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A Comédia de Dante se apresenta ao leitor como um relato autobiográfico de uma viagem no além-mundo e termina com a visio Dei. O argumento do poema pode ser identificado na representação e nas descrições das almas no além-mundo que habitam o Inferno, o Purgatório e o Paraíso. No Inferno, o poeta constrói uma taxonomia das penas a partir do grau moral do pecado cometido em vida pelo pecador. De forma cônica com o vértice em baixo, o espaço da cratera é dividido em círculos, cuja circunferência vai diminuindo até chegar ao vértice habitado por Lúcifer. O Purgatório, cuja forma é exatamente o contrário do inferno, é representado por uma montanha dividida em degraus que marcam o nível do pecado de gravidade decrescente da base ao cume. O Paraíso se encontra fora do espaço terrestre localizado no céu. De topologia esférica, o espaço é dividido em nove esferas que correspondem a sete céus que tomam os nomes a partir dos planetas, o céu das estrelas fixas e o céu do “Primeiro Móvel”. “Céu dos céus, o Empíreo”45

é a sede do Altíssimo, um não lugar onde não há medida do tempo como na Terra. Como nas outras cantigas, a alocação das almas bem-aventuradas dos beatos em cada um dos nove céus e sua proximidade ao Empíreo é estabelecida a partir do mérito; portanto, os mais próximos do Empíreo são os mais merecedores. Em sentido alegórico-anagógico, um dos argumentos do poema que podemos identificar é o homem livre que, por exercitar seu próprio livre arbítrio, será objeto de um juízo final de prêmio ou punição. Portanto, ao escrever sua experiência intelectual e mística, o poeta se depara com a necessidade de enfrentar o topos da inefabilidade. No sentido de negação, a inefabilidade marca, semanticamente, essa impossibilidade de falar a respeito de algo, porque ou é indizível e, portanto impronunciável, ou é indescritível por uma impossibilidade devida à incapacidade da língua de expressar seu conteúdo. Ainda, o lexema destaca a incompreensibilidade de algo que pode ser misterioso, arcano. Na obra de Dante apresenta-se uma situação paradoxal: a inefabilidade é ligada, de uma parte, à indizibilidade do que foi vivenciado e, por outra, à missão de relatar sua experiência. É importante retomar novamente o que Dante, no Convivio, afirma a respeito da inefabilidade.

Però che li miei pensieri, di costei ragionando, molte fiate voleano cose conchiudere di lei che io non le potea intendere, e smarrivami, sì che quasi parea di fuori alienato [...] E questa è l‟una ineffabilitade di quello che io per tema ho preso; e

44 O topos da inefabilidade foi indagado por muitos críticos entre os quais, Ledda e Colombo. Na perspectiva da semiótica da religião são importantes os estudos realizados por Volli.

45 LUCCHESI, Marco Americo. Nove cartas sobre a Divina Comédia: navegações pela obra clássica de Dante. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, Fundação Biblioteca Nacional, 2003, p. 71.

conseguentemente narro l‟altra [...] e dico che li miei pensieri - che sono parlare d‟amore - sonan sì dolci, che la mia anima, cioè lo mio affetto, arde di potere ciò con la lingua narrareν e perchè dire nol posso [...] questa è l‟altra ineffabilitade; cioè che la lingua non è di quello che lo ‟ntelletto vede compiutamente seguace.46

