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3. IDEIAS DE REPÚBLICA E LINGUAGENS DA MONARQUIA: A AMPLIAÇÃO DA

3.2 NOVOS ESPAÇOS, NOVAS LEITURAS: A CIRCULAÇÃO DAS NOVAS IDEIAS

3.2.2 Impressos, leituras e leitores na Província

A criação tardia da imprensa no Espírito Santo, em 1849, certamente afetou a circulação de livros e outros tipos de publicações, pois fazia como que a impressão de livros também fosse inibida até esta data. A situação pouco se modificou nos anos posteriores, já que a maioria das obras de autores locais costumava ser publicada na Corte.268 Os entraves não se relacionavam somente às publicações, mas também aos espaços necessários para a pulverização de ideias e difusão de novos conceitos no fim do século XIX no Espírito Santo. Somente nos anos finais do Império foram criados lugares propícios à difusão de conhecimento e ciência na província. Estes espaços, contudo, mostraram-se de forma diferente nas principais regiões da província.

Foi por meio da Biblioteca Pública provincial criada na capital – Vitória – que as correntes políticas e científicas tomaram fôlego na província.269 O local não era o único reduto de leitura na localidade270, no entanto, a Biblioteca possuiu um papel de destaque em meio à dinâmica de circulação de ideias científicas e das discussões sobre o progresso e a civilização nos anos finais do XIX. Foi durante a década de 1880 que se verificou a intensificação dos trabalhos na Biblioteca e das práticas de leitura na capital, embora sua criação tenha se dado desde a metade do século. Os relatórios emitidos por presidentes de província auxiliam a delinear a história da Biblioteca pública e também exibem as dificuldades para a concretização do projeto na capital. Os preparativos para a instalação da Biblioteca Pública tiveram início por volta de 1853. Em comunicado feito à Assembleia provincial, o presidente da província, Sebastião Machado Nunes, indicou que necessitava da aprovação de verbas para que uma das salas do palácio da presidência abrigasse uma biblioteca.271 Em julho daquele ano, a biblioteca foi aberta, mas continuou a demandar auxílios dos deputados provinciais para a sua permanência.

Os livros que ali existiam eram, em sua maioria, doados por Braz Costa Rubim, intelectual nascido no Espírito Santo, mas residente na Corte no momento da abertura da biblioteca. Autor de diversas obras sobre a história de sua terra natal e membro do IHGB, Rubim presenteou a livraria pública com cerca de 400 obras, que foram então administradas por João Clímaco de

268 HALLEWELL, Laurence. O Livro no Brasil: sua história, São Paulo: EdUSP, 1985. 269 A Biblioteca Pública Provincial foi criada em 16 de julho de 1855.

270 Em Vitória funcionavam algumas sociedades literárias, como o Grêmio Literário Vitoriense.

271 APEES. Relatório com que o Exm. Sr. Dr. Sebastião Machado Nunes, Presidente da Província do Espírito Santo abriu a sessão ordinaria da respectiva Assembléa Legislativa no dia vinte e cinco de maio do corrente anno, 1854.

112 Alvarenga Rangel, João Malaquias dos Santos Azevedo e José Camilo Ferreira Rabelo. A fundação do espaço para leitura não obteve êxito, posto que, em 1859, o estabelecimento já dava sinais de fraqueza. De acordo com o presidente de província Pedro Leão Velloso, era visível a necessidade do apoio de verbas do legislativo para que a biblioteca cumprisse seu papel na província: “Não passa de [...] 900 volumes inclusive as ditas brochuras atiradas à poeira. Se entendeis que a província deve ter uma livraria pública [...] que adoteis dos meios de que há mister o núcleo que já temos, para que se possa desenvolver”.272

Durante a década de 1850, o estabelecimento foi pouco frequentado, o que, para os presidentes de província, devia-se à má organização dos livros e à falta de boas acomodações para os leitores. Além da falta de estrutura, a biblioteca sofria com a ausência de um encarregado permanente, fazendo com que geralmente estivesse fechada. Entre outras reclamações dos administradores locais constava também a ausência de um catálogo regular, o que poderia facilitar a consulta dos leitores, além de mobiliário adequado. Reclamava-se, sobretudo, que fosse solicitado às sociedades científicas do Império e a todas as tipografias que enviassem um exemplar de suas publicações para aquela biblioteca.

