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Identidade e representação social

7 MENSAGENS NA REDE UMA ANÁLISE DE CONTEÚDO

7.4 Algumas leituras possíveis

7.4.1 Identidade e representação social

Dentro deste contexto simbólico se constroem representações sociais. Etimologicamente, a palavra representação remete ao termo latino ‘representare’, que significa ‘fazer presente’ ou ‘apresentar de novo’, ou seja, a representação, já em sua origem, carregava o significado de fazer presente algo ou alguém que está ausente, por intermédio de uma construção simbólica. Portanto, as representações sociais podem ser definidas como “uma série de proposições que possibilita que coisas ou pessoas sejam classificadas, que seus caracteres sejam descritos, seus sentimentos e ações sejam explicados e assim por diante” (MOSCOVICI, S. 2007. p. 207)120. O conceito de representação social na acepção do psicólogo social romeno naturalizado francês Serge Moscovici atualiza o conceito de Émile Durkheim de Representação Coletiva. As representações sociais são modalidades de conhecimento prático orientadas para a comunicação e para a compreensão do contexto social, material e ideativo em que vivemos permitindo numa perspectiva transdisciplinar questionar a natureza do conhecimento e a relação indivíduo-sociedade, inserindo este campo de estudos entre as correntes epistemológicas pós-modernas (JODELET 1985 apud SPINK, 1993, p. 300).

Em outras palavras, as representações constituintes das formas de conhecimento prático orientadas para a compreensão do mundo e para a comunicação emergem como elaborações ou construções expressivas de sujeitos sociais respeito de objetos socialmente valorizados (SPINK, 1993). A representação social se configura como aquilo que dá sentido aos eventos cotidianos e práticas sociais. Dessa maneira, os comportamentos e opiniões podem ser entendidos como desdobramentos destas elaborações cognitivas e simbólicas. Ou seja, pode-se observar que existe uma negociação constante entre o indivíduo e a sociedade, onde as representações sociais e os processos comunicativos assumem uma importância crucial e o indivíduo participa de maneira ativa e consciente dos processos de construção

simbólica das representações sociais. Assim, há uma aproximação com a perspectiva sociossemiótica da cultura defendida pelos teóricos dos Estudos Culturais. Stuart Hall, em palestra proferida na Universidade de Westminster, em Londres, aborda a relação entre a representação, a linguagem, os meios de comunicação, a ideologia e os estereótipos. Tais aspectos se entrelaçam ao reapresentar determinadas identidades quer seja no sentido de reforçar os significados vigentes, quer seja na forma de reconstrução fragmentária da realidade que passa a ganhar projeção através dos meios. Marx e Durkheim já reforçavam o caráter de ilusão da cultura e da representação como meio de dominação ao fundar o senso comum ou reforçá-lo neste caso, através da “consciência coletiva” e das representações sociais.

De acordo com Bertolli Filho (2013, p. 29), apesar de haver certa afinidade com os postulados marxistas, entre os teóricos dos Estudos Culturais buscou-se o afastamento da ideia de que a cultura seja sobredeterminada pela infraestrutura, defendendo em vez disso a existência de um estado de contínuas tensões que instauram a formatação e a dinâmicas peculiares nas as esferas econômicas, políticas, sociais e culturais. Há teóricos como Raymond Williams e Néstor García Canclini que rompem com a visão marxista ao entender que a cultura se constitui no “mundo das significações”. As representações sociais possuem a função de apresentar e explicar a realidade aos indivíduos, mediando a forma como os indivíduos entram em contato com os objetos e sujeitos da vida cotidiana, além de contribuir para que os grupos e pessoas possam se situar na sociedade. Isto é, o mecanismo das Representações Sociais é responsável por atuar nos processos de construções indenitárias como formação da autoimagem e visão social dos grupos e indivíduos e as representações sociais podem aumentar as diferenciações entre grupos sociais, contribuindo para a formação de estereotipias, já que são construções simbólicas negociadas culturalmente entre os indivíduos e a própria sociedade como um todo.