As duas inefabilidades que o poeta ressalta ao narrar sua experiência são causadas pela impossibilidade de escrever acerca dos pensamentos de amor e do desejo ardente que o autor confessa de sentir para com a mulher, pois, primeiro a nobreza dela era de tamanha altitude que ultrapassava a possibilidade de compreensão do intelecto. E a falta de entendimento levava o autor a um estado de perdição que tangencia a alienação. A segunda inefabilidade consiste na incapacidade da língua de “trasladar” o que o intelecto entende. Esta desconexão, percebida e declarada no Convivio como dupla inefabilidade e na Comédia, mediante declarações de indescritibilidade, não é impedimento para o poeta que transforma o material fixado pela memória em um objeto poético, mesmo em virtude da “própria insuficiência” declarada. A impossibilidade, marcada pela desconexão entre intelecto e língua, é invertida, transformada em seu complementar por graça de algo que o Divino outorga. Assim, a insuficiência linguística predispõe o poeta numa postura humilde pela qual “Ciò ch'io vedeva mi sembiava un riso / de l'universo; per che mia ebbrezza / intrava per l'udire e per lo viso. / Oh gioia! oh ineffabile allegrezza!” (E quanto eu via parecia um riso / do universo; e a embriaguez sentia / entrar-me pelo ouvido e pelo viso. / Ó júbilo! ó inefável alegria!)47 (Par. XXVII, 4-7). A consciência de ser como um “corpo diáfano” que se deixa transpassar pela luz permite ao poeta empreender o que não é mais um “folle volo” (voo louco) individual (Inf. XXVI, 125), pois é confiante no mandatário da missão que acalma sua hesitação: “temo che la venuta non sia folle” (temo que a vinda mor loucura seja) (Inf. II, 35)48

; a própria felicidade mental e o arder do desejo de comunicar tudo o que em seu intelecto ele mesmo raciocinava se torna uma árdua tarefa a cumprir.

46 ALIGHIERI, Dante. Convivio. Livro III, cap. III, 13 e cap. IV, 3. In: ____. Tutte le opere. Opere minori. Il convivio, Epistole, Monarchia, Questio de acqua et terra. Fredi Chiappelli, Enrico Fenzi, Angelo Jacomuzzi, Pio Gaia (Orgs.). v. 2. Turim: UTET, 1997, pp. 162-163. Tradução brasileira in: ALIGHIERI, Dante. Banquete. Traduç~o de Ciro Mioranza. S~o Paulo: Editora Escala , p. . E o digo realmente, uma vez que meus pensamentos, voltados a ela, muitas vezes queriam concluir coisas a respeito dela que eu não podia entender e me perdia, […] Esta é uma das coisas inef|veis daquilo que tomei como tema e, por conseguinte, narro outra […]. Digo que meus pensamentos – que se destinam a falar de Amor – soam t~o docemente , que minha alma, isto é, meu afeto, clama para poder narrar isso com a lingual e, porque não posso dizê-lo, […] Esta é a outra coisa inef|vel, ou seja, que a língua n~o segue totalmente aquilo que o intelecto vê. .

47 GRAÇA MOURA, Vasco. A Divina Comédia de Dante Alighieri. Venda Nova: Bertrand, 2000, p. 829. 48 Ibidem, p. 41.

O que nasce desse poeta é uma concepção inédita e ainda não completamente delibada do ato poético. Ora, na Comédia, Dante leva o leitor ao encontro com o sublime em uma palavra ora popular ora erudita, e através do multilinguismo, usando a língua latina, o italiano

in fieri e o provençal, entre outras, é capaz de criar um clímax expressivista, metaforizando

sua própria experiência mística. A viagem explora as fronteiras da linguagem com a criação de neologismos, estruturas sintáticas revertidas para fins poéticos, assonâncias e dissonâncias para efeitos musicais e estéticos do verso, conjuntos sinestésicos cujos núcleos tentam superar a inefabilidade da experiência mística. Dante utiliza o termo inefável, com seus argumentos de intraduzibilidade, a respeito daquilo que ou por sua própria natureza é indizível e/ou indescritível ou pela dupla desconexão entre intelecto e língua.

