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Um Tribunal Internacional do Meio Ambiente(TIMA) como parte de uma

As controvérsias ambientais internacionais já estão sujeitas à jurisdição obrigatória quando estão ligadas a questões do comércio internacional ou a disputas sobre o direito do mar. Então, por que não criar um mecanismo compulsório para questões eminentemente de matéria ambiental? Se é admissível para os Estados serem processados por restringir o comércio, por que não seria admissível se submeterem a uma jurisdição obrigatória quando infringirem as normas ambientais? A realidade nos mostra que os Estados admitem mais facilmente a compulsoriedade de Cortes e Tribunais especializados ou quando os conflitos estão relacionados a um mecanismo de cumprimento das normas de um tratado específico, como por exemplo, o Tribunal Internacional sobre o Direito do Mar e o Sistema de Solução de Controvérsias da OMC.

Partindo do pressuposto de que realmente existem a necessidade e a vontade política para a criação de um TIMA, a questão passa agora a ser outra: como ele deve ser estabelecido?

O que não podemos concluir, a princípio, é qual seria a melhor forma de instrumentalização de um TIMA. A ideia que parece ser mais consistente é a criação de um TIMA no âmbito de uma Organização Mundial do Meio Ambiente (OMMA), nos moldes da OMC e do seu Sistema de Solução de Controvérsias.

Da mesma forma que a OMC, essa OMMA poderia ser instalada sob os auspícios de uma organização mais antiga e prestigiada, como a ONU, e,

164 posteriormente, com o desenvolvimento das suas instituições internas, poderia adquirir personalidade jurídica própria.

A combinação com uma OMMA ou com alguma outra estrutura capaz de coordenar os inúmeros tratados internacionais do meio ambiente poderia facilitar a viabilização de um TIMA, podendo ser visto como um amplo conjunto de compromissos. Além disso, um TIMA, como parte de uma ampla OMMA, se constituiria em uma ferramenta a mais para coordenar e desenvolver os tratados internacionais ambientais os quais fossem criados ao abrigo dessa Organização.

Qualquer que seja a estrutura de um TIMA, será necessário que essa nova Corte atue com base nas normas gerais do Direito Internacional e que atue em estreita coordenação com as outras Organizações Internacionais, com as outras Cortes, com os outros Tribunais e com as Organizações Não Governamentais. Se um TIMA atuar sempre cooperando com essas entidades, a sua criação dificilmente causará sérios riscos de fragmentação no sistema jurídico internacional.

Mais ainda, um TIMA não poderá ficar isolado das demais áreas do Direito Internacional. Como bem colocado por Joost Pauwelyn, “if this potential pitfall is not avoided, setting up a “green” [WEC] to counter-balance the non-green existing tribunals, compounds not resolves, the problem433.

A competência rationae materiae de um TIMA deveria ser definida no âmbito de convenção e acordos específicos. Assim, essa estrutura reduziria o risco de conflitos de competência entre os Tribunais. Ademais, a convenção a qual criasse uma Organização Mundial do Meio Ambiente poderia estabelecer certos princípios gerais do Direito Internacional do Meio Ambiente, da mesma forma que o Tratado da OMC abrange uma multiplicidade de acordos comerciais em diferentes setores. Finalmente, para além dos casos contenciosos, um TIMA poderia também possuir competência para resolver questões preliminares a pedido de outras Cortes ou Tribunais Internacionais, Estados, ou até mesmo, atores não estatais, incluindo as ONGs ou os Tribunais nacionais434.

433 Judicial mechanism: is there a need a World Environmental Court? In: CHAMBERS, W. Bradnee;

GREEN, Jessica F. (Ed.). Reforming International Environmental Governance: from institutional limits to innovative reforms. Tóquio/Nova Iorque/Paris: United Nations University Press, 2005, p. 160. Tradução nossa: Se esta armadilha potencial não for evitada, a criação de um TIMA “verde”, para contrabalançar os Tribunais existentes não verdes, não resolverá o problema.

434 PAUWELYN, Joost, Judicial mechanism: is there a need a World Environmental Court?, p. 165-

165 O assunto em torno de quem poderá ter acesso a um TIMA dentro de uma OMMA também é importante. Considerando o interesse geral e os interesses globais em jogo no Direito Internacional do Meio Ambiente, os atores não estatais também devem possuir legitimidade para acessar a Corte. Isso ajudaria a implementar a efetividade de um TIMA. No entanto, partilhamos da ideia de que haveria de existir um mecanismo de controle para permitir o acesso de atores não estatais. Uma opção é delimitar claramente as condições em que os atores não estatais poderão ter acesso à Corte. Essas condições poderiam ser o esgotamento de recursos domésticos para os indivíduos, e, para as ONGs, a comprovação de que elas estariam representando interesses de uma comunidade435.

