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THE ISSUE OF TEENAGER IN CONFLICT WITH THE LAW AS A THERMOMETER OF DEMOCRACY

SEGURANÇA PÚBLICA E CIDADANIA

THE ISSUE OF TEENAGER IN CONFLICT WITH THE LAW AS A THERMOMETER OF DEMOCRACY

Luiza Eridan Elmiro Martins de SOUSA257

Resumo

O Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA do Brasil estabelece diretri- zes para a aplicação de medidas sócio-educativas a adolescentes autores de atos infracionais; dentre elas, a Liberdade Assistida. Esta é uma me- dida não privativa de liberdade, que não é desempenhada em um sistema institucional fechado, de maneira que as regras de bom comportamento precisam ser incorporadas pelo adolescente por outros “caminhos” que não o da vigilância e do controle diretos. Esta pesquisa busca compreen- der como estes “caminhos” vêm sendo pedagogicamente construídos, ou seja, como o acompanhamento sócio-educativo da Liberdade Assistida atua para atingir seus objetivos, quais sejam: orientar, acompanhar e au- xiliar o adolescente no sentido da “ressocialização” e da inclusão social. O estudo examina a medida judicial de Liberdade Assistida aplicada ao adolescente em conflito com a lei na cidade de Fortaleza-Ce, investi- gando o modo como o Estado vem operacionalizando suas diretrizes de

257 Psicóloga e Mestra em Políticas Públicas e Sociedade pela Universidade Estadual

controle da ordem social e, ao mesmo tempo, oferecendo proteção e as- sistência à adolescência envolvida com a criminalidade.

Palavras-chave: Adolescente em conflito com a lei. Punição. Resso- cialização.

Abstract

The Brazilian Child and Adolescent Statute (ECA) establishes guideli- nes for the application of educational measures to adolescent who made infraction acts. Among these guidelines, there is the Attended Freedom. This is not a measure that excludes freedom, because it does not take place in a closed institutional system. For this reason, the rules of good behavior need to be incorporated by the adolescent in other “ways”, di- fferent from monitoring and direct control. This research aims to unders- tand how these “ways” have been pedagogically constructed, i.e., how the measure of social and educational attendance of the Assisted Free- dom acts to reach its objectives, which are: to guide, to follow and to assist the adolescent toward the “resocialization” and social inclusion. The study analyzes the judicial measure of Attended Freedom applied to the adolescent in conflict with the law in the city of Fortaleza-CE, inves- tigating the way the State operates its guidelines of control of social order and, at the same time, offers protection and assistance to the adolescence involved with the crime.

Keywords: Adolescent in conflict with the law. Punishment. Resocialitation.

Introdução

“Apesar do seu caráter quantitativo reduzido, a questão do adolescen- te infrator possui um indubitável efeito contaminante negativo sobre o conjunto das políticas sociais. Quem não resolve este problema com- promete todas as políticas sociais para a infância em geral e os direitos humanos dos adolescentes em particular. A questão do adolescente in- frator constitui um extraordinário termômetro da democracia.”

É com esta citação de Emílio Garcia Mendez que inicio este artigo, através do qual me proponho a refletir sobre a questão do adolescente em conflito com a lei e sua relação com a democracia e a efetivação de direitos de crianças e adolescentes. Esta relação vem se mostrando bastante complexa, colocando em cheque as ações desenvolvidas no campo sócio-jurídico e sócio-educativo voltados ao adolescente autor de ato infracional.

Diante do debate acerca do “futuro da democracia” é imprescin- dível questionar sobre a situação daqueles que são tomados, ao mesmo tempo, como o “futuro do país” por um lado, e como “problema social” que demanda imediatas soluções, por outro.

As transformações sociais e políticas das últimas décadas deram origem a um quadro crítico de desigualdades e manifestação de violência, evidenciando um abismo entre a lei e a realidade, isto é entre a propalada de- mocracia “ideal” e a democracia “real”. A desestruturação econômica atingiu diretamente as relações sociais e, concomitante ao processo de redemocrati- zação, assistiu-se a uma grave crise financeira, marcada por elevados níveis inflacionários, promovendo paradoxalmente conquistas e crises que, por sua vez, minaram a relação de confiança entre a população e o Estado.