No que se refere particularmente ao conceito de inefabilidade, é importante conhecer sua contextualização na cultura latina medieval em que o Alighieri viveu. Originalmente ligado aos ensinamentos e às teorias de Agostinho e do pseudo-Dionísio, o conceito de inefabilidade é indagado por Colombo, que ao levantar a história do adjetivo ineffabilis, chega a concluir que:

la cultura classica sembra dunque ignorare l‟uso di questi termini, e, sebbene vi siano attestazioni precedenti, soltanto con Agostino e qualche secolo più tardi con le prime opere dello Pseudo Dionigi l‟Areopagita le parole, ma anche la „teoria’

dell’ineffabile‟, fanno il loro ingresso ufficiale nella cultura in lingua latina.49 [negrito meu]

Na cultura medieval de língua latina, que é essencialmente de tradição judaico-cristã, conceito e experiência de algo inefável são ligados estritamente à experiência do transcendente, que por insuficiência tanto a parte obiecti quanto a parte subiecti, é reputado intrasladável e inexplicável de forma completa por meio da linguagem humana. Dante, como veremos, supera parcialmente essa posição com uma língua/linguagem paradoxal, metaforizando sua experiência em um sistema imagético. Para entendermos a presença dos ensinamentos dionisianos presentes na obra de Dante, podemos comparar a estrutura do Paraíso da Comedia com a obra do pseudo-Dionísio e nisso nos ajuda Scazzoso que, ao falar de contemplação natural e sobrenatural, nos explica que:

49 COLOMBO, Manuela. Dai mistici a Dante: il linguaggio dell ineffabilit{. Florença: La Nuova Italia, 1987, p. 21, Apud SBACCHI, Diego. La presenza di Dionigi Areopagita nel Paradiso di Dante. Florença: Leo S. Olschki Editore, , p. XX). A cultura cl|ssica parece, ent~o, ignorar o uso destes termos, e, muito embora haja atestações anteriores, é somente com Agostinho, e alguns séculos mais tarde com as primeiras obras do pseudo-Dionísio, o Areopagita, que as palavras, bem como a teoria’ do inefável, ingressam oficialmente na cultura de língua latina . [traduç~o minha] [negrito meu]. Sobre o tema da inefabilidade assinala-se também o estudo de Giuseppe Ledda: La guerra della lingua. Ineffabilità, retorica e narrativa nella

Tre sembrano essere soprattutto gli elementi comuni che sostengono la struttura delle due opere: primo, l‟elemento gerarchico che ha la stessa solidità nel corpus pseudo-dionisiano e nella Commedia e la stessa risoluzione in un infinito di luce; analogicamente al ragionamento dottrinale che da uno sviluppo logico e conseguente sfocia nell‟ineffabilità del misteroν secondo, l‟elemento unitario che fa sì che ogni tema, ogni concetto delle due opere si converta inevitabilmente verso l‟unica spirale che porta a Dio [...]ν terzo, l‟elemento dinamico dell‟Universo determinato dall‟amore che, in Dante, è moto circolare delle gerarchie angeliche e dei cieli, moto ascendente degli spiriti e di Dante stesso, moto discendente del raggio e della grazia, e trova la sua origine nel moto che lo pseudo-Dionigi illustra, nella sua Teologia mistica, dell‟anima che si purifica salendo a Dio e del raggio divino che scende a lei.

Tale dinamica mistica costituisce la corrente vitale del Poema ed è la stessa

dinamica dell‟Universo pseudodionisiano.50

[negrito meu]

A longa citação se faz necessária para refletirmos sobre a importância que as obras do pseudo-Dionísio têm para Dante, a fim de entendermos melhor a arquitetura do Paraíso, cantiga onde a inefabilidade é crucial na economia poética dantesca. Primeiramente, o Paraíso tem em comum com o autor do corpus areopagítico o elemento da luz,

la lux tenebrosa, la superlucens caligo, la grande ossessione di Dionigi Areopagita, la luce divina inaccessibile e irrappresentabile perché nascosta dal proprio stesso eccesso, segregatus excessus in cui si occulta la supermanans causa.51.

