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JARRO DE BOCAL TRILOBADO, E GARGALO LARGO E BAIXO

(Catál. cc-16, sep. 5)

O conjunto da cerâmica comum estudado inclui um único jarro, de acordo com a terminologia e relação de proporções definidas por Balfet (BALFET ET AL., 1983, p. 16) e Pinto (2003, p. 85). Pelas suas características formais – corpo ovóide, boca trilobada, e um colo largo, baixo e afunilado – consideramos que, de um modo geral, a peça da Rouca encontra correspondência nos jarros de tipo 7-d e 7-e de Nolen (1985, p. 59-60, Est.XIX, nºs 123 e 129). É curioso notar que os seis exemplares que ilustram a forma 7-d de Nolen (dois dos quais provenientes de Torre das Arcas) correspondem à pasta A definida para a cerâmica comum das necrópoles alto-alentejanas, indiciando tratar-se de uma produção de origem local/ regional (NOLEN, 1985, p. 243). No caso de cc-66, e tendo em conta as características da nossa pasta A, consideramos verosímil um idêntico fabrico local. A peça da Rouca distingue-se dos paralelos conhecidos pela aplicação de engobe de cor vermelha (Munsell, 2.5YR, 5/8). Colocamos a hipótese de poder tratar- se de um produto das mesmas oficinas especializadas no fabrico das bilhas com aplicação de engobe vermelho.

Inicialmente Nolen atribuiu a estas formas uma cronologia de finais do séc. I d.C. – primeira metade do séc. II (1985, p. 60 e 234), vindo posteriormente a considerar tratarem-se de produções tardias (datáveis a partir do séc. III) (NOLEN, 1995-1997, p. 370). Esta cronologia tardia suscita-nos algumas reservas em virtude de outros paralelos conhecidos. Na verdade, encontramos os paralelos mais aproximados para esta forma em Santo André, num enterramento datável de finais do séc. I – inícios do séc. II (VIEGAS ET AL., 1981, p.85, 132-133, 149, Est. XXII, D 15/16.6), e na sepultura 32 de Monte do Farrobo, cujo espólio indicia uma cronologia da segunda metade/ finais do séc. I d.C. ou da primeira metade do século II (ALARCÃO, 1974b, p. 14 e 23-24, sep. 32, nº 6, Est. IX). Esta forma encontra ainda paralelos entre exemplares de cerâmica comum ampuritana, datáveis do séc. I d.C. (CASAS i GENOVER ET AL., 1990, p. 164 e 186-187, nºs 379-380). A ausência de espólio datante entre o conjunto de materiais atribuídos ao contexto de achado da peça cc-16 impossibilita-nos de confirmar e afinar as cronologias propostas por Nolen (1985, p. 60 e 234; 1995-1997, p. 370). Todavia, atendendo aos paralelos identificados e ao âmbito cronológico genericamente definido pelas restantes formas de cerâmica comum que compõem o conjunto

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funerário a que pertence cc-16, considera-se verosímil que o fabrico desta forma se tenha iniciado durante o séc. I d.C. (eventualmente durante a segunda metade) e se tenha prolongado até ao séc. II, ou mesmo até ao séc. III.

JARRINHO(A)/ FRASQUINHO TIPO I

(Catál. cc-45, sep. 18)

Da amostra estudada destaca-se a peça cc-45, sem correspondência formal com os restantes exemplares de cerâmica comum provenientes da Rouca mas com correspondência nas formas I, II e III definidas por Sánchez Sánchez para os pequenos recipientes de cerâmica comum emeritense (SÁNCHEZ SÁNCHEZ, 1992, p. 63-65, Fig. 17, nºs 90 a 94). Apesar da nossa peça se encontrar incompleta (ausência de colo e bordo), consideramos verosímil que cc-45 encontre o seu paralelo mais aproximado na citada forma I, distinguindo-se pelo corpo ovóide e pé cilíndrico bastante elevado, ainda que sem as caneluras frequentemente registadas nesta tipologia (SÁNCHEZ SÁNCHEZ, 1992, p. 64, Fig. 17, p. 91). De acordo com esta autora trata-se de uma forma comum em Mérida mas rara fora desse âmbito local, pelo que propõe tratar-se de uma produção de origem emeritense (SÁNCHEZ SÁNCHEZ, 1992, p. 64). Esta origem parece fazer todo o sentido se atendermos que esta forma se encontra associada às pastas do grupo E de Mérida, nas quais encontra correspondência a pasta D utilizada no fabrico de cc-45, e a pasta H definida por Nolen para a cerâmica das necrópoles alto-alentejanas e documentada numa das peças que serve de paralelo a este tipo (NOLEN, 1985, p. 137 e 223, nº 514). Esta tipologia formal suscita inúmeras dúvidas quanto à respectiva funcionalidade e, consequentemente, quanto à correcta designação, pelo que diferentes autores sugerem diferentes designações e usos para este tipo de recipiente cerâmico. Se, por um lado, Nolen designa esta forma como possível unguentário ou rolha de ânfora (NOLEN, 1985, p. 137-138); por outro, na cerâmica comum de Conímbriga encontramos peças semelhantes às formas emeritenses identificadas como «unguentário» (ALARCÃO, 1974a, p. 93, Est. XXV, nº 524), «copinho» (ALARCÃO, 1974a, p. 81, Est. XVII, nº 372), ou «pucarinho» (ALARCÃO, 1974a, p. 138, Est. LV, nº 983). Pelas características tipológicas e contexto de achado deste tipo de peças (columbários ou sepulturas) Sánchez Sánchez sugere três funções possíveis para as mesmas, genericamente designadas como “tarritos” (a tradução portuguesa que nos pareceu afigurar-se mais próxima do termo espanhol corresponde a «jarrinho/a» ou «frasquinho»): unguentários; brinquedos; ou recipientes simbólicos, de carácter funerário (SÁNCHEZ SÁNCHEZ, 1992, p. 63-64). Uma eventual utilização como «rolhas de ânforas» suscita algumas dúvidas em virtude do fabrico cuidado deste tipo de peças, amiúde decoradas (SÁNCHEZ SÁNCHEZ, 1992, p. 64; NOLEN, 1985, p. 138). À semelhança do que se verifica para a peça documentada por Nolen (proveniente da sepultura 33 de Padrãozinho), a peça da Rouca revela pouca estabilidade no seu pé estreito e pesado (NOLEN, 1985, p. 137-138, nº 514), pelo que julgamos não ser totalmente descabido ponderar uma eventual função ritual ou simbólica, eventualmente ligada aos cultos funerários.

