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Hospitais Privados de Portugal/Lusíadas Saúde

No documento Mónica de Melo Freitas (páginas 132-137)

Parte II. Estudo Empírico

Capítulo 7. Os Grupos Hospitalares

7.2. Hospitais Privados de Portugal/Lusíadas Saúde

Os Hospitais Privados de Portugal foram criados a partir da reorganização do negócio hospitalar encabeçada pela Caixa Geral de Depósitos. Até 31 de Dezembro de 2006, a Caixa Geral de Depósitos detinha a totalidade do capital social dos HPP. A partir de 2007, outras empresas passaram a integrar o segmento de negócio da saúde do Grupo Caixa Geral de Depósitos, dentre as quais destacamos a Carlton Life, SGPS, S.A com 35%; e HPP - Medicina Molecular S.A, com 40% (HPP 2007, 36).

O Grupo Hospitais Privados de Portugal HPP é um dos maiores grupos privados da saúde de Portugal. Encontram-se a seu cargo sete unidades de saúde, incluindo o Hospital dos Lusíadas em Lisboa e o Hospital de Cascais, em regime de parceria público-privada, e cerca de 4.000 profissionais de saúde. O grupo apostou fortemente na certificação ambiental das suas unidades, tal como na organização de iniciativas de responsabilidade social (HPP 2007, 9), bem como nas despesas com investigação e desenvolvimento que nos primeiros anos contabilísticos ascendeu a 192.815,00 Euros (HPP 2007:40). Em 2007, o Grupo HPP alcançou um crescimento da actividade e do volume de negócios na ordem dos 6% (56,9 milhões de Euros). Em termos de números

de procedimentos realizados, também se registaram aumentos de 10,7% nas cirurgias, 3,7% nos internamentos, 9,1% nas consultas, 11,5% nos exames de imagiologia, e 4,5% nas sessões de fisioterapia (HPP 2007, 8, 10). O grupo defendia que os resultados alcançados se deveram sobretudo à reputação do corpo clínico, em especial, da área da Cirurgia Plástica e da Medicina Interna, e ao aumento da capacidade de atendimento dos médicos destas especialidades, HPP em conjunto com a adesão aos sistemas informáticos de suporte à decisão HPP (2007, 11, 13).

Contudo, o grupo constituiu alvo de pagamento de multas judiciais devido a processos movidos por clientes e ex-colaboradores. “Não foram constituídas provisões para estas situações, dado que os Conselhos de Administração das empresas do Grupo, inclusive da HPP, classificaram como remota a possibilidade de as Sociedades serem condenadas a efectuar pagamentos no âmbito destes processos” (HPP 2007, 61).

Segundo o Grupo HPP, a sua presença no mercado da saúde nacional tem fomentado a competitividade no setor, graças à contratação de especialistas renomados e ao emprego de soluções tecnológicas. Foi o grupo selecionado pelo Ministério da Saúde para gerir o Hospital de Cascais, cuja assinatura do contrato marcou o início da segunda vaga das parcerias público-privadas da saúde em Portugal iniciada em 2006. Contudo, algumas más opções tomadas pela gestão conduziram os HPP a uma situação financeira complicada. Tal conduziu em 2013 à venda dos HPP ao grupo privado de saúde AMIL, que passou a ser o maior accionista, incluindo a transferência da gestão público-privada do Hospital de Cascais. A Amil Participações S.A. é a maior empresa de saúde do Brasil, e a empresa de medicina de grupo com a maior rede credenciada no Brasil, atendendo atualmente mais de 5,7 milhões de beneficiários nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Minas Gerais, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Bahia e no Distrito Federal.

A visão estratégica dos HPP cultiva uma relação estreita com os desígnios de maximização do ganho de imagem e reputação, que se encontram presentes no seu conceito de Visão Organizacional:

Merecer a preferência natural dos clientes sendo uma referência na qualidade dos serviços que prestam (...) Proporcionar bem-estar através de um serviço de elevada qualidade, de acordo com as melhores práticas na prestação de cuidados

de saúde, obtendo a confiança e o compromisso dos nossos clientes, colaboradores e parceiros, criando valor para os accionistas.31.

