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Histórico das políticas públicas de desenvolvimento regional na Amazônia

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

2 Amazônia: Capital Natural e o Desenvolvimento Sustentável

2.1 Histórico das políticas públicas de desenvolvimento regional na Amazônia

O povoamento e desenvolvimento da Amazônia foram fundados de acordo com o paradigma de relação sociedade-natureza, que Kenneth Boulding denomina de economia de fronteira, significando com isso que o crescimento econômico é visto como linear e infinito, e baseado na contínua incorporação de terra e de recursos naturais, que são também percebidos como infinitos. Hoje, o imperativo é modificar esse padrão de desenvolvimento que alcançou o auge nas décadas de 1960 a 1980.72

O período anterior à década de 40, enquanto, em nível nacional, se dava o debate sobre a industrialização e o desenvolvimento, a Amazônia passava por um momento de relativo isolamento em relação ao quadro nacional. Quadro este que foi quebrado parcialmente com a conjuntura estabelecida com a II Guerra Mundial e, em definitivo, com o cenário estabelecido no período posterior, tendo em vista a estratégia de institucionalização do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, no período após a promulgação da Constituição de 1946.73

Isto porque, durante uma conferência da UNESCO, realizada em Paris, em 1945, foi discutida a criação do Instituto Internacional da Hileia Amazônica, com o objetivo de criar uma comissão científica, formada pelo Brasil e outros países vizinhos, com vistas a estudar os problemas relativos a educação, ciência, cultura e exploração dos recursos da floresta. Em uma convenção realizada em Iquitos, no Peru, em 1948,

72 BECKER, Bertha K. Geopolítica da Amazônia. 2005. P. 73.

73 OLIVEIRA. W. P; TRINDANDE. J. R.; FERNANDES. D. A. O planejamento do desenvolvimento

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o Instituto foi criado e Manaus foi escolhida cidade-sede do órgão, decidiu-se também que o Instituto receberia 300 (trezentos) mil dólares a título de orçamento para aquele ano, metade dos quais seria fornecida pelo Brasil. Apesar de receber de forma positiva esta ação, o presidente Dutra sofreu a pressão daqueles que viram no projeto uma forma de controle do imperialismo econômico sobre a Amazônia e sobre o país, a polêmica gerada fez com que houvesse um recuo no posicionamento e a proposta caiu no vazio, voltando às políticas governamentais a responsabilidade pelo desenvolvimento regional. (D’Araújo, 1992)

Segundo Carvalho (1999), não se pode analisar a dinâmica regional da economia brasileira sem buscar as raízes da configuração do espaço na história da economia regional, em particular nos ciclos econômicos do modelo primário- exportador e do modelo de substituição de importações. Nesse sentido, a conscientização da sociedade brasileira sobre a questão regional amazônica tem como ponto de partida a decadência da economia da borracha.74

O período em foco marca, portanto, em definitivo, a retomada do debate nacional sobre a economia regional amazônica e sua estratégia de interação com a economia brasileira. Isso, contudo, tendo em vista um contexto aonde a economia regional se via fortemente acometida por problemas de ordem estrutural, profundamente relacionados aos impasses sobre os rumos de sua base econômica extractivista no período pós II Guerra Mundial.75

Nesse contexto, a segunda metade da década de 40 constituiu momento de grande relevância para a região amazônica, pois registrou o início da elaboração da primeira tentativa de planejamento do desenvolvimento regional na Amazônia brasileira, isso como parte das alterações institucionais previstas no artigo 199 da

74 BRITO, Liane do Socorro Bastos. Planejamento Regional na Amazônia e seus desdobramentos

espaciais: o caso do Estado do Amapá. P. 50.

