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PARTE II ESTUDOS EMPÍRICOS

CAPÍTULO 4. ESTUDO 1: ESTUDO DAS PROPRIEDADES

4.3. Método

4.3.2. Instrumentos

4.3.2.1. Questionário de Dados Pessoais (QDP)

As características sociodemográficas da amostra foram inquiridas através de um Questionário de Dados Pessoais (QDP) construído para o desenvolvimento global da presente investigação. Para o presente estudo (número 1) foram analisadas as seguintes informações sociodemográficas: idade; sexo; coabitação e rendimento escolar médio (Anexo B).

4.3.2.2. Inventário de Razões para Viver para Adolescentes (RFL-A)

O Inventário de Razões para Viver para Adolescentes (RFL-A, Reasons for Living Inventory for Adolescents) foi desenvolvido por Osman et al., em 1998, tendo como principal objetivo avaliar as razões para viver consideradas adaptativas e protetoras, i.e., que funcionam como “amortecedores” contra os atos suicidas (Osman et al., 1998) . Foi originalmente desenvolvido para ser aplicado a adolescentes, dos 14 aos 18 anos, embora mais recentemente tenham sido desenvolvidos estudos para ampliar a sua aplicação à faixa etária dos 13 aos 19 anos (Gutierrez & Osman, 2008).

É um instrumento de autorresposta formado por 32 itens. Cada item é classificado numa escala de tipo Likert com seis pontos, que variam de 1 (Nada importante) a 6

(Extremamente importante), sendo que a uma classificação mais elevada do grau de importância dos itens corresponde uma maior valorização das razões para viver.

A versão original do RFL-A (32 itens) foi submetida a análise fatorial exploratória e a análise fatorial confirmatória, das quais resultou a retenção de 5 fatores: (1) Otimismo sobre o futuro (OF); (2) Medo do suicídio (MS); (3) Aliança familiar (AF); (4) Aceitação e suporte pelos pares (ASP) e (5) Autoaceitação (AA).

A subescala OF é composta por sete itens (4, 11, 13, 19, 25, 28) que avaliam as expectativas sobre acontecimentos futuros (e.g., “Espero que muitas coisas boas me aconteçam no futuro”, item 13). A subescala MS inclui seis itens (2, 8, 20, 21, 26, 32) delineados para avaliar as atitudes, receios, crenças e medos que “defendem” os adolescentes dos atos suicidas (e.g., “Tenho medo de me matar”, item 26). A subescala AF é formada por sete itens (1, 7, 12, 17, 23, 24, 30) destinados à avaliação dos fatores familiares, que funcionam como atenuantes do risco de atos suicidas (e.g., “Sempre que tenho um problema, posso contar com a minha família”, item 1). A subescala ASP integra seis itens (5, 6, 10, 16, 22, 27) que avaliam a crença de que os pares e os amigos representam recursos importantes para o desejo de viver (e.g., “Eu sinto-me amado e aceite pelos meus amigos mais próximos”, item 6). A subescala AA é constituída por seis itens (3, 9, 14, 18, 29, 31) orientados para avaliar a autoimagem percebida que serve de atenuadora para os atos suicidas (e.g., “Eu gosto de mim como sou”, item 9).

Os coeficientes alfa de Cronbach estimados nos vários estudos da investigação original do RFL-A demonstram valores adequados de consistência interna para o RFL-A total e subescalas – todos os coeficientes são superiores a .8926.

A validade de constructo foi suportada pelas correlações negativas e moderadas com a Escala de Desesperança de Beck (Beck et al., 1974) e com a Escala de Depressão do BSI (Derogatis, 1992). A validade concorrente foi assegurada pelas correlações negativas moderadas significativas registadas entre as subescalas e o total do RFL-A com os índices do SBQ (Linehan & Nielsen, 1981) assim como do SPS (Cull & Cull, 1982) (Osman et al., 1998).

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Estudo 1 (N = 350): RFL-A subescalas OF (α = .91), MS (α = .93), AF (α = .93), ASP (α = .89) e AA (α. = 93); RFL-A total (não disponível); Estudo 2 (N = 654): RFL-A subescalas OF (α = .92), MS (α = .93), AF (α = .94), ASP (α = .89) e AA (α = .94); RFL-A total (α = .96); Estudo 3 (N = 442): RFL-A subescalas OF (α = .94), MS (α = .94), AF (α = .94), ASP (α = .92) e AA (α. = .95); RFL-A total (não disponível).

A validade preditiva foi garantida, posteriormente, ao constatar-se que o RFL-A permitiu diferenciar (a) os adolescentes da população não-clínica dos adolescentes com comportamentos suicidas admitidos no serviço de Psiquiatria e (b) os adolescentes admitidos na Psiquiatria sem comportamentos suicidas daqueles que foram admitidos com comportamentos suicidas.

