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5 METODOLOGIA

6.1 Idade

Nas “Recomendações de Nurembergue para o Ensino Precoce de Línguas Adicionais” (Nürnberger Empfehlungen zum frühen Fremdsprachenlernen), consta que, segundo estudos sobre desenvolvimento psicológico, é aconselhado iniciarem essas aulas nos primeiros anos escolares (GOETHE INSTITUT, [201-?]). Tudo que o ser humano vai precisar ao longo de sua vida é constituído nos primeiros anos de vida e, naquilo que se refere à língua adicional, não é diferente.

As minhas práticas e experiências enquanto professora e gestora da área de educação me permitem dizer que a aprendizagem de uma língua adicional é mais fácil para uma criança, pois há características, como a curiosidade, a necessidade de comunicação, a habilidade de articulação e a disposição da criança, que dão um suporte importante no processo de aprendizagem. Crianças que são alfabetizadas em diferentes línguas desenvolvem sua capacidade de diferenciação. Assim, toda vez que forem aprender uma nova língua, terão menos dificuldades, visto que estão acostumadas a ouvir línguas diferentes, prestam mais atenção e fazem relações vocabulares.

Assim, a idade é um aspecto muito interessante quando falamos de aprendizagem de línguas, visto que ela influencia na capacidade e na pré-disposição de aprendizagem. Como vimos na seção anterior, a aquisição de línguas parte de pressupostos diferentes, conforme Saussure e Chomsky. Hoje, principalmente por meio das neurociências, procura-se explicar essa capacidade de usar a língua, que é exclusiva do ser humano, bem como as diferenças do desempenho cognitivo e as diferenças entre crianças e adultos.

da implantação de um currículo bilíngue. Em relação aos fatores biológicos, os órgãos diretamente envolvidos na aprendizagem são o cérebro, o aparelho auditivo e o aparelho articulatório (cordas vocais, cavidades bucal e nasal, língua, lábios e dentes). Em relação ao cérebro, o lado esquerdo é o lado lógico (pelo qual entram as experiências, que ali são processadas e transformadas em conhecimento), enquanto que o lado direito é o lado criativo, responsável pelas emoções. O autor explica que no cérebro da criança os dois hemisférios estão mais interligados do que no de um adulto, correspondendo esta interligação ao período de aprendizado máximo. Assim, “a assimilação da língua ocorreria via hemisfério direito para ser sedimentada no hemisfério esquerdo como habilidade permanente” (SCHÜTZ, 2003). O desempenho superior das crianças, segundo o autor, estaria relacionado à maior interação entre os dois hemisférios cerebrais. O que é sabido também é que crianças e adolescentes têm uma acuidade auditiva superior e uma provável maior flexibilidade muscular do aparelho articulatório, o que pode contribuir para a hipótese de que crianças assimilam línguas de forma mais rápida do que adultos.

No caso dos adultos, a matriz fonológica já está sedimentada e a sensibilidade auditiva está treinada a perceber apenas os fonemas do sistema de sua língua materna.

A criança, por sua vez, ainda no início de seu desenvolvimento cognitivo, com filtros menos desenvolvidos e hábitos menos enraizados, mantém a habilidade de expandir sua matriz fonológica, podendo adquirir um sistema enriquecido por fonemas de línguas estrangeiras com as quais vier a ter contato. (SCHÜTZ, 2003).

As habilidades cognitivas das crianças são diferentes das dos adultos. Enquanto adultos têm capacidade de lidar com conceitos abstratos e hipotéticos, pela sua bagagem acumulada, crianças precisam de experiências concretas e de percepção direta para consolidar conhecimento. Segundo Schütz (2003), isso ajuda a entender a capacidade superior que os adultos têm para compreender a estrutura gramatical de uma língua adicional, se comparada à sua língua materna. Schütz (2003) acrescenta dizendo que isso

[...] explica também a tolerância superior dos adultos quando submetidos a situações artificiais com o propósito de exercitarem línguas estrangeiras, bem como a tendência de buscar simples transferências no plano de vocabulário, com ajuda de dicionários.(...) [Contudo], se proficiência linguística pouco depende de conhecimento armazenado, mas sim de habilidade assimilada na prática, construída através de experiências concretas, fica com mais clareza explicada a superioridade das crianças no aprendizado de línguas.

Para a criança, a aquisição da fala e a descoberta do mundo são processos paralelos. Conforme explica Harpaz (2003 apud SCHÜTZ, 2003):

A interação linguística da qual a criança participa proporciona a maioria dos dados nesse processo de desenvolvimento cognitivo. Como consequência, as estruturas neurais no cérebro que correspondem aos conceitos que vão sendo aprendidos acabam naturalmente e intimamente associadas às estruturas neurais que correspondem às formas da língua. Quando um adulto aprende uma língua estrangeira, seus conceitos (já formados) já possuem estruturas neurais fixas associadas às formas da língua materna. As estruturas neurais correspondentes às novas formas da língua estrangeira não possuem relação com as estruturas dos conceitos já formados, sendo esta uma associação mais difícil de ser estabelecida. É por isto que, no aprendizado de adultos, as dificuldades causadas pela interferência da língua materna são maiores.