Seguindo Sbacchi,52 no segundo aspecto em comum com Dante, podemos apreciar de que modo, conforme os estudos de Gardner53, o De Caelesti Hierarchia seja “a fonte da angelologia” dantesca, “ou seja, as nove ordens e seu ministério, e as três vias da união

50 SCAZZOSO, Piero. Contemplazione naturale e contemplazione soprannaturale confrontate attraverso Plotino e lo Pseudo-Dionigi. In: Lectura Dantis mystica. Atti della Settimana Dantesca 28 Luglio-3 Agosto 1968, pp. 56-84. Florença: Olschki, 1969 apud SBACCHI, Diego. La presenza di Dionigi Areopagita nel Paradiso di Dante. Florença: Leo S. Olschki Editore, 2006, p. XX: Além do mais, três parecem ser os elementos comuns que sustentam a estrutura das duas obras: primeiro, o elemento hierárquico que tem a mesma solidez no corpus pseudo-dionisiano e na Comédia, e a mesma resolução em um infinito de luz, analogicamente ao raciocínio doutrinal que a partir de um desenvolvimento lógico e consequente chega à

inefabilidade do mistério; segundo, o elemento unitário que faz com que cada tema, cada conceito das

duas obras convirja inevitavelmente para a única espiral que conduz a Deus [...]; terceiro, o elemento dinâmico do Universo determinado pelo amor que, em Dante, é moto circular das hierarquias angélicas e dos céus, moto ascendente dos espíritos e do mesmo Dante e moto descendente do raio e da graça, encontra sua origem no moto que o pseudo-Dionísio ilustra, em sua Teologia mística, a respeito da alma que se purifica subindo para Deus e do raio divino que desce até ela. Tal dinâmica mística constitui a

corrente vital do Poema e é a mesma din}mica do Universo pseudodionisiano. [tradução minha]

[negrito meu].

51 ARIANI, Marco. Lux inaccessibilis. Metafore e teologia della luce nel Paradiso di Dante. Roma: Aracne, , p. : a lux tenebrosa, a superlucens caligo, a grande obsessão do pseudo-Dionísio, a luz divina inacessível e não representável porque escondida pelo seu próprio excesso, segregatus excessus, no qual se oculta a supermanans causa. [traduç~o minha]. Para um aprofundamento da relação com o pseudo- Dionísio vê-se o capítulo X, pp. 203-222.

52 SBACCHI, Diego. La presenza di Dionigi Areopagita nel Paradiso di Dante. Florença: Leo S. Olschki Editore 2006.

53 GARDNER, Edmund Garratt. Dante s Ten Heavens. A Study of the Paradiso . New York: Haskell House 1970, pp. 20-25, apud SBACCHI, Diego. La presenza di Dionigi Areopagita nel Paradiso di Dante. Florença: Leo S. Olschki Editore, 2006, p. XIX, passim.

mística: purificação, iluminação e união”. Já o De Divinis Nominibus influencia de certo modo “o conceito de luz, de imagem do Criador”, bem como “a visio Dei” de Dante. Entretanto, a fim de valorar a relação entre estes elementos – afirma Gardner – é oportuno “levar em conta não apenas o De Caelesti Hierarchia, mas também a contribuição de Bernardo de Claraval com o seu De Consideratione.”54 Finalmente, o terceiro aspecto em comum com Dante se refere ao itinerário que leva a Deus percorrendo a via indicada pela mística.

