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1. Dannie Heineman “le patron de la SOFINA”

1.2. Ideias de Dannie Heineman

É fundamental no pensamento de Heineman a sua confiança na tecnologia e no progresso. Segundo ele, nas mãos da economia o mundo vai-se desenvolver e resolver todos os problemas. Contudo, as intervenções dos políticos e as divisões nacionais são os principais entraves para esse desenvolvimento. A partir de 1929, o seu pensamento relativamente ao futuro da Europa obteve uma grande difusão. Habituado a dar discursos perante accionistas expressou as suas ideias em situações diferentes e que tiveram um público mais alargado. Em 1929, escreveu o prefácio – Economistes et Techniciens – do livro de Delaisi, Les deux Europes e a fim de 1930 apresentou a conferência Outline of a new Europe em Colonia e Barcelona, perante um público diferente ao habitual341. A audiência dessa palestra, no salão de actos do Hotel Ritz, foi descrita nos jornais da seguinte maneira: “Concurrencia numerosísima y distinguida llenaba el amplio salón. Políticos, economistas y escritores, se sumaron ayer al público casi en general femenino, que de costumbre sigue con adicto entusiasmo las selectas sesiones de «Conferentia Club»”342.

O trabalho que desenvolveu em várias cidades do mundo através das empresas de electricidade ligadas à SOFINA permitiu-lhe adquirir uma visão ampla do mundo. Os seus contactos pessoais com personalidades das mais variadas, como podem ser artistas, governantes, diplomatas, empresários, banqueiros, entre outros, abriram-lhe as portas a uma rede de relações pessoais. Tinha contacto directo com pessoas que iam de funcionários de Estado, como o secretário de assuntos estrangeiros britânicos, Joseph Chamberlain, o primeiro ministro Francês, Paul-Prudent Painlevé, o presidente francês, Alexandre Millerand, o rei Leopoldo III da Bélgica, até homens da cultura, como o físico, Heinrich Hertz, o pintor, Henri de Toulouse-Lautrec, o compositor Richard Strauss, passando por homens de negócios como Water Rathenau e August Thyssen343.

Apesar de a sua principal ocupação entre 1905 e 1955 ser a direcção da holding, cujo principal objectivo é obter dividendos para os accionistas, o pensamento de Heineman vai além do fito de lucro no curto prazo. O que se revela nos seus escritos de

341

A conferência em Colónia foi por convite de Konrad Adenauer, a 28 de Novembro de 1930. Cf. Ranieri, L., Dannie..., ob.cit., p.333.

342

“Conferentia Club. «Esquisse d’une Europe Nouvelle»”, La Vanguardia, 3 de Dezembro de 1930, p.6. A conferência de Barcelona foi no dia 2 de Dezembro, no Hotel Ritz, sendo apresentado pelo administrador da SOFINA, o espanhol Juan Ventosa y Calvell.

343

começos da década de 1930 é uma capacidade de reflectir a partir da experiência adquirida e de procurar soluções globais no longo prazo. O seu objectivo é orientar a sociedade (nomeadamente a europeia) para um crescimento no longo prazo, o que trará como consequência o crescimento das suas empresas.

Cabe ainda destacar que há uma ideia central presente no pensamento de Heineman: o fundamento do social é a economia. Nos escritos acima citados, destaca-se a determinação em última instância (ou condicionamento) da economia relativamente à política. No caso concreto do desenvolvimento duma sociedade estável no longo prazo, as instituições económicas, nomeadamente o mercado interno, são a condição prévia para o desenvolvimento das instituições políticas unificadas e duráveis: “Nevertheless it is internal trade that cements political unity. It creates a centripetal force which makes secession impossible”344. Deste modo, a coesão económica estabilizada por instituições económicas é mais forte do que qualquer força política orientada para a divisão.

1.2.1. Heineman e o movimento Paneuropa

Em 1929, Aristide Briand, Ministro de Negócios Estrangeiros da França, apresentou na Sociedade das Nações um projecto sobre a criação duma Federação de Estados Europeus. Hoje, esse projecto é considerado pioneiro na construção da União Europeia345. Simultaneamente a esse projecto, Dannie Heineman publicou em várias línguas os dois trabalhos acima referidos sobre o tema. Segundo as memórias oficiais da União europeia, a criação do mercado comum ficou no esquecimento depois da morte de Briand em 1932346, afirmando o papel pioneiro do Ministro francês. Contudo, houve, naquela altura, um importante movimento do qual Briand e o patrão da SOFINA faziam parte. No início dos anos 1960, quando a União Europeia começava a ser uma realidade, Heineman lembrava a sua conferência com nostalgia e sentia que as suas ideias de então não estavam tão erradas. Numa carta endereçada a Konrad Adenauer, a 28 de

344

Heineman, Dannie, “Outline of a new Europe”, The Statist, Vol.CXVII, Nº2772, 11 de Abril de 1931, p.7.