Os valores éticos foram ativados no pressuposto de que a organização tem a obrigação de gerar bem estar devido à posição que ocupa na sociedade, juntamente com os valores do ganho de imagem e reputação com o propósito de tornar a organização mais competitiva. Já nas suas formulações iniciais, o grupo apoiara em valores éticos a persecução dos desígnios da sustentabilidade: “A compatibilização da promoção e da saúde dos cidadãos, com a necessidade de incentivar o crescimento económico da comunidade, é actualmente o grande desafio da governação da saúde” (HPP 2007, 7).

Posto isto, podemos dizer que os valores acionados pelo grupo HPP foram fundamentalmente éticos e instrumentais. Nos valores éticos, o bem estar das pessoas é afirmado num dos seis valores institucionais dos HPP: “Valorização, das pessoas e com as pessoas: apostar no desenvolvimento pessoal e profissional dos nossos colaboradores, capitalizando todo o conhecimento criado numa importante fonte de informação e diferenciação para todos”.32 Quanto aos valores instrumentais, estes foram invocados sobretudo para legitimar argumentos que se relacionavam com o desejo de maximização de ganho de eficiência através da articulação em redes e/ou da capacitação técnica e humanística dos profissionais como também do desenvolvimento de novos modelos e de gestão.

Na necessidade de identificar e dar respostas às principais demandas apresentadas pelos pacientes, o grupo hospitalar tem optado pela aplicação de questionários e respectivo tratamento dos dados internamente. Segundo o Grupo, a qualidade não é um fim, é um meio, através do qual a HPP Saúde se tem desenvolvido, e tem projectado esse desenvolvimento de uma forma positiva e competitiva perante o cliente. Por este motivo, consolidou uma estratégia interna de qualidade, suportada em ferramentas de controlo, monitoramento e certificação.

Uma das parceiras do grupo hospitalar na área da certificação é a Joint Commission International. Esta organização norte-americana é líder na acreditação de organizações de saúde desde 1999, e foi contratada para certificar os hospitais do Grupo HPP/Lusíadas Saúde em finais do ano 2000. O grupo acredita que o êxito competitivo das empresas centra-se na identificação, obtenção e avaliação dos activos intangíveis e

na sua utilização de forma a gerar vantagem competitiva sobre as demais organizações congéneres. Sob este paradigma, a marca e a reputação no mercado são os principais activos de uma organização moderna, é através destas que fornecem indicações visuais, que transmitem os princípios e os valores da organização.33

A par da estratégia para a qualidade, o grupo tem procurado desenvolver um modelo de gestão multissectorial geral e na área da RS. Desde 2008, que a RSE e a gestão dos stakeholders passaram a fazer parte do modelo de gestão dos HPP, com vista a “[r]espeitar o bem estar e o futuro da comunidade onde estamos inseridos, fomentando um espírito activo de responsabilidade social e ambiental”.34 Numa fase inicial de consolidação da estratégia do grupo na área da RS, as decisões do foro estratégico e programático cabiam ao Conselho de Administração. Entretanto, passados alguns anos, o processo decisional foi descentralizado para Departamento de Marketing, indiciando a sua efetiva subordinação aos valores instrumentais de promoção da reputação.

Apesar de a organização mencionar os valores éticos inerentes ao bem comum no suporte da lógica argumentativa de defesa da RS, não introduziu preocupações inerentes à equidade de género e à igualdade de oportunidades nas suas decisões e nas suas práticas. Embora faça menção de que a diferença é valorizada pelo grupo no momento da contratação de novos colaboradores, contudo, não mostra de que forma isto seria exequível quando não existem linhas de orientação a incentivarem a contratação de imigrantes e/ou pessoas com deficiência, por exemplo.

Além disto, o grupo HPP/Lusíadas Saúde não consolidou parcerias com os sindicatos e ordens profissionais, apesar de assinalar que a sua atuação encontra-se de acordo com as orientações para a saúde e segurança do trabalhador estipuladas pela Organização Internacional do Trabalho. A nosso ver, os planos de formação promovidos pela organização deveriam integrar módulos em áreas como Ética e Responsabilidade Social, numa tentativa de conduzir o grupo, a conciliar os desígnios de maximização de ganho reputacional para a empresa e de bem estar dos colaboradores. É importante referir que a organização tem procurado acautelar que a busca por maximização de ganho de imagem e reputação não comprometa a produção de bem estar social, adotando ferramentas e modelos de avaliação e de negociação entre as partes interessadas no processo negocial e constituindo-se alvo de “modelos

33 www.hppsaude.pt, consultado em 24 de Junho de 2015.

independentes de Avaliação da Satisfação dos Clientes” e de “participação nos programas de melhoria contínua”.

