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CAPÍTULO III: ANÁLISE DOS DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

3.3 Percepções dos examinandos e examinadores em relação a algumas dificuldades

3.3.4 EPs que podem apresentar dificuldades de interpretação

3.3.4.2 Interação EP 1 – Aperto de mão

A interação a seguir foi desenvolvida entre o E19, um examinando francês com o AI5. Esse examinando obteve certificação em nível intermediário superior no exame Celpe- Bras.

1 AI5: Sim? 2 E19: Sim

RI: O que você entende por “Saiba fazer dele (o aperto de mão) um bom começo?

3 AI5: É:: Eu queria que você me explicasse (+) se você concorda com:: com a expressão de 4 que 4(+) saber (+)fazer do aperto de mão (+) um bom começo (+) é importante

5 E19: (+) Sim (+) pra mim é sim eu acho muito importante (+) do ponto da educação (+) de 6 cumprimentar (+) cumprimentar outra pessoa:: de:: (+) assim na França nós somos muito 7 mais distantes (+) só aperto de mão no Brasil vai ter um aperto de mão:: vai dar um tapinha 8 no ombro

9 AI5: É diferente então?

10 E19.: é sim na França é distancia é aperto de mão firme forte e não é um aperto de mão mole 11 AI5: [[um apertinho

12 E19: [[ Principalmente]] para mim quando tô no trabalho todo mundo cumprimenta todo 13 mundo um pessoa entra na sala vem e tal começa a fazer cumprimentar e aí não

14 cumprimento ninguém? 15 AI5: Você sentiu isso?

16 E19.: Algumas pessoas (+) outras não (+) depende das pessoas 17 AI5: Porque nesta imagem o ambiente parece mais (+)formal não?

18 E19.: É mais formal mais (+) sei lá (+) a foto é estranha (+) uma mão de:: de homem uma mão 19 de:: de criança parece (+) ou de::

20 AI5: talvez de mulher não? 21 E19.: ou de mulher

22 AI5: Então você acha que há diferença entre homens e mulheres em relação a esse primeiro contato 23 (+) a esse cumprimento?

24 E19: Não

25 AI5: Nem na França nem no Brasil?

26 E19.: Não acho que as mulheres têm tendência a um aperto de mão ainda mais forte e mais 27 firme

28 AI5: Aqui no Brasil (+) ou na França? 29 E19: Não na França

30 AI5: Na França? 31 E19.: Na França

32 AI5: E a que se deve isso?

33 E19: Ah:: não sei acho que podia ser sobre a mostrar se uma mulher tem que tem caráter que tem 34 gênio forte acho que é alta e aqui vai ter um aperto de mão forte para mostrar que é igual não é 35 porque é uma mulher que

37 E19: de demonstrar que é importante assim

RI: Que outras formas de cumprimento são comuns em situações formais em seu país? E em situações informais? Dê exemplos.

38 AI5: Ok é:: informalmente você acha que há outras maneiras de:: de se cumprimentar (+) 39 fora do meio de trabalho digo

40 E19: Sim (+) sim tem tudo um oi:: mesmo de longe tem abraço tem com amigos próximos mais 41 abraços mais

42 AI5: E você sentiu diferenças (+) em relação:: por exemplo (+) em relação ao número de 43 beijos que se dá ? (+) É comum se beijar na França?

44 E19: ((ri)) sim muito 45 AI5: Homens e mulheres?

46 E19.: Homem e homem também quando tem afinidade muito importante (+) amigos que são 47 muito importante (+) todos os meu amigos a gente tá junto desde a infância e tal a gente a 48 gente se beija tá pronto mas:: se não um aperto de mão

49 AI5: E no Brasil os homens se beijam também? Você percebeu 50 E19: Não no Brasil não existe isso ((ri))

51 AI5: E porque você acha que não existe? 52 E19.: Ah não sei

53 AI5: Você acha que somos mais machistas?

54 E19: não sei mais machistas (+) mais a que ah:: dois homens se beijam ah:: vai ser:: 55 desculpa a expressão (+) é uma coisa de viado

56 AI5: Você chegou a ouvir algum comentário? 57 E19: É mais mais ou menos (risos)

58 AI5: Mais ou menos (+) OK é:: você já vivenciou alguma situação em que:: você se sentiu 59 constrangido com o aperto de mão (+) com este cumprimento

60 E19: Não

61 AI5: Não te assusta nem esse momento de epidemia de ebola 62 E19: Não não minha esposa que tá o dia inteiro no hospital 63 AI5: no hospital

64 E19: no meio de todo a gente tá se não a gente não ia viver 65 AI5: certo. Vamos para o segundo tema.

Figura 17: Roteiro de Interação Face a Face – EP 1

Fonte: Brasil (2014a)

Pelo excerto, mais uma vez notamos a importância da atuação do AI. Nesse caso, ao perceber que o E19 ficou em dúvida em relação à imagem, o próprio AI sugeriu tratar-se talvez de uma mão de mulher e aproveitou, sem mencionar ou insistir no entendimento da imagem, para fazer uma pergunta adicional, o que segundo Sakamori (2006) corrobora o estilo colaborativo do entrevistador.

Entretanto, as percepções dos examinandos 16 e 19 vão de encontro com a opinião do AI1, ao afirmar que o EP 1 foi o que mais gostou:

AI1: Por menos texto verbal e uma única imagem, isso permitiu uma leitura prática e, consequentemente, melhor desenvoltura dos candidatos, sendo primeiro ou último EP, para a interação na entrevista. Todos sabem falar desse gesto, seja pela ausência, formalidade, invasão ou cortesia, o cumprimento dessa forma nas culturas é um tema que suscita muita discussão e expressão de argumentos.

Nesse mesmo sentido, para o E9, o EP 1 também não apresentou dificuldades. Ao contrário, ele afirmou ter gostado desse EP, pois “é uma imagem que carrega o que fazemos cotidianamente. A imagem por si só já sugeria a sensação de ter passado pela experiência. Estimula a comentar de imediato e não necessariamente com ajuda do examinador”.

Levando-se em consideração os comentários citados, entendemos que uma das causas da dificuldade em relação a esse EP, por parte do E19, pode ser uma questão de leitura. Conforme já discutimos, a leitura dos EPs envolve ler imagens também. Segundo Costa (2014), esta é uma condição essencial para que a compreensão efetivamente ocorra.

Ao compararmos o Roteiro de Interação Face a Face com a transcrição da interação notamos que o AI praticamente não o seguiu. Ele fez apenas a pergunta da etapa 2 e uma pergunta da etapa 3. O AI fez mais perguntas adicionais (SAKAMORI, 2006) e utilizou- se, também, de estratégias de desdobramento (FURTOSO, 2011) em função de algumas respostas breves do examinando e às vezes, por estar realmente interessado na conversa, o que contribuiu para que fosse o mais natural possível.

Ressaltamos, no entanto, que ao “sair” do roteiro, o AI facilitou a conversa, com questões de cunho pessoal, o que pode ter contribuído para o desempenho do examinando. Porém ao mesmo tempo, ele pode ter comprometido a confiabilidade do exame.