345

Commission Europeenne, “Note d’information à la presse”, 2007, p.1.

346

Novembro de 1961, refletia: “When I read of the Common Market... and I re-read my lecture in Cologne of 1930, I am astonished at my foresight”347.

Com o principal intuito de ultrapassar a divisão provocada pela Primeira Grande Guerra e atingir um desenvolvimento sustentável no longo prazo, Heineman, pensa que a criação dos “Estados Unidos da Europa” pode ser uma solução. Assim, à contramão de algumas tendências da época, numa Europa com Estados que fechavam as suas fronteiras com medidas proteccionistas, foi parte do movimento Pan-europeu que propunha a constituição duma Federação Europeia. Portanto, ao procurarmos a génese do actual Mercado Comum Europeu, encontramos que este engenheiro americano é um dos seus primeiros defensores. Os dois artigos acima mencionados procuravam apoiar a causa da Federação Europeia do ponto de vista económico e fazem parte do que Robert Frank denominou “le premier âge d’or de l’engagement européen”, período que vai de 1923 a 1930-33. Vejamos a gênese deste processo.

A ideia desta Federação surgiu pela primeira vez no livro Paneuropa, do conde Richard Coudenhove-Kalergi, publicado em 1923348. Este diplomata, filho de pai diplomata austro-húngaro, e cuja mãe era uma princesa japonesa, abraçou a causa duma federação de estados europeus como saída pacifista para a Europa349. Contudo, não vai- se contentar com difundir as suas ideias através de livros e artigos, desenvolvendo uma vida de acção à volta da difusão da ideia pan-europeia, apoiada na sua aptidão de diplomata para multiplicar os contactos350. Em Abril de 1924, com o apoio económico de Max Warburg, Coudenhove lança a revista mensal Paneuropa e cria o Secretariado Geral do movimento Paneuropa351. Embora presente no livro de Coudenhove, o aspecto económico, duma união económica europeia fica em segundo plano nas estratégias de difusão do projecto na fase inicial. Assim sendo, entre 1924 e 1926, o acento é colocado nas virtudes pacifistas do projecto, com o objectivo de tornar popular a ideia pan-

347

Heineman a Adenauer, carta de 28 de Novembro de 1961, Stiftung-Bundeskanzler- Adenauer-Haus, Rhöndorf (StBKAH), Heineman Papers, vol.4, citado em Schwartz, H.P.,

Konrad Adenauer...ob.cit., p.202.

348

É considerado que o projecto Paneuropeu inicia-se com a publicação deste livro.

349

Ranieri, L., Dannie..., ob.cit., p.325.

350

Frank, Robert, “Les contretemps de l’aventure européenne”, Vingtième Siècle. Revue

d’histoire, nº60, Outubro-Dezembro de 1998, p.85.

351

europeia, especialmente junto dos partidos de esquerda352. Este período, que também procura a constituição das primeiras estruturas militantes, chegará ao seu ponto de viragem com a convocação ao primeiro congresso353.

Entretanto, em Berlim, num almoço na casa do dirigente da AEG, Felix Deutsch, em que estavam presentes personalidades como o compositor Richard Strauss, Heineman conhece o conde Coudenhove-Kalergi (c.1926)354. Trinta anos depois desse encontro, Heineman rememora o impacto que lhe produziram as ideias do conde: “Coudenhove explained his ideas about “Pan-europa” and I became interested”355. De 3 a 6 de Outubro de 1926, em Viena, reúne-se o primeiro congresso Pan-europeu, com a participação de 2000 membros a representar 24 nações, dentre as quais a delegação belga356. Em Dezembro desse ano, Heineman organiza uma grande recepção no local da SOFINA, por ocasião da criação do comité belga da União Pan-europeia. A função de Heineman nesse comité é de grande importância, uma vez que será tesoureiro e mecenas357. Nesta altura, o movimento começou a incorporar homens da indústria que lhe aportaram uma mais-valia nas questões económicas: “a partir de 1927, l’adhésion à Paneurope de personnalités économiques particulièrement actives en faveur du rapprochement européen, offre au mouvement de nouvelles opportunités d’actions concrètes”358. Entre estas figuras encontram-se Louis Loucheur, fundador da Société Générale d’entreprise, Francis Delaisi, um dos grandes defensores do pensamento económico liberal de entre guerras, Emile Mayrisch, presidente do Acordo Internacional do Aço [Entente internacionale de l’acier] e Dannie Heineman359. A consolidação da importância destas figuras dentro do movimento concretizar-se-á com a criação do

352

Thery, Franck, Construire l’Europe dans les années vingt. L’action de l’Union paneuropéene

sur la scène franco-allemande, 1924-1932, Ginevra, Euryopa, 1998, p.69.

