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5.1 Os conhecimentos verbalizados dos poetas sobre os aspectos

5.1.3 Indicações de autoria do cordel nos folhetos

Figura 4 – Capa do folheto A feira que não pude pagar

Fonte: Folheto de Diosman Avelino (2014).

No decorrer do século XX, a ideia de circularidade entre autor, leitor e obra consolida-se, contrapondo-se à concepção romântica, cuja compreensão assentava-se no pressuposto de que o autor seria alguém dotado de qualidades superiores (gênio criador) distintas do destinatário. Do nosso ponto de vista, e refletindo a partir das palavras de Bakhtin (2011), tomamos a noção de autoria como o engajamento do autor em provocar nos seus interlocutores uma atitude responsiva. Partindo deste pressuposto teórico, buscamos investigar se os depoentes apontavam indícios de autoria nos folhetos. Diante desse cenário, inquietou-nos saber: “Nos cordéis, aparece alguma informação sobre o autor? Qual?” e “Nesse cordel, tem alguma informação sobre o autor?”.

No Quadro 19, demonstramos, em conformidade com as informações concedidas pelos poetas entrevistados, que a indicação da autoria costumava estar disposta na capa, no interior do folheto (no início ou final) e, em alguns casos, na contracapa.

Quadro 19 – Indicações de autoria nos folhetos produzidos pelos poetas

Nomes dos poetas Indicação de autoria nos folhetos J. Borges Paulo Pereira Zé Guri Val Tabosa Diosman Avelino Jailton Pereira Total Insere o nome do autor na capa X X X X X X 6 Insere o nome do autor no interior do folheto X X X X X X 6

Inclui lista com principais obras do autor na quarta capa do folheto X 1 Faz ou pretende fazer uma biografia X X X 3

Total por poeta 2 3 3 3 3 3 16

Fonte: A Autora (2017)

No que se refere às indicações de autoria dos cordéis, todos os poetas (os seis participantes entrevistados) disseram inserir o próprio nome (ou o nome artístico), por extenso, na capa, e no interior do folheto (no início ou no final do texto). Metade dos entrevistados (3) reportou-se ao uso de biografia, tendo já sido empregada nos impressos ou, ainda, pretendendo utilizá-la em publicações futuras. A totalidade dos participantes (6) também conseguiu indicar essas informações no próprio folheto.

No bojo dessa discussão acerca da autoria, encontramos no único folheto de Paulo Pereira ao qual tivemos acesso uma biografia do autor (FIGURA 5), mas durante a entrevista ela não foi mencionada pelo poeta.

Fonte: Folheto de Paulo Pereira [200-].

Todavia, é importante ressaltarmos que não realizamos nenhuma pergunta específica sobre o uso da biografia, mas quando nos voltamos para a questão da autoria, os poetas Zé Guri, Jailton Pereira e Diosman Avelino constantemente referiam-se a ela. Para além do gênero biografia, os seis folhetos que analisamos dos depoentes continham propaganda (3) e acróstico (1) e, como expresso pelos cordelistas, a identificação do autor, principalmente, na capa, contracapa e no interior dos folhetos. Percebemos a pertinência desta colocação quando observamos as falas desses poetas:

Eu só coloco mesmo isso, o nome por extenso aqui [na capa] e aqui [dentro do folheto]. Na capa eu coloco J. Borges porque a capa do cordel é pequena. Então, não dá para eu colocar o nome todo cortado na madeira: José Francisco Borges. [...] A gente coloca o nome que é para identificar quem fez. É como você pegar um CD: se não tiver o nome do artista você fica sem saber quem produziu. Colocar o nome é até uma forma de divulgar quem fez, porque se não tiver o meu nome, como vão saber? (J. Borges).

Aqui, em algumas obras, era pra ter uma pequena biografia sobre... Aí, isso eu até conversei com o rapaz que faz as impressões pra mim, porque em breve acho que não terá mais. Nas próximas impressões eu vou mudar: ao invés de colocar algumas obras, eu vou colocar uma pequena biografia, porque muita gente me pergunta isso, e às vezes é bom (Diosman Avelino).

Nos meus eu coloco a biografia: tenho livros publicados, fiz tal coisa, moro em tal lugar e uma foto geralmente atrás. Na frente coloco o título e o meu nome na frente, na capa [aponta para um cordel]. Antes tinham cordéis que não tinham informações do autor, mas hoje todos têm. Hoje, os autores se preocupam em dar essa informação. (Jailton Pereira).

A gente coloca no final o nome do autor e também coloca a biografia. Eu nunca faço a biografia não nos cordéis, mas é interessante pra você saber

quem foi que construiu. Agora, nessa nova geração do cordel, eles sempre escrevem uma biografiazinha. Esse meu não tem não. Não, não escrevo nada de biografia. É só o autor e pronto. Do jeito que era antigamente, assim, olha [ele mostra um cordel]. Os folhetos que agora é cordel, mas antigamente não tinha nada no autor. Informação não tem não, mas o nome tem. Olhe aqui, ó [mostra a capa de um cordel dele]. Também tem aqui [dentro do cordel]. Do jeito dos outros. Aqui também tem a minha propaganda [ele mostra o verso do cordel]. Alguns têm a data. Esse aqui é 13(treze) do 12 (doze) de 2013 (dois mil e treze). Quando eu termino eu coloco a data assim (Zé Guri).

Por sua vez, não podemos ignorar, como endossado por Val, que a menção ao autor da obra pelo leitor é uma questão mais ética do que, propriamente, uma obrigação.

Tanto na capa tem o nome do autor como também no término do poema a gente coloca o nome do autor. Isso é mais ético do que obrigatório. Porque, às vezes, a gente vê assim até poetas que declamam uma poesia que não são deles e não dizem, né? Por exemplo, eu sei decorados dois poemas que não são meus, mas eu faço questão, quando eu declamo esses poemas... depende do ambiente onde a gente esteja, de dizer que não são meus e dizer a origem. Então, se você pega um poema como o cordel, é uma coisa leve que até o vento pode levar, se encostar em qualquer esquina, [alguém] ler, achar interessante, mas não tem o nome do autor, A pessoa jamais vai saber quem foi que fez. A gente tem que deixar registrado o nome e a criação (Val Tabosa).

Gaudêncio, Dias e Albuquerque (2015) advertem que, historicamente, os poetas de bancada conviveram com problemas de plágio, principalmente porque os donos das tipografias contratavam cordelistas que não dispunham de recursos financeiros para publicar, distribuir e comercializar os folhetos. À medida que eram impressos, o proprietário da tipografia pagava ao escritor pelo cordel, possuindo, por sua vez, o direito autoral da obra que o permitia suprimir o nome do autor ou substitui-lo por seu próprio nome (ABREU, 2006).

Galvão (2000, p.120) reitera que, ao adquirir os direitos de uma obra, o “‘editor- proprietário’ pode, pelo acordo feito, omitir ou até mesmo modificar a autoria do folheto”, mas, ao passo que o cordel se “populariza”, a questão da autoria e propriedade passa a ter cada vez menos importância.

Em suma, a apropriação indébita dos folhetos parece não ser mais uma das preocupações dos cordelistas. Destarte, Marinho e Pinheiro (2012), por exemplo, aludem que os problemas relativos à autoria dos cordéis já não existem nos dias de hoje e acreditamos que isso se deve, dentre vários motivos, porque alguns cordelistas têm recorrido a repositórios digitais ou registram suas obras.