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O PROJETO REFORMISTA DO SUL E A LINGUAGEM DA CRÍTICA

3. IDEIAS DE REPÚBLICA E LINGUAGENS DA MONARQUIA: A AMPLIAÇÃO DA

3.6 O PROJETO REFORMISTA DO SUL E A LINGUAGEM DA CRÍTICA

Os conflitos políticos que ocorreram na capital foram controlados desde o início do século por um grupo coeso, capaz de neutralizar diferenças e cooptar membros divergentes para os grupos políticos existentes. Como já discutido, as práticas políticas mantiveram-se por muito tempo no terreno dos “não-partidos”, demonstrando a pouca diferença entre as propostas políticas. Tal cultura política perpetuou-se até a década de 1880 e mantinha no poder provincial os homens importantes da política capixaba, juntos a alguns jovens políticos que viram na aliança com os monarquistas a porta de entrada para a ocupação de cargos públicos.

No sul, no entanto, apesar do peso político da região, havia um grupo de indivíduos que almejava a carreira política, a ocupação de uma cadeira na Assembleia provincial, ou ainda, uma vaga no Senado. Os conflitos de interesses políticos com o centro já eram visíveis desde 1879, durante a eleição para senador, após a morte do representante do Espírito Santo. De acordo com os estudos de Geert Bank334, a formulação de uma lista tríplice para e eleição causou intensa agitação na política local. A disputa, no entanto, não ocorreu entre os dois partidos, no interior do grupo liberal. Como o próprio autor afirma, a política clientelista dominava a cultura política no Espírito Santo, fazendo com que as ordens vindas da Corte fossem assimiladas na província. Isso formulava um jogo de poder no qual uma pequena elite política se beneficiava mantendo alianças com o Rio e Janeiro, e, ao mesmo tempo, conduzindo a manutenção da ordem provincial. Em 1879, contudo, percebeu-se pela primeira vez um embate contra a cultura política vigente, já que os liberais da região sul sustentaram a ideia de

334 BANCK, Geert. Dilemas e Símbolos: estudos sobre a cultura política do Espírito Santo. Vitória: IHGES, 1998. p.19.

que precisavam de um representante para a lista tríplice, a fim de que um espírito-santense enfim ocupasse a vaga no Senado.

Os liberais do sul, considerando-se alijados da política provincial, indicaram José Feliciano Horta de Araújo para a lista.335 A liderança do partido Liberal na Corte, no entanto, impôs o nome de Christiano Ottoni também na tríplice. A presença de Ottoni entre os candidatos revoltou os liberais do sul, pois acabaria ali o sonho de um representante da região. Entre Horta de Araújo e Christiano Ottoni era notório que o mineiro seria nomeado. Depois de muitas cartas vindas de Ottoni e da Corte pressionando o chefe dos liberais, Alfeu Monjardim, e autorizando- o a manusear o que fosse possível em função da eleição do candidato forasteiro, Christiano Ottoni foi eleito senador, mesmo sendo o menos votado.

Tornou-se então evidente a cisão dentro do partido Liberal por parte do grupo do sul, que, ao contrário das práticas anteriores, que aceitavam o comando político do centro, tomou a decisão de se unir a Silveira Lobo, inimigo político de Christiano Ottoni, que instaurou um inquérito para investigar a eleição no Espírito Santo. Com base em várias cartas enviadas pelos liberais da região cafeeira, a comissão de investigação indeferiu a nomeação de Ottoni. Posteriormente realizou-se nova eleição, mais uma vez com a presença de Christiano Ottoni na tríplice, mas, agora, excluindo Horta de Araújo, que, após o enfrentamento com o centro, perdeu seu lugar na elite política.

Apesar da narrativa factual, o conflito mencionado entre os liberais na província mostra-se valioso na análise dos projetos políticos desenvolvidos na década de 1880. A exclusão dos liberais do sul e a consequente cisão no interior do partido abriram espaço para uma nova linguagem que contestava as práticas políticas do centro e a cultura política consensual e ordeira que predominava na Província. Se na capital os conflitos ainda eram esmagados com facilidade, o grupo liberal do sul se mostrava disposto a chegar aos cargos políticos a qualquer custo, mesmo que o preço fosse a monarquia.