353

Thery, F., Construire l’Europe...ob.cit., p.5-6. Para uma análise sobre a constituição dessas estruturas militantes ver: Thery, F., Construire l’Europe...ob.cit.,p.27-41, cap.II, “La mise en place des estructures militantes”.

354

Ranieri, L., Dannie..., ob.cit., p.325.

355

Delaware University Library (DUL), Messersmith Papers, Heineman a Messersmith, 10 de Setembro de 1957, p.2.

356

Dannie Heineman, apesar de estar inscrito no Congresso, não participou. Cf. Ranieri, L.,

Dannie..., ob.cit., p.326.

357

Ranieri, L., Dannie..., ob.cit., pp.326-327.

358

Théry, F., Construire l’Europe...ob.cit., p.69.

359

Comité Económico, sedeado nos escritórios da SOFINA em Bruxelas360. Neste comité estavam presentes industriais representando quatro sectores económicos considerados fundamentais: algodão, electricidade, química e siderurgia. Do sector da energia, Heineman era considerado muito importante devido ao seu projecto de criação dum mercado eléctrico europeu361.

Paralelamente, no que diz respeito à difusão das ideias, a revista Paneuropa vai progressivamente incluindo temas económicos relativos à unidade europeia362. A partir de 1928, abre as suas portas aos líderes económicos próximos do movimento, publicando, entre outros, em 1930 um artigo de Dannie Heineman sobre o equilíbrio económico da Europa363. A 5 de Setembro de 1929, o movimento Paneuropeu teve um grande impulso com a participação de Aristide Briand na Xª Assembleia Geral da Sociedade da Nações, onde lançou o seu célebre apelo a favor duma Europa federal364.

Nesta altura, entre os engenheiros circulavam três projectos para fazer uma rede eléctrica europeia. Em Maio de 1929, o engenheiro francês, George Viel, publicou na Revue Generale d’electricité, o seu projecto sobre a rede eléctrica europeia de 400kV; em Junho de 1930, Ernst Schönholzer, engenheiro de Zurich, deu a conhecer o seu plano duma rede de 660 kV, na revista Schweizerische Technische Zeitschrift; no mesmo mês e ano da publicação do artigo de Schönholzer, no segundo encontro da World Power Conference, em Berlim, Oskar Oliven deu uma palestra a apresentar a sua ideia do sistema eléctrico europeu365. Por um lado, apesar da existência de dois

360

Ranieri, L., Dannie..., ob.cit., pp.327.

361

Thery, F., Construire l’Europe...ob.cit., p.82-86.

362

Idem, p.81.

363

Heineman, Dannie, “Das Wirtschaftliche Gleichgewicht Europas”, Paneuropa, 6, nro2 (1930), p.48-56, citado em: Saint-Gille, Anne-Marie, La «Paneurope». Un débat d’idées dans

l’entre-deux-guerres, Paris, Université de Paris-Sorbonne, 2003, p.186 ; Thery, F., Construire l’Europe...ob.cit., p.81.

364

Ranieri, L., Dannie..., ob.cit., p.330. É por esta intervenção que Briand ficou conhecido como o pioneiro da União Europeia. “propose à l’assemblée de la Société des Nations le primer

project officiel d’Union européene”, Cf. Commission Europeenne, “Note

d’information...ob.cit., p.1. (sublinhado no original)

365

Schönholzer, Ernst, “Ein elektrowirtschaftliches Programm fur Europa”, Schweizerische

Technische Zeitschrift, nº 23, 1930, pp.385-397; Viel, Georges, “Etude d’un reseau 400.000

volts”, Revue generale de l’electricité, nº 28, 1930, pp.729-744; Oliven, Oskar, “Europas Groskraftlinien. Vorschlag eines europaischen Hochtspannungsnetzes”, Zeitschrift des Vereines

Deutscher Ingenieure, 74, nº 25, Junho 1930, pp.875-879. Obras citadas em Lagendijk, Vincent, Electrifying Europe. The power of Europe in the construction of electricity networks,

trabalhos anteriores, o projecto de Oliven teve maior impacto na comunidade electrotécnica internacional, por ter sido apresentado num evento internacional366. Por outro lado, o projecto de Dannie Heineman é contemporâneo dos citados, mas a sua vinculação com a causa Pan-europeia deu-lhe uma difusão em círculos diferentes aos estritamente técnicos.