Devido aos efeitos irreversíveis das degradações ambientais, um TIMA dentro de uma OMMA deveria ter poderes para ordenar medidas provisórias. Modelos podem ser encontrados no artigo 290436 da Convenção sobre o Direito do Mar e no

artigo 26437 das Regras de Arbitragem Ambiental da PCA. O procedimento de um

TIMA deverá ser célere e flexível, permitindo uma rápida solução das disputas. É crucial que as decisões de um TIMA sejam legalmente compulsórias. Isso pode ser resultado da sua própria decisão, como é o caso das decisões da Corte Internacional de Justiça e do Tribunal internacional do Direito do Mar, ou podem

435 PAUWELYN, Joost, Judicial mechanism: is there a need an World Environmental Court?, p. 162. 436 “Artigo 290. Medidas provisórias. 1 - Se uma controvérsia tiver sido devidamente submetida a uma

corte ou tribunal que se considere, prima facie, com jurisdição nos termos da presente Parte ou da seção 5 da Parte XI, a corte ou tribunal poderá decretar quaisquer medidas provisórias que considere apropriadas às circunstâncias, para preservar os direitos respectivos das partes na controvérsia ou impedir danos graves ao meio marinho, até decisão definitiva. 2 - As medidas provisórias podem ser modificadas ou revogadas desde que as circunstâncias que as justificaram se tenham modificado ou deixado de existir. 3 - As medidas provisórias só podem ser decretadas, modificadas ou revogadas, nos termos do presente artigo, a pedido de uma das partes na controvérsia e após ter sido dada às partes a oportunidade de serem ouvidas. 4 - A corte ou tribunal notificará imediatamente as partes na controvérsia e, se julgar apropriado, outros Estados Partes, de qualquer medida provisória ou de qualquer decisão que a modifique ou revogue. 5 - Enquanto não estiver constituído o tribunal arbitral ao qual uma controvérsia esteja a ser submetida nos termos da presente seção, qualquer corte ou tribunal, escolhido de comum acordo pelas partes ou, na falta de tal acordo, dentro de duas semanas subseqüentes à data do pedido de medidas provisórias, o Tribunal Internacional do Direito do Mar, ou, tratando-se de atividades na Área, a Câmara de Controvérsias dos Fundos Marinhos, pode decretar, modificar ou revogar medidas provisórias nos termos do presente artigo, se considerar, prima facie, que o tribunal a ser constituído teria jurisdição e que a urgência da situação assim o requer. Logo que estiver constituído, o tribunal ao qual a controvérsia foi submetida pode, atuando de conformidade com os parágrafos 1º a 4º, modificar, revogar ou confirmar essas medidas provisórias. 6 - As partes na controvérsia devem cumprir sem demora quaisquer medidas provisórias decretadas nos termos do presente artigo.”

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“Artigo 26. A menos que as partes acordem de outra forma, o Tribunal Arbitral poderá, a pedido de qualquer das partes, e tendo obtido as opiniões das mesmas, ordenar medidas provisórias as quais considere necessárias para preservar os direitos de qualquer das partes ou para evitar danos graves ao meio ambiente abrangidos pelo objeto do litígio.”

166 seguir a estrutura do Órgão de Solução de Controvérsias da OMC438.

Adicionalmente, quantificar as reparações representa um dos maiores desafios, porque o cálculo do dano pode ser muito difícil. A participação de cientistas e de outros experts nesse ponto é essencial. O risco de poder ser responsabilizado pelo pagamento de grandes indenizações por danos ambientais pode ser uma das razões pelas quais os Estados resistam em aceitar uma jurisdição compulsória. Trabalhando conjuntamente com um TIMA, uma OMMA poderá monitorar o cumprimento das obrigações advindas de uma decisão.

Quanto mais complexa for a estrutura de um TIMA, mais difícil será a sua implementação. Esse é o maior desafio do estabelecimento de um TIMA: equilibrar a dificuldade de negociação e os interesses com a necessária estrutura para a tutela do meio ambiente.