, que saibam. Manejar conscientemente as grandes forças econômicas, não com mutilação, mas com acréscimo de consciência, liberdade, confiança, responsabilidade: uma revolução ética em grande estilo.

"Na direção dessa renovação só pode estar o órgão máximo da consciência coletiva: o Estado. O fenômeno econômico espera da autoridade central do Estado — como personificação concreta da ética humana — cada vez mais enérgicas infusões de fator moral, com obrigações e retoques que purifiquem a atividade econômica e a riqueza, e a dirijam para fins mais elevados. Cabe ao Estado intervir e corrigir, introduzindo um mínimo de ética cada vez mais alta no fenômeno econômico, guiando por dentro e por fora o cruel equilíbrio das trocas, para um regime de colaboração, que não é apenas compensação, mas compressão de egoísmo; não só coordenação, mas fusão num organismo econômico universal. Uma ciência econômica consciente da Lei não deve surgir sobre bases hedonísticas, mas colaboracionistas, pois numa sociedade adiantada, a fase ética e utilitária é cooperação".

Esta função econômica não é certamente nem a única nem a mais delicada função do Estado. Qual é então a essência filosófica do Estado? " É o organismo, situado no centro do organismo social, centralizador do poder diretivo de todas as funções de um povo. Compreendido assim como poder, ele é o órgão psíquico, promotor e coadjuvador das maturações biológicas, individuais e sociais. Sua função é fazer o homem, impulsionar as ascensões humanas; seu mais alto objetivo é criar, no campo do espírito". Visto assim, do alto, "o

comando supremo é apenas o trabalho e a função suprema, a capacidade psíquica e volitiva suprema, a responsabilidade, o perigo, o peso supremo. Esta é posição de dever, posição de obediência aos princípios da Lei".

Em cada idade, tem o Estado sua tarefa precisa. A Idade Média, em suas condições sociais involuídas, só podia oferecer ao indivíduo um sonho de libertação individual, pelo caminho da renúncia mística. Titânica ebulição de almas, assim mesmo a Idade Média lançava no campo da arte, da política, da ciência, a semente das maiores construções espirituais. Amanhã, a grande revolução da humanidade (agora iniciada), filha de um amadurecimento biológico substancial, trará à luz o advento político da intelectualidade consciente: amadurecida na raça, construtora de instintos mais altos, que tornem o homem um ser escolhido por seleção para o ofício social do mando — uma escolha insubstituível por qualidades próprias e eminentes — como o sistema nervoso nos organismos animais superiores. Então, será mais nítida e orgânica a divisão do trabalho, por especificação de capacidade, base do corporativismo moderno.

Hoje, por obra do Estado, retoma-se o ciclo romano das construções e conquistas coletivas: não se pode mais conceber-se o indivíduo isolado, mesmo se santo, sem fuga mística do consórcio humano, mas o indivíduo com ele fundido em colaboração fecunda. Agora podemos mais exatamente definir o poder, como a central psíquica e volitiva de uma Nação.

Hoje, ao retornarem-se as tentativas de 1600 — grandiosas, mas desviadas por ambições dinásticas e parasitismos de cortesãos — o Estado se torna cada vez mais orgânico, progredindo em profundidade: não para sitiar o indivíduo, mas para valorizá-lo e levantar-lhe a consciência, e deste modo enriquecer cada vez mais as suas funções... Agora o Estado já não é mais apenas um poder central sobreposto a um povo... Hoje não mais se admitem essas superposições. E não sendo mais o Estado um poder central dominador, ele é o cérebro de seu povo, e só pode ser a expressão de uma consciência nacional, de uma unidade de espíritos, baseada numa unidade étnica.

O Estado hodierno, democrático e aristocrático ao mesmo tempo, representa a fusão de dois princípios de centralização, ambos necessários. Em sua função totalitária, ele cria uma coletividade mais compacta, em cujo seio o indivíduo não é mais o membro desordenado de um rebanho também desordenado, mas é o soldado de um exército em marcha, em que vibra a alma do chefe. Pela primeira vez, na história, o Estado faz do povo um organismo, em cujo centro, fundido com ele, faz-se a síntese de vontades e de poderes. No Estado moderno, o povo não é mais o rebanho governado, que deve apenas dar e obedecer, mas é o corpo do cérebro central (o governo), o organismo daquela alma dirigente, que o penetra por todos os lados e o vivifica com seus tentáculos e ramificações nervosas. Não mais um chefe ou uma maioria que governa, para si, mas uma doação de deveres na cooperação, uma fusão completa, num trabalho e num objetivo comuns.

Entre as funções do Estado, a primordial é a de ser instrumento de ascensões humanas. Pela altura e intensidade com que tiver sabido educar, se mede o valor de um Governo. Nas atividades individuais e sociais realiza-se o princípio da lei que diz: ordem. Move-se tudo ao longo de uma linha de coordenações e de harmonizações (....). Por esse caminho o centro, atingida a periferia, volta ao centro; este se reforça pela aderência do indivíduo, o indivíduo se valoriza na coletividade, acentuando seu rendimento. O Estado entoa a música da cooperação: prevê e une no espaço e no tempo, antecipa e providencia, garante e protege. Só ele pode criar uma atmosfera ética em que podem florescer as delicadas produções do espírito, pode elevar as

superiores atividades intelectuais, que doutra forma escapam à consciência coletiva, e são condenadas à extinção pelo princípio hedonístico. Nele nada se perde, cada um tem sua função. Nesse organismo; obedecer não é servir, mas valorizar-se. O novo Estado terá o monopólio da força, na medida do qual o império da força se torne necessário pela animalidade não subjugada. Não será agnóstico: deverá ter uma concepção sua, ampla, da vida, e fazê-la compreender, para que se realize. Deve conhecer o homem. No princípio, o centro se deterá num puro enquadramento das massas, mas o futuro consistirá na penetração das almas. Neste novo Estado, o indivíduo realiza sua maturação biológica para a fase do super-homem, todas as forças sociais são disciplinadas para um objetivo de elevação coletiva. Os instintos inferiores são atrofiados por não serem usados, os elementos mais involuídos são domesticados, porque absorvidos na corrente que os orienta para metas espirituais superiores.