Enquanto Oliven centra a sua atenção na racionalização do sistema, a partir de ligar os centros de produção e consumo367, veremos mais à frente que o objectivo de Heineman é encontrar uma fórmula para tirar a Europa da sua crise industrial e agrícola. Segundo Lagendijk, “Oliven, (...), did not directly legitimate his idea by referring to plans for European unification, but by pointing to the economic advantages and efficiency of such a network” 368. Portanto, para além dos meios de difusão, o trabalho de Heineman diferencia-se do projecto de Oliven na sua visão global, que ultrapassa o estritamente ligado ao mundo da electricidade.

As palestras de Colónia e Barcelona, em que se pode ver o projecto de Heineman, circularam em papel e foram publicadas em diferentes línguas em revistas que atingiam um público variado. Assim, por exemplo, o ministro belga de assuntos estrangeiros, Paul Hymans, enviou cópias desta conferência às diferentes repartições do serviço diplomático369. George Messersmith, nessa altura Cônsul Geral dos EUA em Berlim, leu a cópia da palestra de Colónia, “Outline of a new Europe”, que Heineman lhe enviou370. Posteriormente pediu-lhe mais cópias para as difundir, recebendo dez cópias, das quais seis em alemão, duas em francês e duas em inglês371. O Embaixador americano na Alemanha também se mostrou muito interessado pelas ideias de Heineman372. Além da circulação pela correspondência privada e institucional, a conferência foi publicada em alemão, francês e inglês no formato de livro, e como artigo em francês e inglês373.

366

Lagendijk, V., Electrifying Europe...ob.cit., pp.82-83.

367 Idem, p.85. 368 Idem, p.84. 369 Idem, p.86. 370

DUL, Messersmith Papers, Heineman a Messersmith, 2 de Fevereiro de 1931, p.1.

371

DUL, Messersmith Papers, Heineman a Messersmith, 4 de Setembro de 1931.

372

DUL, Messersmith Papers, Heineman a Messersmith, 3 de Abril de 1931, p.1.

373

No caso do livro publicado pela Vromant & Co., o exemplar está composto por 50 páginas.

Porque Heineman pensa que a Federação Europeia pode ser uma solução ao desenvolvimento sustentável? Fundamentalmente, porque significa a criação dum mercado comum. A livre circulação de capitais, tecnologia e mercadorias, acompanhada duma conversão das moedas seria o cenário ideal para o desenvolvimento das empresas de electricidade. Do lado dos países em que se instalam as empresas de serviços públicos, precisa-se da livre circulação de bens, uma vez que as empresas usam tecnologia e capitais estrangeiros, para além de muitas vezes importarem as matérias- primas. Do lado dos capitais, precisa-se da conversão dos lucros da moeda do país onde opera para o país da casa mãe, para o pagamento dos dividendos aos investidores. Portanto, esta Federação Europeia que Heineman imagina seria um lugar óptimo para o desenvolvimento destas actividades.

Segundo ele, devem existir algumas condições prévias para o desenvolvimento da citada federação. Ao ter como ponto de partida o exemplo americano, mostra as condições que durante algum tempo impediram a união dos diferentes Estados. As diferenças no desenvolvimento económico entre o Norte e Sul dos EUA (e a ausência de dependência económica entre as duas regiões) explicam a guerra de secessão. Isto significa que a causa da divisão foi a falta de interdependência económica entre os estados do norte e do sul. O sul dos EUA comerciava com Inglaterra (comprava bens manufacturados e vendia algodão e tabaco) e não tinha quase relação económica com o norte do país. Portanto, segundo o patrão da SOFINA, para a conformação duma federação de Estados é fundamental um equilíbrio económico interno e uma dependência comercial: “Thus the inner economic balance appears as a fundamental necessity for every federation”374; por outras palavras, a conformação dum mercado interno.

Nas condições em que se encontrava a Europa, a começo dos anos 1930, caracterizadas pelo desenvolvimento desigual entre as nações, a federação estava condenada à secessão e ao fracasso. Um primeiro facto que surpreende do seu raciocínio é o objectivo de equilibrar o desenvolvimento do que Delaisi chamou a Europa A

Bruxelas, Vromant & Co., 1931; Skizze eines Neuen Europe, Colonia, Glide-Verlag, 1931. Nos casos das revistas, a edição ficou composta de 7 a 8 páginas: “Esquisse d’une nouvelle Europe“,

L’européen 7 (1931), p.1-7; “Outline of a new Europe”, The Statist, Nº 2772, Supplement, p.1-

8.

