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A remediação de solos contaminados por diferentes tipos de poluentes é um tema relevante no que diz respeito à complexidade do processo devido à heterogeneidade do meio (PARK; PARK, 2010; ROMERO et al., 2011). Atividades relacionadas ao petróleo, como exploração, transporte e armazenamento, além de acidentes ou vazamentos em tanques e oleodutos subterrâneos, liberam resíduos de hidrocarbonetos, causadores de grandes poluições (PENG et al., 2008). Os contaminantes podem atingir águas subterrâneas, rios e oceanos, e depois serem ingeridos por seres humanos e outros organismos. Além disso, a maioria desses contaminantes é recalcitrante e persistente, dificilmente removidos por métodos convencionais de tratamento (PARK; PARK, 2010).

Os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs) constituem a classe mais importante de contaminantes orgânicos, gerados a partir da combustão e processamento incompleto de combustíveis fósseis, comumente relacionados às indústrias de petróleo, gás e madeira (PARK; PARK, 2010). Possuem estrutura molecular complexa e baixa solubilidade em água, assim tendem a adsorver em partículas sólidas gerando maior acúmulo de contaminação no solo.

A Agência Europeia do Meio Ambiente (EEA) relata a presença de quase 250.000 locais contaminados em toda a Europa, onde 13,3% da contaminação está relacionada ao grupo dos HPAs (EUROPEAN ENVIRONMENT AGENCY-EEA, 2017). No Brasil, de acordo com o Banco de Dados Nacional de Áreas Contaminadas criado pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), a maior proporção de contaminação por hidrocarbonetos está relacionada a postos de combustível.

Devido aos efeitos de toxicidade, mutagenicidade, carcinogenicidade e alterações na capacidade reprodutiva, os HPAs pertencem ao grupo de poluentes orgânicos perigosos, considerados onipresentes e altamente resistentes ao processo de degradação (PARK; PARK, 2010; LI et al., 2016; PELUFFO et al., 2016).

Diversas tecnologias têm sido estudadas para remediar áreas contaminadas por HPAs, como extração por solventes, técnicas térmicas, remediação biológica e eletrocinética, fitorremediação, degradação fotocatalítica e oxidação química (GAN; LAU; NG, 2009). O Processo Oxidativo Avançado (POA) é uma técnica promissora e eficiente para remover

poluentes orgânicos de áreas contaminadas por meio de reações químicas envolvendo radicais livres com alto poder oxidativo (ZHOU, 2017; LEMAIRE et al., 2019; ZHOU et al., 2019).

A oxidação química in situ (ISCO) surgiu como uma tecnologia de remediação eficaz entre os POAs. A ISCO é realizada através da injeção de oxidantes diretamente no local contaminado, a fim de converter os poluentes em compostos químicos menos nocivos, em vez de apenas transferi-los de fase (SRIVASTAVA; HUDSON; CASSIDY, 2016; TEEL; ELLOY; WATTS, 2016; BOUZID; MAIRE; FATIN-ROUGE, 2019; LEMAIRE et al., 2019). No entanto, a eficiência da ISCO depende das características do local, da escolha do oxidante e das propriedades dos contaminantes (LEMAIRE et al., 2013; PELUFFO et al., 2016).

Os oxidantes mais comumente aplicados na remediação de águas subterrâneas e solos contaminados são: peróxido de hidrogênio, permanganato de potássio ou sódio, persulfato de sódio e ozônio (ZHOU et al., 2019). Cada oxidante tem suas vantagens e limitações. O processo de oxidação mais utilizado e estudado é o Fenton, em que o peróxido de hidrogênio (H2O2) é ativado por íons ferrosos (Fe2+) gerando radicais hidroxila (٠OH, E° = 2,8 V), os quais são altamente reativos e podem degradar compostos orgânicos em altas taxas de reação (MARIN- MORALES; LEME; MAZZEO, 2009; ROMERO et al., 2011).