Há ainda três aspectos relacionados à idade na aprendizagem de línguas trazidas pelo autor em seu texto: os fatores afetivos e psicológicos, o ambiente e o input linguístico e a importância do contato com estrangeiros na infância. Em relação aos fatores afetivos e psicológicos, Schütz (2003) cita, por exemplo, a desmotivação, que segundo ele é “a ausência de motivo espontâneo, causada por programas não autenticados pela presença da cultura estrangeira e que não representam desafio”. Pode estar atrelada também a frustrações por não se ter alcançado proficiência ou os objetivos de aprendizagem ou pelo insucesso de sistemas de avaliação: isso pode desencorajar o aluno a tentar novamente. Isso acaba se tornando uma diferença também entre adultos e crianças, visto que a criança, de modo geral, tem um alto grau de curiosidade pelo desconhecido e é espontânea em suas ações, o que na vida adulta já ocorre um pouco diferente. O adulto é, em geral, mais cuidadoso e reservado, não quer se expor, com receio de passar vergonha ou cometer deslizes.

Citando as pesquisas de Krashen (1987, 1988 apud Schütz, 2003) cita a importância do ambiente e do input linguístico:

Krashen, em sua comprehensible input hypothesis, sustenta que assimilação de línguas ocorre em situações reais, quando a pessoa está exposta a uma linguagem levemente acima de sua capacidade de entendimento, porém ainda inteligível. Ora, é natural que quando adultos se dirigem a crianças, usam um linguajar próprio, simplificado tanto no plano estrutural como no vocabulário, para se aproximar ao nível de compreensão da criança. Já nos ambientes em que adultos vivem, eles não recebem o mesmo tipo de tratamento. Uma vez que são adultos, seu universo de pensamento e linguagem é mais amplo; ou seja, o caminho já desbravado é maior e a linguagem, por eles almejada e a eles dirigida, tende a ser mais complexa e

os conceitos mais abstratos, facilmente se situando além de seu nível de entendimento. Desta forma, podemos concluir que um ambiente de língua e cultura estrangeira para crianças é, por natureza, mais simples, menos abstrato, mais próximo ao nível de compreensão da criança e mais propício à assimilação da língua do que os ambientes dos adultos.

Os ambientes sociais em que a criança se desenvolve também possuem um papel importante em relação à aprendizagem de línguas. Segundo Schütz (2003), o ambiente é um fator que, além das questões genéticas, também influencia a aquisição de uma nova língua:

Assimilamos a língua daqueles falantes com os quais convivemos, no ambiente cultural deles, e não dos gens paternos. Uma criança nascida de pais coreanos na Coréia, por exemplo, mas adotada e criada desde o nascimento por falantes de inglês nos Estados Unidos, terá características físicas herdadas de seus pais biológicos mas, inevitavelmente, falará inglês e se comportará como americana. Um gato, submetido a um processo semelhante ou não, produzirá o mesmo miado independentemente do ambiente em que for criado. Este processo, através do qual uma língua é transmitida de geração em geração, é explicado como transmissão cultural. É evidente que o ser humano nasce com a predisposição de assimilar não uma determinada língua, mas qualquer língua. Nossa(s) língua(s) materna(s) será(ão) aquela(s) do(s) ambiente(s) cultural(is) em que vivermos na infância.

A partir do texto de Schütz (2003), entende-se que, na infância, o ser humano está mais propenso para aprender línguas, sendo que a língua tende a ficar mais enraizada, de forma semelhante à língua materna. De acordo com Saussure (1969), conforme já vimos nesta tese, a linguagem é o que o diferencia de animais, podendo ser considerada o principal elemento do relacionamento humano. Se o momento ideal de se alcançar proficiência em línguas estrangeiras é a idade escolar e, sendo bilinguismo uma qualificação básica do indivíduo na sociedade contemporânea, a proposta do currículo de imersão precoce (a partir dos dois anos de idade) em Entre Rios proporciona um ambiente autêntico de aquisição de linguagem.

Uma criança em fase de desenvolvimento normal traz características diferentes para a escola – principalmente a sua vontade de aprender, que é inata. Crianças não se perguntam por que existem diferentes línguas. Crianças não apresentam dificuldades para imitar, no sentido de que não têm vergonha para isso e ainda estão desenvolvendo as funções fonológicas. Por isso, também apresentam mais facilididade na pronúncia, pois estão aprendendo os fonemas. Crianças não têm medo de falar. A fantasia das crianças não tem fronteiras, o que é uma grande vantagem, pois elas aprendem a língua brincando e fazendo o que lhes agrada. Se a

aprendizagem for significativa e prazerosa, a criança desenvolve uma empatia para aprender outras línguas.

Uma criança também pode aprender várias línguas ao mesmo tempo, quando pessoas falam línguas diferentes. Geralmente, a criança assimila a língua à pessoa. Logo, parece não fazer muito sentido uma única pessoa falar várias línguas com a criança. Isso, da experiência que tenho como professora de língua adicional, pode confundir.

Embora os estudos que se ocupam com a aquisição de linguagem nos tragam perspectivas diferentes, de que o aprendizado de línguas pode ocorrer em idades mais avançadas sem perda de qualidade, parece-nos que aprender línguas nos primeiros anos de vida ainda apresenta é mais vantajosi, conforme falamos ao longo deste item. Assim, recomenda-se iniciar a aprendizagem de línguas o mais cedo possível, desde que se faça um planejamento que contemple uma proposta que leva vários itens, aqui já abordados, em consideração. Afinal, conforme Schneider (1988, p. 2, tradução nossa):

Crianças querem aprender, são curiosas, querem ser melhores do que antes ou do que outras crianças, querem ganhar, procuram atenção e afeição […] querem ser ativas, se movimentam, precisam da combinação de movimentação do cérebro e do corpo, não precisam de regras verbais, mas sim de regras de ação, procuram um exemplo.66