Diante do quadro apresentado, os movimentos de luta por direitos esbarraram na impossibilidade de materialização e efetivação das garan-

tias constitucionais conquistadas com a promulgação da Carta Magna em 1988, estabelecendo-se um descrédito no governo e o enfraquecimento das relações sociais, tecendo um novo contexto onde a sociabilidade en- contra-se ameaçada. Assistimos, atualmente, a crescente desvalorização da vida, altos níveis de agressividade e desentendimento, bem como a intensificação do processo de individualização, instaurando-se um au- mento nos índices de violência e criminalidade.

As transformações no contexto brasileiro, advindas do período de redemocratização, durante os anos 80, influenciaram de maneira decisiva na forma de fazer política, exigindo, como nos afirma Bobbio (1984) “uma adaptação natural dos princípios abstratos à realidade ou de inevitável con- taminação da teoria quando forçada a submeter-se às exigências da prática”. Adaptação que reverbera nos dias de hoje e se mostra bastante neces- sária, principalmente, no âmbito dos direitos de crianças e adolescentes. Pois assiste-se o alargamento do fosso entre os direitos e as diretrizes propostas pelo Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) e pelo Sistema Nacional de Atendimento Sócio-educativo (SINASE) e a efetivação desses nas práticas cotidianas de atendimento ao adolescente em conflito com a lei.

É nesse complexo campo de forças onde estão inseridas as medidas sócio-educativas aplicadas aos adolescentes autores de atos infracionais, marcadas por uma vertente pedagógica, que demonstra a maneira encontrada pelo Estado para assegurar a obediência “voluntária” às normas de convivência, visto que a aplicação da violência física legítima não se afigura como condição suficiente para assegurar a pacificação dos costumes e hábitos de conduta enraizados na sociedade.

Entre punição e educação: o caráter pedagógico-sancionatório das medidas sócio-educativas aplicadas ao adolescente

autor de ato infracional

Observa-se a crescente ênfase dada à categoria juventude, prin- cipalmente no que concerne à penalização do “menor infrator”. As dis- cussões sobre a redução da maioridade penal e a criação de uma justiça juvenil vêm ganhando espaço no campo das políticas públicas voltadas a este segmento. Diante disso, torna-se relevante refletir acerca da cons- trução histórica que coloca o jovem como centro de políticas repressivas, pois, visto como uma categoria potencialmente perigosa, essa ideologia acaba por influir de maneira decisiva na constituição de políticas públicas voltadas para o adolescente envolvido com a prática de atos ilícitos.

A legislação brasileira, através da Lei 8.069/90 (Estatuto da Crian- ça e do Adolescente/ECA), estabelece as diretrizes para a aplicação das medidas sócio-educativas aos adolescentes autores de atos infracionais, as quais podem ser divididas em dois grupos: a) não privativas de liber- dade (Advertência, Reparação do dano, Prestação de serviços à comuni- dade e Liberdade Assistida), aplicadas em meio aberto; e b) privativas de liberdade (Semi-liberdade e Internação), a serem cumpridas em regime semi-aberto ou fechado.

As medidas sócio-educativas funcionam como instrumentos de in- tervenção estatal no processo individual de desenvolvimento do adolescen- te que cometeu algum delito, objetivando maior e melhor compreensão de sua realidade, efetiva realização pessoal e integração social, com atributos inerentes à cidadania. No entanto, a prática demonstra que as medidas só- cio-educativas admitem uma dinâmica bastante complexa, caracterizada, em sua intencionalidade, por uma natureza híbrida: punitiva e educativa.

Pois, ao mesmo tempo em que se propõem a punir, buscam promover o desenvolvimento do adolescente como pessoa e como cidadão.

É premente repensar as práticas dos operadores do sistema jurídico e do sistema sócio-educativo, seus intercâmbios e as interconexões que colocam o adolescente, ao mesmo tempo, passível de punição e responsabilização e, também, de ‘ressocialização’ ou ‘reeducação’. Como forma de atender essa demanda, este artigo se dispõe a repensar a construção ideológica que fundamenta as práticas de atendimento sócio- educativo ao adolescente autor de ato infracional na cidade de Fortaleza- Ceará e as conseqüências históricas que tais práticas vêm produzindo na vida destes adolescentes.

