• Nenhum resultado encontrado

3 Itens conjuncionais que começaram a ser empregados no séc

3.1 O advérbio somente é empregado como item conjuncional contrajuntivo:

E se ouver$! de mudar meus ossos nõ ho ffacã cõ chamam$!to de gente n$! gasto, somente cõ atee mea dozia de crérigos ou Religio- sos. (CJ, CXIX, l. 44-6).4

... nam avya disso memoria, somente escreveome Gonçallo Macha- do que dezia frey Diogo que nam avya de fallar a S.A. sem ho man- dar chamar. (CJ, CI, l. 66-72).

Peró que este divino sacrifiçio em nenh!a párte seja máis açeito a Deos que em os tempos, por serem pera isso dedicádos a ele, não trataremos das suas pártes e dô que significam: somente dos sinos que nos chamam a orár a Deus, per os quáes podemos entender as trombetas do Vélho Testamento e a pregaçom do Novo que chama os povos à fé. (C, l. 01-6).

Embora não conste no elenco das conjunções coordenativas contrajuntivas, apresentado pelos gramáticos contemporâneos, o item so-

mente é ainda empregado na língua portuguesa em frases do tipo: Ele não me disse tudo, somente que os pais vão viajar.

que pode ser reinterpretada como:

Ele não me disse tudo, mas (me disse) que os pais vão viajar.

ou

O Português Quinhentista - Estudos Lingüísticos

3.2 Contudo, aparece ainda com a forma não gramaticalizada ao ní- vel da escrita, cõ tudo, e até mesmo ao nível semântico, uma vez que ainda conserva o sentido original de: ‘com todas as coisas’ ou ‘com todas essas coisas’:

... mas por mim nã me da nada, antes folguo porque me mostrã a cõta que faz de mim ho mundo, e me desobrigã pera eu fazer a mesma d’ele se podesse. Cõ tudo sera pouco trabalho mandar-lhe as cartas a Arraiolos. (CT, CLXVI, l. 20-1).

Tudo leva a crer, assim, que só no final do séc. XVI, ou mesmo no séc. XVII, a forma contudo, já gramaticalizada ao nível da escrita, tenha passa- do a conjunção e assumido o conteúdo semântico adversativo.

3.3 Aparece, nas CIL, a conjunção modal de modo que, não encon- trada em outros textos do mesmo século ou de séculos anteriores:

E para isto convem, primeiro que tudo, darsse conta ao Reitor da rrezão d’esta mudança, de modo que elle a receba e veja que não tira nada da obrigação... (CIL, XLVI, l. 28-31).

3.4 Outra conjunção modal, de feição que, de idêntico teor semânti- co, ocorre nas CJ:

E se sua alteza tem võntade que eu Receba d’elle esta merce, seja esta Resposta de feição que me pareça a m# que quer sua alteza conclusão; (CJ, LXXXIX, l. 71-3).

3.5 Registra-se a conjunção temporal já que grafada ya que:

Ruy Lour$!nço e ya que e alem de o elle por sy merecer, eu trabalharey de lhe mostrar em tudo que m’alembra quãto vos tora. ( CIL, XIX, l. 48-50).

Só no séc. XVII, esse item conjuncional aparece com a forma já que do português contemporâneo:

Já que falo contra os estilos modernos, quero alegar por mi o estilo do mais

antigo do prégador que houve no mundo. (SS, l. 393-4).

3.6 O advérbio logo ‘imediatamente’ empregado em textos do séc. XV, aparece, no DVV, como conjunção conclusiva:

Todo pecádo é obrár e todo obrár é voluntário, quér seja torpe quer honesto: logo todo pecádo é voluntário. (DVV, p. 433, l. 03-5).

Rosa Virgínia Mattos e Silva e Américo Venâncio Lopes Machado Filho (orgs.)

o que parece indicar ter ocorrido, no séc. XVI, o processo de gramaticalização:

advérbio>conjunção

3.7 Aparecem as concessivas por mais... que e cõ quanto ~ com

quãto

3.7.1 por mais que com a forma ainda não gramaticalizada por mais...

que:

... e considereis que não sois tanto pai de vossa filha, por mais caro que vos custe, que não tenha custado mais a qu$! a levou para si. (CIL, XLII, l. 10-3).

A gramaticalização parece ter ocorrido no século seguinte, como ates- tam os textos consultados:

Acho-me com muitas cartas de V. Exa e com mil obrigações em cada

uma delas para beijar a mão de V. Exa outras tantas vezes, como nesta

faço, sem que os termos de agradecimento, por mais que se multi- pliquem, possam igualar o número e muito menos a grandeza de tantas e tão excessivas mercês. (CVB, CCIII, l. 01-6).

É interessante observar que a forma por mais... que continua ainda a existir.

3.7.2 Cõ quanto, com a forma ainda não gramaticalizada ao nível da escrita, ocorre:

(i) ainda não gramaticalizada ao nível semântico, significando ‘com aqueles que’ e admitindo as flexões do indefinido:

Eu, Deos seja Louvado, fico de saude com quãtos as grandes cal- mas e os trabalhosos caminhos forão a isto asaz contrairos. (CIL, XLIII, l. 48-50).

(ii) já gramaticalizada, ao nível semântico, significando ‘apesar de que’, ‘embora’:

Cõ quanto venho bem desejoso de Repousar, por que desejo mays todos os meyos para a saude e cõt$!tam$!to de sua alteza, nã me pessara de acõpanhar sua alteza $! alg"!a mays larga jornada... (CIL, XII, l. 06- 9).