Entre os oxidantes mais usados, o persulfato atrai atenção especial devido às suas características relevantes visando uma ISCO. Os ânions persulfato (S2O82-), formados pela dissociação de sais de persulfato na água, são capazes de se espalhar por longas distâncias e persistir por semanas no subsolo (SILVA-RACKOV et al., 2017; GUERRA-RODRÍGUEZ et al., 2018). Além disso, a ativação do persulfato gera radicais sulfato (SO4-٠), fortes oxidantes (E° = 2,6 V) com vida útil mais longa, estável e seletiva em comparação com os radicais hidroxila (MARIN-MORALES; LEME; MAZZEO, 2009; BRIENZA et al., 2017; ZHOU, 2017).

Métodos de ativação convencionais por íons ferrosos envolvendo os oxidantes peróxido de hidrogênio e persulfato requerem baixo pH inicial, o que torna o processo desvantajoso devido ao impacto ambiental (DONG et al., 2018; ZHOU et al., 2019). A catálise heterogênea é uma alternativa para evitar a acidificação do meio, uma vez que pode ser aplicada em condições neutras (ROMERO et al., 2011). Além disso, os catalisadores heterogêneos possibilitam sua recuperação e reutilização após a reação, dependendo da forma de aplicação. Nos processos catalíticos heterogêneos por óxidos e hidróxidos de ferro, o ferro é estabilizado na estrutura porosa do catalisador e pode efetivamente ativar os oxidantes e produzir os radicais sem ajuste de pH (RAHIM POURAN; ABDUL RAMAN; WAN DAUD,

2014). Consequentemente, os óxidos de ferro têm sido utilizados em processos de oxidação como uma tecnologia vantajosa, quando comparada aos métodos tradicionais de ativação. Para a degradação de hidrocarbonetos de petróleo e outros poluentes orgânicos por oxidação química, a reação catalisada pela mistura de óxidos de Fe2+/Fe3+ foi mais eficaz em comparação com as reações catalisadas apenas por óxidos de Fe2+ (KONG; WATTS; CHOI, 1998; VIANNA et al., 2010; DA SILVA et al., 2015; SILVA-RACKOV et al., 2017).

Os mecanismos de reações heterogêneas para a ativação de reagentes de Fenton e persulfato foram investigados e continuam sob discussão (PHAM et al., 2009; USMAN et al., 2012b; PU et al., 2017; SILVA-RACKOV et al., 2017; ADITYOSULINDRO; JULCOUR; BARTHE, 2018; ZHOU et al., 2019). Os possíveis mecanismos já relatados envolvem radicais livres formados por espécies de ferro em superfície e por íons de ferro lixiviados na solução (via homogênea) (PHAM et al., 2009). Para as reações Fenton, Adityosulindro, Julcour e Barthe (2018) e Pham et al. (2009) relataram um terceiro mecanismo sem radical envolvendo espécies de ferro de alta valência na superfície do catalisador. Os mecanismos heterogêneos de reação com ferro em superfície para decomposição de peróxido de hidrogênio e persulfato são mostrados na Tabela 2. Contudo, a decomposição de H2O2 e S2O82- em valores de pH próximos a neutralidade é um processo que pode envolver predominantemente reações de ferro em superfície, uma vez que os íons de ferro permanecem dissolvidos apenas sob condições ácidas (PHAM et al., 2009).

Tabela 2. Mecanismos de reação heterogênea com óxidos de ferro para decomposição de peróxido de hidrogênio (H2O2) e persulfato (S2O82-); ≡ representa espécies de ferro na

superfície do catalisador.

H2O2 Equação Referência

Mecanismo homogêneo com radical

Fe2++H2O2→Fe3++OH-+HO∙ (7) a, b

Fe3++H2O2→Fe2++H++HO2∙ (8) a, b Mecanismo heterogêneo com radical

≡Fe(III)+H2O2→≡Fe(II)+ ∙O2H(∙O2-)+H+ (9) a, c ≡Fe(II)+H2O2→≡Fe(III)+ ∙OH+OH- (10) a, c