Para tanto, buscou-se compreender os sentidos e significados que os adolescentes atribuem às práticas pedagógico-sancionatórias da medida sócio-educativa de Liberdade Assistida, principalmente no que concerne ao caráter punitivo e à sua participação em seu processo sócio- -educativo. Na medida em que se é esperado que as medidas sócio-edu- cativas sejam aplicadas em concordância com os preceitos do Estatuto da Criança e do Adolescente, vendo o sócio-educando como sujeito de seu processo, tendo nele um papel atuante e participativo.

Foram realizados três grupos focais com adolescentes acompanha- dos por um dos Núcleos de Atendimento Sócio-educativo de Liberdade As- sistida a fim de compreender os discursos e a inúmeras realidades e contextos que tecem a complexa rede de relações em que se constitui a práxis sócio- -educativa de Liberdade Assistida na cidade de Fortaleza. Participaram, no total, vinte adolescentes e seus discursos foram tomados como ação, pois considerados tão produtores da realidade quanto suas ações concretas.

As questões propulsoras do grupo focal permitiram dar subsídios às seguintes indagações: Como o sistema de responsabilização, em sua

interface pedagógico-sancionatória, vem sendo imposto ao adolescente autor de ato infracional e como este sistema é percebido por ele? De que forma a punição e a sócio-educação se articulam no sentido de exercer o controle social sobre os adolescentes e jovens em Liberdade Assistida?

Em suma, este artigo ressalta, por um lado, a importância da tra- jetória da constituição dos direitos civis na configuração das temáticas da categoria infanto-juvenil e, por outro, os limites decorrentes de práticas sociais de responsabilização e controle social a este segmento populacio- nal. Sua pertinência encontra-se no fato de que, compreendendo como os adolescentes vêm participando e se percebem enquanto atores sociais de seu processo sócio-educativo, seja possível, junto com eles, construir uma prática de atendimento mais efetiva e coerente com os anseios e de- mandas reais de punição e participação desejadas por eles.

A construção social do adolescente em conflito com a lei: vítima ou algoz da violência?

Seguindo uma tendência nacional, Fortaleza também possui um elevado número de adolescentes/jovens, quase um terço de sua popu- lação total tem entre 15 e 29 anos. De acordo com os dados do Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – realizado em 2000, em Fortaleza 636.435 pessoas estavam nesta faixa etária, sendo que 52% eram mulheres e 48% homens. Destes, 235.795 eram jovens entre 15 e 19 anos, 214.961 tinham entre 20 e 24 anos e 185.679 tem entre 25 e 29 anos.

Os dados do Mapa da Violência, lançado em 2006 pela OEI258,

258 Para a Organização Pan-americana da Saúde(OPAS) e a Organização Mundial da

Saúde (OMS), a adolescência constitui um processo fundamentalmente biológico du- rante o qual se acelera o desenvolvimento cognitivo e a estruturação da personalidade.

apontam que no ano de 2004 quase 3/4 de óbitos entre jovens brasileiros deu-se por causas externas, representando 72,1% do total de mortes entre jovens. Entre os não-jovens esse índice é de apenas 9,6%. Os acidentes de transporte são responsáveis por mais 15,6% dos óbitos juvenis, e sui- cídios, por 3,4%. Em conjunto, essas três causas, todas externas e vio- lentas, são responsáveis por bem mais da metade (59%) das mortes dos jovens brasileiros. Em 2007 a mesma organização, lança o Mapa da Vio- lência nos Municípios Brasileiros, em complemento ao Mapa anterior.

Os dados deste último Mapa demonstram que 39,7% do total de mortes de jovens da faixa dos 15 a 24 anos, são atribuídas a homicídios, enquanto que no restante da população este índice cai para 3:

a) É na faixa “jovem”, dos 15 aos 24 anos, que os homicídios atin- gem maior expressividade, principalmente na dos 20 aos 24 anos de idade, com taxas em torno de 65 homicídios por 100.000 jovens. b) É na faixa da minoridade legal, dos 14 aos 17 anos, que os homi- cídios vêm crescendo em ritmo assustador, com pico nos 14 anos, onde os homicídios, na década 1994/2004, cresceram 63,1%. c) É dos 15 aos 29 anos de idade que as taxas cresceram mais na década, com índices bem diferenciados das restantes faixas etárias (Mapa da Violência nos Municípios Brasileiros, 2007, p. 24).