O Português Quinhentista - Estudos Lingüísticos

o que comprova datar do séc. XVI o seu emprego como item conjuncional concessivo.

Percebe-se que, no exemplo acima, o item cõ quanto é empregado com o verbo ainda no indicativo. O emprego do subjuntivo parece ter sido posterior.

3.8 Conforme, começa a aparecer como locução prepositiva, seguida da preposição a e apresentando as variantes gráficas: cõforme a, confforme

a e conforme a:

... e elle me tinha escrito que tudo partiquara cõvosquo, senhor, e me tinha avisado cõforme a vossa carta; e asi se fara pois e cõforme ao que se deve fazer. (CT, CXXXIV, l. 05-7).

Muyto vos encomendo que, confforme ao que se deve esperar de vossa prudentia e de quem vos soeys, asy vos ajaes no sentimento d’este caso, posto que seja cousa tam difficil de fazer. (CR, LXV, l. 08-11).

E trabalhay quanto poderdes por que vos Responsa conforme ao que peço. (CDJIII, VI, l. 233-4).

Não ocorre, nos textos do séc. XVI consultados, como conjunção, o que indica ter se gramaticalizado no final desse século ou em época poste- rior.

3.9 Ao lado das conjunções conclusivas logo e portanto são empre- gados itens que mais tarde viriam também a ser conjunções e a expressar idêntica relação:

3.9.1 per conseguinte, hoje por conseguinte, como reforço adver- bial, com o valor semântico de ‘em, conseqüência’, ‘conseqüentemente’:

... Santo Tomás, diz < S. Tho. II. II q. c. VI ar. II >: Pai – Vergonha é um temor de torpeza reprensível, que principalmente ólha ao vitu- pério e, per conseguinte, à culpa, e isto em duas maneiras: çe[s]sando ou encobrindo. (DVV, p. 415, l. 11-4).

3.9.2 por isso, que ocorre nas formas por isso ~ por esto ~ por

esso, desde o séc. XIII, também como reforço adverbial ou encadeador da

narrativa:

E por esso lhe semelhava que se nom ouvesse a sua vontade, que morreria. (DEM, Cap. CX, l. 28-9).

Rosa Virgínia Mattos e Silva e Américo Venâncio Lopes Machado Filho (orgs.) [Por] esto no me chal de atendermos u"! pouco, ca bem sei verda- deiramente que nossa festa nom é ora sem ventura. (DEM, Cap. VIII, l. 35-7).

... e por isso nã digo mais senã que praza a Deus que seja verdade o que se por aqui afirma da yda de sua alteza pera la. (CT, CXXXV, l. 05-7).

Pode-se, pois, supor que, nesse mesmo século, ou no início do séc. XVII tenha ocorrido a passagem dos dois advérbios a conjunções conclusi- vas.

3.10 Embora aparece como advérbio, nas Cartas do Infante Luis:

Ela sera embora, e emtã vos dyrey o mays que nesta fyca por dezer, por m’o tempo nã dar lugar a mays. (CIL, I, l. 08-9).

Dom Amtonyo amigo. Qua me derã duas cartas vossas e, qyerendovos Responder a ellas por este cooreo, esperando que o secretaryo me fyzesse saber sua partyda a t$!po que podesse mylhor Responder me mãdou dezer agora às dez da noyte, estãdo na cama, quéste parterya esta noyte, e por ysso nã vos dygo mays, senã que me pesou déstardes mal semtydo e mays en tal t$!po, porque sempre me pareceo que vossa v1!da podya aproveytar. Ela sera embora, e então vos dyrey o mays que nesta fyca por dizer, por m’o tempo nã dar lugar a mays... (CIDL, no1, l. 08-15).

o que indica ter a gramaticalização do item ocorrido em época posterior. 3.11 Primeiro que, conjunção temporal, é empregada por João de Barros, uma única vez, no DVV:

E nam te pareça, depois que máis idade teveres pera julgar, ô que óra disse, que usei o modo dos médicos que preambulam cousas primeiro que dem suas mézinhas aos enfermos pera lhe[s] ser doçe e suave ô que, no seu gosto, é azedo e àspero. (DVV, p. 433, l. 06- 10).

Essa conjunção não é citada pelos gramáticos contemporâneos, mas é bastente empregada no português falado do Brasil, especialmente no re- gistro coloquial, em frases do tipo:

Vou viajar primeiro que você.

3.12 Ora, advérbio, começa a ser empregado repetido, constituindo a correlação coordenativa alternativa:

O Português Quinhentista - Estudos Lingüísticos

Ora... ora

Per semelhante módo os pronomes e partiçipios que temos se ajun- tam com os nomes sustantivos, ainda que na órdem de preçe derem àçerca de nós tem deferença, cá o nome ajetivo óra se antepõe, como os bons hómens ora se pospõe, como os hómens bons. (CLP, l. 1766-8)

3.13 Canto variante gráfica de quanto ocorre associada ao advérbio

mais e correlacionada a nã (não) uma única vez, na carta CLVIII, de

Theodosius:

Nã há glutio omrrado, canto mais christão sesudo, que nã simta mais a culpa que ho castigo. (l. 26-7).

Apesar de não constar dos elencos de conjunções apresentados pelos gramáticos contemporâneos, essa correlação é bastante empregada no português contemporâneo, na língua falada, em frases do tipo:

Não gosto de sair de dia, quanto mais de noite.

4 Itens conjuncionais que só ocorreram em textos do

Outline

Documentos relacionados