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O nosso jarrinho/a de tipo I encontra também paralelos na cerâmica comum ampuritana, cujos exemplares conhecidos desta forma são maioritariamente procedentes de contextos da segunda metade do séc. I d.C. e primeira metade da centúria seguinte, período a partir do qual este tipo de achados deixa de estar documentado, pelo menos em cerâmica comum (CASAS i GENOVER ET AL., 1990, p. 205, 210- 211, nºs 411 e 412). A forma I de Mérida não tem cronologia atribuída, mas a cronologia proposta para as formas II e III abrange o período do séc. I d.C. ao séc. III (?) (SÁNCHEZ SÁNCHEZ, 1992, p. 65). Esta cronologia encontra correspondência nas datações apresentadas para os exemplares provenientes do Padrãozinho – séc.s II d.C. a III (NOLEN, 1985, p. 252, nº 512) e Conímbriga – séc.s I d.C. a II (ALARCÃO, 1974a, p. 157 e 160, nºs 372 e 524). Em virtude dos dados disponíveis, e uma vez que a classificação tipológica do único material datante associado a cc-45 se encontra comprometida (uma lucerna de forma Dressel-Lamboglia 27-28 ou Dressel-Lamboglia 30A), limitamo-nos a propor a forma cerâmica em questão uma cronologia de fabrico/ utilização genericamente compreendida entre o séc. I e o séc. III d.C..

POTES

A amostra analisada forneceu 11 peças enquadráveis nesta categoria tipológica. Mais uma vez tomou-se como referência para a nomenclatura das formas a proposta de Balfet, de acordo com a qual a forma «pote» designa um recipiente fechado, com ou sem colo, cujo diâmetro mínimo é igual ou superior a um terço do diâmetro máximo (a altura, tendencialmente compreendida entre uma a duas vezes o diâmetro de abertura, pode ser sensivelmente inferior) (BALFET ET AL., 1983, p. 16). Através da análise da amostra em questão tornou-se evidente a variedade de formas que compõe esta categoria tipológica, genericamente composta por recipientes, de formas maioritariamente ovóides e isentos de asas, destinados ao armazenamento, e eventual confecção, de alimentos (ALARCÃO, 1974a, p. 35; NOLEN, 1985, p. 16). Os potes representados nos conjuntos funerários da Rouca, à semelhança do que se verifica nos exemplares provenientes das necrópoles elvenses, revelam uma evidente variedade formal, e fabricos mais ou menos grosseiros, mas quase sempre denunciando uma origem local ou regional (NOLEN, 1985, p. 16).

À margem das diversas (sub)categorias tipológicas definidas ficaram três fragmentos de bordos identificados, ao longo do presente trabalho, como cc-2, cc-9 e cc-41, e atribuídos, respectivamente, às sepulturas 1-2, 4, e 16 da necrópole da Rouca. As características dos fragmentos disponíveis não possibilitaram uma eventual reconstituição da forma das peças, e a respectiva classificação tipológica. Assim sendo, e reconhecendo a maior representatividade das formas completas ou passíveis de reconstituição (quer em termos numéricos, quer em termos de significância para o conhecimento desta categoria formal na amostra em análise), optou-se por privilegiar a morfologia dos bojos como critério basilar na definição dos diferentes tipos de potes representados.

