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CAPÍTULO 5 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.4. ISOLAMENTO, CARACTERIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DAS BACTÉRIAS

Os procedimentos para isolamento de bactérias foi realizado com a fração líquida das duas amostras brutas, do composto (RC) e da barragem (RB). Os cultivos em meio sólido foram realizados nos dois meios a saber: meio mínimo Bromfield acrescido de éter-aminas e ágar e o meio rico ágar nutriente. Adicionou-se às placas 0,5mL de amostra bruta e submetida a diluições seriadas, correspondendo a 10-1 e 10-2 a fim de permitir o crescimento do maior número de colônias isoladas possível. Após 24 horas de incubação a 35°C±2, as placas contendo meios de cultura sólidos foram analisadas. Imagens das colônias crescidas nas placas estão apresentadas na Figura 5.8. Em geral, as placas que continham ágar nutriente como meio de cultura apresentaram colônias maiores do que as placas que tinham meio sólido Bromfield modificado acrescido de solução de éter-amina.

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Figura 5.8. Fotografias das placas de Petri mostrando crescimento bacteriano em ágar nutriente (1, 2, 3, 4, 5) e Bromfield modificado sólido (6, 7, 8, 9). 1: Colônias irregulares (nuvem) brancas; 2: Colônias transparentes cremosas; 3: Colônias espaçadas, arredondadas brancas; 4: Colônias arredondadas transparentes; 5: Colônias

ramificadas e brancas; 6: Colônias ramificadas e esbranquiçadas; 7: Pequenas colônias transparentes; 8: Colônias arredondadas e transparentes; 9: Grandes colônias transparentes.

92 As colônias que cresceram no meio Bromfield modificado apresentaram coloração transparente ou esbranquiçada e espaçadas pelo meio sólido, enquanto as colônias crescidas no ágar nutriente apresentaram coloração esbranquiçada, e algumas transparentes, bordas regulares ou não, preenchendo grande parte da placa de cultivo. Isso indica que as condições de crescimento no meio Bromfield modificado não são ideais para o crescimento das bactérias, seja pela ausência de nutrientes importantes, seja pela incapacidade de usar a amina como fonte de carbono, ou até pela condição adversa de pH neste meio (em torno de 10), decorrente da adição das aminas. No entanto, o isolamento neste meio foi importante na tentativa de obter alguma bactéria que fosse incapaz de crescer no ágar nutriente.

Um total de 22 colônias foi selecionado, sendo que algumas apresentavam mesmas características, mas eram de amostras de rejeito diferentes ou de diluições seriadas diferentes. A Tabela 5.6 apresenta a origem e as características dessas colônias.

Todas as colônias selecionadas foram transferidas para os meios líquidos correspondentes e seu crescimento analisado pela turvação do meio, no caso do caldo nutriente, e pela transparência, no caso do meio Bromfield modificado, como pode ser visto na Figura 5.9. Posteriormente estas culturas foram transferidas para meios sólidos para a confirmação e obtenção das colônias isoladas. Observações microscópicas diretas das células presentes nos cultivos revelaram que o número de células no cultivo com caldo nutriente foi maior do que no cultivo em meio Bromfield modificado (resultados não mostrados).

93 Tabela 5.6. Origem e características das 22 colônias isoladas

Colônia Origem da amostra/diluição Meio de Isolamento Características da Colônia

A Rejeito Composto/ 100 Ágar nutriente Espaçadas, arredondadas e brancas

B Rejeito Composto/ 10-1 Ágar nutriente Isolada, arredondada e branca

C Rejeito Composto/ 10-2 Ágar nutriente Isoladas, irregulares e brancas

D Rejeito Composto/ 100 Bromfield modificado Pequenas, redondas e transparentes

E Rejeito Composto/ 100 Bromfield modificado Pequenas, redondas e transparentes

F Rejeito Composto/ 10-1 Ágar nutriente Pequenas, redondas e transparentes

G Rejeito Composto/ 10-1 Ágar nutriente Isoladas, irregulares e brancas

H Rejeito da Barragem/ 100 Ágar nutriente Ramificadas e brancas

I Rejeito da Barragem/ 10-1 Ágar nutriente Isoladas, redondas e transparentes

J Rejeito da Barragem/ 10-1 Ágar nutriente Isoladas, irregulares e brancas

K Rejeito Composto/ 100 Bromfield modificado Pequenas, redondas e transparentes

L Rejeito da Barragem/ 10-2 Ágar nutriente Pequenas, transparentes e cremosas M Rejeito da Barragem/ 10-2 Ágar nutriente Isoladas, irregulares e brancas