75 OLIVEIRA. W. P; TRINDANDE. J. R.; FERNANDES. D. A. O planejamento do desenvolvimento

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Constituição 1946 e dos debates que a partir daí se seguiram, culminando com o ato de criação da Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA) em 1953, que posteriormente, veio a fracassar.76

Em nosso país, os primeiros esboços de um programa nacional de economia, no campo da planificação regional, fora a ação do Estado brasileiro, traduzida pela criação da Superintendência de Valorização Econômica da Amazônia.77

Vários fatores são citados para justificar o fracasso do SPVEA: o repasse irregular dos recursos e as votações do orçamento no Congresso que propiciavam um jogo de interesses; o seu formato como órgão de planejamento e execução que também submetia o órgão a várias pressões que limitavam sua autonomia; a amplitude da região e a falta de conhecimento científico sobre a área e sua população, entre outros.78

Ainda no ano de 1953, fora sancionada a Lei Federal n. 1.806, que transformou a Amazônia Brasileira em Amazônia Legal, fruto muito mais de um conceito político do que de um imperativo geográfico, pela necessidade do governo planejar e promover o desenvolvimento da região. Portanto, através desta lei ficava determinado que a região seria compreendida pelos Estados do Pará e do Amazonas, pelos territórios federais do Acre, Amapá, Guaporé e Rio Branco, e ainda, a parte do Estado do Mato Grosso a norte do paralelo 16º, a do Estado de Goiás a norte do paralelo 13º e do Maranhão a oeste do meridiano de 44º.79

76 Ibidem.

77 COMPARATO, Fábio Konder. Ensaios e Pareceres de Direito Empresarial. Ed. Forense. Rio de

Janeiro. 1978. P. 466.

78 BRITO, Liane do Socorro Bastos. Planejamento Regional na Amazônia e seus desdobramentos

espaciais: o caso do Estado do Amapá. P. 57.

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Partindo da necessária formulação de políticas regionais, fora criada, por meio do Decreto-Lei n. 288 de 1967, e atualmente com fundamento constitucional no artigo 150, inciso “I”, a Zona Franca de Manaus, projeto pautado em incentivos fiscais e desenvolvimento sustentável (parque industrial sem chaminé).

Não há no Brasil um balanço conclusivo sobre o volume de recursos investidos ao longo das últimas décadas para a redução das desigualdades regionais, nem tampouco sobre o alcance e acerto das políticas públicas correspondentes. Mais recentemente, diante do esvaziamento político e institucional da SUDENE e SUDAM, dos custos de manutenção da Zona Franca de Manaus, da persistência de graves problemas sociais no Nordeste, das alegações de corrupção e mau uso de recursos públicos, da irracionalidade de múltiplos instrumentos às vezes contraditórios, da “guerra fiscal” entre os estados, da recente experiência da política regional da União Europeia, várias tentativas de avaliar e repensar a “política regional” brasileira vêm sendo feitas como a proposta elaborada pelo Governo Federal dos “Eixos Nacionais de Integração e Desenvolvimento.80

O sistema de incentivos fiscais, generalizados a partir da década de 1960, através das superintendências de desenvolvimento regional SUDENE, SUDAM e SUFRAMA, e dos fundos estabelecidos pela Constituição Federal de 1988. Esses incentivos, em que pesem as críticas que se faça à forma de concessão, o uso inadequado, as divulgações de desvio de recursos e a corrupção, inaceitáveis em todos os sentidos, tiveram importância decisiva na atração de um grande número de projetos para as regiões Norte e Nordeste, os quais refletiram na expansão produtiva e na geração de renda e emprego.81

A vertente industrial do projeto ZFM foi a que obteve maior sucesso, a qual, por conseguinte, sustenta todo o discurso político de defesa da Zona franca de

80 DINIZ, Clélio Campolina. A questão regional e as políticas governamentais no Brasil. 2001. P. 13-14.&&

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Manaus. Estruturadas na lógica da economia capitalista, empresas de capital transnacional, associado ou não ao capital nacional, capitanearam o processo de crescimento da cidade de Manaus, acelerado principalmente no decorrer da década de 80 do século passado. Tecnologia japonesa, norte-americana, alemã, dentre outras, aportaram na ZFM, fazendo surgir subsetores industriais como o eletroeletrônico, o relojoeiro, o de duas rodas, o de materiais plásticos e outros.82

