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2.2 Sujeitos do Direito Internacional do Meio Ambiente

2.2.4 Indivíduos

Assim como acontece com as ONGs, a classificação da doutrina quanto aos indivíduos não é uniforme; há os que negam e os que afirmam que os indivíduos sejam sujeitos de Direito Internacional Público.

Em sua grande maioria, a doutrina internacionalista inclina-se a não admitir tal característica. Apesar desse entendimento, identificamos que algumas Cortes Internacionais já estão acessíveis aos indivíduos.

No Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, qualquer indivíduo ou grupo de particulares que se considerarem vítimas de violação dos direitos assegurados na Convenção Europeia dos Direitos Humanos, bem como as organizações não governamentais (vedado o anonimato) podem provocar o Tribunal, que irá apreciar a

174 A importância da participação das ONGs no processo normativo não pode ser deixada de lado. Tal

participação deve ser observada sob dois focos: o da contribuição técnica e informativa para as discussões e elaboração dos textos normativos, e, por conseguinte, o da pressão que tais organizações fazem junto aos Estados para que estes ratifiquem textos normativos ou sigam tais normas de forma imediata.

175

Ver INTERNATIONAL COURT OF ENVIRONMENT FOUNDATION (ICEF). Site organizacional. Roma, 2009. Disponível em: <http://www.icef-court.org/>. Acesso em: 10 ago. 2009.

74 matéria, analisando todas as questões relativas à interpretação e aplicação da Convenção e dos Protocolos.

Por sua vez, a Convenção Americana dos Direitos Humanos prevê a possibilidade de encaminhamento de petições que se reportem à violação dos direitos humanos por um Estado-membro à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, por qualquer indivíduo, grupo de pessoas ou entidade governamental legalmente reconhecida em pelo menos um dos Estados-membros da organização, possuindo todos eles legitimidade, sendo, porém, vedado o anonimato.

O Tribunal Penal Internacional, por seu turno, trata o indivíduo como sujeito de deveres internacionais, na medida em que admite a sua presença no polo passivo da relação processual penal, mesmo que o seu país não seja signatário do Estatuto do Tribunal. No entanto, o indivíduo não pode formular denúncias, o que constitui competência exclusiva de um Estado-Parte, do Conselho de Segurança da ONU e do Procurador176.

Esses três exemplos mostram uma tendência que também está sendo acompanhada por arbitragens internacionais, como por exemplo, a Corte Permanente de Arbitragem, a Corte Internacional de Arbitragem e Conciliação Ambiental e o Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos, criado sob a égide do Banco Mundial.

Existem duas grandes razões para o indivíduo ser considerado pessoa internacional: a dignidade da pessoa humana, que é amplamente reconhecida e protegida no cenário internacional; e a própria noção de Direito, reconhecendo-o como criado pelo ser humano e para o ser humano. Perde sentido falar dos direitos humanos na esfera internacional se o próprio ser humano não possuir a capacidade jurídica internacional para fazer valer os preceitos defendidos. Além do que, os indivíduos não podem ficar dependendo da atuação de um Estado ou de uma Organização Internacional, devendo sim ter a possibilidade de defender diretamente seus direitos e enviar reclamações às Organizações Internacionais competentes.

Assim, a teoria que nega a personalidade internacional do indivíduo, afirmando que no Direito Internacional a pessoa humana tem a condição de objeto não faz sentido, pois o Direito foi criado para o ser humano.

75 Para Gilmar Antônio Bedin, “a sociedade internacional moderna, com o reconhecimento dos novos atores internacionais e com o surgimento dos fenômenos da interdependência e da globalização do mundo, entrou em declínio, surgindo em seu lugar a sociedade internacional contemporânea”, que representa uma ruptura com as relações internacionais estatocentristas, por meio da multiplicação dos fluxos e canais de comunicação, e da integração entre os diversos atores internacionais177.

Rosalyn Higgins entende que o não reconhecimento do indivíduo como sujeito de Direito Internacional Público encontra guarida na divisão entre sujeitos e objetos do direito e na compreensão de que, se algo é ou sempre foi de uma determinada maneira, deve continuar dessa forma. Para a autora, não se deve falar em sujeitos e objetos, mas em partícipes. Estes seriam tanto Estados como Organizações Internacionais, empresas multinacionais, grupos não governamentais privados e indivíduos178.

Devemos notar, ainda, que os indivíduos desempenham um papel catalisador como atores na elaboração do Direito Internacional do Meio Ambiente, pois eles podem manifestar suas ideias, aspirar por meio ambiente saudável, reivindicar em encontros diplomáticos, entre outras ações. O efeito dos indivíduos, como o ex-vice- presidente dos Estados Unidos Al Gore (que produziu o documentário “An Inconvenient Truth”), Rachel Carson (cujo livro “Silent Spring” serviu como um marco dentro da história do Direito Internacional do Meio Ambiente), e Mostafa Tolba (antigo diretor do PNUMA), não devem ser subestimados.

Mais especificamente sobre a criação de um Tribunal Internacional do Meio Ambiente, é digno de nota o trabalho desenvolvido pelo italiano Amedeo Postiglione, Juiz da Corte de Cassação da Itália, que chamou a atenção do mundo sobre a necessidade da criação de uma Corte Internacional capaz de julgar crimes ambientais transfronteiriços179.

Diante do exposto, a pergunta agora é outra. Somente sujeitos de Direito Internacional Público é que poderiam ter acesso a um Tribunal Internacional do Meio Ambiente? Não vislumbramos por esse lado, na medida em que são várias as Cortes, como mostramos – principalmente ligadas à proteção dos direitos humanos

177 A sociedade internacional e o século XXI: em busca da construção de uma ordem mundial justa e

solidária. Ijuí: Unijuí, 2001, p. 23.

178

Problems & Process: International Law and how to use it. Oxford: Clarendon Press, 1994.

179

Ver POSTIGLIONE, Amedeo. Per un Tribunale Internazionale Dell’Ambiente. Milão: Giuffré, 1990;

76 –, que permitem o acesso de indivíduos, e, como pudemos verificar, os indivíduos não alcançaram o status de sujeito de Direito Internacional Público formalmente falando.