Assim como os “liberais republicanos” descritos por Angela Alonso336, a nova geração política almejava ascender politicamente e via a tradição imperial como empecilho ao seu desenvolvimento. Se um político renomado do sul como José Feliciano Horta de Araújo não logrou êxito em uma disputa política no Senado, jovens descrentes com o Império como seu

335 BANCK, 1998, p. 35.

144 filho, o farmacêutico Bernardo Horta, Joaquim Pires de Amorim, Gil Goulart e João Loyola não viam solução possível para a situação vigente. O jornal utilizado pelo grupo foi O

Cachoeirano, publicação criada ainda na década de 1870 como órgão do povo, e que somente

mais tarde se tornaria órgão republicano.

As mudanças nas práticas políticas são observadas na indefinição partidária que estampava os jornais. Ao enviar uma carta à redação de O Cachoeirano, um leitor conservador pediu informações precisas sobre o partido do candidato a deputado provincial Gil Goulart:

Os partidos ficam a ver navios: pois que nesse boletim lê-se o nome do Sr. Gil Diniz Goulart como candidato liberal; no n. 32 encontra-se a aprovação justa e merecida desse cidadão distinto para ocupar o lugar de deputado, por um eleitor, com certeza liberal: e no entanto S. S dirige-se a Gregos e Troianos sem cor política. Dizem os liberais que o candidato é seu, o candidato pede, dizendo que é sem cor política; que confiança poderá merecer aos partidos, se não vier um protesto clarear nossas dúvidas?[...] os partidos tem direito de ver definida a posição do candidato que lhes pede voto; [...] É bom pois que cada um se defina. Um Conservador.337

A indagação sobre a definição partidária surgiu ainda mais uma vez no mesmo número do jornal, onde, muito confuso, um leitor indagava: “O deputado que não é conservador nem liberal, onde se sentará na Assembleia? Que causa defenderá? Qual dos partidos lhe dará o voto?”338 Percebe-se, desse modo, que alguns liberais do sul já não se enquadravam nas práticas políticas do centro. Todavia, não possuíam outro partido para migrar naquela ocasião. Na ausência de um núcleo republicano na província, eles se definiam sem cor política.

O leitor sob o pseudônimo de “o conservador” voltou a escrever para o jornal, agora insinuando que Gil Goulart era adepto de uma nova seita e por isso havia abandonado os antigos amigos. “O conservador” afirmou que Goulart “desconhece política definida nos partidos, a um dos quais pertenceu, afasta-se dos amigos de muitos anos e vem plantar nova seita, só, sem auxilio, sem pedir! [...] Alerta! ... Vendo aproximar-se um vulto iminente, embora desarmado.”339 Em resposta às acusações do leitor, publicou-se um artigo em defesa de Gil Goulart e sua candidatura pelo município de Cachoeiro de Itapemirim. As alegações do candidato à cadeira da Assembleia Provincial reivindicavam o direito de não aderir a nenhum dos dois partidos monárquicos:

337 O Cachoeirano, n°33, 19/08/1883. 338 O Cachoeirano, n°33, 19/08/1883. 339 O Cachoeirano, nº34, 26/08/1883.

Por ventura tem sido os republicanos, os socialistas, os radicais, os católicos e os próprios conservadores e liberais dissidentes excluídos das assembléias no Brasil e dos outros países civilizados em que há liberdade de pensamento? [...] Fóra dos dois partidos liberal e conservador não se encontrará salvação possível? [...] A sala dos antigos conselhos gerais, hoje Assembleias provinciais, não é um recinto de exclusivismo nem conquista dos partidos liberal e conservador.340

Por meio das retaliações no periódico, é possível perceber que o Gil Goulart se inseria em um projeto político que se desvinculava dos grupos liberal e conservador. Tanto ele como outros publicistas passaram a autodenominar-se os “reformadores” no meio político, mas ainda não divulgavam o republicanismo. A inserção da discussão sobre o regime político parecia ferir alguns leitores do jornal, que, por meio de correspondências, pediam por explicações e provocavam os reformadores indagando se já haviam formado um novo partido:

De que depende a salvação do país? De uma reforma em todo seu regime interno? Apresente-se esse reformado, debaixo de qualquer nome; escreva, ofereça ao público suas grandiosas ideias, dedique à pátria o fruto de suas lucubrações, procure adeptos, forme uma seita e todos bendirão seu nome! [...] Qual a reforma? Qual o nome do novo partido?341