Se em 1860 as tipografias iniciavam intensa produção na província, o mesmo entusiasmo não foi visto na Biblioteca Pública. Em 1861, o presidente Costa Pereira Junior relatou a situação precária daquele estabelecimento na capital. Segundo o administrador, faltavam móveis adequados, principalmente para guardar os livros. De acordo com o presidente, a ausência de estantes fazia com que as obras ficassem amontoadas e jogadas pelo chão da sala que abrigava a biblioteca. No entanto, a preocupação de Costa Pereira Junior não se referia apenas à estrutura física, mas também ao conteúdo dos livros que formavam a biblioteca:

Do exame que ali procedi, logo que tomei conta da administração da província, cheguei ao conhecimento de que poucas são as obras de vulto que a biblioteca possui e destas, algumas pela antiguidade das edições, não mostram o último estado das ciências de que tratam. Abundam as brochuras, relatórios, panfletos, etc.. mas infelizmente muitas que serviram para a história pátria figuram apenas no catálogo.273

A citação destaca ao menos dois problemas. Um deles era o desaparecimento de livros que eram pegos em empréstimos, mas não eram devolvidos. Essa prática, como alertava o presidente de

272 APEES. Relatório do Presidente da Província do Espírito Santo, o Bacharel, Pedro Leão Velloso, na abertura da Assembléa Legislativa Provincial no dia 25 de maio de 1859.

273 APEES. Relatório apresentado à Assembléa Legislativa Provincial do Espírito Santo no dia da abertura da sessão ordinária de 1861 pelo Presidente, José Fernandes da Costa Pereira Junior.

província, contribuía para que obras que existiam em poucos exemplares, livros raros, já não existissem na biblioteca provincial. Outra questão apontada pelo administrador é a ausência de obras “atuais” para o período, ou seja, havia a carência de livros que acompanhassem a discussão científica da época.

O número de público leitor também não era animador. Segundo as fontes, eram raros os indivíduos que frequentavam o estabelecimento, seja por causa das péssimas condições para realização de pesquisas e leituras, seja pelo desprezo por tal atividade. Neste sentido, parece não haver indícios que nos apresentem grande interesse pelos livros e prática de leitura na biblioteca pública em meados de 1860. Entretanto, foi na década de 1870 que a biblioteca viveu seu pior período. O relatório governamental de 1872 exibiu a precariedade da biblioteca pública, afirmando que “hoje apenas existem alguns livros de todo inutilizados e estragados pelas traças”. Contudo, o que chama atenção na fala de Francisco Ferreira Correia não é somente a situação crítica do estabelecimento, posto que tal fato já fosse constatado desde a criação da biblioteca e se assemelhava à situação de outras bibliotecas provinciais. O que o presidente de província faz questão de destacar em seu relatório é a negligência dos capixabas diante da prática de leitura e do conhecimento. Na visão do administrador,

Reconheço infelizmente que na maior parte da população não há somente indiferença e negação pelas letras; há mais que isso; há um horror quase igual ao que se observa em relação ao serviço das armas e até a inoculação da vacina [...] Em geral, pois, evita-se a escola. [...] Uns não sabem ler, outros não querem aprender o que deveriam saber! E assim grassa a ignorância como uma epidemia de mau caráter, que mata a um tempo o espírito público e todas as aspirações nobres que se precedem à indústria, às ciências, às letras, às belas artes e às armas.274

Ainda na década de 1870, paralelo ao surgimento do jornalismo “democrático” vivenciado na província, iniciou-se uma forte discussão sobre a reforma da instrução pública no Espírito Santo. A demanda educacional forjou também a necessidade de se restabelecer a biblioteca como um estabelecimento literário em prol do saber. O discurso de mudanças da época enquadrava as práticas capixabas nos quesitos do “velho” e do “novo”. Entretanto, pouco se viu em termos de mudanças e difusão de ideias científicas na província. Foi somente na década

274 APEES. Relatório lido no paço d’Assembléa Legislativa da Província do Espírito Santo pelo Presidente o Exm. Snr. Doutor Francisco Ferreira Correa na sessão ordinária do anno de 1871.

114 de 1880, durante a administração de Eliseu de Souza Martins, que se consolidou a ideia da biblioteca pública como um espaço da ciência e de conhecimento para o progresso.