N Rejeito Composto/ 10-2 Ágar nutriente Pequenas, transparentes e cremosas

O Rejeito Composto/ 10-1 Bromfield modificado Grandes, ramificadas e brancas

P Rejeito da Barragem/ 100 Bromfield modificado Pequenas, ramificadas e brancas

Q Rejeito da Barragem/ 10-1 Bromfield modificado Pequenas e transparentes

R Rejeito da Barragem/ 10-2 Bromfield modificado Grandes e transparentes

S Rejeito Composto/ 10-1 Bromfield modificado Grandes, ramificadas e brancas

T Rejeito da Barragem/ 100 Bromfield modificado Pequenas, ramificadas e brancas

U Rejeito da Barragem/ 10-1 Bromfield modificado Pequenas e transparentes

94 (a)

(c)

(b)

(d)

Figuras 5.9. Fotografias dos tubos de ensaio contendo meio líquido para crescimento de microrganismos. (a) Tubos com coloração amarelada contêm caldo nutriente e tubo com coloração transparente contém meio

Bromfield modificado; (b, c, d) Tubos com caldo nutriente.

A técnica de coloração diferencial de Gram é muito utilizada na microbiologia para diferenciar a estrutura da parede celular, classificando os organismos em Gram negativos, quando a parede celular é constituída por estruturas de múltiplas camadas de peptidoglicano, lipoproteínas e lipopolissacarídeo bastantes complexas, ou Gram positivos, quando a parede celular consiste de única camada de peptidoglicano, característica essa que auxilia o processo de identificação de microrganismos. Foram confeccionadas lâminas de Gram das 22 culturas isoladas crescidas em meio sólido, como pode ser observado na Figura 5.10 (a e b).

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Figura 5.10a. Imagens de microscopia óptica das lâminas confeccionadas com coloração de Gram dos 22 isolados, chamados de A à R, em aumento de 1.000x..

A B C D E F G H I J K L M N O P Q R

96

Figura 5.10b. Imagens de microscopia óptica das lâminas confeccionadas com coloração de Gram dos 22 isolados, chamados de S à V, em aumento de 1.000x..

Todos os isolados apresentaram forma bacilar e classificados como Gram positivos, pois apresentaram coloração roxa. As lâminas de Gram apresentaram uma estrutura não diferenciada ao fundo e, então foi testada a capacidade de produção de esporos através da coloração específica de esporos, chamada Verde de Malaquita. As imagens das lâminas coradas pela coloração de esporos estão nas Figura 5.11 (a e b).

Figura 5.11a. Imagens de microscopia óptica das lâminas confeccionadas com coloração Verde de Malaquita dos 22 isolados, chamados de A à F, em aumento de 1.000x.

S T U

V

A B C

97 Figura 5.11b. Imagens de microscopia óptica das lâminas confeccionadas com coloração Verde de Malaquita

dos 22 isolados, chamados de A à V, em aumento de 1.000x.

G H I J K L M N O P Q R S T U V

98 Pode-se observar que todos os isolados apresentaram grande número de esporos, corados em verde pelo corente verde de malaquita. Essas imagens confirmaram a capacidade dos isolados em produzir esporos. A capacidade de produzir esporos é uma característica comum dentro do grupo das bactérias Gram-positivas. Dentre elas destacam-se dois gêneros: Clostridium e Bacillus.

Quando os nutrientes essenciais se esgotam, bactérias dos gêneros Clostridium e Bacillus formam células especializadas de “repouso”, chamadas de endosporos. Exclusivo das bactérias, esses endosporos são células desidratadas altamente duráveis, com paredes espessas e camadas adicionais, formados dentro da membrana celular bacteriana. Quando liberados no ambiente, podem sobreviver a temperaturas extremas, falta de água e exposição a muitas substâncias químicas tóxicas e radiação. Os endosporos podem permanecer dormentes por milhares de anos e então retornar ao seu estado vegetativo pelo processo de germinação, formando uma célula (TORTORA, 2005).