Ocorre que a situação nos países pobres caminha para outro sentido. O programa comum aos Estados do Terceiro Mundo chamava-se desenvolvimento, a rigor, outro nome, e mais promissor, para a noção convencional de progresso. Mas em que consistia, a rigor, a prática do desenvolvimento? Aumento da exportação de produtos primários e/ou, em certo lapso de tempo, substituição das exportações, ou seja, estímulo à industrialização.83

Em tal contexto, a tecnologia, quer na produção rural, quer na urbana, era posta apenas a serviço dos interesses internos da empresa regulados em termos microeconômicos. Em geral, mais tecnologia significava menos mão-de-obra. O efeito social era desastroso: desemprego, subemprego, marginalidade, anomia psicossocial. O realismo na frase de Celso Furtado não poderia ser mais drástico: “Ao contrário do que ocorreu no primeiro processo, nenhuma evidência existe de que a industrialização dependente conduza formas sociais estáveis”.84

E como mudar esse cenário de desemprego, subemprego, marginalidade e anomia psicossocial que a dependência em relação as economias centrais, e também a industrialização tardia nos causou?

82 BOTELHO, Antônio José. Redesenhando o Projeto Zona Franca de Manaus. P. 17.

83 BOSI, Alfredo. Prefácio do livro Criatividade e Dependência na civilização industrial.2002. p. 22.

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Diante do potencial da biodiversidade da região e, ainda, da dificuldade logística (escoamento da produção para atender o mercado interno), o modelo executado atualmente (e prorrogado até 2073) é arcaico, atendendo necessariamente a demanda de empresas com suas matrizes em países do eixo “Atlântico Norte”, logo, são necessárias otimizações – à luz do “desafio furtadiano” e do projeto econômico constitucional.

Quando a tecnologia de satélites permitiu ao homem olhar a Terra a partir do cosmos em outubro de 1957, tomou-se consciência da unidade do globo como um bem comum cujo uso deve repousar numa responsabilidade comum. Mas percebeu- se, também, que a natureza tornou-se um bem escasso colocando-se, então, a questão ecológica como duplo desafio, o da sobrevivência humana e o da valorização do capital natural. (Becker, 1997)

E quais instrumentos podem ser usados na dinâmica do capitalismo global? Schumpeter usou a expressão destruição criativa pela primeira vez em 1942, para se referir à maneira como os produtos e métodos capitalistas inovadores estão constantemente tomando o lugar dos antigos.85

Neste contexto, o desafio de amadurecimento do Estado brasileiro depende de governos e políticas públicas inovadoras que permitam a inclusão da população na condição de cidadão digno e capaz de tomar suas decisões e contribuir para o desenvolvimento nacional. Entende-se por políticas públicas inovadoras uma nova combinação de recursos, por exemplo, que permitam interferir na transformação de uma realidade social a partir da intervenção do Estado em determinado local.86

Neste momento, começamos a tratar de um novo modelo de desenvolvimento para a Amazônia. Um modelo baseado na equação – tecnologia + ciência + biodiversidade. Agregando valor ao capital natural, nossa biodiversidade

85 McCRAW, Thomas K. Joseph Schumpeter e a Destruição Criativa: o profeta da inovação, p. 15

86 SILVA, Christian Luiz da. Políticas Públicas e Desenvolvimento Local: Instrumentos e Proposições

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pode prover produtos da moderna biotecnologia. Este novo modelo econômico para a Amazônia deve objetivar as próximas políticas públicas para o desenvolvimento desta região. O capital natural amazônico pode beneficiar uma serie de pesquisas e, assim, contribuir na concretização do projeto de desenvolvimento nacional.

O próximo capítulo do trabalho pretende traçar um modelo de desenvolvimento que albergue dois elementos essenciais na consecução deste projeto para a Amazônia: o Capital Natural e a Biotecnologia.