O governante mencionou em seu relatório à Assembleia provincial sobre a “ideia de fundar na Capital um templo consagrado às ciências, às artes e às letras, e no qual funcionem como sacerdotes meus concidadãos”.275 Para compor a “nova” biblioteca, Eliseu contou com a doação de 1.844 livros e comprou outros 239 volumes. A escolha do acervo concentrou-se na instrução popular, fazendo com que o administrador adquirisse também cartas geográficas, mapas-mundi e do Brasil, globo terrestre e esferas celestes, além de outras figuras geométricas. Dentre as principais mudanças na estrutura física, destaca-se a instalação de gás na biblioteca, o que tornou possível as leituras noturnas, cuja frequência era maior.

No entanto, Eliseu Martins não considerou somente os melhoramentos momentâneos para a biblioteca, pois solicitou renda anual para a compra de livros, assinaturas de revistas nacionais e estrangeiras, e para as despesas referentes a encadernações. Inicialmente a biblioteca teve sua direção entregue ao Atheneu Provincial, e posteriormente, nomeou-se um bibliotecário. Portanto, a biblioteca como espaço destinado à leitura não foi uma novidade para os espírito- santenses nos anos de 1880. Todavia, a ideia de uma biblioteca como espaço da ciência era parte de um novo projeto político e intelectual baseado nas ideias de civilização e ciência. A imprensa positivista da capital prestou honras a Eliseu Martins por concretizar a ideia da biblioteca pública, o que, de certa forma, era visto como parte do projeto positivista:

Coube-lhe a gloriada criação da Biblioteca Pública, essa ideia luminosa que por si só era suficiente para recomendar o nome de S. Ex. à posteridade. Agenciando donativos de grande número de cidadãos par a realização biblioteca, animou Sua Ex. a iniciativa particular, essa alavanca poderosa do século XIX, e que infelizmente estava adormecida nesta província. Para mostrar as vantagens de uma biblioteca pública, basta lembrar que a troca dos jornais, a leitura fácil e cômoda desperta o gosto e o amor às letras. Em seu relatório apresentado à Assembleia Legislativa provincial mostrou Sua Ex. a sua ilustração e amor às letras pátrias, oferecendo um projeto de reforma para a instrução da mocidade, baseada nos verdadeiros princípios das ciências positivas.276

Se a criação de um ambiente de leitura objetivou a difusão de conhecimento e de novas correntes científicas, como o naturalismo, o evolucionismo e as demais discussões do período,

275 Relatório com que o Exm. Sr. Dr. Eliseu de Sousa Martins, no dia 19 de julho de 1880, passou a administração da Província do Espírito Santo ao Exm. Sr. Tenente-Coronel Alpheu A. Monjardim d’Andrade e Almeida, 1º Vice- Presidente.

pode-se dizer que a biblioteca pública resguardava estrutura ideal para tal empreendimento. O mapeamento das obras que eram lidas pelos capixabas na Biblioteca Pública indica que havia circulação desses livros, e, sobretudo, que a consulta a estas obras aumentou largamente no decorrer da década de 1880, perdendo espaço para as práticas de leitura mais comuns até meados de 1870.

QUADRO 4. CONSULTAS NA BIBLIOTECA PÚBLICA DE VITÓRIA

Tipo da Obra Consultas 1881 Consultas 1886

Bellas letras 1.296 644 Jurisprudência 62 58 Ciencias Matemáticas 108 188 Ciências Naturais 78 207 Ciências Médicas 10 47 Filosofia Abstrata 38 78 História e Geografia - 192 Teologia 8 - Moral aplicada 68 123 Jornais e Revistas 467 875

Fonte: A Província do Espírito Santo; O Horizonte.

Os dados indicam que, desde o início do funcionamento da biblioteca empreendida por Eliseu Martins, houve o aumento nas consultas a obras ligadas às ciências naturais e médicas, enquanto as obras de Belas Letras e jurisprudência sofreram declínio no gosto dos leitores. A análise do acervo da biblioteca provincial demonstra a variedade de temas e autores que passam a ser lidos pelos jovens e intelectuais da localidade.