Os indivíduos do gênero Clostridium são anaeróbios obrigatórios e não conseguiriam crescer nas condições aeróbias das amostras analisadas. Assim, de acordo com os resultados, pode-se supor que os isolados obtidos a partir dos cultivos das amostras da barragem e a do rejeito composto sejam bactérias pertencentes ao gênero Bacillus, pois apresentaram a forma de bastonetes, foram caracterizados como Gram- positivos e são microrganismos aeróbios, características essas presentes nos indivíduos do referido gênero (SLEPECKY et al., 2006).

O procedimento de extração do DNA bacteriano foi realizado para todas as culturas isoladas, mas provavelmente a qualidade dos extratos eram ruins (resultado não mostrado). Todos os extratos genômicos foram submetidos ao procedimento de amplificação da região DNAr 16S do domínio Bacteria, com os iniciadores 27F e 1492R, porém o resultado só foi positivo para o isolado K. A presença do fragmento de DNA de interesse foi confirmada após eletroforesse em gel de agarose 1% corado com SyberSafe DNA Gel Stain (Invitrogen) (Figura 5.12).

De acordo com os resultados de diversas tentativas de amplificação dos produtos da extração de DNA dos isolados das amostras de rejeito, apenas o isolado K foi amplificado e

99 esse amplicon foi enviado para o sequenciamento genético. Foram obtidas as sequências do DNA com ambos os iniciadores a fim de obter a totalidade do fragmento que corresponde ao gene DNAr 16S. De posse das duas sequências, a sequência consenso foi obtida, de ótima qualidade, que permitiu a realização das comparações no banco de dados do GenBank e obtenção da árvore filogenética utilizando as ferramentas disponíveis no site “Ribossomal Data Base 10” (COLE et al., 2009).

Figura 5.12. Gel de agarose 1,0%, corado com SyberSafe DNA Gel Stain (Invitrogen). As bandas fluorescente indicam o resultado positivo da reação de amplificação dos fragmentos do DNA ribossomal 16S dos isolados

A à V e a amostra controle “branco”.

Os resultados da comparação da sequência do isolado K com outras bactérias cultiváveis e não cultiváveis resultou em níveis de similaridade superiores a 98% com espécies do gênero Bacillus, chegando a 99% de similaridade com as espécies B. amyloliquefaciens e B. subtilis. A Figura 5.13 mostra a árvore filogenética gerada com as sequências relacionadas, onde é possível visualizar uma maior proximidade do isolado K com a espécie B. amyloliquefaciens cultura Ba-B128, uma bactéria associada a corais.

100

Bacillus amyloliquefaciens| Ba-B128 AY620954 cultura K

Bacillus subtilis subsp. subtilis MO4 AY553097 Bacillus subtilis DSM10 AJ276351

Bacillus licheniformis DSM13 X68416 Bacillus cohnii DSM6307 X76437

Bacillus gibsonii DSM8722 X76446 Bacillus sp. DSM 8724 X76448

Bacillus thuringiensis ATCC33679 AF290549 Bacillus cereus ATCC 27877 Z84581

Enterococcus faecium DSM20477 AJ276355

93 77 74 91 100 47 32 83 100 0.005

Figura 5.13. Árvore filogenética contendo sequências do gene DNAr 16S (~ 1.300 pb) construída pelo método Neighbor-Joining. Análise de Bootstrap com 1000 réplicas. Barra corresponde a 0,5%.

Dessa forma, de acordo com os resultados morfológicos e moleculares, pode-se considerar o isolado K pertencente ao gênero Bacillus, com alta similaridade com a espécie B. amyloliquefaciens.

Os membros do gênero Bacillus são organismos onipresentes, em forma de bastão, Gram positivos e catalase positivos. Esse é um dos gêneros com maior diversidade 16S e diversidade ambiental. Os indivíduos desse grupo têm a capacidade de formar um duro e protetor endósporo, que é formado em épocas de estresse nutricional, permitindo que o organismo persista no ambiente até que as condições se tornem favoráveis.

