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5. Percursos e opções editoriais

5.2. As fases da Edição

5.2.1. Gravação, produção e pós-produção

Para que haja uma edição, é preciso que exista uma obra. Normalmente uma cópia

master com a obra dos artistas que será duplicada, divulgada e comercializada pela

editora. O processo de gravação dos instrumentos e vozes, a produção e pós-produção realizadas por técnicos de som, são os passos dados para a criação da obra. Não nos

parece ser este o espaço para discutir as componentes técnicas específicas de gravação e produção, mas antes o papel que as editoras assumem neste processo e os discursos associados: há editoras que preferem acompanhar o processo de criação da obra que irão editar, outras que apenas trabalham com produtos já finalizados, e ainda, entre estas duas posições mais extremas, editoras que participam numa fase de pós-produção, caso seja necessário.

Ainda assim, muitos entrevistados referem que a sua posição a este respeito poderá ser alterada caso a caso, consoante o investimento disponível para cada banda. A intervenção do editor no processo de gravação pode fazer-se pela via do editor assumir o papel de produtor ou cobrir a despesa de um produtor externo e de um estúdio, ou pela negociação de preços mais baixos com contatos de uma rede de trabalho já estabelecida. Nos argumentos para o não assumir de um papel ativo na gravação e produção estão a falta de retorno económico das edições, associada a um aumento da oferta de estúdios e produtores que tornam mais acessível o acesso dos músicos a condições de gravação e produção, e ainda a falta de competências dos editores nesta fase do processo.

“Nós não pagamos gravações, podemos ajudar a encontrar condições para gravar, mas já tem de estar pronto quando chega a nós. Podemos negociar com estúdios, podemos negociar com produtores, podemos negociar com malta que faz masterizações e etc.” E3, Editora, Feminino, 32 anos, Mestrado, Lisboa

“Isso depende. É óbvio que há uns anos atrás, quando eu tinha um núcleo mais pequenino de bandas, e o budget era diferente, porque o retorno era diferente (…) tu tens outro fundo de maneio para poderes ajudar a gravação ou fazeres um vídeo, ou seja o que for à volta da banda. (…) Entretanto, também a evolução tem sido de cada vez ser mais fácil gravar as coisas, em vez de teres de ir para um estúdio quando só há três estúdios e teres de pagar o que eles pedem, praticamente todas as bandas gravam na sua sala de ensaios ou na... é muito mais fácil, há um estúdio... em cada rua há um estúdio. Os preços, não é como os chineses, mas é quase. É mesmo verdade, há muita gente a gravar e isso também, como há muita oferta, não é? É mais fácil...” E15, Editora, Masculino, 49 anos, Curso Médio, Lisboa

Nesta última citação vemos uma referência a uma mudança de atuação devido à redução do retorno económico das edições ao longo do tempo. Outro entrevistado fez referência a pagar estúdios quando a sua editora estava ativa, no início do milénio – viria mais tarde a fechar por falta de sustentabilidade económica. Assim, podemos talvez identificar uma mudança de funcionamento editorial e de convenções da relação entre partes decorrente da diminuição de vendas de discos desde o início dos anos 2000.

“Quando trabalhamos com os [banda] eles queriam gravar um disco ao vivo num estúdio em condições e nós conseguimos com um budget que para nós era curto, mas foi o que conseguimos arranjar, ir dois dias para o estúdio que era, na altura, talvez o melhor estúdio no país, e eles gravaram o disco ao vivo ali.” E6, Editora Extinta, Masculino, 44 anos, Frequência Universitária, Lisboa

Outros entrevistados que referem pagar estúdios hoje em dia estão associados a editoras formalizadas e/ou que têm estúdio próprios, e também permite mais

investimentos a nível de participações de outros artistas na gravação. Por outro lado, selecionamos também um discurso que assume o pagamento da gravação como responsabilidade intrínseca da editora e que demonstra confusão pelo facto de outras editoras não o cumprirem. Esta é mais uma demonstração de como o habitus e as convenções não se modificam automaticamente por mudanças estruturais, o que faz com que períodos de mudança sejam também momentos de indefinição.

“Há bandas que precisam de ir a estúdio, tens de pagar o estúdio, tens de pagar os voos, tens de pagar para fazer o disco, tens de ter a empresa... há quem não faça, não entendo bem...” E8, Editora, Masculino, 40 anos, Licenciatura, Porto

“Tens as pessoas focadas mais no conteúdo musical, na procura de artistas para editar, procura de artistas com quem colaborar, tens produtores internos a fazer uma coisa, e se eles precisam... se para esta música precisam de uma cantora ou não sei quê, então é preciso conhecer o meio, conhecer o mercado, saber que músicos é que se poderiam adaptar a esta banda, saber procurá-los e também criar uma estrutura de apoio aos próprios artistas que querem trabalhar contigo a todos níveis, não é?” E5, Netlabel e Editora, Masculino

Por fim, retomamos o caso da editora criada para dar apoio à função de produtor do entrevistado. Neste caso, sendo o entrevistado jovem e novo no campo, estamos perante uma situação em que o agente não tem ainda uma posição de destaque no campo e ainda não é muito procurado como produtor. A editora serve assim também como uma forma de divulgar e consagrar o trabalho do agente enquanto produtor. Em acréscimo, na sua entrevista, este agente referiu algumas das vantagens que via no facto de o produtor e editor serem a mesma pessoa.

“A questão de fazeres produção e, principalmente, se estiveres a gravar com a banda em si, é que logo ali conheces as pessoas, e conhecer as pessoas é importante até para a capa, (...) se disserem assim "olha, não temos nenhuma capa, já vimos as outras que tu fizeste, faz tu uma capa", que é que eu vou fazer? Tem de ser alguma coisa a ver com a música, (...) tem de ter um contexto ou, pelo menos eu saber que vou apresentar alguma coisa que eles vão gostar minimamente, ou que de alguma forma faz sentido para eles.

“A parte da gravação é muito importante porque conheci as pessoas e sei o que elas querem, sei o que elas ouvem, sei o que... e depois é só misturar isso também com o que eu também gostava de extrair ali porque, às vezes também mesmo a questão do produtor é as bandas, não só não saberem tecnicamente mexer mas coisas, mas não saberem esteticamente chegar lá, ou criar a sua própria estética. Têm estas músicas, as músicas são muito boas, só que não não têm uma sonoridade muito própria, soam igual a outras coisas, mas às vezes basta produção para as coisas ficarem diferentes.”

“Isso é conhecer as pessoas, e é a parte importante da parte toda da produção, em relação depois à edição também e ao produto final, acho que é isso.” E14, Editora, Masculino, 22 anos, 12º ano de escolaridade, Caldas da Rainha

No que diz respeito ao trabalho de masterização - ou seja, a passagem da mistura final para um dispositivo master a partir do qual são feitas as cópias de exemplares para comercialização – os entrevistados referem comummente fazer parte deste processo, ora trabalhando com estúdios e produtores especializados, ora assumindo eles próprios a realização da masterização.

“Basicamente, masterizamos os temas, enviamos para um estúdio de masterização inglês com quem temos vindo a trabalhar.” E5, Netlabel e editora, Masculino

“Eu entretanto, como fui estudando um bocadinho sobre isto e experimentando e pesquisando e trocando ideias sobre finalização e sobre masterização, agora tenho sido sempre eu a fazer, e então, quando há uma nova edição na calha, eu já sei como é que vou pedir àquele artista que me peça o material, e depois no meu estúdio vejo o que é que é preciso para equilibrar.” E12, Editora, Masculino, 29 anos, Licenciatura, Porto