Destaco, aqui, um trecho do ensaio introdutório de Bellini ao corpus areopagítico que reúne todas as obras do pensador medieval. Bellini faz uma ligação entre este autor medieval e a estrutura do Paraíso da Comédia. Vejamos:

Nella tradizione occidentale, almeno a partire dall'epoca dei maestri vittorini, Dionigi è stato considerato come maestro di teologia mistica. E tale ruolo in un primo tempo fu inteso nel senso che insegnava a scoprire nella Sacra Scrittura le cose ultime (era il maestro per eccellenza dell‟anagogia)ν più tardi, nella età moderna, specie nella tradizione carmelitana, si ricorse a lui per descrivere le esperienze della vita spirituale. Le sue riflessioni sulla tenebra divina furono lette in stretto collegamento con la notte oscura di Giovanni della Croce. Ma contemporaneamente, in Oriente e in Occidente, a lui ci si rivolse per conoscere il mondo angelico e il senso della liturgia quale si presenta nella Gerarchia ecclesiastica. Il Paradiso di Dante non si può capire senza tener presente la ione Tana di Dio, luce che si riflette nelle diverse gerarchie angeliche e nei cieli che formano l'universo. E tutto questo non deve far dimenticare il ruolo svolto da Dionigi nelle controversie cristologiche fino al secolo VII.55 [grifo meu]

Muito embora para a maioria dos estudiosos, dantólogos ou não, seja evidente uma relação entre o Paraíso de Dante e o pensamento do pseudo-Dionísio, não há total convergência sobre isso. Nesse sentido, cabe ressaltar uma posição diferente sinalizada por Sbacchi. O autor põe em evidência que na Enciclopedia dantesca, organizada por Umberto

54 GARDNER, Edmund Garratt. Dante s Ten Heavens. A Study of the Paradiso . New York: Haskell House 1970, pp. 20-25, apud SBACCHI, Diego. La presenza di Dionigi Areopagita nel Paradiso di Dante. Florença: Leo S. Olschki Editore, 2006, p. XIX.

55 BELLINI, Enzo. Saggio introduttivo. In: D)ON)G) L AREOPAG)TA. Tutte le opere. Piero Scazzoso e Enzo Bellini (Orgs.). Introdução de Giovanni Reale. Edição bilíngue. Milão: Bompiani, 2009, pp. 42- . Na tradição ocidental, pelos menos a partir da época dos mestres vitorianos, Dionísio foi considerado como mestre de teologia mística. E tal papel, em um primeiro momento, foi entendido no sentido de que ensinava a descobrir na Sagrada Escritura as coisas últimas (era o mestre por excelência da anagogia); mais tarde, na época moderna, especificamente na tradição carmelitana, Dionísio foi a referência para descrever as experiências da vida espiritual. A suas reflexões sobre a treva divina foram lidas em estrita ligação com a noite obscura de João da Cruz. Mas, contemporaneamente, seja no Oriente seja no Ocidente, ele foi a referência para o conhecimento do mundo angélico e o sentido da liturgia, assim como se apresenta na Hierarquia Eclesiástica. O Paraíso de Dante não se pode entender sem levar em conta o íon Cova de Deus, luz que se reflete nas diversas hierarquias angélicas e nos céus que forma o universo. E tudo isso não deve fazer esquecer o papel desenvolvido por Dionísio nas controvérsias cristológicas até o fim do século V)) . [traduç~o minha] [grifo meu].