Apesar de não plenamente identificados, os isolados obtidos em ambos os meios a partir dos cultivos das amostras da barragem de rejeitos e do rejeito composto parecem pertencer ao gênero Bacillus, porém provavelmente há diferentes espécies, visto as diferenças observadas no crescimento das colônias (Figura 5.15) e dos esporos (Figura 5.18).

O isolamento exclusivo de Bacillus a partir da metodologia empregada sugere que este gênero bacteriano seja um membro dominante na comunidade bacteriana aeróbia presente nas amostras. Sua característica de esporulação provavelmente o torna um genêro adaptado às condições adversas presentes nas barragens e rejeitos da flotação, principalmente pela

101 elevada alcalinidade do meio (pH~10, subitem 5.3). Desta forma, bactérias esporulantes teriam vantagem seletiva frente a outras bactérias e dominariam o ambiente.

Especificamente Bacillus amyloliquefaciens é uma bactéria aeróbia, encontrados em amostras de solo na natureza. Esse microrganismo é conhecido por sua capacidade de degradar algumas proteínas extracelulares, por produzir algumas proteínas como o antibiótico natural, a proteína rionuclease barnase, alfa-amilase utilizada na hidrólise do amido, protease subtilisina, uma enzima que catalisa a quebra de proteínas de forma semelhante à tripsina, usada em detergentes, cosméticos e processamento de alimentos (SLEPECKY et al., 2006; TORTORA, 2005). A capacidade de hidrolisar o amido pode ser considerada uma característica importante para as bactérias presentes nos rejeitos de flotação, uma vez que o amido é utilizado no processo de flotação como depressor dos óxidos de ferro, sendo constituído basicamente pela condensação de moléculas de glicose, além de proteínas, fibras, material mineral e óleos (PERES E CORREA, 1996). O amido poderia ser, portanto, também um substrato para o crescimento destas bactérias no ambiente.

Bacillus subtilis, conhecido também como o bacilo de feno ou bacilo de grama, é também uma bactéria flagelada comumente encontrada no solo, aeróbia estrita, catalase positivos e produtora da enzima proteolítica subtilisina. São indivíduos mesofílicos, que vivem à temperatura média de 25-35°C (SLEPECKY et al., 2006; TORTORA, 2005).

Na literatura não há registros sobre a presença de Bacillus subtilis e Bacillus amyloliquefaciens em barragem de rejeitos da flotação do minério de ferro, mas sabe-se que esse gênero possui vários representantes associados aos depósitos de minerais (DEO e NATARAJAN, 1998a), os quais estão sendo utilizados como “reagentes” em processo de separação de determinados minerais, com resultados satisfatórios, como é o caso do biobeneficiamento da bauxita, para a remoção de sílica, utilizando bactérias heterotróficas, como Bacillus circulans e Bacillus mucilaginous (OGURTSOVA et al., 1990).

DEO e NATARAJAN (1998) estudaram o processo de biodegradação das aminas graxas pela bactéria Bacillus polymyxa, a qual está associada a vários depósitos do minério de ferro. Foi observado que essa bactéria é capaz de degradar acetato de dodecilamônio para

102 retirar carbono e nitrogênio requeridos para o seu crescimento, gerando, no meio, produtos como polissacarídeos, aminoácidos e ácidos graxos como produto do metabolismo. CHOCKALINGAM et al. (2003), a fim de avaliar se o crescimento da Bacillus polymyxa é inibido ou não pela presença de coletores orgânicos, realizaram estudos de crescimento bacteriano em concentrações de 50, 100 e 200mg.L-1 de isopropil xantato de sódio, acetato de dodecilamônio e oleato de sódio. Os resultados indicaram que o B. polymyxa, uma bactéria associada aos depósitos de minerais, pode ser cultivada na presença destes coletores orgânicos e há indicação de esporulação das células durante o crescimento na presença dos insumos. Foi observado também que a biodegradação do acetato de dodecilamônio é bastante efetiva durante o crescimento bacteriano do B. polymyxa.

