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Inteligência emocional – a origem do conceito

No documento RELAÇÕES INTERPESSOAIS (páginas 71-80)

CULTURA ORGANIZACIONAL

6.1 Inteligência emocional – a origem do conceito

CAPÍTULO 6

INTELIGÊNCIA EMOCIONAL E RESILIÊNCIA

Talita Raquel de Oliveira

A razão e a emoção são vistas como antagônicas, demonstra a visão do filósofo Descartes (1596-1650), que separava o corpo da mente.

Ou você escolhe pela emoção, o que em nossa sociedade é visto como fraqueza e diretamente ligado ao estereotipo da mulher, sensível e delicada, ou você é forte e decidido e opta por realizar suas escolhas pautadas na razão, culturalmente ligado ao masculino. Sabe-se que no ambiente corporativo é mais aconselhável optar-se por escutar a voz da razão nas decisões; porém, mesmo assim, também sabe-se que a racionalidade é limitada (SIMON, 1979), o que coloca por terra a força onipresente da razão. Não é a razão que leva o indivíduo à ação, mas sim a emoção, afirma Maturana (2001), de forma que a maturidade emocional deve ser buscada. Mas afinal, o que é inteligência emocional?

Nem oito, nem oitenta, o equilíbrio entre razão e emoção deve ser uma busca para quem procura fugir dos estereótipos e ser inteligente emocionalmente.

emocional (QE) na vida das pessoas é apresentada por Goleman (2007) quando ele afirma que “aqueles indivíduos que conseguem gerenciar suas vidas emocionais com mais serenidade e autoconsciência parecem ter uma vantagem clara e considerável na saúde”. De forma que o conceito não abrange somente questões isoladas, como decisões entre ser racional ou emotivo no trabalho. É muito mais que isso. Esse auto controle está diretamente ligado ao ser humano como um todo, em sua integralidade em todas os seus papéis.

Não há necessidade de colocar-se grau de importância nos dois tipos de inteligência, pois cada um tem o seu papel. Miranda (1997) afirma também que as inteligências (QI e QE) são complementares e não devem estar em grau de importância, pois dependendo do tipo de decisão a ser tomada o individuo escolherá qual acionar. Dificilmente uma pessoa se casará com alguém por uma escolha racional, pois o amor é um sentimento regido pela emoção e dificilmente alguém fará um cálculo que definirá a estrutura de um prédio baseado nas emoções. Há uma divisão clara da oportunidade de cada uma das inteligências se manifestar e por isso é importante que ambas estejam bem desenvolvidas internamente.

No caso da IE, é importante que seja desenvolvida pois ela é primordial no trato com outras pessoas (MOSCOVICI, 1997).

A seguir (Quadro 1) apresenta-se o conceito de inteligência emocional na visão de quatro autores:

Quadro 1 – Conceitos de inteligência emocional

Autor Conceito principal sobre IE Elemento

central Daniel

Goleman (1997)

Determina o potencial para aprender os fundamentos do autodomínio, é a competência emocional que mostra o quanto desse potencial domina-se de maneira que ele se traduza em capacidades profissionais.

Controle das emoções e do impulso.

Fela Moscovici (1997)

A competência emocional constitui uma série de aspectos emocionais que estão incluídos na competência interpessoal. E é decorrente de treinamento, desenvolvimento e educação.

Desenvolvimento da competência emocional.

Roberto Lira Miranda

Refere-se aos dois tipos de inteligência, pois o intelecto não pode dar o melhor de si sem a

Desenvolvimento das aptidões

(1997) inteligência emocional. mentais.

Eduardo Soto (2009)

Descrição das funções cerebrais e mentais referentes às emoções.

Controle emocional.

Fonte: elaborado pela autora.

Para Goleman (1997), a inteligência emocional pode ser tratada como uma competência de controle das emoções e dos impulsos.

[...] a capacidade de criar motivações para si próprio e de persistir num objetivo apesar dos percalços; de controlar seus impulsos e saber aguardar pela satisfação de seus desejos; de se manter em bom estado de espírito e de impedir que a ansiedade interfira na capacidade de raciocinar, de ser empático e autoconfiante (GOLEMAN, 2007, p. 58).

A utilização do termo competência emocional é uma maneira de afirmar que é difícil medir o QE de alguém; não se sabe como medir a variação entre os indivíduos (GOLEMAN, 2007; MOSCOVICI, 1997). E, na verdade, saber utilizar de maneira adequada a IE nas mais diversas situações da vida é uma competência em movimento que contempla o controle das emoções, dentre elas o impulso, que é a emoção traduzida em ação, isto é, sem pensar.