A teoria darwinista e as discussões sobre a evolução, por exemplo, estavam bastante presentes na biblioteca. Entre os livros do acervo estava Introduction à la Science Sociale, de Herbert Spencer, difusor do darwinismo social, e, complementando tal discussão, havia também livros de opositores de Darwin, como L’ Espécie Humaine, escrito por Quatrefages de Bréau, defensor da unidade da origem da espécie humana e da superioridade do homem branco. De acordo com

116 as investigações de Heloísa Domingues277 sobre a recepção do darwinismo no Brasil, a discussão darwinista e evolucionista, que em outros países tornou-se problemática, sobretudo por conta do catolicismo, encontrou no Império brasileiro um terreno fértil para debates que envolviam tanto a defesa, quanto os opositores da teoria, assim como ocorreu na província do Espírito Santo.

É necessário destacar a presençã das obras de Auguste Comte e de vários tomos do Cours

Philosophie Positive. Havia também obras obrigatórias para o debate político da época, como A Província, de Tavares Bastos, e a obra Estudos práticos sobre a administração das províncias no Brasil, do Visconde do Uruguai. Na seção dedicada à História havia Histoire de la Revolution Française, de Adolphe Thiers; História dos Estabelecimentos Scientificos Litterarios e Artisticos de Portugal nos sucessivos reinados da Monarchia, de José Silvestre

Ribeiro; História dos Quinhentistas, escrito por Theophilo Braga; Historia Graeca Tomus IV, obra de Xenophotis, entre vários outros livros sobre História278(APÊNDICE 1).

Apesar de manter um acervo que disponibilizava aos provincianos o contato com diversas teorias em voga no fim do século XIX, a Biblioteca Pública Provincial e, portanto, as práticas de leitura da capital não eram acessíveis a todos os indivíduos da província, até mesmo pela distância que existia entre as cidades e do interior e a capital. A demanda pela leitura e por espaços de discussões científicas e literárias passou então a ser uma necessidade frequente em várias localidades da província, sobretudo no sul, onde a construção do espaço de leitura partiu da iniciativa de populares, redatores e estudantes. Em ambientes diferentes, os capixabas empreenderam a divulgação de ideias que nem sempre se assemelhavam, o que pode ser melhor exemplificado a partir das discussões que a imprensa destacou no Centro e no Sul.

A circulação de impressos que divulgariam ideias cruciais para a contestação da monarquia, como o cientificismo, o republicanismo e o positivismo, também ocorreu na região sul da província. Além dos jornais que eram publicados naquela região, a formação do Grêmio Bibliotecário Cachoeirense também modificou as práticas e os hábitos de leitura em Cachoeiro de Itapemirim na década de 1880. Criado a partir de uma sociedade, o grêmio foi fundado por causa do empenho da própria elite política e intelectual cachoeirana, que, por meio de doações

277 DOMINGUES, Heloisa Maria Bertol et al. (org). A recepção do darwinismo no Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Fiocruz, 2003.

278 A análise do acervo da biblioteca foi feita com base nas obras preservadas da Biblioteca Provincial que hoje se encontram alocadas na Biblioteca Estadual do Espírito Santo.

de livros e móveis, concretizou o projeto de um estabelecimento direcionado à difusão do saber e do conhecimento na região.

A ideia da criação do grêmio surgiu de uma reunião feita na casa do redator do periódico O

Cachoeirano, João Loyola e Silva. Os sócios, autodenominando-se amantes do progresso e das

letras, pretendiam criar um espaço para leitura naquela vila, e, além disso, levar o ensino às classes menos favorecidas:

Felizmente vai desaparecendo o desânimo que havia, e podemos quase garantir que muito em breve o povo encontrará livros com abundância para a sua distração e a classe menos favorecida da fortuna, aulas noturnas gratuitas para sua instrução.279

Em 17 de junho de 1883, alguns cidadãos reuniram-se para a eleição da diretoria do Grêmio para o primeiro ano de funcionamento. A primeira eleição estabeleceu que o Dr. Deolindo José Maciel ocuparia o cargo de presidente, enquanto Emílio Nunes Leão assumiria o cargo de secretário. Bernardo Horta ficou responsável pela tesouraria, e João de Loyola e Silva, editor de O Cachoeirano, foi eleito o bibliotecário do grêmio.280

A instalação do grêmio foi marcada para 1o de julho de 1883, e, antes mesmo desta data, mais de 700 livros já haviam sido arrecadados.281 No dia de sua inauguração, a biblioteca contava com mais de 1.115 livros. A concretização da sociedade Bibliotecária em Cachoeiro de Itapemirim representou muito mais que um estabelecimento dedicado à leitura. A análise da linguagem empregada pelo redator de O Cachoeirano na edição de 8 de julho de 1883 verifica que o nascimento do grêmio carregava em si a simbologia do progresso, do rompimento com o atraso, de anunciação de uma “era auspiciosa”, como denominou João Loyola e Silva. Ao relatar o festejo de inauguração da biblioteca, o redator enfatiza que os que ali compareceram era os que visavam o desenvolvimento das ideias e do progresso, “as conquistas da inteligência”.