DEO e NATARAJAN (1998b) estudaram sobre a remoção biológica de coletores em partículas de minerais e puderam observar que os coletores derivados de aminas, acetato de dodecilamônio (DDA) e isododecil oxipropil aminopropil amina (DA16), foram removidos do sistema e foram também degradados pelo Bacillus polymyxa. Há indícios que levam à conclusão que um aldeído é formado quando as aminas são oxidadas. A degradação da maioria das aminas forma H2O2 como produto metabólico e suspeita-se que este produto é destruído pela catalase endógena, uma enzima específica.

Uma análise preliminar de amostras de água de jazidas de bauxita na Índia mostrou a presença de um número de bactérias heterotróficas pertencentes ao gênero Bacillus, como Bacillus polymyxa e Bacillus coagulans. Entre as várias espécies, Bacillus polymyxa, uma bactéria anaeróbia facultativa, é um organismo interessante, pois remove tanto o cálcio como o ferro do sistema de separação de partículas (ANAND et al., 1996).

DEO e NATARAJAN (1999, 1997) estudaram o comportamento dos polissacarídeos extracelulares e das proteínas das células de Bacillus polymyxa na presença dos minerais calcita, hematita, coríndon e quartzo, e observou que a interação do B. polymyxa com os minerais levou a mudanças significativas tanto na superfície dos minerais como no microrganismo, sendo que o quartzo tornou-se mais hidrofóbico e a calcita, a hematita, o coríndon tornaram-se mais hidrofílicos. Assim, uma eficiente remoção da sílica de outros

103 minerais pode ser alcançada através do processo de bioflotação (BOTERO et al., 2008; DEO e NATARAJAN, 1999 e 1997).

NATARAJAN e DEO (2001, 1998b) estudando sobre a interação das proteínas e metabólitos do Bacillus polymyxa com a hematita, coríndon, calcita, quartzo e caulinita, observaram novamente significativas mudanças da superfície química dos minerais e da bactéria, comprovando maior hidrofobicidade do quartzo e da caulinita, e maior hidrofilicidade da hematita, coríndon e da calcita.Foi observado também que a presença de determinado mineral influencia o crescimento microbiano e, consequentemente, a produção de proteínas, na presença de caulinita e quartzo, ou de polissacarídeos, na presença de calcita, hematita e coríndon. Os testes de flotação realizados com os minerais, após um tratamento preliminar com os metabólitos bacterianos, indicaram que as taxas de sedimentação da calcita, hematita e coríndon aumentaram, assim como as taxas da caulinita e quartzo diminuíram, facilitando o processo de flotação e viabilizando o biobeneficiamento.

Analisando a adsorção do Bacillus polymyxa às partículas de hematita e quartzo, SHASHIKALA e RAICHUR (2002) observaram que uma maior quantidade de células é adsorvida na superfície da hematita do que na do quartzo. Essa diferença foi atribuída, também, à hidrofobicidade, pois, a hematita e as bactérias possuem cargas opostas, o que provavelmente leva a uma maior atração e adsorção, ao contrário do quartzo, que é hidrofílico, não atraindo intensamente as células microbianas.

PATRA e NATARAJAN (2003) também utilizaram o Bacillus polymyxa para analisar a interferência dessa bactéria nas taxas de sedimentação do quartzo, pirita e calcita. Observaram que as células de B. polymyxa apresentaram maior afinidade pela pirita do que pelas partículas de quartzo e de calcita, mas significativas alterações na composição química da superfície foram encontradas para esses últimos após a interação bacteriana. A separação da pirita do quartzo, após o tratamento com células ou produtos metabólicos extracelulares, foi eficiente através da flotação. Assim, a remoção da pirita das pilhas de rejeitos da flotação convencional pode ser realizada pelo biobeneficiamento.