Naquele momento, o grupo certamente ainda não possuía as articulações necessárias para formar um partido, mas as possíveis notícias sobre uma terceira via já assustava alguns políticos. A linguagem política que guiou os liberais do sul se parece em alguns aspectos com os preceitos indicados no Manifesto Republicano de 1870. Definiam a crise como a decadência das instituições políticas, voltando até suas origens para analisar a situação vigente e criticando, por exemplo, a Independência e a permanência do status quo imperial.342 Para os liberais do sul do Espírito Santo, a monarquia era a causa do atraso brasileiro e do futuro sem esperanças. Sem a intervenção do elemento monárquico, dizia o redator, a independência do Brasil teria culminado em uma República, e por isso, assinalava que os brasileiros não deviam assimilar o Império à nossa independência, pois fora um favor não solicitado e que, naquele momento de crise, custava alto preço ao país.343

Posteriormente, beneficiado pela sociabilidade que as reuniões do Grêmio Literário permitiam, muitos de seus frequentadores que faziam parte do grupo dissidente liberal do sul iniciaram a

340 O Cachoeirano, nº34, 26/08/1883. 341 O Cachoeirano, nº 35, 2/09/1883. 342 ALONSO, 2002, p. 183.

146 organização de um reduto onde as discussões não se limitassem à esfera literária. Era necessário refletir sobre os rumos do Brasil e projetar meios de acessar a política do país. Em 1887 o grupo utilizou o jornal O Cachoeirano para convidar os adeptos: “a reunião de todos os cidadãos que tiverem ideias republicanas realizar-se-á amanhã às 6 horas da tarde em casa do prestimoso cidadão Dr. Joaquim Pires de Amorim”.344 A partir de então, totalmente desligados do núcleo liberal do centro, os liberais dissidentes invadiram a imprensa com inúmeros debates acerca da ineficiência do regime, a necessidade de reformas e a adesão tardia dos espírito-santenses ao Manifesto de 1870.345

O foco de preocupações dos liberais republicanos do sul residia na discussão sobre a justificativa para o governo republicano e o direito da soberania popular. A liberdade, outro conceito bastante discutido entre os reformadores, foi comparada à possível liberdade que os monarquistas defendiam como conquista do regime. Em sua argumentação retórica, os liberais do sul retiravam da monarquia a prerrogativa de ceder liberdade ao cidadão, afirmando que esta era, na verdade, um direito inerente ao ser humano, e, portanto, não precisava ser dada por rei ou monarquia alguma. Compatível com o progresso, a República passou a ser a solução para os vícios políticos do Império:

É portanto fatal o movimento favorável ao advento da República, única forma de governo que não depende de intrigas de bastidores, das opiniões e dos atos pensados por uma testa coroada; única forma de progresso; onde cada um tem a responsabilidade de seus atos; onde o povo é governado pelo povo e só feito o que este quer.346

O princípio federativo que ia de encontro à centralização monárquica também se fez presente nas discussões iniciais do Clube Republicano. Os argumentos não revelavam ao certo as vantagens do sistema federativo a fim de não repetir os teóricos republicanos, mas considerava o federalismo inevitável e, sobretudo, uma característica inerente ao país, clamada historicamente pelos brasileiros. Os argumentos, segundo o redator, estavam no plano sociológico e científico, baseados nas obras de Assis Brasil, Alberto Sales e Prondhon. Entretanto, o jornal indica que o argumento nacional, a própria demanda do país, atestava que a federação era o único modelo confiável para a organização política do país.347

344 O Cachoeirano, nº 21- 22/05/1887. 345 O Cachoeirano, nº 22- 29/05/1887 346 O Cachoeirano, nº 29- 15/07/1888. 347 O Cachoeirano, nº 29- 21/07/1889.