374

(industrial) e a Europa B (agrícola)375. Segundo Heineman, a diferença no crescimento entre a Europa do Norte, por um lado, e a Europa do Sul e do Leste, por outro, é uma das questões que impossibilitaram o advento da federação europeia. A solução passaria pela criação dum mercado, isto é, a transformação de 140 milhões de camponeses em consumidores. Para atingir este objectivo seria necessária a criação duma infra-estrutura que possibilitasse a circulação de bens (estradas e caminhos-de-ferro) e a electrificação das zonas rurais: “I am convinced and should like to convince you, that a happy combination of electricity, road transport and credit will suffice to double, in a few years, the welfare and the purchasing power of 140 million peasants in Eastern and Southern Europe”376. Assim sendo, a rede eléctrica faz parte dum projecto maior que inclui a criação dum mercado comum, que procura a transformação de camponeses em consumidores.

Argumentava que a constituição política americana era conhecida na Europa, mas a fundação económica dos EUA era pouco conhecida. O princípio que orienta o seu pensamento é que em qualquer federação de Estados as instituições públicas devem estar apoiadas em instituições económicas: “No Federation of States can endure if it does not found its public institutions on similar economic institutions. This, as I conceive it, is the lesson of what is called the ‘American miracle’”377. Deste modo, tirando o exemplo da Federação Americana, tentou convencer a audiência acerca das vantagens da criação duma confederação de estados europeus. Para avançar com esse projecto seria necessária a constituição de três pilares (instituições) económicos: (1) a organização financeira, (2) a organização administrativa e (3) a organização técnica. No caso americano, as instituições que correspondem a cada um dos pilares são: (1) a Reserva Federal, (2) a Comissão de Comércio Inter-Estadual378 e (3) o Sistema de transportes e indústria. Seguindo o exemplo da Reserva Federal, a instituição banqueiro- financeira deve: (a) a partir do cuidadoso uso das reservas em ouro, assegurar a estabilidade das diferentes moedas europeias; (b) atenuar as diferenças nas taxas de desconto entre os diferentes mercados de divisas europeus; (c) facilitar a transferência

375

Para esta noção da Europa A e a Europa B, Cf. Delaisi, Francis, Les Deux Europes, Paris, Payot, 1929. 376 Heineman, D., “Outline...ob.cit., p.7. 377 Idem, p.5. 378

de capital dos países ricos aos pobres, procurando altas taxas de retorno aos países ricos e dinheiro barato para investimento produtivos nos países pobres379. Vê no Bank for International Settlements uma forma embrionária da instituição bancária necessária para o desenvolvimento da Federação Europeia, embora ainda não atinja as funções da Reserva Federal380. Poder-se-ia considerar, tal como indica Madureira, que estas ideias de Dannie Heineman se traduzem em que, nesta versão da integração europeia, há uma desvalorização da política e dos políticos nacionais. Isto explicaria, em parte, o facto de as suas ideias nunca terem saído do papel381.

Se no caso da organização financeira, uns dos princípios é garantir a livre circulação de capitais, para a organização administrativa torna-se fundamental a livre circulação de bens. Nos EUA a instituição encarregada de garantir a livre circulação de bens e a ausência de taxas directas e indirectas entre os estados é a Comissão de Comércio Inter-Estadual. Com já foi dito, em 1929, Aristide Briand apresentou na Sociedade das Nações um projecto sobre a criação duma Federação de Estados Europeus. Heineman vê nas ideias desenvolvidas nesse memorandum o princípio para o desenvolvimento da organização administrativa. As comissões destinadas a regular o comércio entre os Estados têm por objectivo garantir um tratamento equitativo a todos os países. Deste modo trabalha sobre aquelas cláusulas (“especialization tricks”) que beneficiam com taxas inferiores produtos de um país relativamente aos outros. Em definitiva, esta instituição procura obrigar os países a desenvolver um “fair play”. No fundo, o objectivo é aplicar o critério, usado muitas vezes no comércio bilateral, de “Nação mais favorecida” ao conjunto dos Estados membros382.

Segundo Heineman, a Europa pós-crise está a caminho da constituição duma Federação de Estados. Para a construção dum mercado interno da Federação, o grande problema é o adiamento da discussão sobre a necessidade dum equilíbrio entre os países da Europa agrícola e a Europa industrial. Sintetiza o estado das coisas nos seguintes termos: 379 Heineman, D., “Outline...ob.cit., p.5. 380 Idem, p.6. 381

Ideia transmitida em comunicação pessoal por Nuno Luís Madureira.

382

It seems to me that Europe can easily and quickly erect these three pillars, the necessary foundations for every federal