Com base nas análises do corpus e no estudo teórico que as fundamentaram, é possível tecer algumas considerações sobre a questão da construção da identidade do Movimento Passe Livre São Paulo. O próprio MPL deixa bem claro quais são suas características (anonimato e ausência de identidade política coletiva, discurso sem ideologia, objetivos múltiplos, formato em rede e a-hierárquico, recusa de institucionalização, imprevisibilidade, ação elíptica etc. – DI FELICE, 2013c) e diretrizes em todos os meios virtuais do qual dispõe, conforme anteriormente mencionado ao falar de si mesmo e se apresentar ao público. Além do tópico “Sobre”, na página do Facebook, essa identidade também se constrói por meio das postagens. Viu-se anteriormente que a questão da identidade, construção e desconstrução do

sujeito é tônica desde a antiguidade e se acentuou com a pós-modernidade e esvaziamento do sujeito e que no contemporâneo, essa questão ganha novos contornos e a busca por essa construção identitária passa a operar no simbólico, tanto para definição dos indivíduos (sujeitos) quanto para a questão dos grupos (sujeitos coletivos) nos quais os mesmos estão envolvidos.

Há de se considerar, sob certo aspecto, que há uma construção negativa desta identidade associada aos atos de vandalismo e depredação do patrimônio público. Fica evidente uma espécie repulsa da opinião pública em relação a isso nos exemplos de comentários postados nas páginas do Facebook que aparecem nos exemplos da tabela a seguir.

Tabela 13 - Exemplos de comentários contrários ao vandalismo. Data e

horário

Usuário Local onde

postado

Comentário

12 de junho de

2013 – 3h01 Jose Antonio S. Batista Capa de álbum de fotos 3 viva a juventude consciente mais nao vandalismo ... 11 de junho –

22h27 Vitor Camargo Manifestar sim,fazer vandalismo não! 19 de junho de

2013 – 16h04 Rodrigues Nilton Nota 9 sou a favor da mobilização, agora violência naum o que vão fazer para conter os bardeneiros? 14 de junho de

2013 às 13h47 Tiago Kátia Barbosa Nota 1 essas penoas apoiam o governo ... isso que vc chama de vandalismo...foi pago com nosso

dinheiro tambem... porem o gasto de reforma deste veiculo se equivale a migalhas em relaçao o que e gasto diariamente em corrupçao desse brasil... escolha o seu lado...parabens ao movimento dos 0,20 cents parabens m. passe livre há ± um minuto

20 de junho de

2013 às 16h21 · Noraldo Neto Nota 10 Galera que vai participar da manifestação... Segue uma ideia baseada nas manifestações na Argentina: Quando os vândalos começavam a quebrar tudo lá, os verdadeiros manifestantes se sentavam, assim facilitava a ação da policia para reprimir e prender os culpados por esses tipos de ações mesquinhas. Podemos usar isso como ação na nossa manifestação, pois queremos uma cidade melhor e não uma cidade destruída."

Fonte: Elaborada pelo autor.

Perceba que termos como “baderneiros”, de caráter pejorativo, são relacionados aos manifestantes. O MPL busca por meio das notas combater essa imagem como neste trecho de nota publicada sobre a violência: "O Movimento Passe Livre não incentiva a violência em momento algum de suas manifestações, mas é impossível controlar a frustração e a revolta de milhares de pessoas com o poder público e com a violência da Polícia Militar."

As autoridades e políticos, por sua vez, têm associados a eles termos como “corruptos”, “fascistas”, entre outros, como exemplificado na tabela a seguir.

Tabela 14 - Comentários - representação social das autoridades. Data e

horário

Usuário Local onde

postado

Comentário 12 de junho

de 2013 às 00:22

Victor Mesquita Comentário da

Nota 3 Infelizmente as autoridades fascistas desse Estado não estão abertas ao diálogo. Utilizam a repressão da Polícia contra a manifestação social. Depois reclamam do vandalismo.

19 de junho de 2013 Às 16:21

Carolina Ssaot Comentário da

Nota 9 Que o prefeito, o governador, a presidenta, façam valer a justiça, recuperem o dinheiro desviado pelos corruptos, e comecem a pagar as contas que ELES DEVEM ao povo brasileiro!

Fonte: Elaborada pelo autor.

A representação social e a identidade da PM também estão associadas a aspectos negativos. Nas imagens, a posse das armas, ações violentas contra os manifestantes, os escudos, barricadas, munição ou bala de borracha, disparos. Nos comentários adjetivos ou substantivos reforçam tais aspectos como apontados nos dados quantitativos as críticas à polícia são recorrentes. Um exemplo: No comentário de César Fraciolli, reproduzido abaixo, na Nota 2, à do Passe Livre São Paulo, em 10 de junho de 2013, os policiais são descritos como “vermes” e “bonequinhos”. No comentário de Paulo Ferraz, num compartilhamento da Nota 5, em 14 de junho, a PM é definida como “adestradora de animais” que “ensina a bater em quem está defendendo os direitos de todos”.