3.7 CONCLUSÃO

Após a organização do Clube Republicano, a elite política monarquista se via pela primeira vez frente à iminência de um abalo concreto da instituição que tanto resguardou. Os dissidentes do sul, contudo, já não estavam satisfeitos com as discussões políticas locais e visavam expandir seu projeto político por toda a província. No número 22 do jornal O Cachoeirano, Bernardo Horta convocou seus correligionários para iniciar as conferências republicanas por todo o Espírito Santo, expondo naquela edição os principais pontos defendidos pelo projeto reformista do sul:

A abolição da escravidão foi o prenúncio de muitas abolições e de muitas reformas precisas. A federação das províncias, o sufrágio universal, a grande naturalização, a separação da Igreja do Estado, o casamento civil, a cessão da vitaliciedade do Senado e muitas outras necessidades são as palpitantes aspirações deste povo que quer ser grande como as suas matas, seus rios e suas riquezas.348

Com o início das conferências, vários liberais descontentes com a liderança de Alfeu Monjardim seriam encorajados a aderir ao republicanismo, sobretudo alguns positivistas. Resta-nos, neste sentido, compreender como a atuação dos dissidentes liberais, agora republicanos, modificou as práticas políticas que eram conduzidas pela elite política partidária do discurso da ordem. É necessário identificar os sentidos que o republicanismo assumiu em uma província que, até meados da década de 1880, ainda se enquadrava na linguagem política da moderação e da reverência à monarquia.

Percebe-se, todavia, que, mesmo tendo ocorrido uma ampliação da esfera literária dos espaços de divulgação do saber científico, as novas ideias não foram suficientes para introduzir a concepção republicana na província. Naquele período havia, como adverte Angela Alonso, o repertório capaz de empreender a crítica ao regime, a estrutura de oportunidades políticas, e até mesmo a disponibilidade do vocabulário político cunhado pelos teóricos republicanos. O pensamento republicano, entretanto, não penetrou rapidamente na Província, tendo em vista a rigidez da cultura política monarquista que freou por muito tempo a discussão antimonárquica e conduziu as práticas políticas. O republicanismo, neste sentido, somente ganhou fôlego com

348 O Cachoeirano, nº 22- 3/06/1888.

148 a atuação de uma geração que se distanciava do jogo político da capital e estava descomprometida com a ordem imperial. De todo modo, inicialmente a República não ganhou a adesão de toda a Província, não só em virtude dos fatores já mencionados sobre a barreira imposta pela cultura política do centro, mas certamente também porque a marginalização não era um fator comum a todos os grupos políticos. Ao se sentirem alijados do poder, o grupo liberal do sul decidiu contestar a ordem.

Após o embate entre o projeto político dos dissidentes do sul e o grupo monarquista do centro, é necessário investigar até que ponto os republicanos conseguiram permear e modificar as práticas políticas da província durante o auge da propaganda republicana. Para entender a recepção do republicanismo na província, é preciso buscar seus divulgadores, as ideias propagadas nos meetings, e, sobretudo, a assimilação ou, em contrapartida, a resistência por parte dos monarquistas. Busca-se, neste sentido, refletir se a transição entre a monarquia e a República seria uma verdadeira ameaça à cultura política consensual, ou, por outro lado, a forçaria a reformular algumas práticas em nome da manutenção da ordem provincial.

4. OS SENTIDOS DA REPÚBLICA: A DISPUTA ENTRE LINGUAGENS

E PROJETOS REPUBLICANOS NO ESPÍRITO SANTO

Do Espírito Santo não há de dizer jamais que em seu seio guardavam traidores. Declarados republicanos, hão de sê- lo até morrer. Desenganem-se, pois, os que pretendem volvê-la aos tempos em que era um burgo podre da política e cada governo lhe impunha representantes que não conheciam [...] O 2º distrito resgatou-se, é republicano, e o 1º em breve o será também.349

Este capítulo discute os diferentes projetos republicanos vivenciados no Espírito Santo durante os últimos anos do Império. A análise das linguagens políticas na imprensa local demonstra a existência de, ao menos, duas aspirações republicanas no fim do Império. Examinamos, desta forma, as diferenças entre o projeto republicano liderado pelo núcleo existente no sul da província, o 2º distrito eleitoral, e o projeto político divulgado pelo grupo concentrado na capital, Vitória. Por meio das significações assumidas pela República nestas localidades, apresentamos o viés pluralista do movimento republicano no Brasil, acentuando as experiências de república vivenciadas no Espírito Santo. 350 Neste sentido, investigamos como o republicanismo remodelou a dinâmica interna da província, o vocabulário, e as práticas políticas locais.