Bosco (Roma, Istituto della Enciclopedia Italiana, 1970-1978), a Cristiani56

, no nome „Dionigi‟, por ela curado,

considera che l‟influenza dell‟Areopagita [ è ] “senz‟altro da escludere per due ragioni”: la prima è la totale estraneità della gerarchia celeste dionisiana all‟azione sulla natura, ovvero la gerarchia è pensata solo come mezzo di unione a Dio, non come motore dei singoli cieli. L‟altra ragione é la dottrina del simbolismo e della teologia negativa: l‟uno non è in Dante difforme dal proprio oggetto rappresentato, secondo l‟insegnamento di Dionigi, ma simile al suo referente e perciò positivo, facendo venire così a mancare il termine negativo della dialettica dionisiana affermazione-negazione. Inoltre l‟esperienza mistica non si compie nella negatività della tenebra, ma nella positività della Prima Luce. Pur seguendo la Cristiani nel suo ragionamento, il fatto che le posizioni di Dante su questi due aspetti non coincidano con quelle dello pseudo-Dionigi, non significa affatto che fra i due non possano esistere altri, magari più significativi se non addirittura decisivi, punti di contatto.57. Mestre de teologia mística e mestre por excelência da anagogia, o pseudo-Dionísio ensina a descobrir as coisas últimas e, certamente, de uma perspectiva neoplatônica cristã. A recepção de suas obras foi grande e douradora. Traduzidas e estudadas por muitos, as obras do pseudo-Dionísio se tornaram ponto de referência no pensamento medieval. Embora não se conheça o legítimo autor das obras (por isso é chamado de pseudo-Dionísio), com Gadamer poder-se-ia concordar que “O sentido de um texto supera seu autor não ocasionalmente, mas sempre. Por isso a compreensão não é nunca um comportamento somente reprodutivo, mas é, por sua vez, sempre produtivo.”.58 Entre os comentaristas mais próximos da época de Dante vale destacar Ugo da S. Vittore (1096-1141), o doutor dominicano alemão Alberto Magno (1200?-1280) e Tomás de Aquino.59. Cabe, aqui, sinalizar que no século XIII também Roberto

56 CRISTIANI, Marta. Dionigi. In: Enciclopedia dantesca. Umberto Bosco (org.), Roma: Istituto della Enciclopedia Italiana, 1970-1978, II, p. 461.

57 SBACCHI, Diego. La presenza di Dionigi Areopagita nel Paradiso di Dante. Florença: Leo S. Olschki Editore, , p. XX): considera que a influência do Areopagita deve ser excluída por dois motivos : primeiro, a total estranheza da hierarquia celeste dionisiana à ação sobre a natureza, ou seja, a hierarquia é pensada somente em termos de meio de união para com Deus e não como motor de cada um dos céus. Outro motivo è a respeito da doutrina do simbolismo e da teologia negativa: o um, para Dante, não é diferente do próprio objeto representado, conforme o ensinamento de Dionísio, mas semelhante ao seu referente e, portanto, positivo, fazendo faltar, com isso, o temo negativo da dialética dionisiana: a afirmação-negação. Além disso, a experiência mística não se realiza na negatividade das trevas, mas na positividade da Primeira Luz. Mesmo seguindo a Cristiani no seu raciocínio, o fato de que as posições de Dante, sobre estes dois aspectos, não coincidem com aqueles do pseudo-Dionísio, não significa absolutamente que entre os dois não possam existir outros, talvez mais significativos ou até decisivos pontos de contato. [traduç~o minha].

58 GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método. Tradução de Flávio Paulo Meurer. 3ª Ed. Petropólis: Editora Vozes, 1999, p. 444.

59 SBACCHI, Diego. La presenza di Dionigi Areopagita nel Paradiso di Dante. Florença: Leo S. Olschki Editore, 2006. pp. XV-XVI. Nesse estudo o autor produz também um importante quadro histórico da difusão dos escritos do pseudo-Dionísio e de suas traduções. Cabe destacar a analiticidade documentada do autor, ao nomear filósofos e eclesiásticos da cultura medieval que estudaram o pseudo-Dionísio, o quê denota a importância a ele atribuída.

Grosseteste (1168-1253) publica sua tradução e comentários ao corpus areopagítico, além de um tratado sobre a luz. Conforme marcado por Haroldo de Campos60, Grosseteste era conhecido por Guido Cavalcanti que entretece telas dialógicas com Dante.

Vimos antes com Scazzoso que o raciocínio, a partir de um desenvolvimento lógico e consequente, chega à inefabilidade do mistério. As vias percorridas por Dante são múltiplas, passando por Agostinho, que compreende o intellectus como o conceber racional feito por razão e coração, enquanto última praia do conhecimento; por Dionísio, que ao subir os íngremes degraus rumo às alturas do Uno e Trino, deixa o intellectus nas trevas continuando a

No documento – PósGraduação em Letras Neolatinas (páginas 37-73)