Os avanços da violência homicida das últimas décadas no Brasil são explicados exclusivamente pelo aumento dos homicídios con-

Abrangeria as idades de 10 a 19 anos, divididas nas etapas de pré-adolescência (dos 10 aos 14 anos) e de adolescência propriamente dita (dos 15 a 19 anos). Já o conceito de juventude resumiria uma categoria essencialmente sociológica, que indicaria o processo de preparação para os indivíduos assumirem o papel de adultos na sociedade, tanto no plano familiar quanto no profissional, estendendo-se dos 15 aos 24 anos. A faixa etária considerada pela Organização dos Estados Ibero-Americanos como sendo a juventude é dos 15 aos 24 anos (Mapa da Violência nos Municípios Brasileiros, 2007).

tra a juventude. (Idem, ibidem, p. 69 – grifo do autor).

Da mesma forma que no total de homicídios, mas com maior in- tensidade ainda, existem entre os jovens 83,1% a mais de vítimas negras do que de vítimas brancas. • Com maior intensidade que na população total, 96,7% das vítimas de homicídio entre os jo- vens são homens. • Nos finais de semana, os homicídios juvenis aumentam 80% com relação aos dias da semana (Mapa da Vio- lência nos Municípios Brasileiros, 2007, p. 72).

Assim, revela-se mais um dado sobre a condição juvenil a ser con- siderado no debate e na execução de políticas públicas para a juventude quando acusada de práticas violentas e/ou ilícitas, devendo ser objeto de re- flexão a atual construção social que vêm se construindo acerca dos adoles- centes/jovens brasileiros, principalmente negros e pobres, que os enquadra enquanto “classe potencialmente perigosa”, sobre os quais são atribuídos os predicados de suspeitos, violentos, agressivos, desordeiros, vagabun- dos, tornando-os alvo principal das práticas punitivas e repressivas.

Quando se apresenta a imagem de um suspeito na tela vista por milhões de pessoas e ele cobre o rosto, é preciso distinguir entre um rosto co- berto de vergonha e um rosto que se cobre para não ser julgado antes da hora. Geralmente esse rosto é jovem e nem sempre é um rosto num corpo vivo (MISSE, 2008, p. 10).

Tal construção social é grave na medida em que se reflete principal- mente no segmento infanto-juvenil, de forma a estarmos assistindo a um crescimento bárbaro das ações violentas que vêm ceifando vidas de milhares de jovens brasileiros. De acordo com Soares (2004), a violência se manifesta de forma difusa no seio da sociedade, mas não aleatória. Os principais atingi-

dos são, sobretudo, os jovens, pobres e negros, do sexo masculino, entre 15 e 24 anos. Pode-se falar num verdadeiro genocídio da população jovem, onde perdas desta monta só se observam em situações de guerra.

De acordo com o mais recente Mapa da Violência – Anatomia dos Homicídios no Brasil (2010), lançado pelo Instituto Sangari259 e organi-

zado pelo mesmo elaborador dos Mapas anteriormente citados, o Brasil, dentre os 91 países pesquisados, está em 6º lugar nas taxas de homicídios na população geral, ocupando a mesma colocação no ranking no que se refere a homicídios na população de 15 a 24 anos. No que se refere à taxa de homicídios deste mesmo segmento etário populacional, tendo como referência o ano de 2007, o Ceará se encontra em 15º lugar, e Fortaleza ocupa a 10ª posição. Focando as taxas, na década do estudo (1997-2007), o número de homicídios teve maior crescimento nas idades mais novas: operou-se nos 15 e 16 anos de idade, aumentado acima de 30%. Segundo Waiselfisz, isso evidencia, de forma clara, que os avanços da violência homicida no Brasil das últimas décadas tiveram como motor exclusivo e excludente a morte de jovens (2010, p. 06).

Além de jovens, negros e do sexo masculino, assistimos uma in- feliz associação entre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e os homicídios, de forma tal que o menor IDH ostenta as maiores taxas de homicídios, tanto na população total quanto na população juvenil. Os al- tos índices de homicídios apontados pelo Mapa da Violência IV (UNES- CO-BRASIL, 2004) resultam da forte associação estabelecida, em nossa sociedade, entre crime, violência e juventude pobre; bem como da cons- trução social da juventude como o novo “inimigo” a ser eliminado.

