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Jaraguá como cenário da pesquisa

1.4 O grupo jaragüense

1.4.2 Jaraguá como cenário da pesquisa

Jaraguá, a exemplo de várias cidades de Goiás, surgiu a partir da mineração aurífera do século XVIII. Situa-se no centro-sul do estado, a 142 Km da capital, no chamado Vale do São Patrício, banhada pelo Rio das Almas e aos pés de uma serra que lhe empresta o nome. Segundo os dados da maioria dos estudiosos que se dedicaram a sua história, como Castro (1998), Duarte (1999), Fonseca (1999), Fonseca (2002), Pedroso (1999), Romancheli (1998) e Santos (2002), a cidade tem hoje 130 anos de emancipação política e cerca de 265 de fundação. Segundo Fonseca (2002, p. 19) “as marcas do ciclo do ouro ficaram presentes na memória de sua gente, tanto quanto estão registradas em suas edificações”, igrejas e casarios, datados do século XVIII e XIX. Da mesma essência são muitas das festas tradicionais, vivenciadas ainda hoje, que tiveram suas origens à época das minas, como a Festa do Divino Espírito Santo, das Cavalhadas, da Folia de Reis, que dão sustentação às tradições, crenças e costumes locais (Santos, 2002). Além dessa forte herança colonial, Jaraguá também deteve muitas marcas de um outro fenômeno histórico característico de alguns estados brasileiros do final de século XIX e meados do XX, o coronelismo e as oligarquias rurais.

Embora a antiga Jaraguá preserve muitos traços das várias épocas que a marcaram, atualmente convive com mudanças trazidas pela chegada da indústria de confecção de roupas que vem ganhando espaço, fazendo da cidade uma referência como pólo industrial (Santos, 2002). Curiosamente é dentro desse novo contexto de “pólo de indústria do vestuário” que o fenômeno da migração surgiu e se intensificou na cidade. Não se pode estabelecer ao certo uma relação entre esses dois acontecimentos. Muito embora, em um outro contexto, a pesquisadora Gisele Santos (2001), que investigou a migração em Criciúma em Santa Catarina, levantou a hipótese de o fenômeno lá estar

ligado a um novo rearranjo econômico pelo qual tem passado a região. Analogamente, o caso de Jaraguá também dá alguns indícios de que o contexto econômico local seja condicionante do fluxo de seus moradores para o exterior. Esses indícios emergiram em uma pesquisa anterior sobre jaragüenses nos EUA (Freitas, 2004), que apontou um índice considerável de ex-proprietários de pequenos negócios no ramo de confecção e comércio de vestuário, que teriam optado pela decisão de migrar em decorrência das desilusões advindas do fracasso dessas empresas.

Não obstante, parece-me que a migração em Jaraguá pode ser mais bem esclarecida com base em uma realidade externa à qual estaria ligada: o crescimento do fenômeno em todo o Brasil. Segundo Margolis (1993), o êxodo de brasileiros teria tido início por volta de 1986, desde quando estaria intensificando-se. Ela atribui a origem do fenômeno à crescente instabilidade política do país, e ao clima de insegurança de sucessivos fracassos de tantos planos econômicos. Como já citei antes, Governador Valadares, em Minas Gerais e Criciúma, em Santa Catarina, são as duas cidades brasileiras que ganharam notoriedade, dentro desse quadro de migração, pelas proporções do seu fluxo de migrantes. A exemplo desses dois municípios, Jaraguá também se está tornando um pólo de migração para vários países, dentro do estado de Goiás, que atualmente torna-se um estado brasileiro com grandes índices de migração internacional (Ribeiro, 1999). Essa realidade é indicativa de uma alteração de um dos perfis da cidade, que teria sido por um longo período um centro de chegada de migrantes e não de partida.

Embora Jaraguá divida algumas características de centro migratório com Governador Valadares e Criciúma, seu caráter é bem mais recente, cerca de dez a quinze anos, e seu fluxo é muito inferior, talvez pelas próprias proporções do município

em relação àquelas 3cidades. Assim como não se têm dados precisos sobre a população total de brasileiros no exterior, não se dispõem também de dados oficiais sobre o número de jaragüenses que migraram. Todavia, estima-se que os indicadores sejam altos, porque pelas conversas de rua, nos supermercados, nos bares e nas casas dos moradores são cada vez mais comuns os assuntos que variam em torno das dificuldades enfrentadas por um parente ou amigo durante o processo de requerimento de visto; da chegada no país estrangeiro; dos casos vexatórios dos que foram deportadas ou não conseguiram entrar; dos casos de aflição das famílias cujos membros aventuraram-se via México, e que ficam desaparecidos por dias, sem nenhuma notícia; dos que acabaram de voltar e dos que estão se preparando para embarcar etc. É tema corrente a contabilidade dos bens adquiridos pelos que ainda estão fora ou dos que já se decidiram por gozar deles aqui; das histórias de sucesso de alguns jaragüenses que são noticiadas em jornais locais no exterior com maior concentração de jaragüenses, como Danbury (Freitas, 2003).

Todas essas peculiaridades fazem de Jaraguá um cenário propício a estudos como o que aqui se propõe. Vale lembrar que essa investigação nasceu ainda em um momento anterior, quando as primeiras explorações ensejaram mais aprofundamento, que é o alvo deste trabalho. Não obstante, tais explorações iniciais constituem um ponto de partida fundamental e provêm muitos dados que serão aproveitados no atual estágio da pesquisa. No próximo tópico, exponho sucintamente alguns desses dados.

3 Jaraguá, segundo o IBGE, censo de 2000, possui 33.284 habitantes, contra 247.131 de Governador