Assim como Moscovici (1997), Goleman (2007) afirma que a capacidade de autocontrole é a maneira mais adequada para se lidar com os conflitos, pois entrar na emoção do outro pode ser extremamente prejudicial as relações interpessoais. Se alguém está furioso, de nada adiantará ficar furioso também. É neste ponto que deve-se buscar o equilíbrio entre o QI e o QE, enxergando a situação sob outro paradigma.

Segundo Goleman (2007), a raiva atrai raiva, dessa forma, buscar distrair-se e não pensar no que o tira do sério pode distrair-ser o caminho para a solução de um problema.

O mesmo se fala para pessoas depressivas e tristes. Coisas como sair do contexto em que estão para buscar pequenas vitórias pessoais que levantem o moral podem ajudar essas pessoas. Na sociedade em que vivemos há duas afirmações que prejudicam a competência emocional. A primeira é a que diz que chorar faz bem e que o sofrimento

fortalece a alma. Segundo Goleman (2007), essas são falácias que provocam o efeito contrário ao desejado, pois pessoas que choram ruminam os sentimentos ruins, relembrando do que as fez sofrer, o que traz, assim, instabilidade emocional. Claro que não há como ser feliz e alegre o tempo inteiro, pois isso não é verdadeiro nem saudável; porém o equilíbrio deve ser buscado nas situações de tristeza e de alegria, pois são esses momentos que temperam a vida (GOLEMAN, 2007).

Nesse sentido, o controle das emoções passa obrigatoriamente pelo controle dos pensamentos. Muito se fala em livros de autoajuda sobre como o pensamento atrai “energias”, uma afirmação que, para os mais céticos, soa como clichê quando não como uma tremenda bobagem.

Porém, segundo Goleman (1997), a questão principal relacionada aos pensamentos se refere àqueles de preocupação exagerada ou aos negativos que surgem sem motivação aparente, sem que as pessoas queiram. Para lidar com essa questão, os indivíduos devem seguir o conselho popular de “não se preocupar”, pois a atração que a preocupação trás de emoções negativas vai afetar o individuo prejudicando inclusive a sua cognição (GOLEMAN, 2007). Esse conselho serve para todos os tipos de emoções negativas, como tristeza, melancolia, raiva etc.

Moscovici (1997) fala que a questão do controle das emoções já é tratada desde a infância, e que Freud afirmava que, para o bom desenvolvimento das pessoas, era necessária a substituição do prazer imediato pela realidade. Uma criança quando se socializa na pré-escola aprende isto, que deve dividir os brinquedos e que nem tudo o que ela quer pode ser feito na hora em que ela deseja. É o que os adultos enfrentam o tempo todo. O mundo diz “não” para nossos anseios e cabe a cada um lidar com as situações negativas da vida de forma positiva e madura, analisando o que pode fazer para atingir seus objetivos individuais. Sabe-se que na maioria das situações as oportunidades são apresentadas a quem estiver melhor preparado e não somente a alguém que “quer” aquela oportunidade. E muitas vezes, mesmo estando preparado a oportunidade não chega, é a frustração inerente à vida que deve ser encarada com maturidade.

O desenvolvimento da competência emocional passa por uma autoanálise que só é possível pelo autoconhecimento e pela aceitação das próprias emoções, o que começa a ser trabalhado na infância. Não é

a toa que muitos exemplos apresentados na obra de Goleman (2007) têm origem nesse estágio da vida. Desenvolver é também treinar a competência em questão. Logo, ser inteligente emocionalmente perpassa pela capacidade de resolver problemas, inclusive os emocionais.

Para Miranda (1997), a inteligência emocional pode ser desenvolvida através do exercício das aptidões mentais, que só é possível através de um conhecimento do funcionamento neurológico do cérebro. O autor refere-se a importância do conceito das inteligências múltiplas de Gardner (2007), que possibilita ampliar o leque no desenvolvimento da inteligência emocional, que será apresentado mais detalhadamente no item 6.1.2 sobre a aptidão mestra.

O controle emocional é primordial para o sucesso nos relacionamentos, pois com ele será possível “[...] provocar mudanças transcendentais em nosso dia a dia e fazer com que nossas emoções trabalhem em benefício próprio, de tal forma que melhoremos nossa qualidade de vida” (SOTO, 2009, p. 2). O autor menciona que o QI influencia diretamente não só o comportamento do indivíduo, mas também da organização, pois esta sofre influência da cultura organizacional.

O conhecimento sobre como as emoções afetam o nosso dia a dia é o primeiro passo para a mudança de comportamento. É o controle emocional. E para que ele aconteça não se pode negar nem suprimir a existência das emoções. Aquele pensamento que algumas organizações e gestores têm sobre deixar os problemas do lado de fora da empresa é ilusória e pouco produtiva sob o ponto de vista da qualidade das relações.