A análise proposta mostra-se como oportunidade de explorar a diversidade conceitual do termo

república, que passou por diversas reformulações ao longo da história.351 Modesto Florenzano resgatou a polissemia do termo, indicando a longa trajetória do conceito que, inclusive,

349 O Cachoeirano, nº45 - 18/11/1888.

350 Algumas investigações já destacam o republicanismo no século XIX como movimento plural em outros países. Para a Espanha, o estudo de Román Miguel González investigou a existência de três culturas políticas republicanas. GONZÁLEZ, Román Miguel. Las culturas políticas del republicanismo histórico español. Ayer, Espanha, n. 53, pp. 207-236, 2004; Sobre as particularidades regionais do republicanismo no México: CHUST, Manuel; FRASQUET, Ivana. Orígenes federales del republicanismo en México, 1810-1824. Mexican Studies/Estudios Mexicanos, México, vol. 24, n. 2, pp. 363-399, 2008. Para a Venezuela, ver: STRAKA, Tomás. La república deseada, sobre las concepciones del republicanismo venezoelano (siglo XIX). LOGÓI Revista de Filosofia, Venezuela, n.17, p. 1-23, 2010.

351 A obra organizada por Nilton Bignoto, Matrizes do republicanismo, realizou análise detalhada sobre a trajetória das vertentes republicanas em países como Itália, França, Estados Unidos e Inglaterra. Cf. BIGNOTTO, Nilton (org). Matrizes do Republicanismo. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2013. Sobre a trajetória do conceito “republicanismo”, ver também: RODGERS, Daniel T. Republicanism: the Career of a Concept. The Journal of American History, Estados Unidos, v. 79, n. 1, p.11-38.1992.

150 ultrapassa a significação deste vocábulo na língua latina.352 Para além da plurarilidade conceitual, este estudo busca resgatar também os diversos usos do conceito de república no Brasil do Oitocentos, com enfoque, todavia, nas especificidades do republicanismo na província do Espírito Santo, a fim de analisar este movimento dentro do contexto politico intraprovincial. Destacamos a necessidade de que se investigue o movimento republicano por percepções regionais como uma forma de distanciá-lo das generalizações e de evidenciar o papel do republicanismo na disputa pelo poder entre elites políticas locais, que vai além da sua caracterização como somente resposta ao contexto de crise do Império em âmbito nacional. O perigo das generalizações na análise historiográfica também é destacado por Giovanni Levi353quando propõe a valorização dos elementos locais e específicos durante a investigação. Nessa perspectiva, concordamos que seja necessária a preservação das particularidades em meio à análise do movimento republicano do final do século XIX. As especificidades locais, neste sentido, permitem acentuar as diferenças entre os “republicanismos” existentes no Brasil do Oitocentos. Regionalizar a crise da monarquia torna possível o melhor entendimento da significação e da recepção da República em diferentes regiões do Brasil, pois considera as realidades distintas das províncias. Pretende-se, neste sentido, contribuir para o mapeamento do republicanismo em locus regional, pois este ainda apresenta diversas lacunas, sobretudo com relação ao movimento republicano na província do Espírito Santo.

352 Na Antiguidade Clássica, o conceito de res publica foi entendido como tradução do termo grego politéia. Tanto na língua grega, como no latim, o termo república designava uma constituição política, apresentada por Aristóteles como uma das três formas de governo, ou seja, o governo da maioria em contraposição à aristocracia e à monarquia. A politéia, ou res publica, seria, na verdade, a única forma de governo que permitiria a moderação e o equilíbrio. FLORENZANO, Modesto. Republica (na segunda metade do século XVIII – história) e republicanismo (na segunda metade do século XX – historiografia). Disponível em: http://historia.fflch.usp.br/sites/historia.fflch.usp.br/files/Republica%20e%20republicanismo.pdf. Acesso em: 22/04/2016.

353 Giovanni Levi assinala: “Minha definição é: a História é a ciência das perguntas gerais, mas das respostas locais. Não podemos imaginar uma generalização da História que seja válida. Ou seja, podemos nos perguntar o que é fascismo, mas há fascismos diferentes na Itália, na Espanha ou em Portugal. Por isso, devemos preservar