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2.4 O corpo na adolescência 47

2.4.4 Imagem Corporal e Sexualidade na adolescência 56

De uma forma geral, a evolução da IC na adolescência depende de factores de natureza social e está muito relacionada com a qualidade das relações interpessoais.

Antes da puberdade, os jovens tornam-se mais preocupados com a sua aparência, associada às alterações corporais e às pressões para o enquadramento na figura corporal idealizada pelas normas de beleza da sociedade. Durante a adolescência, estas preocupações intensificam-se e as experiências ajudam a moldar a IC e a correspondente (in)satisfação (Cash & Pruzinsky, 1990).

Os adolescentes desenvolvem sentimentos positivos ou negativos em relação ao próprio corpo, às partes que o constituem e às mudanças de que é objecto. Como tal, a sexualidade e a ES estão relacionadas com o corpo, com a expressão corporal, com a IC e com o maior ou menor desconforto em relação a ele (Frade et al., 1999). Os mesmos autores referem que uma ES positiva ajuda os jovens a aumentarem a autoestima, mas não evita as dificuldades próprias do crescimento e das construções individuais.

A maturação pubertária está associada a um aumento do carácter reservado, a uma maior insatisfação com a IC e a conflitos nas relações com os pais. Estes conflitos são mais evidentes entre as mães e as filhas e verificam-se com maior frequência a meio do desenvolvimento pubertário (Hill, Holmbeck, Marlow, Green & Lynch, 1985).

O estatuto pubertário refere-se ao nível actual de desenvolvimento físico apresentado pelo adolescente, relativo ao processo geral das alterações pubertárias. No caso concreto da IC, à medida que o estatuto pubertário se desenvolve, verifica-se uma maior satisfação com a IC nos rapazes e uma menor satisfação nas raparigas (Vasconcelos, 1995).

O timing pubertário indica até que ponto o desenvolvimento físico do

adolescente é normal, precoce ou tardio relativamente aos indivíduos do mesmo sexo, e as consequências que daí advêm. Os indivíduos de maturação precoce apresentam menor satisfação com a IC, estão menos satisfeitos com o

seu peso e possuem sentimentos menos positivos sobre o seu timing pubertário, relativamente aos indivíduos considerados normais ou de maturação tardia (Dubas, Graber & Petersen, 1991).

As raparigas de maturação precoce começam a namorar mais cedo, são mais populares e manifestam mais atitudes anti-sociais e problemas de comportamento do que as normais ou tardias (Ferron, 1992). No entanto, o desenvolvimento precoce dos caracteres sexuais secundários pode provocar um certo embaraço, devido ao facto de estas raparigas atraírem mais as atenções e serem mais altas e pesadas do que as outras. O autor referiu ainda que a aparência mais matura pode envolver estas adolescentes em situações sociais novas, para as quais elas não estão emocionalmente preparadas.

Dentro das alterações fisiológicas que as raparigas experimentam durante a puberdade, a menarca - primeiro período menstrual, é claramente a mais dramática do ponto de vista físico e sociocultural, influenciando as percepções, sentimentos e sensações que as jovens nutrem sobre si próprias em geral e sobre o seu corpo em particular, obrigando a uma reorganização da IC e da identidade sexual (McGrory, 1990).

A consciência e aceitação dos novos contornos do corpo aumentam durante a adolescência e tornam-se mais precisos à medida que as alterações pubertárias diminuem e as formas femininas maturas emergem (Collins et al., 1987). Para os mesmos autores, a formação de uma IC mais matura envolve também a integração da dupla natureza da fisiologia sexual da mulher: a aceitação do corpo como sexualmente activo e potencialmente procriador.

A insatisfação com o próprio corpo e a preocupação com o peso são aspectos importantes para os adolescentes. O ideal cultural relativamente à elegância feminina e ao mesomorfismo masculino parecem estar bem incorporados nos adolescentes (Phelps & Bajorek, 1991). Os mesmos autores referem que a insatisfação com o peso, é uma concomitante da maturação feminina, pois as adolescentes tornam-se mais insatisfeitas com o seu peso à medida que maturam.

