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CAPÍTULO 3 – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.5. BIODEGRADABILIDADE DAS ÉTER-AMINAS

3.5.2. Microrganismos degradadores de aminas

As bactérias são microrganismos procariontes, não contendo membrana nuclear e sem estruturas intercelulares comuns aos eucariotos. A reprodução bacteriana ocorre com grande rapidez, dando origem a um número muito grande de descendentes em apenas poucos minutos (TORTORA, 2005).

O metabolismo bacteriano pode ser caracterizado como todas as reações químicas que ocorrem na célula, destinadas a atender as necessidades biológicas dos organismos vivos, incluindo tanto as reações que produzem energia como as que utilizam a energia para a biossíntese ou outras funções celulares. A célula transforma a energia existente em compostos químicos ou na luz, em energia útil ao seu funcionamento, que é a energia química presente em certos compostos, principalmente no ATP.

As bactérias possuem grande variedade de metabolismos, visto que podem utilizar vários substratos ou compostos sob as mais variadas condições de ambiente. Os processos metabólicos podem ser autotróficos, quando a fonte de carbono é o CO2, ou heterotróficos, quando a fonte de carbono são compostos orgânicos. Estes dois grupos são divididos em quatro grupos fisiológicos, tendo como base a fonte de energia utilizada na biossíntese, conforme descrito na Tabela 3.3. Entre os grupos fisiológicos apresentados na Tabela 3.3, os quimioheterotróficos são os mais abundantes na natureza, visto que a disponibilidade de compostos orgânicos na natureza é maior.

41 Tabela 3.3. Classificação nutricional das bactérias (TORTORA, 2005).

Grupo nutricional Fonte de Carbono Fonte de Energia

Quimioautotrófico CO2 C inorgânico

Quimioheterotrófico C orgânico C orgânico

Fotoautotrófico CO2 Luz

Fotoheterotrófico C orgânico Luz

A respiração é um processo de geração de ATP em que as moléculas são oxidadas e o aceptor final de elétrons é quase sempre uma molécula inorgânica. Quando o organismo é aeróbio, há utilização de oxigênio no metabolismo, e o aceptor final de elétrons é o O2, mas quando o organismo é anaeróbio, não há utilização de oxigênio na respiração, e o aceptor final de elétrons é uma molécula inorgânica diferente do O2, como NO3-, SO42-, CO32- (TORTORA, 2005). Quando o aceptor final de elétrons é uma molécula orgânica, o processo metabólico é caracterizado como fermentação, o qual também não requer a presença do oxigênio e não participa do ciclo de Krebs, ocorrendo a oxidação incompleta da molécula de glicose.

A quantidade de ATP gerada na respiração anaeróbia varia com o microrganismo e a via, mas devido à somente uma parte do ciclo de Krebs funcionar sob condições anaeróbias, e desde que nem todos transportadores participam da cadeia de transporte de elétron nessa respiração, o rendimento de ATP nunca é tão alto quanto na respiração aeróbia. Já para a fermentação, somente uma ou duas moléculas de ATP, para cada molécula inicial é formada, pois grande parte da energia inicial do composto permanece nas ligações químicas dos produtos orgânicos finais (TORTORA, 2005).

Para a maioria das bactérias, o pH ótimo de crescimento se localiza entre 6,6 e 7,5. Entretanto há bactérias que se desenvolvem em pH9,0 e outras bactérias que crescem em pH 1 (PELCZAR, 1996). Os requisitos nutricionais das bactérias incluem nitrogênio, enxofre, fósforo, vitaminas e elementos metálicos como sódio, potássio, cálcio, magnésio, ferro, cobalto, cobre e níquel. Algumas espécies necessitam ainda de pequenas quantidades adicionais de elementos como selênio, vanádio ou boro.

42 Dentre as bactérias já reportadas na literatura com capacidade de degradar aminas pode-se citar Pseudomonas putida (VAN GINKEL et al. 1995; YOSHIMURA et al., 1980;), Xanthomonas sp (DEAN-RAYMOND e ALEXANDER 1997), Bacillus polymyxa (DEO e NATARAJAN 1998b), Burkholderia cepacia e Stenotrophomonas maltophilia (KROON e VAN GINKEL, 2001). YOSHIMURA et al. (1980) estudaram a biodegradação de várias aminas graxas utilizando a bactéria Gram negativa P. putida, através do monitoramento da Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO). Observaram que essa bactéria pode degradar amina primária n-C12H25NH2 e outras alquilaminas primárias, mas não alquilaminas secundárias e terciárias e surfactantes catiônicos. Além disso, essa linhagem isolada pode utilizar n-C12H25NH2 como única fonte de carbono e nitrogênio para o seu crescimento. A biodegradação da dodecilamina pela Pseudomonas sp. foi estudada por VAN GINKEL et al. (1995) através do monitoramento da DBO e observaram que em 7 dias houve a degradação de cerca de 80% da amina pela referida bactéria. Em ambos os estudos não foram investigados os possíveis intermediários ou produtos formados durante o processo de degradação.