Diferentemente da capital, que recebeu uma biblioteca projetada pela administração pública, a biblioteca instalada em Cachoeiro de Itapemirim nasceu da iniciativa de particulares, como se visasse preencher uma demanda emanada do próprio povo. Sobre a união dos cidadãos do sul em prol de uma biblioteca, João Loyola e Silva afirmou:

279 O Cachoeirano, nº24- 17/06/1883. 280 O Cachoeirano, nº25-24/06/1883. 281 O Cachoeirano, nº25-24/06/1883.

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É belo, grandioso e sublime quando se vê um povo, unido num só pensamento, colocar-se ainda mesmo com passos vacilantes, na estrada que conduz ao grande templo da civilização, deixando após-si as trevas da ignorância. Era tempo! Operou-se a transição e as velhas teorias vão desaparecendo, ofuscadas pelos revérberos dos raios luminosos do século. [...] A mocidade atirou-se com avidez às lutas pacíficas da inteligência bebendo dos livros o elixir confortativo das suas aspirações. Elas caminharão para o zenit e o Grêmio cachoeirense fará parte da grande cruzada civilizadora.282

O local escolhido para a biblioteca foi o edifício cedido pelo coronel José Pinheiro de Souza Werneck no largo de São João, e funcionou naquele recinto desde a instalação. Entre os vários discursos feitos no dia de sua inauguração, destacam-se as falas que demonstravam a importância do conhecimento científico e da função das sociedades bibliotecárias no século XIX, como o fez Dr. Lobão Cedro. O discurso do presidente indicou como seria o funcionamento da biblioteca. A sociedade seria formada por um número ilimitado de sócios efetivos, colaboradores e beneméritos, dirigidos por uma diretoria, que, por sua vez, era regida por um estatuto. Os livros do acervo poderiam ser comprados com as finanças da biblioteca ou ainda oferecidos por particulares. Como já dito, outro grande objetivo da Sociedade Bibliotecária era oferecer aos mais pobres uma aula noturna de instrução primária, e posteriormente pasar a outros cursos gratuitos.

O discurso de abertura283 feito por Deolindo José Vieira Maciel, traçando uma história das bibliotecas por todo ocidente e oriente, exaltou a importância das sociedades bibliotecárias na evolução das sociedades. As bibliotecas de Alexandria, Pérgamo e a Palatina se tornaram exemplos para os cidadãos capixabas do sul que naquele momento empreendiam a consolidação de sua biblioteca, rumo à cruzada pela civilização. Ao verificar a linguagem utilizada pelos fundadores, torna-se evidente que a instalação da biblioteca era parte de um projeto também de cunho político, ligado à ideia de evolução, de civilização e de difusão da ciência. De acordo com Deolindo, a biblioteca poderia trazer à região na qual foi instalada uma série de melhoramentos, como, por exemplo:

[...] a aquisição e desenvolvimento das ciências pelas relações que pouco a pouco se estabelecem com muitas instituições científicas e literárias do país e

282 O Cachoeirano, nº 27- 08/07/1883.

283 O discurso proferido por Deolindo Maciel encontra-se no número 28 de O Cachoeirano, publicado em 15 de julho de 1883.

quiçá do mundo. Desenvolvimento das artes e indústrias pelos constantes noticias de descobertas e melhoramentos ocorridos no jornalismo [...]”284

Desde sua fundação a sociedade contava com 54 sócios efetivos285, 4 colaboradores e 2 sócios beneméritos. Destaque especial à participação feminina como D. Joanna P.das Dores e D. Julieta Werneck. O público leitor alcançava a média de 200 pessoas ao mês. Entre as obras mais consultadas estavam as de belas artes, história, ciências naturais e literatura, sendo esta última