Phelps et al. (1993), num estudo realizado com adolescentes dos 12 aos 18 anos, verificaram que a distorção da IC (por exemplo, sentir o corpo com um

peso superior ao que ele realmente tem) parece começar no início da adolescência, atinge os níveis mais elevados a meio desse período e declina durante os últimos anos da adolescência. Assim, parece que as adolescentes percepcionam gradualmente a IC com maior precisão à medida que o tempo passa.

Num inquérito realizado a jovens portugueses, Ferreira (2003) constatou que apesar da população jovem portuguesa se mostrar relativamente satisfeita com a sua forma e aspecto físico, mais de um terço manifestou desejo de melhorar as dimensões da sua corporeidade, sentimento este que, se acentua nos adolescentes que permanecem na Escola. Por outro lado, 19% de jovens afirmaram não gostar do seu corpo tal como ele é. A este sentimento de insatisfação corporal, 10% de jovens salientaram-se que acumulam um sentimento de insatisfação pessoal, confessando frequentemente que gostariam de ser uma pessoa diferente.

Também o vestuário desempenha um papel significativo no processo de socialização. É visto como uma segunda “pele” que representa os aspectos mais relacionados com o desenvolvimento de cada um (Kaiser, 1990). O mesmo autor referiu que os sentimentos sobre o corpo, nomeadamente a satisfação, desempenham um papel fundamental nas preferências do vestuário e nas atitudes com este relacionadas.

Schilder (1968) também sugeriu que a roupa se torna parte integrante da IC, podendo a aparência corporal ser transfigurada com o uso de roupas. Este autor referiu ainda que a roupa toma o significado do corpo sobre o qual é usada. No entanto, um estudo mais recente de Markee, Carey e Pedersen (1990) contraria esta última afirmação, sugerindo que o corpo é que toma o significado da roupa que o cobre. Estes autores referem também que a roupa não é apenas uma cobertura do corpo, podendo criar, enquanto usada, uma melhor percepção deste. Além disso, os indivíduos usam roupas como forma de camuflarem as “falhas” que percepcionam da sua IC e de aproximarem o seu corpo da norma ou do padrão socialmente aceite.

Cash, Wood, Phelps e Boyd (1991), observaram que as mulheres apresentam uma autoavaliação mais positiva no que concerne à sua aparência física e facial e uma satisfação superior com a IC, quando usam cosméticos.

Para a mulher contemporânea e para a sua IC, perder peso tornou-se sinónimo de esmero pessoal, sucesso e atracção, apesar de os homens manifestarem preferência por mulheres mais “cheias”. As mulheres parecem ignorar esta apreciação dos homens ou não consideram suficientemente importante para interferir no seu autoconceito e na sua autoestima (Sobral, 1995). Por outro lado, nas culturas não ocidentais, em que a forma “roliça” é valorizada ou, pelo menos, não é desvalorizada (na medida em que é considerada sinal de saúde, fertilidade, feminilidade, sexualidade e riqueza) as desordens alimentares são raras (Root, 1990).

Em suma, a adolescência é o período da progressiva diferenciação entre os géneros (masculino e feminino), à medida que as diferenças sexuais biológicas se tornam mais visíveis. Entre outras coisas, a adolescente poderá vacilar entre usar roupas “normais” ou vestir-se de forma a evidenciar os seus atributos sexuais. Assim sendo, a luta interna para consolidar um sentido de identidade sexual é frequentemente transmitida na forma como o vestuário e os acessórios corporais são usados, nomeadamente pelas raparigas, sendo que muitas vezes são usados para acentuar ou suprimir as diferenças sexuais biológicas (Vasconcelos, 1995).

Por fim, há que ter em consideração que o efeito de um determinado factor num dado comportamento poderá não ser estável ao longo das várias fases do desenvolvimento do indivíduo. Daí que, quando se desenvolvem estudos com crianças e jovens, é preciso ter sempre presente que nestas idades as alterações e modificações resultantes do crescimento e desenvolvimento são uma constante, podendo levar-nos a extrair conclusões precipitadas acerca da possível influência de um determinado factor nos seus hábitos (Lessard-Hébert, Goyette, Boutin, 2005).