≡Fe(III)+ ∙O2H(∙O2-)→≡Fe(II)+O2(+H+) (11) a, c

∙O2H↔H++ ∙O2- (12) c

∙OH+H2O2→H2O+ ∙O2H (13) a, c

∙OH+≡Fe(II)→≡Fe(III)+OH- (14) a, c

∙OH+ ∙O2H(∙O2-)→O2+H2O(+OH-) (15) c

∙O2H+ ∙O2H↔H2O+O2 (16) c

Mecanismo sem radical

≡Fe(II)+H2O2→≡Fe(IV)+2OH- (17) a, c

≡Fe(IV)+H2O2→≡Fe(II)+O2+H+ (18) a, c

≡Fe(IV)+≡Fe(II)→2≡Fe(III) (19) a, c

S2O82- Equação Referência

Mecanismo homogêneo

Fe2++S2O82-→Fe3++SO4-∙+SO42- (20) d

Fe3++S2O82-→Fe2++S2O8-∙ (21) d SO4-∙+Fe2+→Fe3++SO42- (22) d S2O82-+2Fe2+→2Fe3++2SO42- (23) e

SO4-∙+S2O82-→SO42-+S2O8-∙ (24) d SO4-∙+H2O→SO42-+ ∙OH+H+ (25) d

∙OH+S2O82-→HSO4-+SO4-∙+ 1 2⁄ O2 (26) f

∙OH+S2O82-→OH-+ S2O8-∙ (27) d Mecanismo heterogêneo

≡Fe(II)+S2O82-→≡Fe(III)+ SO4-∙+SO42- (28) e

≡Fe(III)+S2O82-→≡Fe(II)+ S2O8-∙ (29) e ≡Fe(II)+SO4-∙→≡Fe(III)+ SO42- (30) e

Fonte: Elaborado pelo autor baseado em a - (ADITYOSULINDRO; JULCOUR; BARTHE, 2018); b - (CHENG et al., 2016); c - (PHAM et al., 2009); d - (PU et al., 2017); e - (ZHOU et al., 2019); f - (USMAN et al., 2012b).

As argilas são amplamente utilizadas na indústria devido à sua alta área específica, capacidade de troca catiônica e abundância natural, principalmente no Brasil. Além disso, são materiais de baixo custo, ecológico e apresentam característica reativa. Os minerais argilosos são relatados na literatura como eficientes suportes de catalisadores heterogêneos para reações de oxidação, principalmente para tratamento de águas subterrâneas contaminadas (BEL HADJLTAIEF et al., 2014; RAHIM POURAN; ABDUL RAMAN; WAN DAUD, 2014; GAO et al., 2016; WEI; WU; SUN, 2017; ZENG et al., 2017).

Catalisadores com ferro em sua estrutura podem ser usados em processos de oxidação, porém nem sempre o ferro é suficiente ou está acessível. Assim, outra abordagem é a incorporação de espécies ativas de ferro num suporte, e a argila pode ser empregada como suporte do catalisador (GAO et al., 2016; WEI; WU; SUN, 2017). Os catalisadores sólidos com óxidos de ferro produzem altas taxas de degradação de poluentes recalcitrantes (RAHIM POURAN; ABDUL RAMAN; WAN DAUD, 2014). Não foi encontrado nenhum estudo até o momento com avaliação de oxidação por processo heterogêneo com catalisadores de ferro à base de argila para remediação de solos contaminados com HPAs.

O objetivo desse estudo foi sintetizar e caracterizar um catalisador à base de argila com oxi-hidróxidos de ferro capaz de ativar os oxidantes persulfato de sódio (PS) e peróxido de hidrogênio (PH), para oxidação química de HPAs em solo contaminado. Assim, foi aplicada a ferramenta de planejamento experimental (DOE, do inglês design of experiments) para avaliar a melhor condição de síntese do catalisador, uma vez que essa técnica permite uma análise multivariável, verificando os efeitos entre as variáveis e a influência das variáveis na resposta. Os catalisadores produzidos, usando íons de ferro e hidróxido de sódio em bentonita como suporte, foram aplicados a processos de oxidação heterogênea para avaliar a eficiência de ativação por cada catalisador. O poluente fenantreno (PHE) foi escolhido como representante do grupo HPAs. Utilizou-se solo contaminado artificialmente com PHE, uma vez que estudos preliminares envolvendo amostras sintéticas são importantes para fornecer uma avaliação mais precisa do processo.