Valorizadas as atitudes, eliminadas as rivalidades, impedidos os desperdícios de riquezas e energias, o povo realiza lentamente as grandes assimilações espirituais, e, compacto, avança para a conquista de seus ideais. "O trabalho, iluminado por finalidades superiores, não é mais uma condenação, mas é triunfo cotidiano sobre a matéria, triunfo da vontade e do espírito, viril ato de domínio. O Estado impelirá os cidadãos através da célula corporativa, num fecundo amplexo produtivo”.

No novo Estado as anarquias econômicas devem ser eliminadas, o individualismo não é admitido, por ser desordem. O homem futuro que ele quer construir, não será uma simples máquina de fabricar dinheiro, apenas uma hipertrofia volitiva, mas um homem completo mesmo em seu lado espiritual, no desenvolvimento harmônico de todas as suas faculdades (....). O Estado aspira e emana, centraliza e descentraliza", é o coração que a cada instante lança todo o seu sangue, para que circule em seu organismo.

Gravíssimo erro do marxismo foi o de ver só os aspectos obscuros e deteriorados da convivência humana: uma concepção negativa e aniquiladora, semente de destruição, e não de construção. Hoje o Estado sente o dever de anular a luta de classe, antieconômica e imoral, que domina os antagonismos econômicos.

"Mas estava nas leis da vida a ascensão e uma fusão e solidariedade de todas as forças da produção, sem opressões e supressões, dando lugar a todos, para que todos dessem sua contribuição. E todas as classes encontram, no colaboracionismo, reconhecimento e proteção; o agricultor, o soldado e o operário. Colaboração, não luta de classes. A propriedade é base natural do edifício econômico, como a família o é do edifício social; é, como esta, uma lei da natureza, própria ao mundo animal. Destruir estas unidades primordiais insubstituíveis é demolir a natureza humana”.

Às revoluções destruidoras, sucedeu uma revolução construtiva, que enquadra todas as forças e delas forma uma unidade; às revoluções que sobem — de baixo — para demolir, sucedeu uma revolução que desce — do alto — para construir; descida das aristocracias do pensamento para erguer os humildes, subida dos humildes para compreender. A tarefa das classes não é eliminar-se, mas dividir entre si os frutos da própria civilização, dirigindo-se à compreensão recíproca. O papel da classe dirigente não é dominar, mas educar a plebe tumultuosa, velho instrumento de vinganças, muitas vezes vítimas das repressões, sempre massa ignorante, amorfa e cega; para transformá-la em povo que ascende para mais alta consciência coletiva".

Um leitor apressado, versado na história das Religiões, seria induzido a acreditar que em A Grande Síntese revivem as tendências gnósticas, tão insidiosas contra o Cristianismo que

nascia, e por isso condenadas desde o primeiro instante pela Igreja, tanto quanto pelo bom senso. Já São Paulo se insurgira imediatamente, e não só ele, contra estas "aniles fabulae" ("histórias de velha").

Para quem não tem as idéias claras sobre a matéria, traduzo uma página de A. Lulicher (um douto racionalista): "Não existe um ensinamento gnóstico fundamental. Os gnósticos autênticos só têm em comum o fato de quererem alcançar os objetivos da Religião, isto é, a liberação do espírito da servidão da matéria mediante o ensinamento de uma ciência oculta, que, antes de tudo, consiste em especulações cosmogônicas, e depois em preceitos e normas para facilitar o processo de divinização. Os gnósticos cristãos, em particular, não se apresentam como filósofos que esperam demonstrar racionalmente sua doutrina. Ao contrário, dão-se o ar de Apóstolos ou Profetas de uma nova sabedoria revelada, que eles, conforme os gostos, receberam, ora de iluminados contemporâneos, ora de desconhecidos discípulos dos Apóstolos, ora de uma literatura antiquíssima que estava escondida (o último processo ainda está em, uso em certas igrejolas). Quase sempre se descobre. aí uma marca forte das concepções babilônico-persas, que, nos cultos misteriosos daquele tempo em que florescia o sincretismo religioso, se haviam misturado singularmente às idéias gregas. Por isso, na base das doutrinas, encontra-se um grosseiro dualismo, mas dissimulado por arabescos politeísticos, pelo qual o espírito é matéria, Deus e o mundo aparecem como antíteses absolutas, o processo esotérico apresenta-se ligado à devastação das forças morais, os indivíduos surgem como meros espectadores passivos do drama das forças que movem o mundo". (Die Rel. lesu und die Anfange des Shristentums).

Ora, compare-se a Gnose com o fundo doutrinal de Ubaldi: "Eis o mecanismo secreto da lei: o psiquismo animador das formas, sede da centralização dínamo-cinética da substância no