68 TIPO I – POTINHOS DE PERFIL OVÓIDE, OMBRO MARCADO POR CANELURAS, BORDO VOLTADO PARA O EXTERIOR, E DECORAÇÃO DE CARRETILHA

(Catál. cc-31, sep. 14; cc-53, sep. 29)

Dispomos de duas peças que se enquadram na tipologia dos designados «potinhos alentejanos» e, de acordo com as características definidas por Nolen, na variante I desta forma (NOLEN, 2004, p. 85 e 87), com origem no Alto Alentejo e bem representada no espólio das necrópoles elvenses (NOLEN, 1985), Santo André (VIEGAS ET AL, 1981), Aramenha (NEVES, 1972), El Pradillo (DEL AMO, 1973; HABA QUIRÓS, 1998), Mérida (SÁNCHEZ SÁNCHEZ, 1992), Conímbriga (ALARCÃO, 1974a) e até Monte Mozinho (SOEIRO, 1981-82). Caracterizam-se pelo bojo ovóide, decorado com bandas impressas, o ombro reentrante marcado por canelura(s), e o bordo voltado para o exterior; bem como pelo seu fabrico em pastas finas e compactas, de boa qualidade, geralmente cozidas em forno redutor, conferindo-lhes assim a típica coloração cinzenta a cinzenta escura. As características das pastas usadas nas peças da Rouca, tal como referido anteriormente, encontram correspondência nas pastas dos exemplares documentados nas necrópoles alto-alentejanas (NOLEN, 1985, p. 114-115 e 248) e em Santo André (VIEGAS ET AL., 1981, p. 102-103), indiciando uma provável origem local/regional para um tipo de produto mais requintado e com um amplo mercado de difusão, como o atestam, por exemplo, os paralelos conhecidos em Conímbriga (ALARCÃO, 1974a, p. 99-100, Est. XXVIII, nºs 606-608). O facto de não se encontrarem paralelos exactos para a conjugação do perfil do colo e bordo de cc-31 parece reforçar esta hipótese, colocando-nos perante uma provável variante da produção de um oleiro local/regional. De acordo com Sánchez Sánchez (1992, p. 40), as ligeiras variações no perfil, decoração e bordo comuns a esta forma não são significativas, sendo evidente tratar-se de um mesmo tipo comum. Tais variações não devem ser interpretadas como diferenças de âmbito cronológico, mas antes como prováveis indícios da existência de diferentes oficinas a fabricarem um produto com uma influência em comum (a cerâmica de paredes finas?) (NOLEN, 1985, p. 115). Segundo diversos autores (SÁNCHEZ SÁNCHEZ, 1992, p. 41; NOLEN, 1985, p. 115-116; DEL AMO, 1973, p. 73), deve atribuir-se a esta produção um carácter regional, com origem lusitana, e uma cronologia a partir de Cláudio até ao primeiro quartel do séc. II. A presença deste tipo de potes em Mérida (SANCHÉZ SANCHÉZ, 1992, p. 40-41, Fig. 8, nº 41) poderá ser mero reflexo da comercialização e divulgação de um fabrico de origem alto- alentejana, ou pelo contrário, poderá estar relacionada com a produção de paredes finas emeritense (RODRÍGUEZ MARTÍN, apud HABA QUIRÓS, 1998, p. 334).

Em termos de acabamento, a típica decoração impressa, definindo um fino padrão recticular, encontra os seus paralelos mais próximos nos exemplares das necrópoles alto-alentejanas (NOLEN, 1985, p. 114- 117, Est. XLI, nºs 420 a 436), e em Santo André [VIEGAS ET AL., 1981, p. 102-103, Est.s XIV, LXI, e LIII, D 1(4), J 3(3), e G 4.3]. No que respeita à aplicação de aguada ou engobe de cor escura, é de notar que 7 exemplares do total de 15 potinhos de tipo 1-a documentados por Nolen (1985, p. 214-215, Est. XLI, nºs 420, 423, 424, 430, 432, 433 e 434) apresentam este tipo de acabamento, à semelhança da peça cc-31 da necrópole da Rouca.

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Com base no espólio datante associado aos potinhos de cerâmica cinzenta documentados na necrópole de Valdoca, Alarcão atribui-lhes uma cronologia do séc. I d.C. (em especial da segunda metade da centúria) (ALARCÃO & ALARCÃO, 1966, p. 11), cronologia posteriormente corroborada pelo estudo dos potinhos de Santo André (VIEGAS ET AL., 1981, p. 102-103) e das necrópoles elvenses (NOLEN, 1985, p. 114-115; 1995-1997, p. 374), indiciando assim a existência de fabricos distintos da mesma forma, localizados no Alto Alentejo e no Baixo Alentejo, mas aparentemente contemporâneos. Tendo em conta os paralelos conhecidos, e o espólio associado às peças cc-31 e cc-53 da Rouca, reforça-se a ideia de uma cronologia sensivelmente da segunda metade do séc. I d.C., eventualmente extensível a inícios do séc. II. A ausência dos ditos «potinhos alentejanos» entre o espólio cerâmico da necrópole de Silveirona (CUNHA, 2004) parece-nos sintomática do desfasamento cronológico entre o período de produção e utilização deste produto local e a diacronia de utilização de Silveirona I e II.