Tabela 15 - Comentários - representação social da PM.

Data e horário Usuário Local onde postado Comentário

10 de junho

de 2013 Cesar Franciolli Nota 2 Sempre os vermes, bonequinhos do estado 14 de junho

de 2013 - 16h15

Paulo Ferraz Compartilhament o da Nota 5

e tem escola de adestramento de cães , e a PM E ADESTRADORA DE ANIMAIS TAMBEM ENSINAM A BATER EM QUEM ESTA DEFENDENDO OS DIREITOS DE TODOS, AGORA SERÁ QUE NENHUM PM SE PERGUNTOU PQ ARRISCAR A VIDA POR UM BANDO DE BANDIDO NO PLENARIO E NO GOVERNO? BANDO DE JUMENTOS...

14 de junho

de 2013 Anne Caroline F. Rocha Nota 5 Olha a cara de ódio desse policial!E a expressão de horror pela covardia dele na face das pessoas...Um absurdo!

A internauta com o perfil Anne Caroline F. Rocha, como se observou na tabela anterior, ao comentar uma foto destaca a “ a cara de ódio” de um policial: “E a expressão de horror pela covardia dele na face das pessoas...Um absurdo”, conclui. Na imagem evidencia- se o contexto violento da foto e a expressão das pessoas ao fundo é outro indicador disso.

Figura 30 - Reprodução de foto comentada pela internauta121 .

A crítica à imprensa e a Rede Globo também é presente, como já destacado. A representação social da mídia, em especial dessa emissora de TV também é negativa. No comentário de Ulysses de Melo, reproduzido na tabela a seguir, cria-se o termo “GLOebbels” para fazer uma associação à emissora e Paul Joseph Goebbels (1897 –1945), político e Ministro da Propaganda do Reich na Alemanha Nazista de Adolf Hitler entre 1933 e 1945. No comentário de Gabriel Gianóglio Brabo, uma comparação entre a cobertura da imprensa nacional e internacional, destacando que a nacional tenta “encobrir” a violência da PM.

Tabela 16 - Exemplos de comentários sobre a imprensa.

Data e horário Usuário Local onde postado Comentário

12 de junho de

2013 16h06 Ulysses de Melo Capa do Álbum 3 A rede GLOebbels tentou, mas não conseguiu! Parabéns! 19 de junho de

2013 – 16h11 Alexandre Marques Comentário da Nota 9 Ta explicado o porquê de não ter aulas nas escolas sobre Constituição Federal!!! Será que a grande maioria da população (que tanto leem Veja e assistem a Globo) sabem o que é VINCULADO e DISCRICIONÁRIO? A mídia também ajuda pra kct nas manipulações de informações. Temos que aproveitar a internet para adquirir mais conhecimento.

13 de junho de Willian Compartilhamento ENQUANTO VOCÊ ESTÁ ASSISTINDO SUA

121Disponível em <https://www.facebook.com/notes/passe-livre-s%C3%A3o-paulo/nota-n%C2%BA-5-nota-

p%C3%BAblica-do-mpl-sp-sobre-a-viol%C3%AAncia-e-repress%C3%A3o-do-dia-1306/530514310338158>. Acesso em 15 mai. 2015.

2013 Holanda de comentário da Nota 3

TELEVISÃO , A VERDADE ESTÁ AQUI 14 de junho de

2013 - 16h26 Gianóglio Gabriel Brabo

Comentário na Nota 5

Entre os brasileiros aqui (e são muitos), só se fala nisso. Todo mundo indignado com a ação da polícia. Mas pelo que vi, pelo menos a imprensa internacional consegue enxergar o que está acontecendo. Estão noticiando o absurdo que a PM está fazendo, diferente daí né, que tentam encobrir. Vai rolar uma passeata aqui de brasileiros, no domingo. Na verdade, irá rolar em vários lugares na Europa.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Pode-se dizer que algumas opiniões são, em tese, politizadas ou tem um teor informativo. Por exemplo: