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Anexo III – Notas de Campo 6

8. Instrumentos Expressivos – Ana 34

A sessão individual com a Ana foi muito interessante.

Inicio com o “círculo de amigos”. Ela entendeu que seria para identificar o grupo de amigos e não seus os nomes. No círculo interior, indica primeiro os técnicos da instituição. Relativamente a estes, afirma ter mais pessoas, mas de momento não se recorda. Quanto aos utentes do Lar, comenta que são todos amigos, no entanto, só escreve alguns e coloca reticências. Sinaliza, ainda neste círculo, alguns nomes a preto que correspondem aos amigos da universidade. Não tendo mais espaço, assinala fora do círculo outros amigos e diz não pertencerem à universidade.

Já o segundo círculo é preenchido somente a preto. Questiono-a se não terá alguém ligado à instituição. Refere a D. Glória e acaba por fazer um círculo azul em volta desse nome, uma vez que já estava identificada.

Achei curioso o círculo de participação, pois não identifica ninguém, nem mesmo do núcleo de Letras, onde tinha a função de tesoureira, nem do ginásio, nem da biblioteca. Em contrapartida, no círculo de troca já identifica algumas pessoas, sem apresentar grande dificuldade. Tem a mesma pessoa em dois círculos, Isabel Silva (proprietária do salão de cabeleireira) e afirma ser muito próxima.

No círculo da intimidade identifica muitas pessoas quer do Lar, funcionários crianças e jovens, amigos da universidade e de outros serviços.

Participantes: Ana

Data: 2ª feira, 16 de setembro de 2013

Local: Apartamento de Autonomização (sala) Hora: 10:00h – 10:30h Técnica: Instrumentos Expressivos – Círculo de amigos e Linguagem musical

Dando por terminada a primeira atividade, prosseguimos para a segunda – Linguagem musical.

Depois de explicar o que pretendo, imediatamente ela pede para buscar o telemóvel, pois “assim é mais fácil.” Chegada à mesa, vai de imediato ao youtube procurar uma música da Beyoncé e indica-a como a principal. Não se lembrando de outra música em particular, resolve procurar no facebook, “com certeza tinha-a publicado”, afirma ela.

Entretanto, quer transcrever uma parte da letra que publicou no facebook. Diz que esta carateriza a sua vida. De seguida, indica uma música específica para o seu ingresso na universidade: “Viseu graciosa”. Na parte dedicada ao momento da entrada na Instituição, refere não se recordar de uma música em especial, pois nessa altura não lhe dava muita importância. Recorre à play list do telemóvel e procura mais músicas para o segundo momento – amigos na instituição. Ao ouvir a música “ De zero a heróis” diz que “tem a ver com o pessoal lá de casa, porque passaram de zero a heróis.”

Continua a procurar e encontra outra, “Estranhos como eu”, e coloca-a no primeiro momento, uma vez que “era uma estranha quando cheguei à instituição”. Refere que a casa estava cheia quando chegou e não conhecia ninguém. Só se lembra da mãe a chorar, quando veio. A Ana não chorava, pelo contrário, só queria ir-se embora. Ao passar mais uma música, “Hakuna matata”, diz logo que também se encaixa, só não sabe onde. Quando ouve a letra: “pra sobreviver é preciso aprender” identifica-a logo para o primeiro momento.

A par da música, fala do episódio de uma fuga do Lar. Identifica-a como “foi uma fuga gira e não deixei por menos, fui

A entrada no Lar proporciona caminho para chegarem a heróis, serem alguém na vida, um caminho orientador para um futuro promissor.

Ao entrar no Lar sentia-se como uma estranha.

O Lar permitiu desenvolver aptidões de sobrevivência.

Promessas falsas da família biológica levam à fuga do Lar.

a tribunal”. Este episódio aconteceu quando ela tinha cerca de 14 anos, no dia 6 de Janeiro de 2004. Nesse dia, deixou a Alexandra na escola porque ela lhe tinha pedido. Foi ter com a mãe para irem a tribunal dizer que queria ir-se embora. Justifica-se com o facto de a mãe lhe fazer muitas promessas falsas. Como eram muito chegadas, acreditava, pois não via muito bem as coisas. Comenta que “não fugi e fiquei por lá, tinha que fazer a coisa certa, ir a tribunal…”. A sua fuga foi de um dia, ao final da tarde. Depois voltou e nunca mais repetiu. O tribunal contactou a Instituição, pois ela tinha ido lá pedir para ir-se embora. Quando foi a tribunal, na sexta-feira, 7 de janeiro, chorou muito, assim como toda a gente no tribunal, segundo diz. A Ana acrescenta que: “gostava muito de estar cá mas queria estar com a minha mãe e a instituição ao mesmo tempo. Queria que, quando estivesse mal num sítio ia para outro, quando estivesse mal noutro ia para o outro.” Comenta que, naquela altura, até pôs o advogado dela e a escrivã da juíza a chorar. A própria juíza se emocionou.

Desse dia, diz ter chorado toda a tarde e noite. Diz que o procurador falou com ela como se se tratasse de um adulto e não uma criança, o que realmente era. Chocou-se, embora soubesse que o que ele havia dito sobre sua mãe era verdade. Já na sala da juíza, quando entram a Dra. Maria, a mãe e a assistente social, diz que a primeira pessoa a quem se agarrou a chorar foi à Diretora.

Após ter saído da sala para se acalmar, o procurador perguntou- lhe porque é que ela se tinha agarrado à Doutora uma vez que queria ir embora. Esta pergunta tocou-a muito, diz ter sido então que “fez click” pensou melhor.

Queria estar na Família e no Lar ao mesmo tempo

Laços afetivos- abraçou primeiro a Dra. Maria (impacto positivo do papel da Diretora na sua vida).

Consciência da verdade acerca das falsas promessas da mãe.

Refere que lhe deram autorização para passar os fins de semana com a mãe, tirar um dia com ela até aos 18 anos, “ia visitar-me todos os domingos e sempre que eu estivesse doente, ligava- me.” Depois diz ter desistido de a visitar, apesar de serem muito ligadas, “a determinado momento da minha vida, comecei a perceber que tudo o que ela me dizia não batia certo.”

Enquanto relatava este episódio foi acrescentando mais músicas, duas no segundo momento e mais uma no terceiro momento. Por fim, comenta que eu levo muitas músicas para ouvir…

Confesso ter passado um bom tempo com a Ana. Fomos ouvindo as músicas e partilhando algumas histórias, até mesmo algumas risadas. Hoje experimentei, com sucesso, o que se pretendia com esta atividade, um ambiente de descontraída comunicação.

Visitas familiares – fins de semana, um dia a mais até aos 18 anos; se ela estivesse doente a mãe ligava. A certa altura deixa de visitar a mãe.