Em relação à cotação, o RFL-A permite obter uma pontuação total e uma pontuação para cada subescala. A pontuação total do RFL-A corresponde à média, i.e., ao somatório dos 32 itens a dividir por 32. A pontuação de cada subescala corresponde à média da mesma, ou seja, à soma das respostas nos respetivos itens a dividir pelo número de itens dessa subescala. Quanto maior for a pontuação numa subescala, maior é a frequência de ocorrência dos eventos avaliados pela mesma, ou seja, pontuações elevadas no RFL-A sugerem que as pessoas têm fortes razões adaptativas para não se matarem a si próprias quando se confrontarem com situações complicadas (Osman et al., 1998) (Anexo C).

4.3.2.3. Escala de Desesperança de Beck (BHS)

A Escala de Desesperança de Beck (BHS), desenvolvida por Beck, Weissman, Lester e Trexler, em 1974, tem como principal objetivo avaliar os sintomas de desesperança sobre eventos futuros. É uma escala de autorresposta com vinte itens e com um formato de resposta dicotómico.

A escala apresenta onze itens referentes à desesperança e nove itens que dizem respeito à esperança. Após a inversão dos itens adequados, a pontuação total da escala é obtida pelo somatório de todos os itens, podendo variar entre 0 e 20 valores. Quanto mais elevado for o valor obtido, maiores serão os níveis de desesperança, sendo que o valor 9 equivale ao ponto de corte para risco de suicídio.

O estudo original identificou três fatores na estrutura interna da escala: (a) sentimentos sobre o futuro; (b) falta de motivação e (c) expetativas futuras, que em conjunto explicaram 53.5% da variância.

Esta escala registou também boa consistência interna no estudo original, com um coeficiente alfa KR-20 de .93, o que indica a sua fiabilidade. Os resultados encontrados ao nível da validade – concorrente e de constructo – foram também bastante satisfatórios (Beck et al., 1974).

A BHS tem sido assaz utilizada a nível mundial, registando propriedades psicométricas razoavelmente satisfatórias em múltiplos estudos (e.g., Chang, Dzurilla, & Maydeuolivares, 1994; Holden & Fekken, 1988; Pompili, Tatarelli, Rogers, & Lester, 2007).

Em Portugal, a Escala de Desesperança de Beck foi validada por Cruz (2000), tendo reproduzido a estrutura fatorial do modelo original e obtido boa consistência interna (KR- 20 = .90). As propriedades psicométricas, ao nível da validade e da fiabilidade, da versão portuguesa foram consideradas satisfatórias (Cruz, 2000).

No presente estudo, o coeficiente alfa estimado da BHS (KR-20) foi de .72 (intervalo de confiança a 95% entre .49 e .97 e a média da correlação inter-item foi de .23) (Anexo D).

4.3.2.4. Questionário de Ideação Suicida (QIS)

A versão original do Questionário de Ideação Suicida (QIS) – Suicide Ideation Questionnaire – foi desenvolvida por Reynolds, em 1988 (Reynolds, 1991), e adaptada para a população portuguesa por Ferreira e Castela (1999).

O QIS tem por objetivo avaliar a gravidade dos pensamentos bem como cognições suicidas em adolescentes e jovens adultos, podendo ser aplicado individualmente ou em grupo. O tempo de preenchimento é de aproximadamente 10 minutos.

Este questionário de autorresposta é composto por trinta itens, que apresentam sete alternativas de resposta, a saber: 0 (Nunca tive este pensamento); 1 (Pensei nisto, mas não no último mês); 2 (Cerca de uma vez por mês); 3 (Duas vezes por mês); 4 (Cerca de uma vez por semana); 5 (Duas vezes por semana) e 6 (Quase todos os dias). O respondente assinala, portanto, cada item numa escala de 0 a 6 pontos, sendo a pontuação total obtida através do somatório do valor de todos os itens. Os resultados obtidos no QIS podem variar entre o mínimo de 0 e o máximo de 180 pontos, sendo que a uma maior frequência de pensamentos suicidas corresponderá uma pontuação mais elevada no questionário.

Os estudos sobre a fiabilidade do instrumento na versão portuguesa incluíram a análise da consistência interna (alfa de Cronbach) e da estabilidade temporal realizada através do método teste-reteste. Os resultados sobre a consistência interna revelaram um coeficiente alfa de Cronbach no valor de .96 e sobre a estabilidade temporal um coeficiente de correlação entre as duas aplicações no valor de .76.

Os estudos relativos à validade do instrumento incluíram a validade concorrente, divergente e de constructo. A validade concorrente e divergente, determinadas através da relação com os resultados do Inventário da Depressão de Beck (correlação positiva) e a Escala de Autoestima de Rosenberg (correlação negativa), mostraram que o instrumento apresenta estas duas qualidades. A validade de constructo, medida através da análise fatorial exploratória, permitiu identificar três fatores que explicaram 55.7% da variância total.

Ao nível do estudo da validade do instrumento, a análise fatorial exploratória realizada pelos autores sugere a existência de três fatores, porém os conteúdos dos mesmos não coincidem exatamente com os do estudo original (Ferreira & Castela, 1999). No presente estudo, o coeficiente de correlação item-total corrigido oscilou entre .498 (item 8) e .816 (item 14) sugerindo uma boa validade interna dos itens; o coeficiente alfa de Cronbach obteve um valor de .96, indicando uma consistência interna muito boa (Anexo E).