O controle das emoções trás benefícios para quem o pratica e deve ser um exercício diário. É ilusório querer que o funcionário esqueça os problemas no horário de trabalho; por outro lado, o que ele pode fazer é aprender a gerenciar como essas questões influenciam seu dia a dia.

Essas são questões que permeiam as afirmativas dos autores vistos neste capítulo. Elas se referem a como exercitar o controle emocional sem nos colocarmos em situações constrangedoras e estressantes, ainda mais neste mundo repleto de mudanças aceleradas em que os indivíduos muitas vezes têm de se adaptar às novidades enquanto elas ainda estão ocorrendo. O importante é respeitar o tempo de cada um, não tratando as pessoas como, nem querendo que elas sejam, objetos que oferecem somente sua força de trabalho, sem emoção e

reflexão sobre o que fazem. O respeito à individualidade deve estar presente e o ambiente deve ser propício e acolhedor.

Sabe-se que a sociedade em que vivemos prioriza a razão e a masculinidade como força, deixando para trás as questões emocionais. Ir ao contrário desse pensamento é difícil, uma vez que ele é intrínseco a nossa cultura. Porém, se a organização quer um ambiente produtivo em que as relações interpessoais facilitem, e não dificultem, o alcance dos resultados, a mudança de paradigma se faz necessária. No entanto, todo o esforço só fará sentido se particularmente o indivíduo se abrir para acessar suas emoções e se pré-dispor a lidar com as mesmas, aceitando suas características, trabalhando as dificuldades empaticamente com os demais.

Finalmente podemos acrescentar que, ao usar nossas emoções para reforçar nossos resultados e nossas relações no trabalho, temos não só o desafio de fomentar, mas o de inspirar o desenvolvimento da inteligência emocional entre os empregados da empresa (SOTO, 2009, p. 6).

Então, é um benefício para a organização, e de certa maneira até um de seus deveres, desenvolver as pessoas que nela trabalham, não só tecnicamente, mas também no seu comportamento.

6.1.1 Aptidão mestra

A aptidão mestra tem relação com a resiliência, pois ambas tem conceitos focados no positivo, no enfrentamento das dificuldades com otimismo.

A aptidão mestra está relacionada diretamente a capacidade de aprendizagem do indivíduo. Segundo Goleman (2007), as emoções podem dominar a concentração, prejudicando a memória funcional, que é aquela capacidade de lembrar de coisas importantes para executar uma determinada tarefa. O estado emocional, nesse caso, influencia diretamente no nosso desempenho acadêmico e profissional.

Um exemplo típico disto é quando se está com algum problema

pessoal, como algo financeiro, por exemplo, e a tendência é pensar muito sobre o assunto buscando soluções, seja antes de dormir, assistindo televisão, tomando banho ou nas relações com os familiares e, claro, no trabalho. Esse desvio de foco prejudica o desempenho do indivíduo em outras atividades que não se relacionem com o problema enfrentado.

6.1.2 O controle emocional e a impulsividade

Sendo a competência emocional um dos aspectos mais importantes para o sucesso do indivíduo nas relações interpessoais, é importante que se saiba como ter controle emocional. Nesse quesito, a impulsividade pode ser uma das suas maiores inimigas.

Mas, afinal, o que é essa força que mexe tanto com as pessoas? O teste do marshmallow pode ser um bom exemplo para ilustrar a questão.

Este teste foi realizado com crianças de quatro anos e consistia em oferecer-lhes um marshmallow que deveria ser degustado somente quando a pessoa que conduzia o teste retornasse. Se assim ocorresse, a criança ganharia um doce extra; se comesse antes do retorno, não ganharia outro, ficando somente com um marshmallow, ou seja, aquele que ela já teria comido. Esse teste foi iniciado na década de 1960 pelo psicólogo Walter Mischel e perdurou até as crianças terem ido para o ensino médio.

Os resultados do teste do marshmallow são muito interessantes. As crianças que resistiram ao retorno da pesquisadora se tornaram jovens mais competentes nos seus propósitos, assertivos e eficazes, pessoas que conseguiam lidar bem com as frustrações. Já os que não conseguiram controlar seus impulsos comendo de imediato o marshmallow apresentaram um perfil psicológico mais problemático (GOLEMAN, 2007).

Esse teste simples demonstra que é necessário controlar o impulso para se alcançar uma meta. Observa-se isto em muitas situações do dia a dia, como fazer uma dieta, poupar para fazer uma viagem ou até controlar palavras para não haver arrependimentos nem mágoas futuras.