104 Muitos microrganismos precisam de determinados elementos químicos como importante mineral biológico para seus processos metabólicos. Nos estudos realizados por ANAND et al (1996), utilizando uma cultura pura de Bacillus polymyxa NCIM 2539, foi observado que estes microrganismos apresentam um metabolismo dependente de cálcio, uma vez que houve crescimento reduzido quando na ausência desse composto. O número de células bacterianas presentes nestes experimentos foram compatíveis com a presença de CaCO3 ou de minério bauxita, o que sugeriu que o Bacillus polymyxa é capaz de utilizar o cálcio presente na bauxita para o seu crescimento e metabolismo. A fonte e a quantidade de carbono presente no meio determinaram a geração de polissacarídeos extracelulares, sendo que a maior taxa de crescimento e de produção de metabólitos ocorreram na presença de 2% de sacarose. Além disso, essa bactéria gerou produtos metabólicos secundários, como os ácidos acético, nítrico e oxálico, o que foi evidenciado pela diminuição significativa do pH durante o crescimento microbiano (VASAN et al., 2001; ANAND et al., 1996; MANKAD e NAUMAN, 1992).

Para a flotação aniônica da apatita e dolomita, já foi demonstrado que Bacillus subtilis e Bacillus lichenformis e seus produtos metabólicos agem com a função de depressores da flotação (ZHENG e SMITH, 1997a,b apud SMITH e MIETTINEN, 2006). Staphylococcus carnous, Bacillus firmus, B. subtilis e B. lichenformis também atuam como agentes coletores no processo de flotação da apatita e calcita (MIETTINEN et al., 2003a,b apud SMITH e MIETTINEN, 2006).

Além de indivíduos do gênero Bacillus, na literatura há registros de outras bactérias que também podem interferir no processo de separação de minerais, como o Acidithiobacillus ferrooxidans e o Acidithiobacillus thiooxidans, que são capazes de afetar as características da superfície dos minerais e afetar o comportamento de flotação dos minerais (HOSSEINI et al., 2005; SANTHIYA et al., 2001).

PRAKASAN e NATARAJAN (2010) estudaram sobre a separação do quartzo e da hematita utilizando Desulfovibrio desulfuricans NCIM 2047, uma bactéria Gram-negativa, redutora de sulfato, anaeróbia facultativa, que está naturalmente associada aos depósitos de minério de ferro e está relacionada com a biomineralização de vários óxidos de ferro. A

105 adaptação do microrganismo ao mineral influenciou a produção de proteínas e polissacarídeos, que adsorveram nos minerais, sendo que a superfície do quartzo tem alta afinidade pelos compostos protéicos e a hematita pelos polissacarídeos. Assim, foi possível separar os minerais, uma vez que as proteínas bacterianas aumentaram a hidrofobicidade do quartzo, e a adsorção dos polissacarídeos deprimiu a hematita.

MESQUITA et al. (2003) avaliaram a interação de Rhodococcus opacus no sistema de flotação de quartzo/hematita e observaram que os dois minerais apresentraram maior flotabilidade na presença desta bactéria. Cerca de 90% da hemaita pode ser flotada para o pH em torno de 4,0, e 72% para pH entre 6 e 12. Em contrapartida, o quartzo apresentou maior flotabilidade em pH em torno de 3, alcançando 42%, e para valores de pH maiores que 4, este mineral praticamente não apresentou flotabilidade. Apesar de as partículas de hematita e quartzo apresentarem superfícies polares, dando carácter hidrofílico à estes minerais, o mecanismo de interação entre as células bacterianas e as partículas minerais pareceram ser diferentes e por isso a separação seletiva entre hematita e quartzo, utilizando apenas R. opacus como reagente em pH7, foi alcançada nos testes de microflotação.

A bactéria Escherichia coli também é utilizada em processos de separação seletiva de minerais, atuando como agente coletor da flotação de quartzo em condições ácidas (FARAHATA et al., 2009).

Os estudos a respeito do biobeneficiamento estão em períodos de aprofundamento e análise uma vez que se sabe do potencial da utilização de bactérias e outros microrganismos, e seus produtos metabólicos, na flotação e floculação (SMITH e MIETTINEN, 2006), sendo que o uso de seres vivos naturalmente presentes no ambiente torna o processo não oneroso e também diminui os impactos ambientais causados pelos coletores químicos, mesmo sabendo que para atuarem nos processos esses microrganismos, ou derivados metabólicos, devem estar presentes em grandes quantidades (SMITH e MIETTINEN, 2006).

Dessa forma, sabendo do potencial do biobeneficiamento, pode-se avaliar o grau de interferência natural do Bacillus identificado neste estudo no processo de flotação do minério de ferro, de maneira positiva ou negativa.