DEAN-RAYMOND e ALEXANDER (1997) utilizaram técnicas padrões de medidas de oxigênio dissolvido no meio para avaliar a degradação de 10 compostos de amônio quaternário, nas concentrações de 10, 25 e 100µg.mL-1, sendo que as concentrações de oxigênio foram medidas em intervalos de 5 a 8 dias, em um período de 60 dias. Os compostos cloreto de benziltrimetilamônio, brometo de feniltrimetilamônio, brometo de benziltrietilamôniocloreto, brometo de didodecildimetilamônio, brometo de dioctadecildimetilamônio, cloreto de hexadecildimetilbenzilamônio, cloreto de fenildimetilbenzilamônio e hyamine 10-X foram resistentes ao ataque dos microrganismos inoculados. O composto brometo de deciltrimetilamônio (DTM) foi completamente degradado dentro de 8 a 10 dias, para as três concentrações analisadas, mas, a degradação do brometo de hexadeciltrimetilamônio foi evidente apenas nos níveis de 10 e 25µg.mL-1 de insumo, em um tempo de 15 a 43 dias de observação. Para este mesmo composto, a ausência de biodegradação em 100µg.mL-1 foi associada à sua toxicidade. Os microrganismos utilizados foram retirados de amostras do solo e também de efluente doméstico, e foram posteriormente caracterizados, sendo que duas colônias apresentaram crescimento satisfatório em placas contendo meio ágar nutriente, diferenciando-se pelas

43 colorações branca e amarelada. As colônias diferenciadas eram compostas por bacilos Gram-negativos com flagelo polar, oxidase positivas e não produziam pigmentos fluorescentes. Assim, essas culturas foram identificados como Pseudomonas e Xanthomonas.

O Bacillus polymyxa, espécie de bactéria renomeada como Paenibacillus polymyxa após uma análise comparativa da sequência do RNAr 16S (ASH et al.,1993), é uma bactéria Gram positiva, quimiorganotrófica fixadora de nitrogênio e anaeróbia facultativa, que produz diversos metabólitos como ácido acético, fórmico, lático e succínico, além de etanol. Na presença de oxigênio esse microrganismo também produz polissacarídeos extracelulares que formam sua cápsula celular. Além disso, seu metabolismo é dependente de cálcio, pois esse íon é requerido durante a produção de enzimas, como as amilases e proteases, e também para a síntese de dipicolinato de cálcio, um componente essencial para a formação de endosporos (VASAN et al., 2001).

CHOCKALINGAM et al. (2003), a fim de avaliar se o crescimento da Bacillus polymyxa é inibido ou não pela presença de coletores orgânicos, realizou estudos de crescimento bacteriano em concentrações de 50, 100 e 200mg.L-1 de isopropil xantato de sódio, acetato de dodecilamônio e oleato de sódio. Para o xantato não foi observada a fase lag, caracterizada como fase de adaptação às condições estabelecidas, e a fase estacionária, onde não ocorre crescimento microbiano e inicia uma competição por espaço e alimento, foi alcançada após 3 horas para as concentrações de 50 e 100mg.L-1, e após 5 horas quando a concentração do coletor foi de 200 mg.L-1. Foi encontrado pH final 3 para todas as concentrações testadas desse coletor. Já para as análises com acetato de dodecilamônio, a fase lag foi de 3 horas para todas as concentrações e a fase estacionária foi observada após 5 horas para 50mg.L-1 e 6 horas para 100 e 200mg.L-1. Enquanto o pH final foi de 3,5 para as duas primeiras concentrações, o valor para a concentração máxima foi igual a 4. Para o oleato de sódio não houve fase lag na presença de qualquer concentração desse coletor, enquanto que a fase estacionária foi de 3 horas para 50mg.L-1 e de 4 horas para as demais concentrações. O pH3,5 foi encontrado em todos os testes com esse coletor. O número máximo de células obtidas nestes testes foi de 109células/mL em todos os casos. Estes resultados indicaram que o B. polymyxa, uma bactéria associada aos depósitos de minerais,

44 pode ser cultivada na presença destes coletores orgânicos e há indicação de esporulação das células durante o crescimento na presença dos insumos. Foi observado também que a biodegradação do acetato de dodecilamônio é bastante efetiva durante o crescimento bacteriano do B. polymyxa.

