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4. MÃOS À OBRA

5.6. ILHA DAS FLORES

No 6º encontro, realizado em 18 de abril de 2008, com a presença de 9 (nove) participantes, pudemos afirmar que o grupo havia, enfim, criado uma matriz, pois percebemos que os jovens participantes deste encontro, foram aqueles que estavam vindo com maior freqüência do grupo semanalmente, com exceção de Suzane. Finalmente, o movimento da identidade do grupo ganhava uma nova personagem: a de grupo-com-matriz.

Tal personagem foi possível ser detectada pelo aparecimento de um clima mais descontraído, dos sorrisos mais espontâneos, da respiração mais solta e relaxada dos jovens, segundo as observações de Diógenes (2007). Nesse momento a identidade do grupo estava mais definida e os participantes que compareciam aos encontros eram os mesmos, com mais assiduidade. Como nos lembra Ribeiro, ao versar sobre a matriz grupal:

Um grupo, nos seus primeiros momentos, é apenas um campo geográfico sem significação, como um conjunto de pessoas numa sala. Após algumas horas ou dias, as pessoas começam a se conhecer, a se sentir, a ter afetos, e ele passa a ser um campo psicológico. Mais um pouco, surge a matriz grupal. As palavras e os gestos passam, então, a ter sentido e a gerar comportamentos e atitudes específicas.

Esse campo é agora um todo significativo, uma configuração total por si, onde o comportamento se torna previsível (RIBEIRO, 1994, p.64).

A partir daqui, os personagens de cada jovem já emergiam com mais fluidez, apresentando-se como momento oportuno para a realização do 1º círculo de cultura – a primeira coleta de dados da pesquisa.

Iniciamos, então, com a apresentação da Suzane, valorizando sua presença, uma vez que, pelo fato de ter participando somente do 1º encontro, ela ainda não havia construído vínculos com o grupo. Sua participação no grupo foi prejudicada devido às condições financeiras de sua casa, que dificultavam o seu deslocamento três vezes na semana para o MSMCBJ. Analisando suas personagens que emergiram no 1º encontro, podemos afirmar que a de jovem-desprovida-de-recursos-financeiros impediu a participante-interessada de vivenciar no grupo o seu desejo de transformar a personagem jovem-que-muda-de-humor.

Posteriormente, lemos o texto (anexo 1) que a Pâmela trouxe no encontro passado. A discussão foi demorada. Um dos trechos do texto falava que “veio uma onda e destruiu todo o castelo que as duas crianças haviam construído”. Perguntamos se já havia acontecido algo parecido na vida deles e muitos balançaram a cabeça num gesto afirmativo. Somente Ricardo se dispôs a falar o que havia pensado e relatou que na semana anterior preparou-se para apresentar um trabalho de Biologia, mas a professora faltou e ele teve que estudar novamente todo conteúdo, pois havia esquecido.

A partir desse relato, dialogamos sobre como estavam sendo realizados os trabalhos em grupo da escola a partir da seguinte pergunta geradora: “são mesmo de grupo esses trabalhos?” (Aprofundando a frase do texto que dizia “somente aquele que tem as mãos de alguém para segurar será capaz de sorrir”). O que percebemos foi que nem na escola os jovens tinham uma experiência de construir o conhecimento em grupo, como estávamos propondo a cada encontro nosso. Num trabalho de equipe, “cada um

faz a sua parte” (Gilson, RV6.P13.L623-624), apresenta e o professor atribui uma nota

individual pela apresentação de cada um. Percebemos, assim, que o que estávamos querendo propor com a Educação Biocêntrica era algo deveras inovador dentro das experiências pedagógicas que cada um já tinha vivido, pois eles pouco ou não vivenciavam situações de grupo e menos ainda aquelas que buscavam construir um conhecimento coletivo acerca da realidade. Nesse encontro, porém, a potência de cada jovem no grupo, através do discurso, foi revelada como em nenhum outro momento.

Exibimos o documentário “Ilha das Flores” e, posteriormente, realizamos um círculo de cultura. Entregamos canetinha e uma tarjeta de papel para os participantes e pedimos para que eles escrevessem uma palavra que expressasse o sentimento vivido ao assistir o vídeo.

Nossa inovação no círculo de cultura foi tê-lo transformado em um jogo – o que sempre trazia uma dinamização no processo grupal. Como no “jogo verdade ou desafio”, colocamos um pincel piloto no centro da roda e cada um, girava aleatoriamente. Quando o pincel parava, o participante que tinha a tampa virada para si fazia perguntas para quem estava no lado oposto da caneta. Foi sugerido que o foco das perguntas girasse em torno do filme e da palavra escrita na tarjeta. O restante do grupo estava autorizado a interagir com qualquer dupla que estivesse jogando, ou para perguntar ou para expressar sua opinião.

O objetivo de se criar um jogo foi dar alguma orientação às falas, principalmente no início do diálogo (quando os jovens ficavam mais calados), bem como garantir a palavra de todos. No meio daquela tarde, não foi mais preciso rodar o pincel, pois os jovens foram se colocando e apresentando sua palavra. Após o participante perguntar tudo o que quisesse sobre a palavra do outro, ele propunha um desafio para ser realizado no seu cotidiano.

Pela 1º vez, passamos o encontro como um todo somente no diálogo, que durou 1h45min – houve um atraso inicial que prejudicou a vivência artística no momento de instalação dos equipamentos de áudio e vídeo. Finalizamos com uma roda de comunicação com a música de Beth Carvalho e Mercedes Sosa (“Eu só peço a Deus”) e posteriormente, em roda, com as mãos na cintura, criamos uma poesia coletiva, com as palavras geradoras que nos tocaram naquela tarde. Cada um foi falando sua palavra quando sentia que era o momento e falaram 2,3,4,5 palavras cada um num fluxo único que permitiu a criação de um texto único, poético e com sentido.

As palavras escritas pelos jovens nas tarjetas que facilitaram o círculo de cultura foram:

Suzane: miséria e descaso. Gil: tristeza.

Ricardo: oportunidade. José: questões financeiras. Helton: esperança.

Lia: pobreza.

6. 2º ATO: PACTUANDO A PESQUISA

Nesse capítulo, apresentaremos o processo vivido durante o 7º encontro, quando foi apresentada nossa pesquisa para o grupo de jovens a fim de pactuar e viabilizar a continuidade desta com a realização do 1º círculo de cultura para coleta de dados. Nas linhas que seguem, apresentaremos, respectivamente, os tópicos: apresentando a pesquisa e considerações sobre o instrumento de coleta de dados.