A análise SWOT do grupo HPP/Lusíadas Saúde salienta que este grupo foi o primeiro a empregar o termo Responsabilidade Social em justificativa dos programas implementados na área da prevenção das doenças. Contudo, ainda não incorporou os princípios de igualdade de género e de igualdade de oportunidades, quer na estratégia como nas práticas relacionadas à RSE. Ao nosso ver, isto poderá estar relacionado com o baixo nível de sistematização em que a RSE da saúde se encontra. Como se sabe, não existe um sistema de gestão da RSE intrinsecamente voltado para a área da saúde.

O grupo HPP ainda não consolidou sistemas de gestão de stakeholders, de auscultação e de avaliação de impactes das iniciativas da RSE. Apesar disto, a organização tem dispendido alguns esforços na articulação com outros setores da sociedade, tidos como estratégicos para o seu redimensionamento. Tal facto reforça a predisposição que esta organização cultiva para o trabalho em rede e para a negociação participada. Por fim, o nosso estudo mostrou que a RSE depara-se nos HPP com dois grandes desafios: o primeiro prende-se com a conciliação dos desígnios de maximização de ganho de imagem e reputação para a organização e os desígnios de produção de bem comum, e o segundo, com a mobilização das diferentes partes interessadas no processo negocial em torno da RSE.

Quadro 4. Matriz SWOT do Grupo HPP/Lusíadas Saúde

Pontos Fortes Pontos Fracos

Elevada cobertura do o território nacional. Primeiro grupo hospitalar português a invocar o termo responsabilidade social em justificativa das iniciativas promovidas no âmbito da prevenção de doenças.

Publicação de relatórios de contas de acordo com as normas técnicas e com as diretrizes de revisão/auditoria da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas.

Submissão do relatório de contas à revisão de organizações externas.

Consolidação de alianças estratégicas nas iniciativas que visam o redimensionamento do grupo.

Adoção de instrumentos de auscultação das partes interessadas

Ações de formação incipientes na área da ética e da responsabilidade.

Alvo de condenações judiciais em processos movidos por clientes e ex- colaboradores. História organizacional marcada por práticas de gestão deficitárias.

Ausência de certificações na área da responsabilidade social (ex. NP 4469-01, ISO 26.000).

Ausência se sistemas de auscultação na área da RSE.

Utilização dos programas de RSE fundamentalmente para produção de ganho de imagem e reputação para a organização. Ausência de articulações com os sindicatos e ordens profissionais.

Desenvolvimento de programas relacionados na área da responsabilidade social.

Certificação na área da qualidade.

organizações congéneres em torno da RSE. Os programas de responsabilidade social implementados não constituem alvo de auditorias externas.

Fraca adesão aos princípios de igualdade de género e igualdade de oportunidades.

Oportunidades Ameaças

Desenvolvimento de programas de formação na área da RSE.

Implementação de códigos de orientação ética.

Incorporação dos princípios de igualdade de género e de igualdade de oportunidade no modelo de gestão de recursos humanos. Despender esforços para estreitar laços com os vários stakeholders e afinar a sua política interna de qualidade.

Implementação de sistemas de auscultação na área da RSE.

Consolidação de parcerias com os sindicatos e com as ordens profissionais.

Incentivo à participação de outros hospitais e dos centros de saúde concelhios nos programas de RSE.

Implementação de sistemas de certificação na área da RSE (ex. NP 4469-01, ISO 26.000). Submissão dos programas de RSE à avaliação de organizações externas.

Não conseguir conciliar os objetivos estratégicos de produção de ganho de imagem e reputação com os objetivos de bem comum.

Continuar centrando a sua estratégia de mobilização de stakeholders na área da RSE apenas em figuras públicas.

No documento Mónica de Melo Freitas (páginas 132-137)