KROON e VAN GINKEL (2001) isolaram grupos de bactérias utilizando compostos derivados de aminas alifáticas, como dodecildimetilamina e dimetilamina, sendo que no meio de cultura contendo o primeiro composto houve o crescimento de apenas um tipo de colônia caracterizada como ADM12D e nas placas contendo o segundo insumo, foram caracterizados os grupos DMA1, DMA2, DMA3 E DMA4. Todos estes grupos isolados eram de bacilos Gram-negativos e oxidase e catalase positivos. Os grupos ADM12D, capaz de degradar dodecildimetilamina, e DMA1, que apresentou maior taxa de crescimento e foi capaz de degradar dimetilamina, foram selecionados e estudadas as seqüências do 16S rDNA. A seqüência do grupo ADM12D apresentou similaridade de 99,6% com Burkholderia cepacia, sendo que o perfil de ácidos graxos celulares foi característico para esta espécie e a utilização nutricional e propriedades bioquímicas de B. cepacia são similares para o isolado descrito por KROON et al. (1994). Já o grupo DMA1, identificado também através da utilização nutricional e pelo conjunto de ácidos graxos celulares, apresentou uma seqüência com similaridade de 99,3% com Stenotrophomonas maltophilia (KROON e VAN GINKEL, 2001).

B. cepacia é capaz de degradar dodecilmetilamina liberando dimetilamina no sistema, enquanto que S. maltophila degrada dimetilamina, formando amônio. Uma cultura mista contendo estes microrganismos foi inoculada em um reator, contendo apenas dodecildimetilamina como fonte de carbono e energia, e após duas semanas não foi encontrado o insumo, nem dimetilamina, subproduto de degradação do primeiro. Esta ausência de compostos derivados de aminas graxas sugeriu total mineralização e caracterizou que B. cepacia e S. maltophila, presentes em uma cultura mista, são capazes de mineralizar completamente dodecildimetilamina (KROON e VAN GINKEL, 2001).

Pesquisas realizadas por AFZAL KHAN et al. (2006) para analisar a eficiência de degradação do para-diaminobenzeno pelo grupo Pseudomonas sp. ST-4 indicou que, para

45 um efluente com demanda bioquímica de oxigênio inicial de 470mg.L-1, 84% do insumo foi biodegradado.

Em outra pesquisa, WANG et al. (2007) isolaram um grupo de bactérias da planta de tratamento por lodos ativados, de efluentes petroquímicos no nordeste da China, ricos em pentil-amina, uma amina primária alifática, e anilina, uma amina aromática. De acordo com as características morfológicas, bioquímicas e fisiológicas, este grupo, chamado de PN1001, foi identificado como membro da família Pseudomonas. A maior taxa de biodegradação dessa mistura de aminas aromáticas foi encontrada para uma concentração de 150 a 200mg.L-1 de insumo, em 24 horas de reação e com, no máximo, 6mgO2.L-1 de oxigênio dissolvido, à 30°C e pH7,0. Dessa forma, a eficiência de remoção dos contaminantes pode chegar a 91%.

Os testes realizados por ARAÚJO (2007), analisando amostras brutas provenientes da barragem de rejeitos da flotação do minério de ferro, para identificação de microrganismos responsáveis pela biodegradação das aminas, mostraram que nas amostras reais foi identificada a Serratia marcescens bizio 1823AL e nas amostras da flotação em bancada, foi

identificada a Enterobcter cloacae. Tanto a Serratia marcescens como a Enterobcter cloacae são bactérias Gram-negativas, não esporuladas, móveis e anaeróbias facultativas. Os estudos realizados sobre o crescimento dessas bactérias na presença e ausência de minério de ferro, composto de 52,54% de Fe, 32,5% de SiO2, 0,026% de P, 0,012% de Ca, 0,21% de Al, 0,017% de Mn e 0,012% de Mg, demonstraram que o minério de ferro exerce papel fundamental no metabolismo microbiano, fornecendo, provavelmente, os minerais essenciais para o seu crescimento (ARAÚJO et al., 2010; ARAÚJO 2007).

Serratia marcescens ITRC S7, identificada por SINGH et al. (2007), é um potente isolado bacteriano aeróbio, capaz de degradar pentaclorofenol (PCP), sendo passível a utilização deste grupo de microrganismo para processos de bioremediação em ambientes contaminados com este composto.

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