Algumas pessoas são muito bem sucedidas profissionalmente e intelectualmente, mas não conseguem se relacionar de forma tranquila com as pessoas a sua volta. Ficam taxados de “malas”, “rudes”, “grossos”, deixando inclusive as outras pessoas com medo de se aproximar. Pois bem, há, sem sombra de dúvidas, uma competência emocional a ser desenvolvida nesses casos. Mas para que isso ocorra, o individuo deve admitir o problema e querer resolvê-lo, pois se ele não acredita que seus comportamentos o prejudicam, ele não vai se abrir para o autoconhecimento e para a consequente busca do controle emocional.

Uma das maneiras de abordar esse indivíduo é por meio do feedback, que deve ser realizado pelo gestor imediato se esse for realmente comprometido com os membros da sua equipe.

6.1.3 Como desenvolver a IE?

“Temperamento pessoal não é destino” (MOSCOVIVI, 1997, p.

55).

Todos são capazes de desenvolver a competência emocional, basta querer e buscar se conhecer, acessando as próprias emoções de maneira sadia. Já dizia Sócrates “Conhece-te a ti mesmo”, como trazido por Goleman (2007), o que revela que este é o ponto principal para o indivíduo entender melhor seus sentimentos. Essa consciência do que se passa no interior emocional é atingida através da autovigila, observando atentamente como os acontecimentos afetam o dia a dia e consequentemente como se sente em relação a isto. A busca pode ser realizada com a ajuda de um terapeuta, mas é responsabilidade do indivíduo.

Assim como escuta-se popularmente, Goleman (2007) traz a questão da angústia emocional, que é apresentada ao indivíduo como uma dor física, mas que na verdade tem origem emocional na somatização.5 Por isso, deve se prestar atenção às mudanças de rotina que o nosso corpo apresenta. Insônia, por exemplo, normalmente está associada a preocupações.

Outro ponto que dificulta o desenvolvimento da competência emocional é o orgulho e a falsa ideia de que “voltar atrás” em uma decisão é sinônimo de fraqueza. Às vezes, nas escolhas mais pensadas, o resultado pode ser negativo. Diante disso, por que não pedir desculpas e reconhecer o erro? Isso é sinônimo de maturidade emocional. As organizações sabem disso, pois normalmente as pessoas são contratadas pelos seus conhecimentos técnicos e demitidas pelo seu comportamento, são as atitudes que fazem diferença. “A empresa que desenvolver melhor emocionalmente os seus empregados, terá uma posição competitiva mais avançada.” (MOSCOVICI, 1997, p. 46).

É muito comum nas organizações encontrar-se pessoas que não têm tanto conhecimento técnico, mas que mesmo assim conseguem resultados incríveis através da forma como se relacionam com as outras pessoas, ou da forma como articulam informações e competências. Tais pessoas sabem se comunicar e aceitam com naturalidade a contribuição de terceiros, sem medo de parecer incompetente por não ter as respostas imediatamente, pois sabem que ao articularem com outras pessoas sempre poderão ter recursos diferentes para buscar soluções que individualmente seriam mais difícil. Normalmente essas pessoas são líderes empáticos e bem quistos pela equipe.

Não são as normas, os padrões, os sistemas, mas sim o desenvolvimento da competência interpessoal de cada membro da equipe que vai proporcionar um atendimento adequado ao cliente (MOSCOVICI, 1997, p. 72).

Para desenvolver a competência emocional, o indivíduo deve olhar para si mesmo como um todo, e não analisando a sua vida de maneira isolada, como se o trabalho fosse uma área e a vida pessoal outra, pois viu-se que muitas pessoas são sucedidas profissionalmente mas em suas vidas pessoais amarguram a insatisfação. Goleman (2007) fala desse olhar interior como sendo uma busca pela inteligência espiritual, reencontrar a fé, as crenças, que podem ser variadas e que ajudam o indivíduo a se encontrar em sua plenitude.

Moscovici (1997) fala em desenvolvimento pessoal a partir de um modelo holístico que contempla o lado físico, que seria atingido por meio do cuidado com o corpo, regulando a alimentação e praticando exercícios;

o lado emocional, que seria o controle das emoções e da consciência do que se sente, do que é mental, por meio de boas leituras e pensamentos;

e o espiritual, que é o menos acessado e o mais difícil, pois é relacionado às crenças e à religiosidade, que estaria na pirâmide de Maslow associado a auto realização, no topo da pirâmide, relacionado a transcendência (MOSCOVICI, 1997).

Outro aspecto que pode auxiliar nessa busca de desenvolvimento holístico da competência emocional é receber feedback, ouvindo atentamente, sem resistência, para que se possa ter uma fotografia clara de seus comportamentos e atitudes. Mas é importante que nesse processo não se busquem culpados, mas sim que se analise friamente a situação a fim de verificar em que ponto se pode atuar de maneira diferente, se isso for possível.

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