259 Fundado em 2003, o Instituto Sangari desenvolve ações e projetos voltados para a

promoção da difusão científico-cultural em diversos países, dentre eles o Brasil, visando a democratização do acesso ao conhecimento científico. Disponível em: http://www. institutosangari.org.br. Acesso em 04/04/2010.

Quando são os outros os culpados pelo mal que nos atinge e quando as crenças são transcendentes ou absolutizadas, a idéia do mal vem asso- ciada à demonologia e à classificação dos inimigos, dos rivais, dos es- tranhos e dos diferentes como agentes do demônio. Muitas vezes, nes- ses casos, os inimigos não passam de bodes expiatórios que devem ser sacrificados para que a ordem ameaçada, supostamente pela presença deles, possa vigorar novamente (ZALUAR, 2004, p. 38).

Observa-se ainda que, às condições de pobreza, masculinidade e cor, reúne uma terceira: a de “delinqüente convicto”; compondo o “tipo ideal do jovem autor de infração”, sujeito perigoso, o estranho em nossa sociedade, para quem se devotam preocupações constantes, eleito como o maior inimigo de todos os tempos.

É à pobreza que se destina esse design globalizado, escondendo sobre o pretexto da promoção da paz os interesses econômicos que realmente determinam as políticas governamentais. A pretensa escalada do crime e da violência urbana é, sobretudo, uma “temática-político-midiática visando facilitar a redefinição dos problemas sociais em termos de se- gurança” e a promoção da punição dos pobres como nova tecnologia da gestão da miséria de todo mundo (BOCCO, 2009, p. 100).

A juventude pobre é também a mais nova representante da mi- séria e da ameaça à ordem, ela choca por ser trazer à tona aos olhos da sociedade o descontrole e o descaso do Estado em administrar a pobreza e promover a igualdade. Se os indivíduos pagam seus impos- tos ao Estado a fim de que este redistribua riqueza e efetive direitos, o resultado de sua incompetência e ineficácia é escancarada através do crescimento dos índices de violência e criminalidade e, princi- palmente, da morte cotidiana que atinge um número assustados de adolescentes e jovens.

Incapaz de realizar a promoção social dos excluídos do mercado de trabalho e destituídos do poder de consumo, o Estado opera sua gestão da pobreza através do recrudescimento das ações punitivas. Controlar a miséria é controlar os comportamentos e atitudes daqueles tidos como seus principais atores, utilizando-se de práticas pautadas em uma ideo- logia que toma a juventude como “caso de polícia” e segurança pública. Rotular a juventude como “classe perigosa”, impregnando-a de estigmas e atributos negativos, é um meio de desviar a atenção da ne- cessidade de intervenção em áreas sociais, apontando os holofotes na direção destes jovens, produzindo no imaginário coletivo a necessidade de urgente controle coercitivo a estes sujeitos, evitando o desabrochar da semente da delituosidade e da periculosidade que neles foi plantada.

O atendimento ao adolescente em conflito com a lei é uma terra de ninguém, um terreno baldio entre as áreas da justiça, segurança pública e assistência social; e cada uma delas espera que as outras cumpram o papel de fazer o que precisa ser feito sem, de fato, assumir seus deveres e obrigações institucionais em relação a esse segmento da população juvenil (COSTA, 2006, p. 466).

As políticas públicas para adolescentes autores de atos infracio- nais sofrem inflexões desta concepção excludente acerca da juventude, influenciando de maneira incisiva na execução e práticas de atendimento sócio-educativo.

No caso da Liberdade Assistida - enquanto medida em meio aber- to, que prioriza a convivência familiar e comunitária como essenciais à sua execução sob o fundamento de que é na relação estabelecida com o espaço social em que vive que o adolescente poderá refletir sobre suas práticas e realidade e constituir-se como ator social - a aprendizagem das regras de “bom comportamento” (pedagogia da punição) é realizada por

meio de atendimentos individuais e grupais aos adolescentes obrigató- rios ao cumprimento da medida, bem como das inflexões das práticas de atendimento sócio-educativo na convivência comunitária, nas condutas